Categoria: ESPECIAL COVID-19

  • E aqueles resultados das Vacinas? (Parte 1)

    8 meses de pandemia. Mais de 58 milhões de casos mundo a fora, e próximo de 1,4 milhão de mortes. A maior crise sanitária do século1. Ultrapassando o HIV na década de 80, a SARS em 2003, a H1N1 em 2009 e o Ebola entre 2013-2016.

    Tempos sombrios, sem dúvida. Mas também tempos de esperança. 

    Por um lado temos um vírus facilmente transmissível e que já atingiu todo o globo. Por outro lado, temos todo o aparato científico e tecnológico que desenvolvemos nas últimas décadas para combatê-lo. 

    Nossa principal arma?

    As vacinas!

    Vacina é um termo cunhado em 1798 por Edward Jenner, pai da imunologia. As vacinas são uma medida fácil, rápida e com poucos riscos para a saúde. Além disso, elas são capazes de proteger a população contra patógenos e limitar sua transmissão.

    Entretanto, (sempre há um entretanto) seu único problema: um desenvolvimento que leva em média 10 anos.

    A vacina mais rápida a ser desenvolvida até então demorou 4 anos. Ela foi feita por Maurice Hilleman, durante a década de 60, no combate à caxumba2

    – Ok, Maurílio, já entendi! Vacinas são ótimas! Mas tudo o que tem sido publicado parece confuso né?

    – Calma lá! No post de hoje vamos falar um pouco sobre as fases de teste e eficácia!

    Entretanto, o tempo urge!

    A segunda onda chegou. A cada dia mais pessoas contaminadas e mais vidas são perdidas para o SARS-CoV-2. Os hospitais se enchem de pacientes com casos severos e graves novamente. Cidades e países entram em novos lockdowns

    Mas a ciência não parou também. 

    Centenas de cientistas em universidades e empresas procuram entender melhor como esse vírus funciona. Bem como, que medicamentos usar para combatê-lo após a pessoa se infectar e, principalmente, desenvolver uma vacina para ele. O esforço que tem sido feito para esse último grande! E é tão grande que o recorde de 4 anos para uma vacina ser desenvolvida está próximo de ser quebrado. Assim, após oito meses, 3 candidatas a vacinas já liberaram resultados preliminares da terceira fase de teste para a mídia. Lembrando que a fase três é a final e com maior número de pessoas. As vacinas são da Pfizer/Biontech, Moderna e AstraZeneca/Oxford – 3,4,5. Apesar da comunidade científica e os órgãos regulamentadores ainda precisarem avaliar e aprovar tais resultados para o uso ser liberado à população. 

    O que é essa eficácia das vacinas que tanto falam?

    Uma coisa que tem se falado muito nas notícias sobre esses resultados é a eficácia de X% e número de eventos. Mas será que todos sabem o que é isso?. Para entender melhor, vamos precisar relembrar brevemente para que servem as 3 fases de testes de uma vacina. Queres saber mais sobre o assunto? Então dá uma olhada na seleção de textos sobre vacinas já publicados no blog.

    Fase 1

    Os testes realizam-se em algumas poucas dezenas de pessoas para se verificar principalmente a dosagem. Isto é, a quantidade aplicada e quantas aplicações são necessárias. Além disso, a segurança da vacina também é testada. Isto é, sua toxicidade.

    Fase 2

    Na Fase 2, o teste acontece em algumas centenas de pessoas. Dessa forma, neste caso, um grupo um pouco mais diverso do que na fase anterior e com algumas características (como idade e sexo) do grupo de risco. Além disso, nesta fase também se analisa a imunogenicidade da vacina, junto com os efeitos colaterais. Imunogenicidade é uma palavra difícil né? Mas em termos mais simples, quer dizer que verificam a capacidade dela gerar uma resposta imune no organismo. Ou seja, número de células, quantidade de anticorpos, perfil de linfócitos, entre outras características.

    A fase 2 também é quando aplicamos a candidata à vacina propriamente dita em um grupo e o placebo (água com sais minerais) em um outro. Este grupo placebo funciona como controle para a pesquisa. Isto é, um comparativo para se ter certeza que a aplicação da vacina está realmente criando uma resposta imune maior do que o normal.

    Fase 3

    Por fim, há a Fase 3 – a maior e mais demorada. Milhares de pessoas passam pela pesquisa e são testadas nesta fase. A seleção destas pessoas é feita a partir da diversidade, pois é necessário diferentes características em dois grupos. Novamente, um grupo vai receber a candidata a vacina, enquanto o outro recebe um placebo. As características analisadas, nestes grupos, são por exemplo, etnias, idade, sexo, com doenças cronicas, etc.

    Além disso, as pesquisas verificam novamente a segurança e possíveis efeitos colaterais. Desta vez, levando em conta as muitas condições já comentadas. Assim, o principal intuito dessa fase é avaliar a efetividade da resposta imune criada pela vacina, respondendo perguntas como “Qual a eficácia da vacina? Qual a duração da imunidade gerada? A vacina é capaz de parar a transmissão do patógeno?”. 

    Pausa para ver o material que a gente preparou prá mandar nos grupos do whats da família 😉
    Mas, a eficácia?

    No caso da eficácia, as pesquisas analisam quantas pessoas que receberam a vacina ficaram doentes e quantas pessoas que receberam o placebo ficaram doentes. Isto após a aplicação e durante o período de acompanhamento. Confuso? Nada melhor do que um exemplo para entender:

    “Suponha que 50.000 pessoas serão testadas, 25.000 com a vacina e 25.000 com o placebo. Desses 50.000, 100 se contaminaram com o patógeno em um período de 3 anos. Analisando essas 100 pessoas que se infectaram, descobriu-se que 97 delas estava no grupo que recebeu o placebo e somente 3 no grupo vacinado. Fazendo uma divisão simples, descobre-se então que a vacina tem uma eficácia de 97%.”

    Esse assunto é muito amplo e por causa disso vamos dividir esse texto em duas partes. Fica ligado que nos próximos dias já vai sair a parte 2 desta postagem! Vamos explicar o que são os “eventos” que tem saído nas notícias da mídia. Além disso, a relação entre células de memória e a proteção gerada por elas e os resultados preliminares liberados pelas empresas.

    Para saber mais

    1. WHO Director-General’s opening remarks at the media briefing on COVID-19 – 16 March 2020, Acessado em: 24/11/2020.
    2. Maurice Hilleman, o médico que criou a vacina mais rápida da história por causa da filha de 5 anos. Acessado em: 24/11/2020.
    3. PFIZER AND BIONTECH CONCLUDE PHASE 3 STUDY OF COVID-19 VACCINE CANDIDATE, MEETING ALL PRIMARY EFFICACY ENDPOINTS, Acessado em: 18/11/2020.
    4. Early Data Show Moderna’s Coronavirus Vaccine Is 94.5% Effective, Acessado em: 19/11/2020.
    5. AZD1222 vaccine met primary efficacy endpoint in preventing COVID-19, Acessado em: 23/11/2020.
    6. Vaccines and immunization: What is vaccination? Acessado em: 24/11/2020

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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  • Vacina, Estado e Liberdade: a manipulação do debate – Parte 2

    Figura 1: A vacina. Fonte: Dalcio Machado no Facebook. 21 out. 2020.

    O discurso antivacina, segundo o Dicionário Online de Português, é aquele que se declara contrário ao processo de vacinação. Isto é feito ignorando que é pela vacinação que é possível atribuir uma imunidade específica a determinada doença. Todavia, esse discurso – ao contrário do que circula em veículos na internet – não nasce em 1998 com a pesquisa fraudulenta do médico britânico Andrew Wakefield. Pois, para quem não se recorda: este estudo relacionou vacina ao autismo. Mas, o movimento antivacina se inicia ainda no século XIX, no Reino Unido e nos Estados Unidos, numa reação à vacinação contra a varíola (1). Atualmente, esses grupos, formados especialmente por pais que não querem que seus filhos sejam vacinados, são conhecidos como antivaxxer.

