Categoria: Educação

  • O ensino remoto e pesquisa no pós-graduação sob olhar das mestrandas

    Texto escrito por Priscila Ayres Wonghon e Roseana Passos

    Para falar do assunto que nos propomos neste texto, o ensino remoto e a pesquisa no pós-graduação, é preciso primeiramente dizer como entendemos o ensino, a ideia que entendemos em relação a experiência docente e discente. Entendemos que a experiência formativa de cada um é subjetiva e muitas coisas vão nos subjetivando ao longo da nossa vida.

    Como nos relacionamos com os espaços físicos, que valor atribuímos a ele, como nos relacionamos com os docentes, com os colegas, e com nossos objetos de estudo. Somos tocados, atravessados por discursos, e experiências diversas. E assim como Larrosa acreditamos que a experiência formativa se dá também em voltar-se a si mesmo, uma viagem ao interior.

    Em específico este texto da série envolve esta viagem ao interior, buscando nossas reflexões com o ensino e a pesquisa remotos na pós-graduação. Escrevem aqui uma mestranda  do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências (PPGEC) que trabalha em sua pesquisa desde antes da entrada do ensino remoto e outra mestranda também do PPGEC que já entrou no curso de pós-graduação  na forma de ensino remoto, e até a sua seleção de entrada no programa de pós foi de forma remota. Cada uma de nós tem visto de forma diferente esse modo de ensinar, aprender, estudar e se comunicar.

    Ensino no pós: do presencial ao remoto

    Seguimos aqui nosso texto sobre o ensino remoto, com a minha escrita. Me apresento primeiro. Sou Priscila, estudante de pós graduação, e este momento pandêmico tem me atravessado enquanto sujeita de diversas maneiras. Eu poderia citar o quanto este momento me atravessa enquanto profissional da área da Educação Infantil, mas, no entanto, não posso fazê-lo, pois com as escolas fechadas e com poucas oportunidades de emprego na área, me encontro afastada de tais atividades.

    É importante marcar aqui que quando cito as escolas fechadas, cito no intuito de contextualização de meu momento profissional, e não com um intuito de crítica ao fechamento das mesmas. Entendo que neste momento pandêmico o fechamento das escolas significa preservar vidas, as vidas das crianças, seus responsáveis e profissionais da Educação, pois muitos podem ser assintomáticos e mesmo assim contaminar outros, levar para a escola o vírus ou da escola para suas casas.

    Hoje já com a vacinação de professores e profissionais da Educação já é possível ver algumas escolas em funcionamento, atendendo de forma reduzida ou em Ensino Hibrido. Ainda é um processo de adaptação na retomada das atividades, mas estamos trilhando o caminho de volta a normalidade.

    O ensino remoto e alguns questionamentos

    Mesmo afastada de minhas atividades, tenho me questionado muito sobre o ensino remoto para a Educação Infantil, como tem se dado as interações com crianças tão pequenas em meio uma tela de computador? Como adaptar as metodologias, como prender a atenção deles em meio aos estímulos de casa? São perguntas que me faço pois também sou aluna, aluna do mestrado num programa de pós-graduação, e a falta dos espaços físicos da universidade tem me tocado muito, mesmo sendo uma pessoa já adulta.

    Pode parecer bobagem para muitos, mas para mim estar dentro dos espaços da universidade sempre foi meu ponto de equilíbrio, de resgate de forças e energia. Minha terapia, assim como também a concretização de um sonho! Por algum tempo depois do término do Ensino Médio, almejar estar dentro da universidade foi o que me deu forças para seguir. Assim, após esta conquista, os espaços físicos se tornaram para mim algo a mais do que apenas paredes de concreto, estes espaços são repletos de significados para mim.

    Estudos sozinha e trocas de experiência

    Estudar, sozinha, no silêncio da biblioteca, e, ao mesmo tempo, ver muita gente, gente diversa. E essa diversidade toda, naquele espaço em comum, naquele momento em silêncio, todos estavam buscando o mesmo: conhecimento, formação. Sem contar o fato da biblioteca ser pública e de imensa qualidade, poder ter a sensação do livro físico em mãos (mesmo que por um tempo curto), livros estes que muitos inclusive eu não poderiam (ou ainda não podem)  adquirir, saber que após minha leitura outros terão a possibilidade de os ler, e assim ter acesso a conhecimentos diversos, tudo isso no ensino remoto perdemos, pois a ida a biblioteca em seu espaço físico já não pode mais ser feita.

    As trocas de experiência nas salas de aula, as conversas com os professores(as) e com os colegas, aquilo que dá sentido à prática, ao debate, à troca de ideias, à circulação de discursos. A partilha do mate, do conhecimento e do afeto. Do café no Centro de Convivência, a janta do Restaurante Universitário em meio a inúmeras aulas diárias, estágio e horas complementares.

    Desafios diários

    O ensino remoto tem sido desafiador, pois dentro das demandas diárias de uma casa, é muito difícil dissociar o espaço, a casa, e seus afazeres, para prestar atenção somente na aula que está sendo dada, ou somente na escrita de minha pesquisa. Este espaço que antes era o do lar, agora se mescla ao do trabalho… São diversos os estímulos que temos que lidar, o cachorro que late, a vizinha que escuta música alta, o marido que chama. Esses são apenas alguns dos exemplos. Sem contar a constante falta das interações e relações humanas.

    O Ensino Remoto tem nos trazido diversos desafios como os ditos no parágrafo acima, e como cita Saraiva, Traversini e Lockmann, tanto para docentes quanto para discentes a insegurança do que há por vir, a ansiedade que nos assola frente as condições sanitárias e econômicas do nosso país tem sido motivos de exaustão.

    Na minha opinião, o que ficará de aprendizado do ensino remoto em meio a pandemia, é a valorização das relações. Destaco, também, o entendimento de que podemos utilizar sim a tecnologia a nosso favor, como por exemplo, no meu caso de estudante de pós-graduação, reuniões e orientações, caso não haja a possibilidade de deslocamento, as próprias reuniões de grupo de pesquisa que passaram a ser virtuais e tem funcionado de forma bastante satisfatória, disciplina como a de seminários onde assistimos aos trabalhos de pesquisa dos colegas do Programa de Pós Graduação e interagimos com os mesmos. Trazendo equilíbrio dentre as metodologias de ensino como formas de estímulo para os estudantes independente da etapa e grau educacional.

    Ensino remoto na pós-graduação: sob o olhar de uma mestranda

    Lendo as observações que a Priscila trouxe ao debate, percebo que há alguns pontos que concordo com ela, pois afinal já fui aluna de aulas presenciais minha vida toda… Bom, mas especificamente agora, na pós-graduação, eu, Roseana, formada em biologia licenciatura, tenho vivido uma infinidade de novos sentimentos e aí vai um pouco deles pra vocês.

    Tentar aprovação em um programa de mestrado é sempre desafiador, mas com uma pandemia acredito que seja um pouco mais complicado…

    Depois de 6 anos parada da vida acadêmica, após muita reflexão e confesso que com muito medo, pensei a hora de voltar a correr atrás dos meus sonhos e fazer meu mestrado, algo que sempre quis desde que saí da graduação (mas a vida me levou a outros caminhos). Obviamente a primeira coisa que me veio à cabeça: Como vou estudar tudo que preciso para entrar no mestrado sem poder pegar um livrinho? Tá, mas peraí, felizmente tudo pode ser online. Ok, lá fui eu: filho pequeno (check), pandemia (check), anos sem escrever (check). Alguns momentos pensei que ia dar uma enlouquecida básica (que todos devem ter quase ou dado) desde abril em isolamento, e, ainda, inventei mais este desafio.

    Enfim, alguns fios de cabelos a menos, muitas lágrimas (muitas mesmo). Um pré-projeto feito, entrevista, lattes e SIMMMMMMMMM! Estou dentro! Agora é comemorar (sem poder aglomerar – que tristeza, mas ok).

