Categoria: ESPECIAL COVID-19

  • As 11 Fake News sobre vacinas infantis que circularam antes e durante a consulta do Ministério da Saúde

    Segundo agências de checagem de fatos, 90% dos textos abordam a questão da segurança das vacinas. Eles distorcem estudos, peças publicitárias e até falas do Diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS). Além disso, parte dos conteúdos trazem vídeos de médicos e especialistas (nem sempre reconhecidos pela comunidade científica) que desaconselham vacinar as crianças, contribuindo para confundir a população.

    Contexto

    Após pouco mais de 22 meses desde que a OMS caracterizou a Covid-19 como pandemia, as vacinas ainda são a única medida eficaz, de que se tem notícia, para combater a doença, porém, no Brasil a imunização tem sido questionada não só por movimentos historicamente contrários às vacinas, mas também, surpreendentemente, por lideranças políticas que, paradoxalmente, deveriam zelar pela saúde da população. 

    O último embate, em que mais uma vez as autoridades nacionais se prestaram ao papel de questionar a necessidade das vacinas, começou no dia 26 de outubro de 2021 quando o comitê de especialistas do Food and Drug Administration (FDA), agência federal reguladora de saúde dos Estados Unidos, recomendou a aplicação da vacina em crianças de 5 a 11 anos. Assim, no dia 27, a imprensa noticiou que a farmacêutica Pfizer anunciou que solicitaria à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorização para vacinar crianças a partir de 05 anos de idade, o que se deu no dia 12 de novembro.

    Já em16 de dezembro, a agência aprovou o uso e divulgou os resultados técnicos de sua análise. Aliás, no mesmo dia, em live para seguidores, o atual Presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), ameaçou divulgar os nomes dos técnicos da Anvisa que participaram da aprovação do imunizante para crianças. Além disso, no dia 18, o quarto ministro da Saúde da gestão Bolsonaro, Marcelo Queiroga, anunciou que o governo federal realizaria uma consulta pública sobre a vacinação de crianças antes de decidir se aprovaria o início da imunização para elas, medida criticada tanto por médicos quanto por técnicos da Anvisa.

    Por que é importante verificar quais fake news circularam em dezembro?

    Em Saúde Pública (mas não apenas), a desinformação é um gravíssimo problema, pois, pode, por um lado provocar sobre demanda nos Sistemas de Saúde com exames desnecessários, motivados por alarmismo, por outro, levar pessoas a comportamentos extremos como deixar de realizar tratamentos necessários e de usar remédios essenciais para sua vida, enfim, no limite, a desinformação pode matar. Dessa forma, dado o momento em que o Ministério da Saúde solicitou uma consulta pública sobre o tema, a desinformação pode ter sido usada para distorcer a percepção das pessoas sobre as vacinas contra a Covid-19 para crianças.

    Metodologia

    Foram colhidas manualmente informações verificadas pelos sites, editorias e agências de checagem brasileiros Boatos.org, Aos Fatos, Projeto Comprova, Fato ou Fake, Uol Confere e Lupa, entre 01 dezembro de 2021 e 03 de janeiro de 2022. Assim, no total, os jornalistas realizaram no período cerca de 226 checagens, das quais 79 estavam relacionadas à Pandemia da Covid-19. Dentre estas, há 11 peças desinformando sobre a vacina infantil contra a Covid-19. Dessa forma, optamos por classificar essas verificações utilizando os rótulos de Misinformation and Disinformation (M&D) em Vacinas, compostos por 5 categorias e 17 subcategorias, elaborados por integrantes do Grupo de Estudo da Desinformação em Redes Sociais (EDReS), da Unicamp :

    1. Segurança: vacinas causam doenças (A); pessoas vacinadas transmitem a doença (B); vacinas causam autismo (C); as vacinas causam efeitos colaterais graves (D); as vacinas contêm ingredientes perigosos (E); é mais seguro contrair a doença do que vacinar (F); as vacinas podem prejudicar o sistema imunológico (G); sobrecarga de vacinas e suas consequências (H); esquemas alternativos de vacinação são mais seguros (I)

    2. Efetividade: as vacinas não funcionam (J); as vacinas não são responsáveis ​​pela diminuição das doenças (K)

    3. Saúde alternativa: promoção de alternativas à vacinação, principalmente serviços naturopáticos e de bem-estar (L)

    4. Moralidade: associação entre vacina contra HPV e promiscuidade, e / ou questões religiosas (M)

    5. Teorias da conspiração: narrativas sobre instituições poderosas ou atores com intenções nefastas e planos secretos (N)

    6. Outro: autodireção – liberdade de escolha, pesquisa independente (O); alegam que quem conhece a “verdade” não vacina (P); apelo emocional (Q) 

    (TOKOJIMA MACHADO, DE SIQUEIRA e GITAHY, 2020: p. 03)

    Análise

    Discussão

    Das 5 categorias possíveis de M&D em Vacinas, figuram na amostra Segurança (81%) e Teorias da Conspiração (19%). Assim, de todas as 17 subcategorias categorias possíveis, figuram quatro: as vacinas causam efeitos colaterais graves (D), as vacinas contêm ingredientes perigosos (E) as vacinas podem prejudicar o sistema imunológico (G), e narrativas sobre instituições poderosas ou atores com intenções nefastas e planos secretos (N). 