    Embora, no Brasil historicamente esse discurso nunca tenha conseguido se estabelecer de maneira consistente, hoje temos outra situação. Isto é, com a pandemia da Covid-19 pesquisadores vêm constatando um aumento expressivo nas publicações que espalham desinformação sobre as vacinas. 

    A ciência e o mapa do discurso antivacina

    União Pró-Vacina (UPVacina)

    Um levantamento produzido pela União Pró-Vacina (UPVacina – USP/Ribeirão Preto) busca esclarecer informações falsas sobre vacinas. Este estudo identificou um aumento de 383% em postagens com conteúdo falso ou distorcido envolvendo a vacina contra a Covid-19 (2). 

    A análise foi feita com base em postagens dos dois principais grupos antivacina brasileiros no Facebook. Assim, entre maio e julho de 2020 foram 155 publicações com 3.282 reações, 1.141 comentários e 1.505 compartilhamentos. Nesse cenário, chama a atenção a produção da desinformação. Pois, os dados apontaram que 50 usuários geraram 52,3% das publicações. Além disso, apenas 6 usuários geraram os 47,7% restantes. ou seja, há uma clara evidência de que essa produção é deliberada.

    A incidência dos assuntos encontrados na análise é variada (Gráfico 1). Assim, há um maior volume as postagens contendo teorias da conspiração (27,1%) e perigos e ineficácia das vacinas (24,5%). O estudo cita como exemplo um vídeo (já removido do YouTube) de 13 minutos. Dessa forma, neste vídeo, o autor, Claudio Lessa, funcionário da Câmara dos Deputados faz diversas afirmações falsas e alarmistas contra a vacina de mRNA contra covid-19. Ele faz isso baseado em argumentos comprovadamente mentirosos e que circulam há tempos pelos grupos antivacina. Para tanto, cita pelo menos três desses temas:

    • as vacinas alteram o DNA;
    • teoria da conspiração de controle social;
    • Bill Gates financia vacinas para reduzir a população.
    Gráfico 1: Incidência dos temas abordados pelos grupos antivacina no Facebook. Fonte: União Pró-vacina, 2020.
    Grupo de Pesquisa em Mídia, Discurso e Análise de Redes Sociais (Midiars)

    Conforme mostra outro estudo do Grupo de Pesquisa em Mídia, Discurso e Análise de Redes Sociais (Midiars – UFPEL), existe uma estrutura de distribuição da desinformação via redes sociais nas redes bolsonaristas. Os pesquisadores analisaram 800 mensagens desinformativas. Assim, estas mensagems circularam em grupos públicos do WhatsApp entre março e abril de 2020. Além disso, a pesquisa do Midiars descobriu que nesses grupos a desinformação enquadrou (ou agendou, nos termos de McCombs e Shaw) a pandemia como debate político. Dessa forma, foi utilizada para fortalecer uma narrativa pró-Bolsonaro em meio a crises que o governo enfrentava (3).

    Ainda segundo o estudo, a principal estratégia para isso foi o uso de teorias da conspiração. Estas teorias são o tipo de desinformação mais comum nas mensagens analisadas. Ou seja, isto que indica que as características da plataforma podem influenciar o conteúdo dessa desinformação. No caso do WhatsApp, o fechamento da mesma, o que torna mais difícil contrapor a desinformação.

    Figura 2: Exemplo de teoria da conspiração veiculada nos grupos de WhatsApp bolsonaristas. Fonte: Preprint: Desinformação sobre o Covid-19 no WhatsApp (3)

    O agendamento e os interesses

    O jornalista e professor doutor em Linguística, Fabiano Ormaneze observa que não é comum adjetivar as vacinas com a nacionalidade ao mencioná-las. Assim, de modo que não se diz “vacina inglesa”, “vacina alemã” ou “vacina americana”. No entanto, ao se referir à CoronaVac tanto as pessoas nas mídias sociais quanto parte da mídia tradicional adotaram a expressão “Vacina Chinesa”. Esta vacina é produzida pela farmacêutica chinesa Sinovac Life Science em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo.

    Para Ormaneze, é preciso pensar pode haver “um preconceito embutido nessa expressão, um preconceito que esbarra até na questão da xenofobia”. Dessa forma, lembrando que se atribui à China a origem da Covid-19. Assim, esta construção reforça o adjetivo pátrio tem um apelo negativo e preconceituoso. Isso é, caracterizando-a como uma vacina menos válida. É preciso lembrar que a base dessas afirmações é um artigo polêmico, ainda sem comprovação atribuindo à China a criação intencional do Sars-Cov-2 em laboratório.

    Para desvendar a intencionalidade de determinados discursos é sempre bom perguntar a quem interessam desacreditar os produtos chineses? Lembramos que estamos num momento em que os EUA estão numa aberta guerra comercial com o país asiático, sendo o Brasil alinhado aos americanos. Assim, questionamos também: a quem interessa desacreditar uma vacina produzida num laboratório estatal comandado por um potencial candidato nas próximas eleições?

    Obrigatoriedade da vacina não é um debate aberto

    Tanto do ponto de vista doutrinário quanto do legislativo, não há debate sobre a prevalência do direito coletivo à saúde. O promotor de justiça Samuel Fonteles (4) esclarece que há duas dimensões da dignidade humana.

    • Autonomia – que reconhece a liberdade que cada pessoa tem para efetuar suas escolhas existenciais);
    • Heteronomia – que limita essa liberdade individual em nome de valores substantivos compartilhados pela sociedade

    com o que concorda o eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso:

    Escolhas individuais podem produzir impacto não apenas sobre as relações intersubjetivas, mas também, sobre o corpo social e, em certos casos, sobre a humanidade como um todo. Daí a necessidade de imposição de valores externos aos sujeitos. Da dignidade como heteronomia. (5)

    Do ponto de vista da legislação temos a diversas leis que determinam a obrigatoriedade da vacinação:  

    • Programa Nacional de Imunizações, Artigo 3º da Lei 6259/75;
    • Constituição Federal de 1988, Artigo 196º;
    • Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Artigo 14 §1º;
    • Lei de Enfrentamento da Covid-19 (Lei 13.979/2020), assinada pelo próprio presidente Bolsonaro, Artigo 3º;

    Evidentemente, não há unanimidade sobre o assunto. A vice-diretora geral da área de Medicamentos, Vacinas e Produtos Farmacêuticos da OMS, Mariângela Simão, afirmou no dia 21/10 que no caso dos adultos, a agência não recomenda medidas autoritárias em relação à vacinação de adultos. Isto ocorre, uma vez que eles “têm capacidade de discernimento, de fazer escolhas informadas” e que a obrigatoriedade dependeria do contexto de cada país. E aqui reside a questão crucial. Ou seja, a partir dos dados da UPVacina e do Midiars, é possível afirmar que parte dos cidadãos brasileiros estão fazendo “escolhas bem informadas”?

    Já vimos esse filme

    Conforme Naomi Oreskes e Erik Conway (6) constataram questões importantes sobre isso. Por exemplo, os questionamentos sobre a relação cigarro x câncer de pulmão e dos gases CFC x destruição da camada de ozônio não tinham como objetivo trazer evidências contraditórias aos achados científicos. Mas, conseguiram atrasar as ações governamentais para a resolução dos referidos problemas por décadas, o que atendeu a interesses corporativos. 

    No Brasil da pandemia, podemos retomar a postagem 1 analisando a partir dos Padrões de Manipulação de Perseu Abramo. Neste sentido, é possível identificar uma deliberada intenção de fragmentar aspectos do debate sobre a vacina contra a Covid-19. Além disso, inverter a relevância desses aspectos, apresentando o secundário como o principal. Dessa forma, discutir a liberdade individual ou o direito coletivo em relação à obrigatoriedade da vacina é uma forma de agendar politicamente esse debate. Bem como, serve para fabricar um consenso entre os seguidores e induzi-los a aderir à vacinação. Tudo isso apenas com base em suas crenças político-ideológicas ou nem aderir.