    Hoje, quase 6 meses depois da aprovação, penso que entrei num grupo de pesquisa INCRÍVEL, onde conheço pessoalmente apenas duas pessoas, os outros 6 nunca vi pessoalmente. Meu tema de dissertação mudou, a vida mudou, tudo mudou (e a vacina ainda não chegou para minha faixa etária, mas FINALMENTE parece bem próxima), mas me sinto realizada.

    Toda semana temos uma reunião online, onde debatemos sobre alguma leitura realizada pelo grupo. Às vezes é a única interação que tenho com pessoas que não moram comigo, então sempre é um momento alegre e de muito aprendizado. Ainda temos aulas e orientação, tudo online, muitas vezes isso é um desafio. Internet que não funciona, cachorro que late, gato miando, filho chorando. Mas é isso, esse é o nosso novo normal, então nos resta ‘seguir o baile’.

    Parece que conheço meus colegas pessoalmente e somos amigos faz tempo, nesses 6 meses não foram poucas às vezes que surtamos juntas (sempre online, obviamente) e pensamos ‘pelo menos temos umas às outras’.

    Good vibes?

    Não consigo ser ‘good vibes’ e ver o ‘lado bom’ do que estamos vivendo. Isto é, ter um presidente negacionista e ignorante que atrasou a compra da vacina tantas vezes é desesperador. Mesclo o sentimento de esperança e desesperança o tempo todo. Ver mais de 500 mil pessoas morrendo por falta de vacina e muita gente ainda negando a gravidade da situação dá um vazio enorme, todos os dias sabemos de alguma notícia triste e cada vez mais perto de nós.

    Obviamente, consigo enxergar o privilégio de fazer home-office. Bem como, conseguir me manter segura todos esses meses. Além disso, também tive a sorte de encontrar pelo meu caminho pessoas maravilhosas, que dão luz a dias tão escuros. Mas não vejo a hora de conhecer pessoalmente meus colegas, abraçar, conversar e obviamente tomar um chopinho bem gelado, em segurança, sem máscaras, onde todos possamos ver sorrisos novamente.


    Para saber mais…

    SARAIVA, K.; TRAVERSINI, C.; LOCKMANN, K. A educação em tempos de COVID-19: ensino remoto e exaustão docente. Práxis Educativa, v. 15, p. 1-24, ago. 2020. ISSN 1809-4031. Disponível em: https://revistas2.uepg.br/index.php/praxiseducativa/article/view/16289. Acesso em: 9 out. 2020.

    Diretor da Pfizer escancara atraso letal do Governo Bolsonaro na compra de vacinas. Jornal EL PAÍS, Brasília 13 de maio de 2021. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2021-05-13/diretor-da-pfizer-escancara-atraso-letal-do-governo-bolsonaro-na-compra-de-vacinas.html Acesso em: 3 junho de 2021.

    LARROSA, Jorge. Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. Porto Alegre: Contrabando, 1998.

    As autoras

    Olá! Meu nome é Priscila, sou Pedagoga. Formada pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG. Atualmente sou mestranda em Educação em Ciências e faço parte do grupo de Pesquisa PemCie.

    Olá! Meu nome é Roseana, sou Bióloga. Formada pela Universidade Federal do Rio Grande – RG. Também sou mestranda em Educação em Ciências e faço parte do grupo PemCie.

    Este texto foi elaborado originalmente no Blog Pemcie

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, o texto foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • O que muda no pós-graduação com o ensino remoto?

    Antes de falar sobre o ensino remoto e a pós-graduação. Antes de mais nada, eu, professora Lavínia, gostaria de me apresentar para as inquietações e discussões que eu trouxer terem sentido para vocês. Sou professora há 21 anos! Aham, maioridade já! E posso dizer que se tem uma coisa que me inspira no trabalho como professora – no Ensino Médio, na graduação ou no pós-graduação – é o contato direto com os estudantes. Aquele cotidiano de sala de aula que nenhum outro tipo de interação é capaz de substituir. Nós enxergarmos aquele grupo à nossa frente, “olho no olho”. Os gestos feitos, as posições corporais tomadas e as frases ditas durante o processo de ensinar e de aprender não tem qualquer mecanismo tecnológico que substitua.

    Sim! Estou muito insatisfeita com o rumo que tivemos que tomar durante essa pandemia. Ouvíamos falar de gripe espanhola, de outras pestes que acometeram a população mundial ao longo da história e jamais, nem nos piores pesadelos, pensávamos passar por isso. Ainda mais ter no distanciamento social, uma das principais formas de prevenção a essa doença. Nem vamos falar nas vacinas, a segunda possibilidade de prevenção que o governo brasileiro também – assim como o distanciamento – não soube organizar nem possibilitar para a população.

    Esse ensino remoto é igual pra qualquer professor? E vale para qualquer nível de ensino?

    Vamos falar disso nos próximos textos. Mas hoje o assunto é pós graduação e, em relação ao ensino de pós-graduação – um dos níveis de ensino que trabalho atualmente – temos a possibilidade de continuidade pelo trabalho remoto, em nossas casas, com auxílio da internet. É a internet que nos une aos estudantes, aos colegas de trabalho e aos nossos grupos de pesquisa.

    Em termos de quantitativo de trabalho, em meu caso, não houve mudança. Isto é, continuo com as mesmas atividades que já divulgamos em outros textos aqui e aqui também neste blog. Inclusive, me sinto um pouco mais sobrecarregada! Isto porque os horários, no trabalho remoto, se ampliam e se mesclam aos afazeres de manutenção de uma casa. Ou seja, muitas vezes, quando me dou conta, ultrapasso o trabalho de 40h semanais, avançando a noite à frente do computador.

    Nessas horas, dá uma saudade do sinal sonoro da escola! Aquele marcador disciplinar que ditava o início e o fim das aulas. Ele marcava o momento em que eu veria outros rostos em uma turma diferente ou que avisava que era a hora de saída do trabalho! Tudo bem, vocês podem dizer que na graduação ou no pós-graduação não tem sinal.

    É… Não tem! Mas os marcadores do que este sinal representa dentro do contexto educacional persistem dentro de nós. Estão introjetados! Assim como a forma de nos acomodarmos em sala de aula, sejamos estudantes ou professores. E assim também, como as tarefas que temos de entregar e os objetivos que temos de alcançar, sejamos alunos ou professores. Essas tarefas e objetivos permanecem, mesmo no trabalho remoto.

    Marcadores na escola e na sociedade: os mecanismos disciplinares…

    Estamos falando aqui de mecanismos disciplinares! Desde que nascemos somos interpelados por eles. E claro que eles nos ajudam a nos tornar o que somos. Assim, vamos sendo disciplinados pela organização familiar, pelos tempos definidos para cada ação ou atividade dentro dela. Também pelo espaço que ocupamos dentro de nossa casa tanto corporalmente, quanto nas funções que assumimos nessa instituição familiar.

    Depois, conforme vamos nos desenvolvendo, outros tipos destes mecanismos de disciplina corporal, de tempo, do espaço, ou funcional nos produzem dentro da escola, e de outras instituições que vivenciamos. Aprendemos, nessas vivências, que há modos de falar e se portar em determinados contextos. Aprendemos que não se pode falar ou fazer qualquer coisa a qualquer hora! Assim, os mecanismos disciplinares são aqueles que agem sobre nossos corpos para torná-los produtivos e parte da nossa sociedade (FOUCAULT, 2002).

    Voltando ao nosso tema sobre o ensino remoto na pós-graduação, percebo que não temos tantas dificuldades em relação ao desenvolvimento das aulas, pois os estudantes do nível de pós-graduação já estão muito bem disciplinados. Foram, no mínimo, 16 anos de escola, incluindo Educação Básica e Ensino Superior.

    E é por isso que estes pós-graduandos abrem suas câmeras, sem receio de mostrar o rosto. Eles participam abertamente das aulas, têm muito menos vergonha de se expor, e fazem todas as tarefas disponibilizadas a eles. Neste futuro pesquisador que está se formando, os mecanismos disciplinares já estão bem internalizados no corpo e na mente.