    Contudo, há textos que podem ser enquadrados em mais de uma categoria, como por exemplo a desinformação sobre 13 crianças que teriam morrido na África em função da vacina (categoria D) que também é associada ao nome do empresário estadunidense Bill Gates (categoria N). Dessa forma, por essa perspectiva, o número de textos que abordam a segurança dos imunizantes sobe para 90%.

    Observando especificamente para as 09 peças que versam sobre efeitos colaterais graves causados por vacinas, constata-se que 04 delas associam vacinas diretamente a mortes de crianças, em 02 os “especialistas” desaconselham a vacinação de crianças, em outras 02 a vacina é associada a riscos de AVC, miocardite e pericardite em crianças e 01 repisa a teoria da “vacina teste”.

    Hoje, já existe um consenso de que esses conteúdos não são tão espontâneos quanto fazem parecer e que existe uma linha de produção de desinformação com interesses financeiros e/ou políticos, um Ecossistema da Desinformação. Assim, partindo dessa premissa, a absoluta predominância de peças com foco nos efeitos colaterais das vacinas apontam para o interesse em criar na população uma atmosfera de risco, levando-as a hesitar em vacinar seus filhos. Apesar disso, conforme apontam recentes levantamentos de opinião, a imensa maioria dos brasileiros (79% segundo o Datafolha e  72%, Genial / Quaest), pretende vacinar seus filhos.

    Por fim…

    Neste estudo não dispomos de dados para afirmar que esses 18% (em média) de pais que ainda hesitam em vacinar seus filhos estão sendo influenciados pela desinformação que circula desenfreadamente via mídias sociais e, por vezes, na mídia tradicional, uma vez que insiste em dar espaço para negacionistas da vacina. Todavia, outros estudos utilizando a Análise de Redes podem confirmar ou negar essa hipótese, mapeando o alcance dessas publicações, os seus produtores e toda a rede de disseminadores que trabalha diuturnamente contra a saúde pública e contra a ciência.

    Referências: 

    PROJETO COMPROVA (2021) É enganoso que vacina contra covid-19 tenha provocado aumento de morte de crianças

    PROJETO COMPROVA (2022) Médica distorce estudo para atacar vacinas e é desmentida pelo autor.

    TOKOJIMA MACHADO, DF, DE SIQUEIRA, AF, GITAHY, L (2020) Natural stings: selling distrust about vaccines on Brazilian YouTube Frontiers in Communication, Volume 5, p 91.

    G1, Fato ou Fake

    DOMINGOS, R “É #Fake que”:

    Cartaz de campanha de prevenção ao AVC em crianças na França tenha relação com a vacina contra Covid-19

    Cartaz de campanha de prevenção ao AVC em crianças na França tenha relação com a vacina contra Covid-19

    Imagens de autópsia mostrem lesões causadas por vacina contra Covid e que imunizante cause vasculite

    Vídeo de homem que se diz inventor das vacinas de mRNA e afirma que vacinas são tóxicas para crianças

    Vídeo que diz que Austrália vai colocar 24 mil crianças em ‘campo de quarentena’ para serem vacinadas

    Boatos.org

    BECKER, K (2021) Pfizer admite que vai levar 5 anos para descobrir riscos de vacinas para crianças #boato

    MATSUKI, E

    13 crianças morreram após serem vacinadas contra Covid-19 na África #boato,

    Austrália cria campo de concentração para não-vacinados e vai vacinar crianças à força #boato

    Diretor da OMS diz que vacinas contra Covid-19 matam crianças #boato

    Diretor da OMS diz que vacinas contra Covid-19 matam crianças #boato

    Robert Malone é o inventor da vacina mRNA e está certo sobre vacinação de crianças #boato

    Agência aos fatos

    FAUSTINO, M (2021) Em vídeo, médica mente sobre substâncias e efeitos adversos de vacinas contra a Covid-19. Agência Aos Fatos

    MENEZES, LF (2021) É falso que Anvisa aprovou sem contraindicação vacina da Pfizer para crianças Agência Aos Fatos.

    MENEZES, LF (2021) Em vídeo, virologista falseia ao dizer que vacinas de mRNA são tóxicas para crianças Agência Aos Fatos

    RUDNITZKI, E (2022) Austrália não vai separar 24 mil crianças de seus pais para vaciná-las em ‘campo de quarentena’ Agência Aos Fatos

    PACHECO, P (2021) Vacinas contra Covid-19 não provocam liberação de fibrina na corrente sanguínea Agência Aos Fatos

    Agência Lupa

    NOMURA, B (2021) #Verificamos: É falso que Austrália colocou 24 mil crianças em ‘campos de quarentena’ para vaciná-las, Agência Lupa.