    Como se observa, as personagens e as ferramentas mudaram, mas, as estratégias permanecem as mesmas. Os mercadores da dúvida atenderam a interesses da indústria do tabaco e do petróleo. Num cenário em que a solução para a Covid-19 passa pela vacinação em massa da população, resta saber a quem interessa retardar esse processo. À sociedade, certamente, não interessa.

    Para Saber Mais / Referências

    (1) ROSS, Dale-L (1967) Leicester and the anti-vaccination movement, 1853-1889. Transactions-The Leicestershire Archaeological and Historical Society, Leicestershire Archaeological and Historical Society, v43, p35

    (2) CARDOSO, Thaís (2020) Campanha de desinformação sobre vacina contra covid avança com testes no Brasil. Jornal da USP, 26 ago

    (3) RECUERO, Raquel; SOARES, Felipe; VOLCAN, Taiane; FAGUNDES, Giane; SODRÉ, Giéle (2020) Preprint: Desinformação sobre o Covid-19 no WhatsApp: a pandemia enquadrada como debate político, Midiars/UFPEL, 15 out

    (4) FONTELES, Samuel Sales (2020) Vacinas compulsórias e dignidade humana, Migalhas UOL / Coluna Olhar Constitucional, 14 ago

    (5) BARROSO, Luís Roberto (2018) Um outro país: transformações no direito, na ética e na agenda do Brasil, Editora Fórum, 2018, Apud FONTELES, Samuel Sales. Vacinas compulsórias e dignidade humana

    (6) ORESKES, Naomi; CONWAY, Erik M (2011) Merchants of doubt: How a handful of scientists obscured the truth on issues from tobacco smoke to global warming, Bloomsbury Publishing USA, 2011.

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Vacina, Estado e Liberdade: a manipulação do debate – Parte 1

    Figura 1: Caricatura do século XIX retrata um homem da classe trabalhadora sendo vacinado à força por um oficial de saúde, enquanto é detido por um policial. Fonte: Hathitrust Digital Library. 

    Pesquisas de opinião têm demonstrado uma queda no número de pessoas dispostas a aderir a uma vacinar contra a Covid-19, quando esta for aprovada. Assim, questionamos, haveria uma deliberada intenção de agendar o debate em torno da obrigatoriedade da vacina? Isto feito utilizando o Padrão da Fragmentação e da Inversão e também fabricando um consenso, induzindo à hesitação vacinal?

    O Agendamento, o Consenso e a Inversão

    A Hipótese do Agendamento foi elaborada nos anos 1970 por Maxwell McCombs e Donald Shaw (1). Esta hipótese sustenta que os consumidores de notícias tendem a considerar mais importantes os assuntos que são veiculados com maior destaque na cobertura jornalística. Dessa forma, como consequência disso, ela propõe a ideia de que a mídia (as empresas de comunicação) pautam o debate pública. Ou seja, selecionam quais os temas mais relevantes a serem discutidos pela sociedade, relegando os demais a um segundo plano ou até ao esquecimento.

    Posteriormente, McCombs vai admitir a possibilidade da existência de um agendamento reverso (2). Isto é, que o público seja capaz de influenciar a mídia. Assim como acontece atualmente nos casos em que os assuntos mais comentados nas redes sociais tornam-se pauta nas redações. Entretanto, por sua vez, a mídia, por dever de ofício, também pode ser pautada pelos políticos na medida em que precisa cobrir o trabalho deles. Qual seja, propor mecanismos (por meio de leis) que criam um modelo de sociedade de acordo com sua ideologia político-partidária. 

    Assim, na busca de estabelecer qual tema será debate pela sociedade e qual será esquecido, há um embate de imposições de agendas entre a mídia, o público e os políticos.

    Noam  Chomsky e Edward Herman, em 1988, elaboram uma crítica aos meios de comunicação de massa, apontando que eles realizam escolhas, ênfases e omissões. No entanto, isto ocorre não por meio de técnicas jornalísticas. Mas de propaganda. Isto ocorreria com o objetivo de produzir na população a aceitação de algo inicialmente indesejado por ela. Todavia, privilegia determinados interesses, sejam do Estado ou de setores da atividade privada. Denominam a esse procedimento de Consenso Fabricado (3).

    Perseu Abramo, também no final dos anos 1980, descreve cinco padrões de manipulação da “grande” imprensa:
    1. Ocultação: é o deliberado silêncio militante sobre determinados fatos da realidade;
    2. Fragmentação: implica em duas operações básicas: a seleção de aspectos, ou particularidades, do fato e sua descontextualização;
    3. Inversão: é o reordenamento das partes, a troca de lugares e de importância dessas partes (é aplicado depois da fragmentação);
    4. Indução: o leitor é induzido a ver o mundo, não como ele é, mas sim como querem que ele o veja; 
    5. Global ou o padrão específico do jornalismo de televisão e rádio: divide-se em três momentos: o fato é apresentado sob ângulos mais emocionais; há a necessidade de personagens (testemunhas); a autoridade anuncia as providências.

    Naquela época, a internet comercial ainda nem existia – ela foi criada no Brasil em 1995. Além disso, os sites de redes sociais ainda não tinham sido inventados. No entanto, no mundo contemporâneo, escreve a jornalista Patrícia Cornils,

    “parte da disputa pela opinião pública se dá nesta esfera conectada e em publicações online independentes da grande mídia” (4).

    Nesse sentido, penso que, guardadas as devidas proporções, os padrões podem ser aplicados para a análise da produção da informação que se faz nas mídias sociais. Isto tendo em vista que, parte dela, já é profissional.

    Estratégias de ação (Modus operandi)

    Figura 2: Capa do livro Merchants of Doubt (Mercadores da Dúvida). Fonte: Bloomsbury Publishing

    Erik Conway e Naomi Oreskes (5), no livro Merchants of Doubt (Mercadores da Dúvida, 2011) falam sobre grupos empresariais. Neste livro, eles falam sobre como, desde os anos 1950, estes grupos financiam cientistas para questionar evidências científicas. Por exemplo, a relação cigarro x câncer de pulmão. Isto teria a finalidade de passar à sociedade a impressão de que há incertezas em relação às conclusões de inúmeras pesquisas. Ou seja, fazem parecer que há um debate aberto sobre o tema. Este livro foi adaptado como  documentário em 2014 pelo diretor Robert Kenner (6).

    Além disso, outra estratégia desses grupos é transformar o consenso científico em debate político. Quem fez isso foi o físico Fred Singer. O cientista relacionou a destruição da camada de ozônio da atmosfera pelos gases chamados CFCs (clorofluorcarbonos) – descoberta premiada com o Nobel de química em 1995 – a uma suposta defesa de posições políticas:  

    Singer escreveu que se tratava de uma “declaração política”. A opinião pública sueca até mesmo apoiaria uma “hipotética taxa sobre o carbono para reverter um aquecimento do clima global que ainda não foi detectado (…). Sinteticamente, o país está tomado de uma histeria ambiental coletiva” (7)

    Todos sabemos que uma das características da ciência é estar aberta a mudanças, diante de novas evidências. No entanto, nem sempre sabemos como funcionam as estratégias dos mercadores da dúvida…

    Mas quais são elas?

    • Primeiro é distorcer exatamente o natural grau de incerteza presente em todo estudo científico. Com isso, transforma-se a incerteza em uma grande dúvida que coloque em xeque a credibilidade do próprio estudo;
    • Em seguida, trazer para o debate questões de natureza política. Isto faz com que as pessoas passem a aceitar ou a negar verdades científicas com base em suas crenças político-ideológicas. Com isso, incute-se nelas a ideia de que a ciência é uma questão de opinião ou de lado.

    E por que é importante entender isso?

    O mundo segue em busca de uma vacina segura e eficaz para combater a Covid-19. Até 21 de outubro de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia registrado cerca de 179 pesquisas em desenvolvimento. 44 delas sendo testadas em humanos. Das quais, 10 na terceira e última fase antes da aprovação (entre as quais a CoronaVac e a vacina de Oxford). No Brasil, as vacinas precisam ainda ser aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) antes de serem disponibilizadas à população.