    Mecanismos disciplinares são produtivos, qual é o problema no ensino remoto?

    Então, professora, se parece que está tudo bem ao nível de pós-graduação, o que a incomoda tanto? Aí, eu posso dizer que nem só de disciplina vive o humano… hehe!

    Como professora, não tenho queixas ou problematizações acerca do trabalho no pós-graduação em relação ao comprometimento dos estudantes. No entanto, assim como todos nós que estamos nessa “bolha” profissional daqueles que podem desenvolver trabalho remoto, a falta da convivência direta com o outro que nos abate! Essa ausência de contato físico, o “olho no olho” que comentei no início atrapalha bastante o andamento das atividades. Assim, essa ausência é sentida pelos professores – e também pelos alunos, como vocês verão na sequência da série – em qualquer nível de ensino.

    O que nos move é o contato! O contato com os espaços físicos da universidade, com os colegas no cafezinho no Centro de Convivência. Aquele papo aleatório no corredor com o colega que não via há um tempo, ou apenas a conversa que trocamos com o/a porteiro/a do prédio! É isto que a pandemia tem tirado dos professores!!!

    O que vem agora no ensinar e aprender?

    Aqueles que já vivenciaram as duas formas de ensino: presencial e remota, entendem o que tenho dito. Dessa forma, fico me perguntando se criaremos um novo modo de entender e produzir a educação nas escolas? Penso naquelas crianças que nunca vivenciaram outra forma de ensino a não ser esta mediada por tarefas impressas ou por tarefas postadas em plataformas digitais. Ou ainda, quando possível, por conversas mediadas via computadores e acesso à internet.

    Em suma, elas estão tendo um outro tipo de disciplinamento. E aquilo que há pouco me referi como o que mais move o professor em sua sala de aula, talvez possa não existir para elas. Um novo de ensinar, de aprender e de disciplinar os sujeitos vem sendo desenhado. Quais os resultados disso? Outras pesquisas e textos nos dirão.

    Para saber mais sobre o que foi trazido aqui…

    Foucault e a educação: entre o poder disciplinar e as técnicas de si (é possível educar para a liberdade?). Artigo de Fábio Antonio Gabriel e Ana Lucia Pereira, publicado na Educação em revista. V19. 2018.

    O texto clássico de Michel Foucault sobre o poder disciplinar é do livro Vigiar e Punir, cuja 12ª edição é da Editora Vozes. 2002.

    Este texto foi elaborado originalmente no Blog Pemcie

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Reflexões sobre o Ensino Remoto: da escola à universidade!

    Vocês já pararam para pensar como nos formamos e de que modo nos inserimos dentro de determinados grupos sociais?

    Pois esta é uma das linhas que analisamos e pesquisamos: “como nos tornamos quem somos”. Dessa forma, em tempos de pandemia, este debate tem sido frequente no PEmCie. Assim como somos todos professores, também temos estudado sobre estas formações que tivemos – e temos ainda – a partir do ensino remoto.

    Resolvemos compartilhar com vocês um pouco destes nossos estudos e reflexões, a partir desta semana!

    Em nossas discussões semanais no grupo de pesquisa PEmCie, percebemos que estamos em constante formação desde que nascemos. A partir das leituras que fazemos, sabemos que mesmo algumas características pessoais, que parecem ser nossas desde a nascença, não são tão naturais assim. 

    Após nascermos, conforme vamos crescendo, passamos a conviver com pessoas diferentes de nossos núcleos familiares, de locais diversificados, em situações inesperadas, com outros modos de ver e pensar o mundo. Então, vamos nos constituindo enquanto sujeitos de uma época, de um local, de uma família conforme vamos crescendo e outros discursos vão nos interpelando.

    A pandemia e o tempo de docência

    Em especial, nesse Brasil de 2020 e 2021, o que mais tem mexido com nossas subjetividades de professores e pesquisadores – lembrem que somos múltiplas facetas – é este momento pandêmico. As pequenas atitudes ou as ações diárias que fazíamos se modificaram com: o trabalho remoto (ou a ausência dele), as dificuldades de grande parte da população em conseguir obter uma renda para se manter, com os preços de alimentos subindo, as restrições de saída para “arejar a cabeça” num barzinho, numa festa (ou numa reunião de amigos), o uso constante de máscaras e álcool gel; entre outros. 

    O nosso grupo, como vocês já sabem aqui pelos textos do blog, discute questões que envolvem educação, ciência, cultura e política e produz pesquisas em educação e, mais especificamente, educação em ciências. Mas não é só isso, nós Somos pesquisadores de diferentes graduações como Matemática, Pedagogia, Biologia. Além disso, somos todos professores ou quase lá. 

    Assim,  o que vamos falar nessa série de textos a partir de hoje é o que mudou com o ensino remoto.

    Já de início, destacamos que a série que passamos a produzir agora será feita de reflexões, pensamentos, questionamentos… Dessa forma, colocaremos aqui o que esse contexto pandêmico tem causado neste grupo de professores pesquisadores no sul do país.

    Logo que começou o ensino remoto, este tema frequentemente surgia em nossas reuniões de pesquisa. Larrosa sempre nos ensinou que aquilo que nos toca de alguma maneira, nos constitui e assim passamos a pensar em divulgar o que temos pensado sobre este assunto. E é isso que vais encontrar nas próximas postagens!

    Série Reflexões sobre o Ensino remoto: da escola à universidade! 

    Os dois primeiros textos desta série envolvem as nossas reflexões com o ensino e a pesquisa remotos na pós-graduação. Assim, Lavínia inicia essa discussão, apontando seu olhar como professora no Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências (PPGEC). 

    Depois deste primeiro texto, Priscila, que entrou no mestrado ainda no modo presencial antes da pandemia em 2019, e traz para nossa discussão sua visão da Pós-Graduação antes da pandemia e do momento presente. E Roseana entrou na seleção de novembro de 2020, quando todas as etapas foram feitas de forma online e continuam assim até hoje. Por isso, ela trará para nós algumas reflexões sobre esse processo.

    A formação docente via EAD na graduação

    O quarto texto consiste na visão de dois alunos de graduação, bolsistas no grupo PemCie: o Pedro Leal, que participa do  grupo há dois anos e o Jonathan Cardoso que participa do grupo há um ano, ambos perto da conclusão do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas. Assim, nesses textos, os dois falam sobre a suas vivências durante uma formação em ensino remoto, articulando lados positivos e negativos de estar inseridos neste contexto.

    Seguindo a série, os autores Mélany Santos e Peterson Keeps cursam a segunda licenciatura em Pedagogia no modo EAD, contudo já ingressaram no curso durante o período de pandemia. No quinto texto, eles apontam suas vivências, e falam como tem sido essa adaptação com as atividades que seriam de modo presencial, como, por exemplo, os estágios,  no modo remoto. 

    A educação escolar e o Ensino Remoto

    Já no penúltimo texto da série, vamos trazer inquietações e vivências sobre a educação escolar no Ensino Fundamental. Assim, novamente, Mélany e Peterson escrevem, agora como professores que atuam na rede pública de ensino. E, a partir disso, relatam de forma mais específica certos acontecimentos do chamado ensino emergencial. Além disso, apontam críticas ao modo como a Secretaria de Educação Municipal conduziu o processo; apresentando as dificuldades encontradas neste período, bem como os desafios superados.

    Por fim, em continuidade à postagem sobre a educação básica, Tanise irá abordar algumas  experiências vividas por ela como professora recém formada que atuou no ensino híbrido em uma escola privada de Ensino Fundamental.

    Finalizando

    Em suma, com essa apresentação de todos textos e autores da série, convidamos a seguir atento às postagens e a trocar conosco ideias sobre o ensino remoto em tempos de pandemia!