    NOMURA, B (2021) #Verificamos: É falso que vacinas de RNA mensageiro levam à produção de proteínas tóxicas em crianças Agência Lupa

    SKROCH, JB,  MACÁRIO, C (2021) #Verificamos: Médica distorce informações ao relacionar vasculite a vacinação contra a Covid-19, Agência Lupa

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Maurílio é autor no Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Join the campaign #Igetvaccinated

    This post was kindly translated by Marina Fontolan (@Mafonts01)

    You are: Science communicator Artist Or Scientist: Join us to create content to encourage Covid-19 children (5-11 yo.) vaccination efforts and counter disinformation!
    a campaign by the movement All for the Vaccines www.todospelasvacinas.info Contact info: Ana Arnt blogs@unicamp.br Flávia Ferrari obscovid19br@gmail.com

    All for the Vaccines movement invite all science communicators, artists, and scientists to act upon encouraging Covid-19 Vaccination to Children


    The new campaign #Igetvaccinated aims at counter disinformation on Covid-19 children vaccination and encourage the vaccination for 5 to 11 year olds

    While we wait for the children vaccines to arrive, the  All for the Vaccines movement is organizing a campaign #Igetvaccinated. Our movement unites science communicators, artists, scientists, science institutions, and famous people to foster pro-vaccination campaigns.

    As children vaccination efforts draw near, we noticed that the amount of disinformation on vaccines and specialists countering them has grown. Differently from our previous campaigns, #Igetvaccinated will not have a specific launch date and it is already receiving support and organizing its actions.

    The movement All for the Vaccines is organized by ABRASCO, Unicamp’s Science Blogs, COSEMS/SP, Halo team/United Nations (UN), UPS Vaccine Research Center (NPV-USP), Observatório COVID-19 BR, Rede Análise COVID-19, ScienceVlogs Brazil, and the Pro-Vaccine Union (União Pró-Vacina).

    Our campaings aim at dialoguing with the population through digital content created by specialists and science communicators with information on Covid-19 vaccines. Our website (www.todospelasvacinas.info) presents all the content generated during our campaigns in formats ready to be shared in all social media, including texas, audios, images and videos. 

    In our current campaign, we have created a new space for our campaign: children (5 to 11 yo.) – who has their parent’s consent – can send drawings or other types of arts (without exposing themselves) explaining “why #Igetvaccinated”. All art can be sent to blogs@unicamp.br and odospelasvacinas@gmail.com. They will be published in the website and the social media.

    On the campaign, Flávia Ferrari (Observatório COVID-19 BR) states that “vaccines save lives, but the virus will not go magically extinct; we need a great vaccination coverage and we need to vaccinate children as soon as possible, so we can continue to fight the disease”.

    Unicamp’s Science Blogs’ coordinator, Ana Arnt remind us that “the National Immunization Program is one of the most important milestones of our country’s Health Public history. It allowed us to eradicate polio and smallpox. Now it is time to face yet another chapter, to protect children against Covid-19, lowering the number of cases in Brazil”.

    Rede Análise COVID-19’s member Mellanie Fontes-Dutra affirms: “To all parents who are unsure, who thinks that there are not enough studies for children (5-11 yo.) vaccination, it is important to point out that ANVISA’s document approving children vaccination explains all the details and reassures vaccination safety”. The researcher also states that it is crucial to vaccinate the children, fostering the country’s fight against Covid-19.

    Contact info: Ana Arnt blogs@unicamp.br and Flávia Ferrari obscovid19br@gmail.com

    Original content:

  • Vacina contra COVID-19 para Crianças: entre o dever e o poder, o que prevalece?

    Era uma época sombria. Os mortos se acumulavam. O vírus caminhava pelas ruas sem controle, como uma besta desvairada, batendo de porta em porta e entrando naquelas que se abriam à ele. Infestava tudo e todos que encontrava em seu caminho: desde combatentes da pandemia a desavisados, perdidos e negacionistas.

    E então ela chegou, aquela que realmente poderia afastar as escuras nuvens que tomavam nosso mundo, permitindo que o sol brilhasse novamente nesse pálido ponto azul que chamamos de Terra: a Vacina.

    Começou com os idosos. Pais, avós, tios, conhecidos. Reclusos, com medo e trancados desde o início da pandemia. 

    Com o tempo, aqueles de meia idade, muitas vezes chamados efetivamente de “adultos”, foram sendo vacinados. 50, 40, 30 anos… a cada semana, pessoas mais novas eram chamadas.

    Então, chegou nosso momento, os “jovens”. Após ver avós e pais vacinados, finalmente seria a nossa hora. A tão sonhada proteção estava chegando, e logo poderíamos – quem sabe – rever os amigos, dessa vez sem o intermédio de uma tela.

    E agora?

    Com a situação um pouco mais calma, mas não completamente resolvida (e podendo facilmente voltar ao caos passado), a vacinação da próxima geração, as nossas crianças, se aproxima a passos módicos. Entretanto, assim como um vulto que persiste em ficar na extremidade de nossa visão, as sombras do movimento antivacina se lançam sobre os indivíduos, espalhando o medo e mentiras sobre a vacinação dos menores.

    Pensando nisso, viemos aqui para explicar as novas notícias sobre a vacinação das crianças e responder suas dúvidas, cara leitora e leitor, para que possa entender melhor sobre isso e proteja suas filhas e filhos.

    O que se sabe sobre a COVID-19 em crianças?

    O vírus causador da COVID-19, o SARS-CoV-2, tem muitas similaridades com o vírus causador da SARS em 2003, o SARS-CoV-1. Entretanto, os casos infantis entre as duas doenças têm algumas diferenças. Na SARS, os casos entre crianças eram bem raros e tinham um histórico de exposição muito claro. Isto é, sabia-se como, onde e quando a criança havia pego o vírus. Já com a COVID-19, esse rastreio de casos foi e é bem mais complicado [1]. 