    Neste momento, a doença já ceifou mais de 169 mil vidas brasileiras. O debate que realmente importa à sociedade é como sobreviver a essa pandemia, não apenas do ponto de vista da saúde e da economia. Mas também sob o aspecto emocional. Dessa forma, custa a crer que alguém cogite em recusar uma vacina que pode significar a volta a uma vida quase normal. Todavia, apesar disso, o instituto Datafolha lançou duas pesquisas realizadas em quatro capitais do país (o Gráfico 1 mostra apenas os resultados de São Paulo). Estas pesquisas indicam que vem caindo o número de pessoas que pretendem aderir a uma vacina quando esta for aprovada:

    Gráfico 1: Adesão à vacina contra a Covid-19 na Cidade de S. Paulo. Fonte: Instituto Datafolha em 10 out. 2020 e 07 nov. 2020

    Mas…

    Coincidentemente, há pelo menos dois meses o país passou a debater intensamente a prevalência do direito individual de não se vacinar sobre o direito coletivo à saúde. Este é um discurso que o movimento antivacina se utiliza desde o século XIX. O debate foi insuflada por falas do presidente Jair Bolsonaro a apoiadores e em cerimônias oficiais do governo, além de uma peça publicitária da (Secom). 

    Quer saber mais?

    Calma, tem a 2ª parte deste texto! Lá vamos demonstrar como a ciência vem mapeando a atuação de grupos políticos na internet, suas estratégias e esclarecer por que o debate em torno da obrigatoriedade da vacina não está aberto.

    Para saber mais / Referências: 

    1. McCOMBS, Maxwell; SHAW, Donald (1972) The agenda setting function of mass media, In Public Opinion Quarterly, Vol36, N2, Summer 1972, P176-187.

    2. McCOMBS, Maxwell (2009) A teoria da agenda: a mídia e opinião pública, Petrópolis: Vozes.

    3. CHOMSKY, Noam; HERMAN, Edward S; (2010) Manufacturing consent: The political economy of the mass media Random House, 2010.

    4. ABRAMO, Perseu (2016) Padrões de manipulação na grande imprensa, Com colaborações de Laura Capriglione [et al] – 2ed, São Paulo: Editora Fundac̦ão Perseu Abramo.

    5. ORESKES, Naomi; CONWAY, Erik M (2011) Merchants of doubt: How a handful of scientists obscured the truth on issues from tobacco smoke to global warming, Bloomsbury Publishing USA, 2011. 

    6. KENNER, Robert (2014) Merchants of Doubt, Participant Media, EUA, 30 ago, 96 min.

    7. LEITE, José Corrêa (2014) Controvérsias científicas ou negação da ciência? A agnotologia e a ciência do clima; Scientiae Studia, v12, n1, p179-189.

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Esteja atento(a) aos sintomas da COVID-19

    A Covid-19 afeta as pessoas de maneiras diferentes:

    Arte por Beatriz Durlin

  • 250 dias: E a pandemia, já acabou?

    Desde o anúncio da Organização Mundial da Saúde, em 11 de março, até  16 de novembro, se completam 250 dias da pandemia. 

    arte de @clorofreela

    Já podemos ir para a rua?

    Temos tido essa sensação pelo excesso de pessoas que temos visto flexibilizar o isolamento social. Pessoas que antes pareciam estar firmes no propósito de isolamento, agora afrouxam as regras e frequentam eventualmente bares, restaurantes e eventos sociais familiares. 

    Além disso, claro, sabemos que grande parte da população tem sido pressionada a abandonar a modalidade home office cada vez mais. Além da parcela de pessoas que nunca teve essa chance – ou por serem serviço essencial, ou por serem profissionais autônomos ou prestadores de serviços cuja parada implica em não recebimento completo…

    Tal característica, todos sabemos, acarreta não apenas em precarização da vida destas pessoas, mas um risco cotidiano para conseguir o mínimo de subsídios para manterem-se mensalmente. Especialmente a partir desta semana, quando o Auxílio Emergencial já contará com um novo valor, metade do que vinha sendo pago anteriormente.

    As escolas também têm aberto suas portas cada vez mais. Assim, isto acontece com pressões constantes para funcionários voltarem, nem sempre nas condições sanitárias que são indicadas, segundo a OMS.

    No entanto, o risco não só segue à espreita, quanto o número de internações e mortes segue nos rondando… 

    E nós sabemos que é difícil, tem sido difícil e continuará sendo difícil.

    Os tempos árduos de isolamento (para quem se mantém em isolamento desde março) e os tempos árduos de exposição (para quem está na rua desde que tudo começou) são, sim, tempos de asperezas. No entanto, Nagamine comenta que:

    “O alerta que os sucessivos marcos fúnebres – das mil, das dez mil, das cem mil mortes por Covid-19 no país – disparou não encontrou eco em nossa sensibilidade, e os descaminhos dos direitos humanos entre nós não permitem que nos surpreendamos”

    A autora aponta que precisamos de mais elementos não apenas para estancar a morte, uma vez que vivemos diariamente – e não é a pandemia que inaugura isso, apenas agrava. Mas comenta como precisamos lidar com ideais de falta de empatia e insensibilidade geradas a partir de uma gestão da morte cotidiana e do negligenciamento dos direitos humanos. 

    Ademais, Serge Katembera ao comentar este texto em uma análise no seu perfil do Twitter, aponta para a falta de relação entre a infecção e morte pelo Coronavírus e a estética.

    Como assim? 

    Se esse vírus fosse o Ebola, não sairíamos de casa – Serge comenta esta frase que escutou em um canal de televisão francês. Como assim? O SARs-CoV-2 não nos retira a forma, não nos causa hemorragias nem nos faz deteriorar o corpo com chagas abertas. Para grande parte da população é uma doença respiratória que afeta, sim, mas passa. 

    Queremos falar para além da questão estética, da não caracterização disforme do corpo no processo do adoecimento. Ou seja, temos um tempo intenso de desconexão por quem está dentro de casa há meses (o quê mesmo está ocorrendo do lado de fora das casas?). Temos um distanciamento dos corpos, a moralização do abraço, a desconfiguração da receptividade do sorriso.

    Além disso, temos empregos (ou atividades profissionais) que exigiram presença das pessoas, com uma intensa condenação de alguns costumes – julgando que é parte da vida trabalhar e aglomerar nos transportes coletivos, mas um absurdo irresponsável ver pessoas para sorrir e conversar.

    Há um debate acerca da moralização da noção de risco e a relação com a Covid-19. Isto é, a normalização da morte também faz parte deste processo – que culpabiliza alguns grupos, enquanto justifica outros por suas mortes e contaminações. Junto a estes processos, Segundo Moreno (2020) temos um relaxamento das medidas de proteção, diminuição de recursos para tratamento e manutenção da população e colapso dos sistemas de saúde.

    A moralização do cotidiano e seus colapsos

    Dessa forma, aparentemente, estes colapsos de sistemas de saúde e gestão da morte não afetam nem concepções de direitos humanos. Tampouco questões de estética que nos fazem temer um invisível vírus que nos afeta.

    A moralização cotidiana proveniente do SARS-CoV-2 tem também um caráter polarizante no debate pró ou contra vacinas, pró ou contra usos de máscaras e liberdades individuais, pró ou contra debates científicos, pró ou contra a economia.

    “A pandemia da COVID-19 reforça a urgência do amparo humanitário” nos diz Loiane Prado Verbicaro, em muitas dimensões de conhecimento e ação cotidianas.

    A Divulgação Científica no Brasil

    Parte do debate que a Divulgação Científica tem realizado no Brasil centra-se nas publicações científicas nacionais e internacionais sobre o SARS-CoV-2. Bem como, sua ação no organismo, ou resultados das vacinas em desenvolvimento. Tudo isto é fundamental para entendermos cada vez mais e melhor sobre a doença.

    Também temos visto, nas últimas semanas, publicações que apontam para o aumento de casos em vários lugares do mundo. Bem como, tentativas de contenção dos contágios e resistências – ou não – das populações quanto a isso.

    Talvez precisemos voltar às ênfases acerca das contaminações, auto-cuidado e, acima de tudo, compreensões acerca de como responder melhor a pergunta:

    E a pandemia já acabou?