    Por fim, organizamos uma tabela abaixo é para você não perder nenhuma postagem dos olhares sobre o ensino remoto em diferentes níveis educacionais, desde a Educação Básica até o Ensino Superior.

    Texto 1Reflexões sobre o ensino remoto na educação: da escola à Universidade!
    Texto 2 O que muda na pós-graduação com ensino remoto?
    Texto 3 O ensino e a pesquisa remotos no pós-graduação sob olhar das mestrandas
    Texto 4Aprendizagens e defasagens com o ensino remoto numa licenciatura
    Texto 5E a licenciatura em ead? mudou muito?
    Texto 6 Ensino Fundamental e a pandemia de covid-19: realidades e vivências no ensino público
    Texto 7Ensino Fundamental e a pandemia de covid-19 II: realidades e vivências no ensino privado

    Para saber mais sobre a formação de como nos tornamos o que somos…

    LARROSA, Jorge (2002) Notas sobre a experiência e o saber da experiência.

    Gostou deste texto? Pois vocês podem gostar também de:

    Disciplina e escola: que sujeitos queremos formar?

    Identidade, cultura e música em dias de sol

    Como pensamos? Os sistemas de pensamento na história

    Este texto foi elaborado originalmente no Blog PEmCie

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Ciência para Crianças! Como funcionam as vacinas

    Por Giovanna S. Veiga e Carolina S. Mantovani

    No quadrinho anterior, Dragonino ficou sabendo que os cientistas já desenvolveram vacinas contra o novo coronavírus. Não perca o videoclipe do MC Fioti e as informações que Draco trouxe sobre a vacina do Butantan! Dragonino ficou muito feliz com a novidade, mas ainda não sabe muito bem como funcionam as vacinas. Você já sabe?

    Para resolver isso, hoje Draco vai explicar melhor sobre as vacinas! Sistema imunológico, patógenos, vírus inativados, células de defesa, anticorpos, memória imunológica… junte-se ao Dragonino e venha descobrir o que isso tudo tem a ver com as vacinas!

    Quadrinhos da série "Ciência para Crianças!", com o tema "Como funcionam as vacinas".

    Obs.: após esses quadrinhos terem sido elaborados, surgiram notícias sobre algumas vacinas já estarem sendo testadas em crianças e adolescentes também. Assim, espera-se que em breve esse grupo possa ser incluído na fila da vacinação, respeitando a ordem das prioridades.

    O que você achou das explicações do Draco sobre como funcionam as vacinas? No próximo quadrinho, vamos entender sobre a importância da vacinação em massa para gerar a “imunidade de rebanho”. Não perca!

    Fontes de informações:

    Equipe: 

    • Design, pesquisas e roteiro: Giovanna S. Veiga e Carolina S. Mantovani

    Este texto foi escrito originalmente no blog Nas Asas do Dragão

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Dilema do Prisioneiro e o Lockdown

    Dilema do Prisioneiro é um famoso experimento mental da teoria dos jogos (ramo da matemática aplicada que estuda situações estratégicas onde os participantes escolhem diferentes ações na tentativa de melhorar seu retorno), que apesar de variações nos valores, pode ser exemplificado como:

    Duas pessoas são presas (A e B) por um crime e mantidas em celas separadas.

    Então apresentam a ambas a mesma proposta:

    • se você confessar e seu parceiro ficar em silêncio, você estará livre e seu parceiro cumprirá 10 anos de prisão;
    • se você ficar em silêncio e seu parceiro confessar, você cumprirá 10 anos de prisão e ele estará livre;
    • se você e seu parceiro confessarem, ambos cumprirão 5 anos de prisão;
    • se nenhum dos dois confessar, ambos cumprirão 1 ano de prisão.
    Prisioneiro “B” se mantêm em silêncioPrisioneiro “B” confessa
    Prisioneiro “A” se mantêm em silêncioAmbos cumprirão 1 ano“A” cumprirá 10 anos enquanto “B” sai livre
    Prisioneiro “A” confessa“A” sai livre enquanto “B” cumprirá 10 anosAmbos cumprirão 5 anos

    Esquema da relação

    Nesse dilema cada prisioneiro precisa fazer a sua decisão sem saber que decisão o outro vai tomar, e nenhum tem certeza da decisão do outro. Assim nesse dilema surge a questão da desconfiança na hora de buscar uma consequência pequena para ambas as partes (manter o silêncio) e do medo de ser traído pelo parceiro que pode agir de modo egoísta, obtendo assim a liberdade sem se importar com o que ocorra ao outro. 

    Numa situação dessa, como você agiria?

    O medo mútuo de ser “traído” nesse caso, leva ambos a confessarem, fazendo com que sofram uma penalidade bem maior do que manter o silêncio.

    Ok, mas o que isso tem a ver com o Lockdown?

    De fato, vamos trocar no dilema os protagonistas de prisioneiros para cabelelereiros.

    Em uma pequena comunidade bem isolada de qualquer outra, o único serviço presencial que atende aquela população é o de cabeleleiro, e lá existem dois cabeleleiros (X e Y) que atendem a toda a demanda dessa população. Mas com a pandemia e o surgimento dos casos de COVID-19 nessa região, decretaram o fechamento de seus estabelecimentos até que houvesse uma grande redução nos casos.

    Porém as contas não param de surgir e ambos os cabeleleiros precisam lidar com essa situação:

    • se eu obedeço a restrição enquanto meu concorrente atende escondido, eu começarei a acumular dívidas, mas ele vai faturar mais (pois agora todos os clientes iriam apenas pra ele), e também o número de casos não vai diminuir, então a restrição continuaria;
    • se eu atender escondido enquanto meu concorrente obedece a restrição, ele começará a acumular dívidas, mas eu vou faturar mais (pois agora todos os clientes iriam apenas pra mim), e também o número de casos não vai diminuir, entao a restrição continuaria;
    • se ambos atendemos escondidos, manteremos o mesmo faturamento de antes, não teremos dívidas, mas o número de casos não vai diminuir, então a restrição continuaria;
    • se ambos cumprimos as restrições, ambos acumularemos dívidas, mas o número de casos diminuiria, então a restrição terminaria.
     Cabeleleiro Y obedece a restriçãoCabeleleiro Y continua atendendo
    Cabeleleiro X obedece a restriçãoAmbos tem prejuízo, mas os casos de COVID-19 reduzemY tem lucro, X tem prejuízo, mas os casos de COVID-19 continuam
    Cabeleleiro X continua atendendoX tem lucro, Y tem prejuízo, mas os casos de COVID-19 continuamAmbos mantêm seus faturamentos, mas os casos de COVID-19 continuam

    Esquema da relação

    Nesse dilema cada cabelereiro precisa fazer a sua decisão sem saber que decisão o outro vai tomar (senão não seria um atendimento escondido), e nenhum tem certeza da decisão do outro. Assim nesse dilema surge a questão da desconfiança na hora de buscar uma consequência pequena para ambas as partes (ter prejuízo/acumular dívidas) e do medo de ser traído pelo parceiro que pode agir de modo egoísta, obtendo assim seu lucro (ou mantendo seu faturamento) sem se importar com o que ocorra ao outro. 

    Numa situação dessa, como você agiria?

    O medo mútuo de ser “traído” nesse caso, leva ambos a atenderem escondidos, fazendo com que seus faturamentos se mantenham mas que o número de casos de COVID-19 continuem.

    Percebeu agora a relação desse dilema com o Lockdown?

    Nesse contexto simplificado, temos dois estabelecimentos apenas (dois prisioneiros), enquanto que nos contextos mais próximos da realidade temos incontáveis estabelecimentos (incontáveis prisioneiros), sendo tentados com a oferta de agirem de forma egoísta (confessarem) sem se importar com as consequências que isso resultará aos outros (tanto seus parceiros, quanto o fato do número de casos de COVID-19 continuarem).