    A princípio, como muitas crianças desenvolviam a forma leve ou assintomática, os casos entre elas eram ignorados. Assim, dizia-se que não haveria qualquer problema em elas pegarem o SARS-CoV-2. Com o passar das semanas e o aumento gigantesco do número de infecções, começou-se a ver que esses casos assintomáticos (tantos infantis quanto adultos) eram fonte de uma parte significativa do espalhamento do vírus. 

    Mas há muito mais informações hoje…

    Atualmente, até onde se sabe, a COVID-19 afeta todas as idades de crianças e adolescentes, desde recém-nascidos até maiores de 18 anos. Os principais sintomas que elas apresentam são febre e tosse. No entanto, outros sintomas inespecíficos podem aparecer, como dor de cabeça e de garganta, cansaço, nariz tampado e escorrendo, vômito e diarréia [2, 3]. Em geral as crianças desenvolvem a forma assintomática, leve ou moderada da COVID-19. Todavia, alguns estudos sugerem que recém-nascidos (e crianças com menos de 1 ano de idade) possuem 3x mais chances de ter sintomas gastrointestinais e desenvolver a forma severa da COVID-19 [3]. Assim, pensando nisso, é de suma importância levar em consideração ainda a proteção dos pequenos, seja mantendo-os em isolamento social ou levando-os para se vacinar, quando as campanhas de vacinação para essas faixas de idade começarem.

    ainda sobre controvérsias

    Infelizmente, nos dias atuais, o mesmo discurso do começo da pandemia (sobre não haver risco para as crianças) ainda é utilizado para advogar a volta às aulas, mesmo já sabendo de tudo isso. Mas, é claro que, por um lado, compreendemos ser muito difícil todo o processo de ensino a distância, as dificuldades e problemáticas criadas com ele, fora a questão que muitas crianças de famílias necessitadas dependiam de serviços escolares para necessidades de saúde mental, física e nutricional. 

    Entretanto, é necessário lembrar que apesar da maior parte das crianças desenvolverem casos leves de COVID-19, elas ainda podem desenvolver casos severos e vir a falecer, principalmente aquelas que possuem alguma comorbidade, são imunocomprometidas ou fazem uso de imunossupressores. Além disso, alguns estudos vêm sugerindo que, assim como em adultos, após uma infecção de COVID-19 em crianças, pode haver a persistência de sintomas como cansaço, dor muscular, insônia, problemas respiratórios e de concentração, durante vários meses pós-infecção [4, 5].

    Mas algum país já está vacinando menores de 12 anos?

    Sim! Alguns países já começaram a vacinar as suas crianças 

    • Cuba: a partir de 2 anos com a Soberana 2 e Soberana Plus [6],
    • Chile: 6 anos ou mais com CoronaVac [7],
    • China: a partir de 3 anos com CoronaVac [8],
    • Estados Unidos: a partir dos 6 anos com a Pfizer [9].

    A grande questão aqui é que os Estados Unidos foi o primeiro país a ter uma vacina (Pfizer) aprovada para uso emergencial em crianças por uma agência reguladora e a publicar os dados das fases de teste em revistas científicas, para avaliação do resto da comunidade científica [10]. Enquanto isso, tanto os dados da Soberana 2 (em Cuba) e da Coronavac (no Chile e na China) permanecem em sigilo. Ou seja, sem comunicação oficial para a OMS e revistas científicas para revisão por pares. 

    Assim, por esses e outros motivos que vamos apresentar agora as principais informações referentes às vacinas contra COVID-19 que estão sendo testadas e aprovadas para uso em crianças:

    Vacina Pfizer [10-13]:

    • Pode ser aplicada em crianças de 5 a 11. A Pfizer e Biontech anunciaram que até o final de 2021 iriam publicar os dados referente ao uso da vacina em crianças entre 6 meses e 5 anos.
    • A dose utilizada em crianças de 5 a 11 é ⅓ da dose original utilizada em adultos e jovens maiores de 12 anos. 
      • Serão aplicadas duas doses, com um intervalo de 3 semanas entre elas.
    • A quantidade de anticorpos neutralizantes (falamos sobre este conceito nesse e nesse texto) observadas nas crianças após um mês da segunda dose, foi bem parecida com a quantidade vista em jovens e adultos.
      • Isso quer dizer que mesmo com a dose sendo menor, as crianças acabam tendo uma proteção boa.
    • Não foram vistos grandes efeitos colaterais. Os poucos efeitos observados assemelham-se com os efeitos que aparecem em jovens adultos.
    • A eficácia da vacina ficou por volta dos 90%, bem parecido com a eficácia em adultos.
    • A Pfizer já obteve, em nosso país, a aprovação da ANVISA para uso da sua vacina para crianças entre 5 e 11 anos.