    Hoje nós inauguramos a seção E a pandemia já acabou? Vamos trazer dicas mais precisas para situações específicas. Além disso, nós, do Blogs de Ciência da Unicamp, vamos reorganizar a apresentação dos dados. Ademais, criar séries que expliquem a ciência de base para entender o vírus, a doença e sua contínua expansão na população.

    Não, a pandemia não acabou. Em tempo, não, reuniões com a família não são tranquilas e isentas de riscos. Assim como, não, ir a bares e restaurantes – especialmente ambientes fechados – não são atos seguros neste momento.

    Chegamos aos 250 dias de pandemia. Temos 165 mil mortes no Brasil e mais do que 1 milhão e 300 mil mortes no mundo inteiro. Dessa forma, é preciso frisar, diariamente sim, que tempos de exceção precisam de ações empáticas, solidárias e científicas. Bem como, precisam compartilhar continuamente – e retomar debates “antigos” – sobre como o vírus está presente. Isto é, se espalhando e novamente ocupando leitos das UTIs – de hospitais públicos e privados.

    Em suma, 250 dias pandêmicos

    250 dias se passaram. Vamos encarar cada dia que acordamos. Como? Com um compromisso de seguirmos informando, conversando, debatendo. Assim como produzindo conteúdos para pensarmos esta etapa de nossas vidas com mais segurança, cientificamente embasados, socialmente engajados. 

    Fiquem bem, se puderem permaneçam em casa. Não, a pandemia não acabou!

    Para saber mais

    Katembera, Serge (2020) 1. Os ratos não temem o vírus (publicação no Twitter)

    MORENO, Arlinda B. et al. (2020) A pandemia de COVID-19 e a naturalização da morte. Observatório Covid-19 Fiocruz Observatório Covid-19.

    Nagamine, Renata (2020) Partilha do insensível; Quatro Cinco Um

    Nagamine, Renata (2020) “Repensando a partilha do insensível: reflexões sobre direitos humanos e sensibilidades no Brasil da pandemia”; Errante

    Organização Mundial de Saúde (2020) Coronavirus disease (COVID-19): Schools

    Verbicaro, LP (2020) Pandemia e o colapso do neoliberalismo, Voluntas: Revista Internacional de Filosofia, v11, e3, p1-9

    Reportagens recentes no jornal

    Da Redação G1,(2020) Após menor média em outubro, Grande SP volta a ter mais registros de internações em novembro; erro em sistema impede dados de mortes G1, 13/11/2020

    Da Redação G1 ES (2020) ES chega a 4.009 mortes e 169.928 casos confirmados de Covid-19, G1 Espírito Santo, 15/11/2020

    Da O Globo (2020) Covid-19: SP tem aumento de internações em hospitais e alta de casos suspeitos; cientistas avaliam possibilidade de 2ª onda O Globo, 12/11/2020

    Bergamo, Monica (2020) Prefeitura de SP deve analisar nesta semana se há crescimento de internações por Covid-19; Folha de São Paulo, 13/11/2020

    Da Redação Gaúcha ZH (2020) Rio Grande do Sul registra 1.189 novos casos de coronavírus em 24 horas, Gaúcha ZH Corona Serviço, 15/11/2020.

    Do Uol (2020) Caixa paga parcelas de R$ 600 e R$ 300 para novo grupo; veja todas as datas, UOL Economia, 15/11/2020

    Portal A Crítica (2020) Amazonas registra 569 novos casos e mais 10 mortes por Covid-19, A Crítica, 14/11/2020

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Foram produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Por um olhar mais ético e menos apressado na comunicação sobre ciência e sociedade

    O processo de produção de conteúdo de divulgação científica deve passar por um processo de reflexão crítica. Isto envolve não apenas o conteúdo a ser publicado. Mas acima de tudo um compromisso ético, de empatia e responsabilidade com a sociedade.

    Uma das maiores dificuldades de se trabalhar com a Divulgação Científica é ponderar sobre o quê e como se vai falar/abordar algo. Quando estamos em tempos [digamos] regulares, produzimos conteúdo a partir de um planejamento, com organização de pautas, postagens semanais e/ou quinzenais, também temos um cronograma para estudar cada temática que vamos abordar. Isso nos traz uma certa segurança no que escrevemos, temos tempo de depurar tudo o que fazemos, incluindo revisar, repensar as palavras.

    Algumas vezes, óbvio, há acontecimentos sociais que se tornam urgentes e produzimos textos mais apressados. Normalmente solicitamos tais textos a blogueiros das áreas específicas, por exemplo.

    No entanto, desde março nossa periodicidade de publicação foi alterada. São dois ou três textos semanais, além da reorganização dos textos nas redes sociais. Resolvemos, há algumas semanas, reestruturar o trabalho da Covid-19. Isto aconteceu não só pelo excesso de trabalho em si. Mas por sentirmos que vínhamos fazendo sem este tempo de ponderação. Também sentimos a necessidade de organizar melhor o conteúdo que temos abordado, frente às necessidades de nossos leitores.

    Comunicação e Divulgação Científicas em tempos de pandemia

    Como assim? Trabalhar com comunicação científica em tempos de crise sanitária. Também há obscurantismo científico e negacionismo em altos cargos executivos do país. Além disso, vemos disputas político-partidárias em torno da vacina. Há demandas diárias de conhecimentos de alta complexidade. Tudo isso é um desafio para todos da divulgação científica. Há também a reafirmação de um compromisso assumido perante aqueles que, de alguma maneira, confiam no que temos feito e buscam aqui informações, diálogos, trocas acerca da pandemia e relações científicas e sociais que nos atingem diariamente.

    Ouvimos falar sobre a importância da divulgação científica para a construção de uma cultura científica (Vogt & Morales, 2018). Mas para isso é essencial que ela seja construída a partir de uma relação mais próxima com o humano, mais empática.

    E a vacina? A morte? O Butantã? A Anvisa?

    Desde segunda as reviravoltas com o tema da vacina estão mais assoberbados que o usual. Primeiro, os pronunciamentos da Pfizer, depois, vimos a suspensão da CoronaVac, que hoje foi retomada.

    Divulgadores científicos e cientistas que acompanhamos e com os quais trocamos informações – parceiros de trabalhos – têm produzido conteúdo incessantemente. Pessoas que se apresentam cansados, virando (literalmente) noites e noites para trabalhar e compreender a complexidade de toda a situação deste momento.

    Hoje o dia foi distante de redes sociais em nosso expediente. Víamos a movimentação e os debates de maneira fragmentada, em meio às aulas, palestras e reuniões. Buscávamos informações, tristes pelo embate político. Tentando compreender ataques de duas instituições de respeito disputando por legitimidade frente ao que era narrado como “evento grave” (na hora do almoço).

    Nesta hora, já nos parecia nefasto um presidente da república vibrar pela suspensão dos procedimentos de desenvolvimento da vacina. Isto acontecia como se fosse uma partida de um lance em um jogo de sorte ou revés. Acrescente a desconsideração sobre o momento tão importante e que requer atenção para cada etapa que vivenciamos.

    Que momento?

    Nós temos, hoje, no Brasil 161 mil mortes, 364 mil casos em acompanhamento e 5,5 milhões de pessoas já foram infectadas. No mundo, são 51 milhões de infectados e mais de 1 milhão e 200 mil mortos. Lamentamos a perda de cada uma dessas vidas.

    A pandemia, ao que tudo indica, está longe de acabar. A morte é vivência cotidiana. As contaminações são expectativas de muitos que trabalham diariamente, expondo-se por falta de políticas que direcionem nosso país e nossa população de modo mais seguro.

    Não há o que vibrar por uma pesquisa com vacina sendo suspensa.

    Ao fim do dia…

    Soubemos a causa da morte ao final da tarde. A morte por evento grave não é vinculada à vacina. Foi um suicídio. Todo e qualquer debate deve sempre cercar-se de extremo cuidado e muito (MUITO!) respeito. Tanto que se buscou omitir a causa pelas instituições envolvidas com a pesquisa, ressaltando-se somente o fato de não ser relacionada à vacina. Inclusive há formas e procedimentos para notícias que envolvem suicídio. A Organização Mundial da Saúde tem um documento e debate específico para isso.