    A solução para o Dilema do Prisioneiro, é o pensamento colaborativo, de entender que se cada um buscar apenas o melhor apenas para si, chegarão a um resultado pior do que se buscarem uma solução melhor para o coletivo. Deixo ao leitor, a tarefa de encontrar a solução para o Dilema do Cabelereiro.

    Este texto foi escrito originalmente no blog Zero

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Covid-19, Infodemia e Hiperpartidarismo

    Como explicar a não adesão de parte da sociedade às medidas sanitárias de enfrentamento da COVID-19?

    O Brasil vive seu pior momento da pandemia da COVID-19, até agora, chegando à triste marca de 300 mil mortes e mais de 12 milhões de casos de contaminação. Especialistas acreditam que, em função de fatores como as novas variantes do vírus, o colapso da rede hospitalar e a falta de vacinas, não se pode descartar a ocorrência de 4 mil mortes diárias pela doença até o fim de abril.

    No início de março deste ano, apesar da maioria dos estados apresentarem, segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), taxas de ocupação de leitos de UTI acima de 80%, o índice de isolamento social oscilava em torno de 32%, número que só não é pior do que fevereiro de 2020 (26%), quando houve o registro do primeiro caso no país. 

    Assim, o país segue na contramão da pandemia, registrando na última semana de fevereiro um aumento de 11% no número de mortos, ao passo que no mundo inteiro essa porcentagem diminuiu em 6%, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cuja previsão de que a infodemia poderia atrapalhar a resposta dos países frente à crise sanitária se concretizou.

    Infodemia é a superabundância de informações – algumas precisas e outras não – que ocorre durante uma epidemia. Isso pode levar à confusão e, em última análise, à desconfiança nos governos e na resposta da saúde pública. (1)

    Pesquisadores, como o professor João Cezar de Castro Rocha, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), vêm apontando que a Guerra Cultural liderada pelo Presidente da República é um dos principais fatores do desencontro nas diretrizes do enfrentamento à pandemia pelas autoridades de saúde. Além disso, a retórica do Palácio do Planalto está assentada em uma grande estrutura de apoio e de atuação nas mídias sociais encarregada de enquadrar a pandemia como debate político e, assim, fortalecer uma narrativa pró-Bolsonaro em meio às crises que o governo enfrenta, conforme mostra estudo (2) do Grupo de Pesquisa em Mídia, Discurso e Análise de Redes Sociais (Midiars) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).

    Desinformação no Facebook

    Outro estudo do mesmo grupo (3), agora envolvendo o medicamento hidroxicloroquina (ainda sem eficácia comprovada contra a Covid-19), analisou a circulação de 70 mil publicações sobre o medicamento em páginas e grupos públicos da rede social Facebook, entre março e julho de 2020. Os resultados mostram que as URLs sobre a hidroxicloroquina (HCQ) circularam de forma polarizada tanto nas páginas quanto nos grupos, ou seja, nas duas redes há comunidades distintas, uma pró-HCQ (azul) e outra anti-HCQ (verde),

    Imagem 1: Gráficos de análise de rede indicam que o conteúdo que circula em um dos clusters (ou bolhas  de informação) não circula no outro. Fonte: Grupo de Pesquisa Midiars – UFPel.

    Ainda segundo esse estudo, constatou-se que esse contexto polarizado é assimétrico, ou seja, que os comportamentos no consumo de informações dos grupos são diferentes. Enquanto o cluster anti-HCQ deu preferência a veículos da imprensa tradicional e não circulou desinformação (4), o inverso ocorreu no pró-HCQ onde a maior parte da circulação de URLs foi de desinformação, frequentemente apoiada em mídias hiperpartidárias, isto é, “veículos que produzem conteúdo que dá preferência a uma narrativa política, por isso, frequentemente, distorcem fatos e produzem desinformação” (3).

    O hiperpartidarismo é caracterizado por contextos em que “usuários mais radicalizados em suas posições políticas tendem a ser mais ativos no reforço de uma narrativa única e compartilham com suas redes apenas informações que confirmam esta narrativa”. (5)

    Desinformação no Twitter

    Ainda em 2020, pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) analisaram 21.076 tweets que traziam links contendo as palavras-chave “cloroquina” e “hidroxicloroquina” em língua portuguesa, publicados entre março e abril daquele ano por 14.356 perfis únicos. Foram encontrados nesses links 819 domínios diferentes, dentre os quais, as notícias com maior número de compartilhamentos foram submetidas a análises qualitativas, a fim de verificar o grau de desinformação presente em seus conteúdos.

    Dentre os 15 domínios mais referenciados, segundo o estudo, “pelo menos três foram previamente identificados como propagadores de desinformação sobre a Covid-19 por iniciativas de checagens de fatos brasileiras. Gazeta Brasil, Conexão Política e Jornal da Cidade Online aparecem num levantamento da agência de checagem Aos Fatos, que revela sites que lucraram com anúncios publicitários ao publicar desinformação sobre, por exemplo, a eficácia da cloroquina no tratamento da Covid-19”. Os demais sites identificados nessa investigação (Notícia Brasil Online, Senso Incomum, Agora Paraná e Jornal 21 Brasil) também apareceram na amostra, embora não estejam entre os 15 mais referenciados (6).

    Para identificar quais as referências mais compartilhadas no contexto das disputas ao redor da cloroquina e hidroxicloroquina como tratamentos da Covid-19, os pesquisadores fizeram a análise das redes formadas em torno desses sites no Twitter. A partir do grafo a seguir, podemos observar como as diferentes fontes de informação abasteceram o Twitter com a polarização política e a controvérsia em torno da cloroquina. Foram destacados os 30 perfis com maior grau de entrada.

    Imagem 3: Ao lado esquerdo do grafo, uma massa de conexões na cor vermelha, com destaque para domínios da imprensa tradicional e de sites noticiosos mais associados ao espectro da esquerda. À direita, na cor verde, destaque para domínios de sites e portais alinhados ideologicamente à direita e à extrema-direita. Fonte: LIMA, CALAZANS e DANTAS, 2020.

    A dificuldade na resposta à Covid-19

    Quando surge uma doença nova, dispõe-se de pouca ou nenhuma informação, especialmente sobre tratamentos eficazes, de modo que é preciso ser bastante criterioso na comunicação para que ela não piore ainda mais um cenário de incertezas. Por sua vez, as redes bolsonaristas trabalharam desde o início da pandemia para transformá-la numa disputa política, além de desacreditar a ciência, conforme mostram as pesquisas aqui citadas e muitas outras já disponíveis na academia.

    Isso por si só já seria pérfido, fosse o Brasil um país do norte global dada a probabilidade de pessoas que poderiam morrer por fazer uso de remédios inócuos contra a Covid-19 ou por seus efeitos colaterais. Porém, diante do quadro de recessão econômica no qual o país se arrasta há pelo meno cinco anos, criar uma falsa sensação de segurança em parte da população para que ela vá para as ruas e se exponha ao vírus, sabendo que não há segurança, não há tratamento precoce e que a vacina é a única saída para a volta de uma vida normal é um crime contra a humanidade.

    A partir desses dados científicos é possível deduzir que o fato de o Brasil ter feito (estar fazendo) a pior gestão do mundo na pandemia não tem sido fruto apenas de sua incompetência, mas de seu projeto de governo.

    Para saber mais: 

    (1) ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Infodemic Management. Disponível em: https://www.who.int/teams/risk-communication/infodemic-management/ Acesso em 22 mar. 2021.

    (2) SOARES, Felipe Bonow et al. Desinformação sobre o Covid-19 no WhatsApp: a pandemia enquadrada como debate político. SciELO Preprints, 2020. Disponível em https://preprints.scielo.org/index.php/scielo/preprint/view/1334 Acesso em 22 mar. 2021

    (3) SOARES, Felipe Bonow et al. Covid-19, desinformação e Facebook: circulação de URLs sobre a hidroxicloroquina em páginas e grupos públicos. SciELO Preprints, 2020. disponível em: https://preprints.scielo.org/index.php/scielo/preprint/view/1476 Acesso em 22 mar. 2021

    (4) Entendemos a desinformação como o conjunto de informações não factuais ou distorcidas que têm a função de enganar (FALLIS, 2015).