    Vacina Moderna [14-17]:

    • Ainda não há aprovação pelo FDA, mas a Moderna já divulgou alguns dados de fase ⅔ da sua vacina infantil, anunciando que logo deve enviar para análise da agência reguladora.
    • Vacina testada em crianças entre 6 e 12 anos (assim como da Pfizer). Demonstrou uma boa capacidade na geração de anticorpos neutralizantes.
    • Diferente da Pfizer, nesse caso serão duas doses com um intervalo de 4 semanas.
    • Os poucos efeitos colaterais relatados foram bem leves, como dor local, dor de cabeça e cansaço.
    • Em algumas análises preliminares, alguns pesquisadores notaram uma diferença na taxa de desenvolvimento de inflamação no coração (miocardite) em adolescentes (12-17) que receberam a vacina. Isso levou a um atraso na análise da vacina para crianças, pois quiserem verificar se também haveria essa diferença para os pequenos.
      • Ainda não se estabeleceram relações entre a miocardite como uma reação adversa e as vacinas. Para mais informações, você pode conferir aqui, aqui e aqui.

    Vacina CoronaVac [18-21]:

    • A China, Chile e Emirados Árabes já estão vacinando suas crianças e jovens entre 3 e 17 com a CoronaVac.
    • Em junho, a China aprovou o uso da CoronaVac em crianças e adolescentes, contudo, a vacinação em si só começou em meados de outubro. 
    • Apesar de já estar sendo aplicada em alguns países, até o momento só temos os dados de fase 1 e 2 (caso não lembre o que são as fases de desenvolvimento das vacinas, confira esse texto aqui) da CoronaVac nessa faixa de idade (3-17 anos). 
    • Em agosto, o Instituto Butantan fez o pedido para a ANVISA para aprovação do uso emergencial da CoronaVac em crianças, contudo, a ANVISA negou tal pedido, requisitando mais informações.
    • Até o momento, o uso emergencial para essas faixas etárias ainda não foi concedido para a CoronaVac.

    Deveríamos vacinar as crianças e só então voltar às aulas presenciais?

    Na última semana do mês de junho, 250 mil crianças tinham sido diagnosticadas – a constar, somente naquela semana – com a COVID-19 na Inglaterra. Inclusive, este foi o pior momento da pandemia no quesito escolar desde a reabertura do país em março de 2021. Em Israel, país modelo da vacinação na população adulta, o número de crianças em período escolar que testaram positivo para COVID-19, triplicou na mesma semana. Devido a somente 4% da população menor de 15 anos estar vacinada. Em suma, na época, ambos os países estavam com a vacinação bem avançada, mas ainda não o suficiente para voltar às aulas [22].

    Assim, isso nos mostra que, se não tomarmos cuidado, aqui no Brasil a mesma coisa pode acontecer. Inclusive, um aviso, já está acontecendo: cada vez mais vamos ver menores de 18 anos e crianças testando positivo para COVID-19. Aliás, vemos quando são feitos os testes, enchendo os hospitais e, inclusive, falecendo.

    Ainda é cedo para bater o martelo, mas…

    Sabemos que este é um terreno difícil de discussão e que as crianças perderam muito com os distanciamentos e pouca socialização nestes dois anos. Portanto, o debate é realmente delicado. A princípio, a nossa indicação e o que consideraríamos ideal era esperarmos um pouco mais, tanto para a volta às aulas quanto para a retomada da sociedade ao “antigo normal”. Assim, a chegada da Pfizer no Brasil é um sinal de que a etapa de vacinação infantil está mais próxima, tornando a vida social um pouco mais segura.

    Todavia, também sabemos que com a variante Ômicron tomando lugar rapidamente do cenário atual, somado ao apagão de dados e falta de testes, fica muito difícil não apenas analisar os melhores caminhos como também indicar um lugar seguro para tomada de decisões tão importantes, como as que precisamos no momento.

    Para saber mais:

    1. Zhou, MY, Xie, XL, Peng, YG, Wu, MJ, Deng, X. Z, Wu, Y, … & Shang, LH (2020) From SARS to COVID-19: What we have learned about children infected with COVID-19, International Journal of Infectious Diseases, 96, 710-714 
    2. She, J, Liu, L, & Liu, W (2020) COVID‐19 epidemic: disease characteristics in children, Journal of medical virology, 92(7), 747-754. 
    3. Cui, X, Zhao, Z, Zhang, T, Guo, W, Guo, W, Zheng, J, … & Cai, C (2021) A systematic review and meta‐analysis of children with coronavirus disease 2019 (COVID‐19), Journal of Medical Virology, 93(2), 1057-1069.
    4. Ludvigsson, JF (2021) Case report and systematic review suggest that children may experience similar long‐term effects to adults after clinical COVID‐19, Acta Paediatrica, 110(3), 914-921.
    5. Buonsenso, D, Munblit, D, De Rose, C, Sinatti, D, Ricchiuto, A, Carfi, A, & Valentini, P (2021) Preliminary evidence on long COVID in children, MedRxiv. 
    6. Oppmann, P (2021) Cuba vaccinates children as young as 2 in strategy to reopen schools, economy, CNN
    7. Mohor W, D (2021) Chile overcame the Delta variant. Now it’s racing to vaccinate kids, CNN,
    8. Wu, H (2021) China to start vaccinating children to age 3 as cases spread ABC News
    9. G1 (2021) CDC passa a recomendar vacina da Pfizer contra a Covid-19 para crianças de 5 a 11 anos nos EUA
    10. FDA (2021) FDA Authorizes Pfizer-BioNTech COVID-19 Vaccine for Emergency Use in Children 5 through 11 Years of Age
    .
    1. Pfizer (2021) Pfizer and Biontech announce positive topline results from pivotal trial of COVID-19 vaccine in children 5 to 11 years.
    2. Walter, EB, Talaat, KR, Sabharwal, C, Gurtman, A, Lockhart, S, Paulsen, GC, … & Gruber, WC (2021) Evaluation of the BNT162b2 covid-19 vaccine in children 5 to 11 years of age, New England Journal of Medicine
    3. Martins, A (2021) Pfizer pede autorização à Anvisa para vacinar crianças de 5 a 11 anos, Exame
    4. Moderna (2021) Moderna Announces Positive Top Line Data from Phase 2/3 Study of COVID-19 Vaccine in Children 6 to 11 Years of Age.
    5. Moderna (2021) Moderna Provides Update on Timing of U.S. Emergency Use Authorization of its COVID-19 Vaccine for Adolescents.
    6. Hernandez, J (2021) The FDA is probing whether the Moderna vaccine can cause a rare side effect in teens, NPR.
    7. Witberg, G, Barda, N, Hoss, S, Richter, I, Wiessman, M, Aviv, Y, … & Kornowski, R (2021) Myocarditis after Covid-19 vaccination in a large health care organization, New England Journal of Medicine
    8. G1 (2021) China aprova uso da CoronaVac para crianças a partir de 3 anos, diz Sinovac.
    9. Han, B, Song, Y, Li, C, Yang, W, Ma, Q, Jiang, Z, … & Gao, Q (2021) Safety, tolerability, and immunogenicity of an inactivated SARS-CoV-2 vaccine (CoronaVac) in healthy children and adolescents: a double-blind, randomised, controlled, phase 1/2 clinical trial, The Lancet Infectious Diseases
    10. Mattos, L. (2021). Butantan entra com novo pedido para aprovar uso da Coronavac a partir dos 3 anos, Folha de São Paulo 
    11. Giving Compass. (2021). The Impact Of The Delta COVID Variant On Unvaccinated Youth.

    Outros materiais:

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Maurílio é autor no Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Políticas Públicas em Saúde e vacinação de COVID-19

    Temos falado muito da vacinação como pacto coletivo e como medida de políticas públicas em saúde. Mas vocês sabem o que isto significa? O texto de hoje vai falar um pouco sobre o significado de Política Pública e como isto se aplica ao contexto da saúde e, especialmente, da pandemia de COVID-19 e as vacinas.

    Pode parecer banal, mas Políticas Públicas é uma área de conhecimento que está situada nas Ciências Políticas. Ou seja, isto quer dizer que existe um campo de especialistas dedicados a estudar como as políticas públicas funcionam e se implementa, ao que se relacionam e quais efeitos se estabelecem em uma sociedade, ao se idealizar, desenvolver e estabelecer uma política pública.

    Mas o que significa Política Pública?

    Política pública, em um sentido prático ou concreto, pode ser vista como uma interferência direta do Estado na vida (e na manutenção da vida) de uma população. Esta interferência ocorre a partir do momento em que o Estado assume uma forma complexa, na modernidade. Dessa forma, as políticas públicas têm como principal função regulamentar a vida e os espaços públicos, analisando, organizando, legislando  e possibilitando espaços de liberdade, atuação e estrutura social, em uma sociedade e territórios também complexos.

    Pareceu difícil? Em termos gerais, as políticas públicas, como conhecemos hoje, têm como base a centralização de alguns poderes para organizar a vida de uma população, dentro de um território.

    Essa centralização pode acontecer em maior ou menor grau, dependendo do país e de sua política social e econômica. De qualquer modo, ao termos um estado centralizado, em um território determinado, em que uma população reside, teremos políticas públicas com maior ou menor interferência na vida desta população.

    Outro ponto que pode ser importante também de compreender é que políticas públicas não são leis apenas. Isto é, Políticas públicas dizem respeito a uma estrutura e organização que, sim, passam por leis. Todavia também dizem respeito aos programas de governo, às instituições governamentais, aos planejamentos públicos, ao levantamento de dados para análises públicas e estabelecimento de leis, programas, aos financiamentos públicos, dentre outras questões.

    Como vocês podem perceber, políticas públicas dizem respeito a um conjunto de ações em um estado centralizado, para uma população.

    Políticas públicas como estratégia e instrumento democrático

    É fundamental compreendermos que as políticas públicas são estratégias para organização e manutenção de uma vida em sociedade, dentro de um estado. Todavia, torna-se atualmente também fundamental entendermos que as políticas públicas são instrumentos de promoção e defesa de um estado democrático, a partir de estratégias específicas. Mais do que isto, são instrumentos que visam interferir na população por sua ação ou falta de ação. Ou seja, quando um governo decide não agir em algum acontecimento ou setor específico isto também é interferir, uma vez que produz efeitos específicos em uma população definida, dentro de um território nacional.