    Neste momento, retomamos o início deste texto. Isto é: para abordarmos qualquer tema na Divulgação Científica, com ética, empatia e responsabilidade, é fundamental não nos apressarmos, nem buscarmos ineditismo para falas proferidas aqui. Todo o tema científico, por princípio, precisa de cuidado, revisão e rigor.

    O suicídio, prezados leitores, é tema para falas cuidadas e atentas. Poderíamos, sim, escrever sobre isso, no tempo que uma publicação precisa para ser desenvolvida, com os profissionais que se ocupam com esta discussão no âmbito científico – como sempre fizemos aqui. Ver pulular publicações que deveriam centrar-se na produção e desenvolvimento da vacina – falando tão vulgarmente deste tema nos deixou pensativos sobre se este deveria ser o foco, usando a dor como mote.

    Nosso compromisso

    Temos profundo respeito e compromisso com cada texto que produzimos e, desta vez, não será diferente. É preciso mais do que uma análise mais estruturada para conversar com todos. Precisamos, antes de tudo, apontar que debates inócuos e vazios, não fazem parte do que consideramos cientificamente válidos e eticamente pertinentes.

    A isto, estarrecidamente, observamos o acréscimo de posicionamentos governamentais necropolíticos. Também observamos disputas territoriais e ganhos individuais. Tudo isso sobrepondo-se aos debates científicos e causando desinformação, e em cima de conhecimento científico produzido em benefício da população, debates apressados para cliques exagerados. Somos (e precisamos ser) mais do que isso.

    Àqueles que, neste momento, perderam alguém em um ano tão difícil, nossos mais sinceros sentimentos.

    Para saber mais

    OLIVEIRA, L (2020) Da fatalidade epidemiológica à ferramenta de extermínio: a gestão necropolítica da pandemia; Blogs de Ciência da Unicamp – Especial Covid-19

    SCHÜTZER, DBF e CAMPOS, LKS (2020) “Quando fecho a porta da minha casa, me sinto mal acompanhado”: impactos da pandemia e do isolamento social na saúde mental; Blogs de Ciência da Unicamp – Especial Covid-19

    VOGT, C e MORALES, AP (2018) Cultura Científica; ComCiência,

    World Healt Organization; Suicide Prevention: Responsible reporting on suicide Quick reference guide https://www.who.int/mental_health/suicide-prevention/dos_donts_one_pager.pdf

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Obrigatoriedade da Vacina: discurso contrário vem do século XIX

    Este é o primeiro post de uma série sobre vacinação, sua história, pesquisas científicas, construção de vacinas, políticas públicas e outras temáticas.

    “Não será obrigatória esta vacina e ponto final”, afirmou o Presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido) a seus apoiadores políticos, no último dia 19 de outubro.

    Recente no discurso presidencial, mas presente no Brasil desde o início do século XX e no Reino Unido (nascedouro dos movimentos antivacina) desde meados do século XIX.

    O questionamento sobre a obrigatoriedade da vacina evidencia um argumento recorrente no discurso antivacinacionista: o de que o Estado não tem o direito de interferir na saúde individual do cidadão.

    Um pouco sobre a História da Vacina

    O conceito de vacinação pode ser atribuído ao médico britânico Edward Jenner que em 1796 testou pela primeira vez a inoculação da varíola bovina em seres humanos.

    Figura: Dr Jenner realizando a vacinação em James Phipps, um garoto de oito anos de idade. 14 de Maio de 1796
    Fonte: Por Ernest Board – [2] images.wellcome.ac.uk, Domínio público, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=8776638

    O nome Vacina vem daí, uma vez que Jenner a chamava de Variolae vaccinae (versão em latim para “Varíola da Vaca”). O médico observou que as ordenhadeiras que ficavam em contato com as mamas das vacas eram, geralmente, imunes à varíola, o que o levou a levantar a hipótese de que, provavelmente, elas eram protegidas da varíola (Smallpox, em inglês) pelo pus das bolhas da varíola das vacas (Cowpox) que recebiam (JENNER, 1988). 

    Ocorre que esse procedimento foi introduzido num contexto em que não havia métodos laboratoriais suficientemente desenvolvidos (estamos no final do século XVIII) para controlar a qualidade, tampouco explicar suas possíveis falhas.

    As primeiras vacinas, por exemplo, foram ministradas inicialmente por transferência “braço a braço” e, posteriormente, pela produção na pele dos animais, em que a esterilidade bacteriológica era impossível.

    Como não havia como identificar uma mostra de vacina que estivesse, por exemplo contaminada com alguma bactéria, vírus ou fungos, à época, identificou-se na literatura médica algumas doenças como erisipela, tuberculose, tétano e sífilis tendo sido causadas pelas vacinas.

    Portanto, havia por parte daquela sociedade preocupações legítimas a respeito da validade de se vacinar e da “aventura” que isso significava, por melhores que fossem as intenções. 

    Figura: The Cow-Pock—or—The Wonderful Effects of the New Inoculation! (O Cow-Pock – ou – os maravilhosos efeitos da nova inoculação!)
    Fonte: (GILLRAY, 1802). Wellcome Collection. Acesso em 11 set. 2020

    Segundo Ross (1967), a promulgação da Lei de Vacinação Britânica em 1840, embora não estabelecesse penalidades, foi a primeira incursão do Estado em nome da saúde pública naquele país).

    Dessa data até 1907, o Reino Unido conheceu realidades diversas em termos de interferência do Estado em relação à vacinação, que foram do incentivo para vacinar os filhos, passando pela coerção com pena de multa e prisão, chegando à autorização de isenção da vacinação, mediante requerimento e autorização judicial. 

    Essas legislações causaram indignação em parte da população porque se sentia coagida a vacinar os filhos, podendo até ir para a prisão em caso de não pagamento da multa. Isso era uma afronta para os ideais liberais surgidos à época na Europa, gerou hostilidade e um violento movimento de oposição culminando com os grupos antivacinação (ROSS,1967).

    A fundação da Anti-Vaccination League (Liga Antivacinação) em Londres, em 1853 criou um núcleo para os oponentes da vacinação. A Anti-Compulsory Vaccination League (Liga de Vacinação Anticompulsória) foi fundada em 1867 concentrando sua preocupação na violação da liberdade e escolha pessoais. (WOLFE e SHARP, 2002). Todos os movimentos antivacinas que vieram subsequentemente são derivados dessas revoltas que eclodiram no Reino Unido.

    Em novembro de 1904 no Brasil, o Senador Ruy Barbosa de Oliveira, posicionou-se contrário à lei de vacinação obrigatória em um discurso no qual afirma que a mesma seria “uma lei morta” e que o Estado feria as liberdades individuais, cometia violência e exorbitava de suas funções constitucionais ao instituí-la.

    Além disso, para o Águia de Haia, as vacinas eram possíveis condutoras da “moléstia ou da morte”. A referida lei, aliada à insatisfação de parte da sociedade com decisões políticas da época, deram origem à Revolta da Vacina, motim popular ocorrido entre 10 e 16 de novembro de 1904 na cidade do Rio de Janeiro, então capital do Brasil deixando ao menos 30 mortos, 945 pessoas detidas e 461 deportados para o Acre.

    Figura: Charge que mostra “O povo contra Oswaldo Cruz, o Napoleão da Seringa e Lanceta
    Fonte: Leonidas Freire (1904). Revista O Malho de 29 de outubro de 1904. Acervo da Biblioteca da Casa de Oswaldo Cruz.

    Nos dias atuais…

    219 anos após a primeira vacina de Jenner, mesmo com os avanços da medicina, em 2015, na Itália, o partido de extrema-direita Movimento 5 Estrelas apresentou uma lei contra a vacinação, associando-a a doenças como leucemia e autismo. Dois anos depois, o Ministério da Saúde o responsabilizou pelo surto de sarampo ocorrido no país, cujos casos cresceram 230%, sobretudo em crianças.