    (5) RECUERO, Raquel et al. Polarização, hiperpartidarismo e câmaras de eco: como circula a desinformação sobre COVID-19 no Twitter. SciELO Preprints, 2020. (p.05). Disponível em: https://preprints.scielo.org/index.php/scielo/preprint/view/1154. Acesso em 23 mar. 2021

    (6) LIMA, Cecília Almeida Rodrigues; CALAZANS, Janaina de Holanda Costa; DANTAS, Ivo Henrique. (Des) Informação em Câmaras de Eco do Twitter: Disputas sobre a cloroquina na pandemia da Covid-19. Revista Observatório, v. 6, n. 6, p. a5pt-a5pt, 2020. (p. 07 e 13) Disponível em: https://sistemas.uft.edu.br/periodicos/index.php/observatorio/article/view/9966 Acesso em 23 mar. 2021

    Bibliografia

    FALLIS, Don. What Is Disinformation?. Library Trends, v. 63, n. 3, p. 401-426, 2015. Disponível em https://muse.jhu.edu/article/579342 Acesso em 05 mar. 2021.

    BRADD, Sam. Coronavirus disease 2019 (COVID-19) Situation Report – 86. World Health Organization. Genebra. 15 Abr. 2020 (p. 02). Disponível em: https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/situation-reports/20200415-sitrep-86-covid-19.pdf?sfvrsn=c615ea20_6 Acesso em 05 mar. 2021

    Este texto é original e exclusivo do Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Preprints: o que são e como fazer sua divulgação científica

    Em janeiro do ano passado, um grupo de pesquisadores da Escola de Ciências Biológicas Kusuma, na Índia, publicou um manuscrito em que apontava uma “misteriosa semelhança” entre o novo Coronavírus e o (Vírus da Imunodeficiência Humana, em inglês, Human Immunodeficiency Virus) HIV, vírus causador da Aids.

    No texto, os autores especulavam que essa coincidência dificilmente teria ocorrido ao acaso, abrindo espaço para teorias conspiratórias que afirmavam que partes do código genético do vírus foram inseridas intencionalmente.  

    O manuscrito continha falhas metodológicas grosseiras e, após receber críticas generalizadas da comunidade científica, foi retirado do repositório onde havia sido publicado, o bioRxiv. Mas o estrago já havia sido feito, e perfis nas redes sociais, veículos de imprensa e até um Nobel de medicina divulgaram amplamente que o coronavírus havia sido criado em laboratório por cientistas chineses. 

    Como um estudo com tão pouca qualidade conseguiu ser publicado? Isso aconteceu porque se tratava de um preprint, um relato de pesquisa que não passou pela avaliação dos pares e que é compartilhado em um servidor público antes de ir para um periódico científico. O principal objetivo dos preprints é acelerar o processo de comunicação das pesquisas entre os especialistas, uma vez que a divulgação em revistas acadêmicas pode demorar meses ou até mesmo anos, o que faz deles uma boa opção para as áreas que costumam ter urgência na publicação de seus resultados, como é o caso da saúde. 

    Desvantagens dos preprints

    Por ser um trabalho que ainda não passou pela avaliação por pares, os preprints também apresentam desvantagens, como a possibilidade de publicação de pesquisas com erros metodológicos, pouco confiáveis ou até mesmo fraudulentas. Embora os repositórios (atualmente existem mais de 60) possuam seus sistemas de triagem, estes ocorrem de forma superficial e são concluídos em poucos dias. Em geral, as avaliações buscam detectar apenas se há plágio, conteúdo ofensivo ou não científico e risco à saúde da população, sem verificar os métodos, conclusões ou qualidade do artigo. 

    A principal forma de controle de qualidade desses trabalhos ocorre por meio do feedback dos leitores – que são, na maior parte das vezes, cientistas – como um mecanismo de autocorreção. No entanto, ainda existem poucos estudos que indiquem a frequência com que esses preprints são examinados ou como os autores lidam com as críticas recebidas. O que se sabe é que os principais servidores ou não moderam a seção de comentários ou controlam apenas aqueles que são ofensivos e não pertinentes, além de ser um recurso pouco utilizado, com apenas 10% de todos os preprints recebendo algum tipo de comentário.  

    Por todos esses fatores, é preciso ter cautela ao fazer a divulgação científica de um preprint, para não correr o risco de dar como fato estabelecido um conhecimento que ainda está em construção ou uma conclusão enganosa. 

    Abaixo, apresento cinco dicas de cuidados que podem ser tomados ao escrever uma reportagem sobre esses estudos. Embora essas dicas tenham sido pensadas com o intuito de auxiliar jornalistas em suas matérias, elas podem ser aplicadas por qualquer divulgador científico e são interessantes mesmo para o caso de pesquisas que já passaram pela avaliação dos pares.

    1) Seja claro 

    Informe aos seu públicos-alvo que o estudo que está sendo divulgado é um preprint, que os resultados ainda são preliminares e podem ser contestados no futuro. Se possível, explique como ocorre o processo científico e a avaliação por pares e lembre-se que o sensacionalismo pode criar falsas expectativas em seu público, especialmente no caso de tratamento para doenças graves como a Covid. Tome cuidado para não apresentar como cura algo que é apenas o primeiro de vários passos ou, pior, algo que não é eficaz. 

    2) Verifique a reputação dos autores

    Qual é a formação desses cientistas? Eles são especialistas no assunto sobre o qual estão escrevendo? Em qual instituição eles trabalham? Há algum conflito de interesses que possa trazer desconfiança para os resultados? Eles já estiveram envolvidos em alguma polêmica ética, como acusações de fraude ou plágio? Já publicaram trabalhos em periódicos renomados? 

    Tenha em mente que dentro de uma área mais ampla existem várias subcategorias e que um biólogo não vai necessariamente entender de microbiologia, da mesma forma que um microbiologista nem sempre será especialista em virologia. 

    Se o pesquisador for brasileiro, é possível encontrar o currículo dele na plataforma Lattes, disponibilizada pelo CNPq. Se for um autor estrangeiro, esses dados podem ser procurados em locais como o ResearchGate, o ORCID ou o perfil deles no Google Scholar. 

    3) Busque a avaliação de especialistas independentes 

    É muito comum que os veículos de mídia entrevistem apenas os autores do estudo em suas reportagens. Embora essa consulta seja importante para entender como foi feita a pesquisa, é preciso ter em mente que existe um conflito de interesses e que nenhum cientista irá apresentar as limitações do próprio estudo ou confessar que errou nas conclusões. 

    Procure especialistas (idealmente, mais de um) na área do preprint e peça a opinião dele sobre o estudo. Pergunte sobre as metodologias, conclusões e cálculos estatísticos e verifique se é algo que realmente vale a pena publicar ou se é melhor esperar a publicação oficial em um periódico. 

    4) Desconfie de tudo   

    As conclusões da pesquisa se opõem ao atual conhecimento sobre o assunto, são muito sensacionalistas ou abrem espaço para teorias da conspiração? Nem sempre um jornalista sem formação em ciência será capaz de identificar falhas na metodologia – por isso a importância do tópico anterior –, mas tenha cautela com cientistas e pesquisas que afirmem ter respostas para tudo. 

    Dê preferência a fontes honestas, que reconheçam as próprias limitações e não tenham medo de dizer quando não sabem de alguma coisa. A ciência é construída por meio do trabalho coletivo de indivíduos, grupos e instituições ao redor do mundo, então olhe para o volume de opiniões e não para o que apenas uma pessoa diz. 

    5) Se errar, corrija! 