    Tendo em vista que as políticas públicas são uma área das Ciências Políticas, mas podem relacionar-se com qualquer aspecto da vida pública, elas têm algumas características específicas. São obrigatoriamente multidisciplinares, isto é, precisam de profissionais de diversas áreas para compreender um determinado aspecto ou acontecimento social, para definir ações para solucionar problemas. Além disso, nestas ações estratégicas também são predominantemente fundamentais os princípios éticos que vão reger as ações, visando prioritariamente a manutenção da dignidade humana, dentro de um estado democrático de direito.

    Assim, estes são princípios que regem as políticas públicas. Ou seja, quando pensamos em um problema específico relacionado a uma população, parte das perguntas que iniciam e atravessam toda a busca por soluções, por todos os profissionais envolvidos, é (ou deveria ser): como salvar a maior quantidade possível de pessoas e mantê-las sadias, salvas e com bem estar social mínimo.

    Dito isto, vamos ao próximo ponto…

    Qual a importância de se compreender o que é política pública, em um momento de pandemia?

    Talvez essa seja uma pergunta extremamente relevante para o contexto atual. Quando pensamos em uma política pública de saúde, por exemplo, existem muitos fatores a serem levados em conta. Não é apenas alguém de um governo dizendo:

    • Ah, eu quero que vacinem pessoas;
    • Eu acho que tem que tomar este medicamento e vou espalhar por aí.

    As políticas públicas de saúde são (ou deveriam ser) feitas a partir de dados de uma população. Que tipo de dados?

    • Quantas pessoas estão nascendo?
    • Quantas pessoas estão morrendo?
    • Do quê as pessoas estão morrendo?
    • Em que região se nasce e se morre mais?
    • Em que região as pessoas estão morrendo mais? De que causas?

    Em relação à COVID-19, por exemplo, não basta ter testes diagnósticos (o que temos muito pouco), é preciso analisar quem está falecendo em relação à idade, características de saúde e doenças prévias, condições sanitárias, habitacionais, classe social, etc.

    No cruzamento destes dados, teremos alguns perfis que adoecem mais. A partir disso, poderemos estabelecer estratégias específicas para cada grupo social e parcela da população (desde campanhas de conscientização, até cuidados básicos e protocolos de atendimento). Isto é, não adianta eu criar uma campanha sobre cuidados básicos com personagens infantis (por exemplo) e usar para atingir pessoas da terceira idade. Também é sem sentido eu criar protocolos de pronto atendimento para idosos em postos em que só atendem crianças até 10 anos.

    Assim, políticas públicas de saúde dizem respeito a um conhecimento técnico da população, com levantamento de longa data, e organização deste conhecimento para aplicar estratégias de manutenção da saúde e combate à doenças. Isto vai desde legislações, passando por instituições (postos de saúde, hospitais, formação profissional, alocamento de materiais e recursos, logística), até comunicação em campanhas.

    E as vacinas?

    Uma das questões polêmicas contemporâneas é a obrigatoriedade da vacina, o passaporte vacinal e a vacinação de crianças. Isso têm relação com política pública? Como?

    Nós sabemos que a vacinação infantil têm gerado polêmica e há muitos pais, mães e responsáveis com muito medo de vacinar. Esse receio vem sendo promovido pelo discurso de que a vacina é experimental e as crianças seriam cobaias de um experimento em massa.

    Bom, já vamos logo dizendo que não! A vacina que vai ser disponibilizada para as crianças em nosso país não é experimental. Ela passou por todas as etapas de testes, foi analisada por pares, registrada em instituições internacionais de pesquisa, que acompanham passo a passo os resultados. Ao final de todas as etapas, as fábricas que produzirão as vacinas também são vistoriadas para a aprovação final de uma vacina em países como o nosso.

    Dito isso, voltemos à questão das políticas públicas de vacinação. A pergunta relacionada às políticas públicas em saúde e vacinação normalmente têm sido:

    • Se a vacina é obrigatória, como pode ser escolha dos pais?
    • Se eu quiser não vacinar meus filhos, por qual motivo eu deveria estar batalhando tanto para que a campanha de vacinação ande logo no Brasil?

    A vacinação obrigatória e a vacinação compulsória

    Primeira questão: a vacinação ser obrigatória não a torna compulsória. Ou seja, nossas políticas públicas em saúde são cruzadas, quando se trata de vacinação. Isto quer dizer que não se vacinar pode te restringir acesso a serviços públicos e privados em nosso país – ou mesmo internacionalmente. Por exemplo, um país e/ou estado pode restringir, legalmente, matrícula em escolas, prestar serviço público, circular em determinados espaços públicos ou estabelecimentos. Tratamos desta questão no texto sobre Passaporte Vacinal.

    A vacina, todavia, segue sendo uma escolha pessoal e individual e não é compulsória. Com isto, queremos dizer que não há nenhum agente do governo federal, estadual ou municipal que entrará na tua casa à força e te vacinando (ou vacinando teus filhos) contra a tua vontade. 

    Não quero vacinar, tanto faz o governo comprar ou não vacina!

    Considerando que a vacinação é um pacto social e que precisamos de uma ampla cobertura vacinal para diminuir casos de infecção, riscos de agravamentos e, também, transmissão do vírus SARS-CoV-2, faz muito sentido batalharmos por ações de vacinação em massa sim!

    Se a vacinação é uma ação pública em nosso país, nós deveríamos ter um plano para torná-la disponível à população brasileira. E como podemos fazer isto?