    O Governador de Fruili-Venezia Giulia, Massimiliano Fedriga, filiado a outro partido de extrema direita, a Liga do Norte, classificou a obrigatoriedade de vacinação como uma medida “stalinista”, defendeu a liberdade de escolha e a não imposição da vacina. Em março de 2019 foi internado com catapora e virou chacota mundial.

    De volta ao Brasil de 2020, não é a primeira vez que o mandatário brasileiro se manifesta sobre o tema. Em 31 de agosto deste ano uma apoiadora fez um pedido ao presidente: “Bolsonaro! Não deixa fazer esse negócio de vacina, não, viu! Isso é perigoso!”.

    Ao que ele responde sem cerimônia: “Ninguém pode obrigar a ninguém a tomar a vacina” (CASTRO, 2020).

    No dia 01 de setembro  a Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) o órgão da Presidência da República, publicou em seu perfil oficial na Rede Social Twitter um post (Figura 3) com a frase dita no dia anterior pelo Chefe do Executivo. 

    Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo, chat ou mensagem de texto

Descrição gerada automaticamente
    Figura: Propaganda oficial do governo brasileiro desestimulando a população a se vacinar contra a Covid-19, quando a vacina for aprovada.
    Fonte: Perfil da Secom no Twitter (2020). Acesso em 22 out. 2020

    No dia 03 de setembro, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) aprovou uma recomendação à Presidência da República pela retirada imediata de todos os materiais de comunicação que façam alusão à não obrigatoriedade de vacinação contra a Covid-19.

    Porém, não só o conteúdo continuou disponível na web, como no dia 08 de setembro, numa cerimônia no Palácio do Planalto, o presidente voltou à carga e afirmou que “não pode amarrar o cara e dar vacina nele” (UOL,2020).

    Não se sabe com qual intenção, mas, o discurso presidencial se contrapõe à sua própria atitude normativa, uma vez que na Lei nº 13979/20, assinada em fevereiro de 2020 respalda, em seu artigo 3º, a vacinação compulsória contra a Covid-19:

    Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas: I – isolamento; II – quarentena; III – determinação de realização compulsória de: a) exames médicos; b) testes laboratoriais; c) coleta de amostras clínicas; d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou e) tratamentos médicos específicos. (BRASIL, 2020: art. 3º. Acesso em 22 out.. 2020)

    Segundo Organização Mundial da Saúde (OMS), a hesitação vacinal é a relutância ou a recusa em vacinar ou em ter seus filhos vacinados contra doenças contagiosas, apesar da disponibilidade de vacinas.

    Em 2019, a entidade incluiu essa prática entre as dez maiores ameaças à saúde global para a humanidade e criou um grupo consultivo para identificar as principais razões pelas quais as pessoas optam por não vacinar.

    Embora complexos, eles podem ser resumidos a três:

    • Complacência (baixa percepção dos riscos das doenças preveníveis por vacinas e da importância das vacinas);
    • Inconveniência no acesso às vacinas (disponibilidade e acessibilidade das vacinas e dos serviços de saúde);
    • E falta de confiança (nos profissionais de saúde, nas vacinas e sua eficácia). 

    Estaria o Direito Individual acima do Direito Coletivo?

    É uma discussão tão antiga antiga quanto a vacina. Hoje, no contexto de uma sociedade capitalista, concordo com a OMS que, apoiada em dados, informa que “a vacinação é uma das formas mais econômicas de evitar doenças – atualmente evita 2 a 3 milhões de mortes por ano, e mais 1,5 milhão poderiam ser evitadas se a cobertura global de vacinações melhorasse” (OMS, 2019).

    Por outro lado, se nem o apelo econômico sensibilizar os governantes por vidas humanas, vamos acabar por dar razão àqueles que acreditam que a Necropolítica é uma opção consciente por parte de alguns governos.

    REFERÊNCIAS:

    BRASIL. Medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Lei nº 13.979.  Brasília. 06 fev. 2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13979.htm Acesso em 22 out. 2020. 

    CARVALHO, Daniel; URIBE, Gustavo; CANCIAN, Natália. Não será obrigatória esta vacina e ponto final, afirma Bolsonaro sobre Coronavac. Folha de S. Paulo. São Paulo. 19 out. 2020. Disponível em: https://folha.com/1ye5j3ar Acesso em 22 out. 2020. 

    CASTRO, Grasielle. ‘Ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina’, diz Bolsonaro a apoiadora. The Huffington Post Brasil. 01 set. 2020. Disponível em https://www.huffpostbrasil.com/entry/bolsonaro-obrigar-vacina_br_5f4ea302c5b69eb5c0357e3b. Acesso em 22 out. 2020.

    FERRAZ, Lucas. Movimento antivacina: como combater essa onda que ameaça sua saúde? Revista Galileu [online]. Rio de Janeiro. 02 out. 2019. Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Saude/noticia/2019/10/movimento-antivacina-como-combater-essa-onda-que-ameaca-sua-saude.html Acesso em 21 out. 2020.

    FREIRE, Leonidas. Guerra Vaccino-obrigateza!. O Malho. Rio de Janeiro. 29 out. 1904. Acervo da Biblioteca da Casa de Oswaldo Cruz. Disponível em: http://cienciaviva.org.br/index.php/2020/04/05/breve-historia-do-movimento-anti-vacina/ Acesso em 13 set. 2020. 

    GILLRAY, James. The Cow Pock or the Wonderful Effects of the New Inoculation. Wellcome Collection. 1802. Disponível em https://wellcomecollection.org/works/jh8pftqz/images?id=b3zbs6t3 Acesso em 11 set. 2020

    JENNER, Edward. An Inquiry into the Causes and Effects of the Variolae Vaccine. In: BUCK, Carol; LLOPIS, Alvaro; NÁJERA, Enrique; TERRIS, Milton. The Challenge of Epidemiology: Issues and Selected Readings.  Pan American Health Organization. v. 505, p. 31, 1988.

    MENDONÇA, Ana. Bolsonaro sobre obrigatoriedade da vacina: ‘Não pode amarrar o cara e dar vacina nele’. O Estado de Minas. Belo Horizonte. 08 set. 2020. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2020/09/08/interna_politica,1183567/bolsonaro-nao-pode-amarrar-o-cara-e-dar-vacina-nele.shtml Acesso em 22 out. 2020.

    MIGALHAS – UOL. “Lei da vacina obrigatória é uma lei morta”, disse Rui Barbosa contra vacina de doença mortal do século XX. 15 jul. 2020. Disponível em: https://migalhas.uol.com.br/quentes/330685/lei-da-vacina-obrigatoria-e-uma-lei-morta—disse-rui-barbosa-contra-vacina-de-doenca-mortal-do-seculo-xx Acesso em 22 out. 2020.

    OMS. Ten threats to global health in 2019. Organização Mundial da Saúde. Genebra. 19 jan. 2019. Disponível em:  https://www.who.int/news-room/spotlight/ten-threats-to-global-health-in-2019 Acesso em 21 out. 2020  

    PODER 360. Bolsonaro volta a afirmar que vacina contra covid-19 não será obrigatória. 20 OUT. 2020. https://youtu.be/Ec56SV8bPGs 

    ROSS, Dale-L. Leicester and the anti-vaccination movement, 1853-1889. Transactions-The Leicestershire Archaeological and Historical Society. Leicestershire Archaeological and Historical Society, v. 43, p. 35, 1967. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/11636858/ Acesso em 20 abr. 2020

    TUCKER, Jonathan B. Scourge: the once and future threat of smallpox. Grove Press, 2002. Disponível em: https://bit.ly/33oAXNK Acesso em 11 set. 2020

    UOL. Bolsonaro volta a dizer que não pode obrigar ninguém a tomar vacina do coronavírus. 08 set. 2020. Disponível em; https://youtu.be/E4Q9djjtSkM; Aceddo em 22 out. 2020.