    Você divulgou um preprint muito interessante, mas que foi retratado algum tempo depois. O que fazer agora? Seguir o exemplo da comunicação entre pares e publicar uma errata que tenha o mesmo destaque da publicação original. Ninguém gosta de admitir que errou, mas estudos apontam que o público tende a ser mais benevolente e a avaliar a integridade de autores que cometem erros de forma mais positiva quando eles corrigem a informação.  

    Isso se torna ainda mais importante na atual epidemia de fake news e desinformações, em que grupos tentam deliberadamente confundir e manipular pessoas por meio de informações desonestas, como ocorreu no caso que abre este texto. Embora os autores daquele preprint pareçam ter cometido um erro honesto, ele foi amplamente utilizado por teóricos da conspiração para influenciar um comportamento xenófobo e ainda hoje, mais de um ano depois, existem pessoas que acreditam que o coronavírus foi criado em laboratório. 

    Nesse contexto, dar à correção a mesma visibilidade concedida ao preprint torna mais fácil o processo de verificação. Mas, tome cuidado para não reforçar a informação errônea quando for refutá-la, efeito conhecido como “tiro pela culatra”. 

    Aqui, você pode ler um texto bastante interessante do Roberto Takata sobre como evitar cair nessa armadilha.

    Referências

    BARATA, Germana. Pandemia acelera produção e acesso a preprints. Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/covid-19/pandemia-acelera-producao-e-acesso-a-preprints/ 

    FORSTER, Victoria. No, the coronavirus was not genetically engineered to put pieces of HIV in It. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/victoriaforster/2020/02/02/no-coronavirus-was-not-bioengineered-to-put-pieces-of-hiv-in-it/?sh=e8d59a356cbc 

    MAKRI, Anita. What do journalists say about covering Science during COVID-19 pandemic? Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41591-020-01207-3  

    MARIOSA, Erica. Fake News, Desinformação e Infodemia. Qual a diferença? Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/mindflow/?p=634 

    MARQUES, Fabrício. Correção veloz de erros: Produção científica sobre o novo coronavírus tem trabalhos cancelados por equívocos e falhas metodológicas, na maioria cometidos de boa-fé. Disponível em: https://revistapesquisa.fapesp.br/correcao-veloz-de-erros/ 

    ORDWAY, Denise-Marie. Covering biomedical research preprints amid the coronavirus: 6 things to know. Disponível em: https://journalistsresource.org/health/medical-research-preprints-coronavirus/ 

    SANT’ANA, Fabiano. Entenda o que são e como funcionam os preprints. Disponível em: https://galoa.com.br/blog/entenda-o-que-sao-e-como-funcionam-os-preprints 

    SPINAK, Ernesto. Acelerando a comunicação científica via preprints. Disponível em: https://blog.scielo.org/blog/2019/10/04/acelerando-a-comunicacao-cientifica-via-preprints/#.YGtkvOhKhPY 

    TAKATA, Roberto. Errei. E agora? Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/blog/errei-e-agora/ 

    TIJDINK, Joeri; MALICKI, Mario; GOPALAKRISHNA, Gowri; BOUTER, Lex. Preprints são um problema? Cinco formas de melhorar a qualidade e credibilidade dos preprints. Disponível em: https://blog.scielo.org/blog/2020/10/15/preprints-sao-um-problema-cinco-formas-de-melhorar-a-qualidade-e-credibilidade-dos-preprints/#.YGtj2uhKhPZ 

    Este texto é original e exclusivo do Especial Covid-19

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Não há ensino híbrido em período de pandemia

    Destaco nesse texto a ideia de que o blended learning ou o ensino híbrido perpassa uma construção histórica que surge a partir das discussões a respeito de como associar abordagens de ensino de modo a promover métodos, metodologias e estratégias adequadas a um objetivo educacional específico. Dessas discussões e com a chegada dos primeiros computadores (e posteriormente outras tecnologias), o ensino híbrido se vincula de forma indissociável ao conceito tecnológico e a ideia de ensino realizado em espaços diferentes e por meios diferentes. Esta ideia, que à época e até os dias de hoje parece promissora. Mas ganha distorções e, por razões mercadológicas, o ensino híbrido passa a ser confundido com uma proposta de simples ensino a distância com o auxílio de recursos tecnológicos.

    Em artigo de 1996, denominado “Constructivism: implications for the design and delivery of instruction”, Thomas Duffy e Donald Cunningham trazem diferentes críticas ao construtivismo discutido na época. Algumas destas críticas podem ser consideradas bastante infundadas e outras nem tanto. Os autores apresentam uma proposta própria de interpretação do construtivismo e justificar a abordagem denominada “Problem-based learning”1. Apesar de bastante duros em suas críticas, que por vezes generalizaram estudiosos do construtivismo colocando-os como padronizados, o texto ilustra uma característica emergente da época. A discussão de abordagens para o ensino diferentes daquelas pautadas na reprodução.

    Realize uma busca nas bases de dados de periódicos com o termo Science learning ou mathematics learning. Se você filtrar para a década de 1990, um conjunto de trabalhos será encontrado fazendo referência John Dewey, Vigotsky, Piaget. Vocês estarão vendo referências que propõem estudos sobre as formas de aprender. Também encontramos termos como: student-centered learning; alternatives approachs; pratical instruction; os quais associam as bases das teorias da aprendizagem a estratégias didáticas utilizadas. 

    É nessa época que a ideia de metodologia ativa emerge. Por exemplo, Eric Mazur (o dito criador da “peer intruction”) tem seu livro proposto em 1997 (Peer Instruction: User’s Manual). É nesse período que surgem as primeiras associações a aprendizagem híbrida. E esta é compreendida como uma proposta que visava que o estudante buscasse as informações por meio de diferentes caminhos e fontes. Além disso, mediado pelo professor, construísse sua aprendizagem. 

    Nesse sentido, incorporando as bases pedagógicas, a intenção é o surgimento de propostas de ensino em que conteúdos não sejam organizados da mesma forma para todos os aprendizes; a rota de aprendizagem é construída considerando as individualidades e as necessidades, valorizam-se atitudes e não conhecimentos; o processo de avaliação pode ser acompanhado podendo ser individualizado. Com a chegada das primeiras tecnologias, os vídeos e seguido dos computadores surge o termo delivery-learning. A partir daí a blended learning passa a ser conhecida como blended e-learning. 

    No entanto, toda a proposta não é inicialmente pensada para a escola. Toda a “beleza” começa a ser aplicada a cursos de treinamento empresarial. Pois com o ensino “delivery” é possível  ensinar administradores e (trabalhadores de modo geral) em larga escala. Dessa forma, avalia-se cada profissional de forma individual. Isto é, observa-se o rendimento, a capacidade de aprender sozinho e a forma de linkar o aprendizado com as questões da “firma / empresa”. Como consequência, reconhecer quem deve ou não ser mantido. Quem é ou não melhor.

    Na escola, uma mescla dos dois sentidos começa a emergir. Com isso, a apropriação da tecnologia, o blended e-learning não pode mais existir (ou seria mais raro sua existência) dissociado de qualquer forma de tecnologia. Nesse cenário, a ideia de uma educação híbrida inicia-se com uma proposta de mudança dos objetivos educacionais. Isto com bases nas teorias do desenvolvimento e da aprendizagem e incorpora recursos diversos. Dentre eles a tecnologia, sendo este último, por conta do caráter de nossa sociedade, indissociável da ideia de educação híbrida atualmente.

    Apesar de antiga, usarei termos de um dos autores mais referenciados sobre educação híbrida. No livro The Handbook of Blended Learning: Global Perspectives, Local Designs, Graham cita que há três definições comuns para o BL: “Combining Instrucional modalities”; Combining instructional methods” e “Combining online and face-to-face instructional”. Não apenas como Graham. Mas diversos outros autores e divulgadores da BL se apropriaram da última definição a qual ficou, deste modo, sendo a mais difundida e utilizada ao redor do mundo. 

    Portanto, nos dias atuais é possível definir a educação híbrida como sendo a junção entre a educação presencial e a educação não presencial mediada por tecnologias. O erro que, ao meu ver se comete, é esquecer das bases de desenvolvimento do conceito. Com isto, diminui-se a proposta ao uso de recursos tecnológicos sem que se pense no objetivo deste uso. 