    WOLFE, Robert M.; SHARP, Lisa K. Anti-vaccinationists past and present. BMJ, v. 325, n. 7361, p. 430-432, 2002. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1123944/#B5 Acesso em 20 ago. 2020

    Este texto é original e escrito originalmente com exclusividade para o Mindflow

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Quando sair, use máscara

    76% do Estado de São Paulo avançou para a fase verde, mas os cuidados precisam continuar, afinal a pandemia ainda não acabou!

    Arte por Beatriz Durlin

  • Quando o aumento das Fake News mexe com a temperatura

    Os termômetros clínicos digitais infravermelho, esses usados para aferir a temperatura na entrada nos estabelecimentos, são seguros. Eles medem a quantidade de luz que emitimos no infravermelho.

    Imagem: Rawpixel.

    Esses dias recebi algumas mensagens dos meus tios me perguntando se há perigo no uso do termômetro clínico infravermelho. 

    A pergunta: 
    Esses termômetros de apontar podem danificar o cérebro? 
    Resposta: Não, eles são seguros. 

    O princípio do uso dos novos termômetros clínicos, os termômetros digitais infravermelho,  vem de uma observação antiga de um astrônomo e músico chamado Frederick William Herschel. Há mais de 200 anos atrás, Herschel observou que havia uma correlação entre o calor emitido e a cor de cada um dos espectros obtidos por meio de um prisma.

    Fonte: OpenClickArtVectors em Pixabay.

    Assim, Herschel passou a luz por meio de prisma de vidro e mediu a temperatura de cada cor refratada visível por meio de um termômetro de mercúrio. Os resultados dele mostraram que a temperatura aumentava do violeta para o vermelho. Isto é, ele descobriu que havia uma relação entre a radiação e calor. 

    Mas Herschel não parou por aí. Ele resolveu medir a temperatura para uma região em que não havia cor visível, para além do espectro do vermelho e descobriu que aquela região tinha uma temperatura ainda maior, a região que hoje conhecemos como o da radiação infravermelha. Além disso, desses resultados que mostraram a relação entre radiação e calor, ele descobriu que há tipos de luz ou radiação que não são visíveis aos nossos olhos.  

    Imagem: Desenho experimental presente no artigo de William Herschel. 

    Como você está radiante hoje: os termômetros digitais infravermelhos. 

    Sim, nós emitimos luz, mas calma aí, todos os objetos emitem, desde que estejam acima do zero absoluto

    Mas qual é a relação com a sua temperatura? 

    Pois veja, toda matéria emite uma radiação térmica ou radiação eletromagnética. Todavia, isso inclui os nossos corpos? Sim! Isso acontece graças ao movimento dos átomos e moléculas que acabam movimentando partículas carregadas que compõem a matéria. Assim, no processo, a energia cinética é transformada em radiação.

    No caso da radiação infravermelha, um material emite essa radiação de acordo com a sua temperatura e do seus constituintes, ou sua capacidade de emitir essa energia, ou seja, sua emissividade. Isso quer dizer que materiais diferentes vão emitir radiação infravermelha de forma distinta. 

    [Existem equipamentos que disponibilizam a imagem do calor, ou radiação infravermelha, são as câmeras termográficas] 

    Crédito da imagem: Rawpixel
    Mas, que faz o termômetro clínico infravermelho?

    Medir a energia radiante do corpo é uma forma indireta de se medir a temperatura. O que o termômetro clínico infravermelho faz é mensurar a energia radiante por meio de um sistema ótico, ou seja, tem uma lente no termômetro capaz de captar a radiação infravermelha. Ele lembra uma câmera, mas ao invés de registrar uma imagem transforma as informações recebidas e a transforma em um dado, a temperatura de um corpo. 

    O termômetro não causa dano, mas uma medida errada pode ter consequências para as pessoas. Como os termômetros clínicos infravermelho foram ajustados para medidas da radiação/temperatura da testa, medir a temperatura apontando para outra parte do corpo, pode levar a medidas erradas da temperatura da pessoa. 

    Mas e aquele laser que sai de alguns termômetros infravermelho? Alguns termômetros vem com um laser, mas ele serve só para saber para onde o equipamento está sendo apontado. Vai que a pessoa mira no cabelo! 

    O importante no caso do laser: Como qualquer apontador, não pode mirar no olho do coleguinha viu!  

    Então quando alguém apontar o termômetro para a sua testa fica tranquilo: seja um ser de luz e deixa o termômetro captar a sua radiação! 

    Tá pronto para dicas de leituras e atividades?

    Dica de leitura:

    Para entender o processo experimental e de descoberta de William Herschel, recomendo a leitura do artigo em português Os raios invisíveis e as primeiras ideias sobre radiação infravermelha. O artigo contextualiza os experimentos de Herschel e analisa as conclusões de uma série de artigos do autor sobre a luz e os raios invisíveis.

    Dica de atividade:

    [1] A National Aeronautics and Space Administration (NASA) preparou um guia para testar em casa o experimento do Herschel. Você vai precisar de uma caixa, um prisma de vidro e termômetros de álcool. Os de mercúrio não são mais usados, pois esse metal é tóxico. Atividade para fazer em casa sobre temperatura e espectro eletromagnético. Uma versão em português pode ser encontrada em O experimento de Herschel no site do Instituto de Física da UFRGS

    [2] A NASA Science – Space Place Explore Earth and Space preparou uma atividade sobre correlação entre imagens em infravermelho de rostos e temperatura.

    Para saber mais

    Herschel, William, XIV. ” target=”_blank” rel=”noreferrer noopener”>Experiments on the refrangibility of the invisible rays of the sun (1800). Philosophical Transactions

    NASA (2020) Discovery of Infrared Light

    Oliveira, Rilavia Almeida de; Silva, Ana Paula Bispo da (2014) William Herschel, os raios invisíveis e as primeiras ideias sobre radiação infravermelha Revista Brasileira de Ensino de Física, v36, n4.

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Calma Pitágoras… a gente resolve

    Com a atual pandemia a necessidade de distanciamento dentro dos estabelecimentos públicos fez com que vários materiais propondo essa distância segura fossem criados… entre elas, temos a imagem de capa desse post que virou um meme envolvendo o Matemático Grego Pitágoras (570 – 495 a.C.) sendo detido por outros colegas das Ciências para não surtar diante dessa imagem.

    O motivo de Pitágoras estar surtando diante isso, é que vemos a proposta de que 4 pessoas fiquem equidistantes 1,5 m cada uma no plano. O erro dessa representação pode ser percebido facilmente ao desenharmos um triângulo retângulo como na figura abaixo. Temos nele que os dois catetos valem 1,5 m e a hipotenusa também vale 1,5 m.

    Mas se os três lados são iguais, então não é um triângulo retângulo, e sim equilátero. Sim, 3 pessoas podem ficar equidistantes no plano a 1,5 m cada, mas na figura temos 4 pessoas, e isso complica a coisa. Vamos fazer algumas contas e ver qual valor podemos manter e qual é melhor trocar.

    Se a informação dos catetos estiver certa, teremos:

    Se a informação da hipotenusa estiver certa, teremos:

    Assim, como desejamos um distanciamento maior entre as pessoas, é melhor adotarmos que os catetos estivessem certos (valeriam 1,5 m) enquanto a hipotenusa estava errada, e neste caso valerá 2,12 m (melhor prevenir do que remediar).

    Mas o post não termina aqui… e se na verdade a imagem estivesse certa? É possível 4 pessoas ficarem equidistantes cada uma 1,5 m? Como disse antes, no plano não é possível… mas no espaço sim! No caso, para considerar a imagem inicial correta, precisaríamos imaginar que as 4 pessoas estivessem cada uma em um vértice de um tetraedro regular (uma pirâmide de base triângular na qual todos os seus lados ou faces, tem a mesma medida).

    Assim, se o aviso foi feito para uma loja na qual os clientes se distribuem por vértices de tetraedros regulares, ele está correto.

    Viu Pitágoras, no fim a gente resolve 😀

    (E resolve mais ainda se, além da conta do distanciamento, lembrarmos que é preciso respeitar a distância por nós e pelos outros. Cumpra o distanciamento social, use máscara, lave as mãos com frequência e, se possível, não se exponha)

    Este texto foi escrito originalmente no blog Zero para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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