    Este erro acarreta, como consequência, pelo menos dois aspectos preocupantes. Primeiramente, não se pensam nos objetivos de ensino para uma proposta híbrida, fazendo com que a transposição de um ensino presencial para o ensino mediado por tecnologias seja visto como proposta híbrida. Aulas online são o exemplo clássico. Há uma exposição do conceito, com uma avaliação no formato de prova ao final de um conjunto de aulas mas, o fato de ser no computador ou no celular faz com que seja híbrido? Obviamente que não. 

    O segundo aspecto preocupante faz com que, uma vez considerando essa possibilidade fajuta de ensino híbrido, a mesma se propague como proposta a ser oferecida em diferentes cenários educacionais. Isto faz com que empresas e fundações privadas produzam materiais do chamado “ensino híbrido” para redes de ensino públicas e privadas. Como algum dos pontos mais marcantes da venda desses materiais aparece o jargão da educação personalizada. Este é outro termo bastante frutífero do ponto de vista dos estudos educacionais. Principalmente na alfabetização! Mas que é distorcido para uma ideia de que não é mais necessário gastos com a presença física ou profissionais específicos como professores.

    De fato, num período em que buscamos suprir necessidades básicas de estudantes por meio de recursos bastante limitados, dizer que aprimoramos os objetivos educacionais para uma proposta híbrida é simplesmente absurdo. Não estamos fazendo ensino híbrido, estamos adaptando propostas para em ensino emergencial. 

    Divulgar este ensino emergencial como proposta híbrida gera uma distorção, prejudica pesquisas a respeito e potencialidades. Num futuro, quando não estivermos em pandemia, falar em ensino híbrido poderá ser algo extremamente ruim pelo simples fato de estarmos usando a terminologia de forma inadequada. Os mais de 20 anos de pesquisas a respeito do ensino híbrido estão sendo negligenciados.

    Para saber mais

    1. Foundations for Research in Educational Communications and Technology Chapter 7. Constructivism: implications for the design and delivery of instruction . Thomas M. Duffy Donald J. Cunningham 

    2. Blended learning design: five key ingredients. Jared M. Carman.

    3. A White Paper: Achieving Success with Blended Learning Harvi Singh and Chris Reed, Centra Software

    4. Mudando a Educação com metodologias ativas. José Moran

    5. Aprender e ensinar com foco na educação híbrida Lilian Bacich; José Moran 

    6. The Handbook of Blended Learning: Global Perspectives, Local Designs Por Curtis J. Bonk, Charles R. Graham

    7. Blended Learning:

    Este texto foi escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • O ensino remoto durante a pandemia pelos olhos da Profa. Natália De Nadai

    Entre as inúmeras mudanças ocasionadas pela pandemia da COVID-19, a situação do ensino talvez seja um dos assuntos mais urgentes a serem debatidos. O Ciência Pelos Olhos Delas adentrou tal problemática por meio de interessantes conversas com profissionais do ensino fundamental/médio e superior.

    Hoje trazemos mais um diálogo, agora com a educadora Natália De Nadai, que atua na criação de conteúdo de uma ferramenta de aprendizagem remota, a Khan Academy Brasil. A Khan Academy é uma organização estadunidense sem fins lucrativos, mas hoje possui representações em diversos países – dentre eles o Brasil. O objetivo da organização é criar um conjunto de ferramentas online (incluindo exercícios práticos e aulas curtas em vídeo) para ajudar na educação de estudantes de forma gratuita.

    A Natália foi uma das colaboradoras do Ciência pelos Olhos Delas no período de 2019/2020 e é uma honra para nós trazermos suas experiências e visões sobre o ensino remoto e o uso de novas tecnologias nesse momento. A seguir apresentamos o conteúdo na íntegra das respostas fornecidas por ela.

    Conte-nos um pouco sobre a sua formação e sobre a sua experiência com educação/ensino?

    Sou formada em Física, Matemática, Pedagogia e tenho especialização em Design Instrucional. Durante uns 10 anos dei aula de matemática em instituições de ensino privado, na maior parte desse tempo para alunos do Ensino Fundamental II. Atualmente trabalho com produção de conteúdos de matemática para a Khan Academy Brasil.

    Essa faixa etária é muito ativa e muitas vezes perdem o foco com facilidade, ainda mais com 6 aulas de matemática em uma semana, então sempre achei interessante usar diferentes estratégias para trabalhar conteúdos.

    Como você conheceu a Khan Academy?

    Foi nesse período, em que dava aulas, que um colega professor me apresentou a Khan e logo me encantei, pois era possível, na verdade ainda é, criar turmas e fazer recomendações específicas para cada um de seus alunos.

    A Khan me ajudou muito nessa época, pois eu tinha turma de reforço, e normalmente todos os alunos ficavam juntos (de 6º ao 9º anos) e isso impossibilitava que eu fizesse uma aula tradicional na lousa, mas com a Khan cada um dos meus alunos recebia a atividade que eles precisavam e eu podia fazer um acompanhamento mais individual.

    Como a pandemia da COVID-19 afetou as atividades da instituição de ensino em que você trabalha?

    Com a pandemia, o nosso número de usuários aumentou e, além disso, criamos cursos preparatórios de matemática (Prepare-se) para os alunos de 3º ao EM. A ideia desses cursos é trabalhar as habilidades da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que são consideradas habilidades essenciais, permitindo que o aluno estude o conteúdo do ano letivo de 2020 em que ele estava, juntamente com o conteúdo que ele aprenderá em 2021.

    Como a Khan Academy pode ajudar no ensino remoto?

    Atualmente temos conteúdos do Ensino Fundamental I e II alinhados à BNCC de matemática, ciências e português; essas atividades podem ajudar alunos e professores de diversas formas, desde a revisar conteúdos de anos anteriores até o uso completo de lições para o ensino a distância.

    O fato do professor criar suas turmas e poder fazer recomendações individuais ou para a turma e acompanhar os relatórios de progresso dos alunos (por exemplo, ver quais itens de um exercício o aluno errou) é o que faz com que a Khan Academy seja tão completa.

    Um fato super importante é que todo o conteúdo disponível na Khan é gratuito, a única coisa necessária é que o professor e os alunos tenham uma conta de e-mail e criem uma conta na plataforma.

    Como os professores podem utilizar as ferramentas da Khan Academy para avaliar seus alunos?

    Pelo relatório de progresso, o professor tem acesso a todas as tentativas e todos os erros e acertos dos seus alunos para cada exercício que ele recomendou, logo ele pode utilizar isso como forma de avaliação.

    Como você acha que essa experiência coletiva de ensino remoto/híbrido vivida durante a pandemia vai impactar o futuro da educação no pós-pandemia?

    Atualmente minha maior preocupação é que nem todos têm acesso a internet; muitas crianças e adolescentes não estudaram em 2020 e isso é muito complexo, pois gera uma evasão nas escolas, então um exercício que deverá ser feito é o de manter esses alunos nas escolas. Lógico que o modelo de 2020 provavelmente trará outras dificuldades para alunos e professores, e acredito que esse déficit todo será sentido nos próximos anos.

    Agradecemos novamente a Natália por disponibilizar seu tempo para compartilhar um pouco mais sobre seu trabalho na Khan Academy e suas percepções sobre o ensino remoto na atual conjuntura.

    Este foi escrito originalmente no blog Ciência Pelos Olhos Delas

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Volta as aulas presenciais! – Vídeo

    Vídeo por Beatriz Durlin (@beatriz.durlin )e Caio Silvano Serafim ( @caio170321)

    Ref. do Vídeo:

    Por Helena Vetorazo blogs.unicamp.br/prometeus/2019 

    e Todos Pelas Vacinas @tdspelasvacinas  #todospelasvacinas todospelasvacinas.info

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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