    Assim, vou considerar neste texto que a vacina foi aprovada pela ANVISA e esta etapa não precisa mais entrar na nossa conta, ok? Também vou considerar apenas as crianças de 5-11 anos, que é o foco atual da vacinação de COVID-19. Dessa forma, vou traçar aqui alguns pontos que podem ser importantes sabermos para estabelecer uma política pública de vacinação:

    • Número de crianças de 5 a 11 anos e número de crianças que farão 5 anos em 2022 no Brasil;
    • Distribuição destas crianças no território nacional (quantas crianças por estado e município brasileiro);
    • Quantidade de doses suficientes para vacinar 100% das crianças nesta faixa etária;
    • Numero de seringas e agulhas necessárias para aplicar as vacinas;
    • Quantidade de profissionais para aplicar estas vacinas;
    • Organização de um calendário de vacinação;
    • Organização de critérios de prioridades para vacinar – diminuindo aglomeração de pessoas em postos de vacinação;
    • Compra de vacinas;
    • Distribuição de vacinas;
    • Armazenamento de vacinas;
    • Treinamento de profissionais, caso necessário;
    • Impressão de carteirinhas de vacinação específica;
    • Campanha de vacinação (oi, Zé Gotinha!);

    Esta lista não se pretende completa, de modo algum. Entretanto, é um bom exercício para percebermos que políticas públicas de saúde não dizem respeito necessariamente ao exercício da medicina, por exemplo. A vacinação de crianças envolve dados que vão desde censos populacionais, até compras, licitações, logística, espaços de armazenamento, formação profissional, etc.

    Só isso?

    Também é preciso de algo que vou chamar aqui de ação coordenada. Ou seja, é um diálogo e estabelecimento de protocolos que são estruturados por um órgão máximo de um país – como o Ministério da Saúde – e repassados para órgãos equivalentes regionais – como as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.

    Quando estabelecidos os protocolos e este diálogo, também se sabe quais as condições que estados e municípios têm de efetivar esta política pública. Portanto, é neste diálogo que se consegue desenvolver estratégias de execução destas políticas, caso precise de algum suporte federal aos estados e municípios.

    Políticos (seja do poder executivo, seja do poder legislativo) e instituições políticas governamentais (ministérios, secretarias, por exemplo) e instituições jurídicas (como o STF) sabem destes trâmites todos com mais detalhes. E é por isso que são considerados GOVERNO representados por 3 poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário.

    É possível compreender a complexidade de ações envolvidas em algo que parece tão simples, como o ato de vacinar pessoas?

    Pois é! O Programa Nacional de Imunização, o famoso PNI, foi pensado e estruturado em pleno período de governo militar brasileiro, em 1973! 

    Já tivemos vários êxitos maravilhosos desde a criação do programa. Por exemplo, podemos destacar a erradicação da Varíola, em 1977 e da poliomielite, em 1989, no território nacional! Assim as vacinações entram no que chamamos de Políticas Públicas de Saúde Preventivas. Isto é, uma política pública que visa, através de suas ações, prevenir doenças (ou evitar ao máximo que a população chegue a adoecer e, caso adoeça, evitar ao máximo que faleça).

    A vacinação de crianças não é só um tema banal a ser debatido em dias comuns por pessoas comuns – como nós. Independente de querermos ou não vacinar crianças (embora nossa recomendação seja fortemente de que vocês vacinem as crianças assim que possível), precisamos que as vacinas estejam disponíveis para nossas crianças o mais rápido possível! Mas, para isto, precisamos de planejamento, organização, estrutura, compras, viabilização de transporte, espaço físico para armazenamento, treinamento técnico, estabelecimento de protocolos, definição de diretrizes.

    Em suma, políticas públicas de saúde são sobre tudo isso (e mais um pouco). E é por isso que temos perguntado todos os dias (e seguiremos perguntando):

    Em que pé estão os planejamentos para a vacinação das crianças?

    Para Saber Mais

    Documentos Oficiais Brasileiros:

    Programa Nacional de Imunizações – Vacinação

    CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

    Lei Orgânica de Saúde – LEI Nº 8.080, DE 19 DE SETEMBRO DE 1990.

    Outras Bibliografias

    Azevedo, JML (2004) A educação como política pública, Campinas: Autores associados.

    Derani, C (2004) Política pública e a norma política, Revista da Faculdade de Direito UFPR

    Marques, E, Faria, CAP (2018) A política pública como campo multidisciplinar, São Paulo: Editora UNESP, Rio de Janeiro: Editora Fiocruz.

    Paulus Junior, A, Cordoni Junior, Luiz (2006) Políticas públicas de saúde no Brasil Revista Espaço para a Saúde, Londrina, v8, n1, p13-19.

    Reis, DO, Araújo, EC, Cecílio, LCO (s/d) Políticas Públicas de Saúde no Brasil: SUS e pactos pela Saúde, Unifesp.

    Santos, Nelson Rodrigues dos (2007) Desenvolvimento do SUS, rumos estratégicos e estratégias para visualização dos rumos Ciência & Saúde Coletiva, v12, n2, pp 429-435 (Acessado 30 Dezembro 2021).

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Ana é coordenadora do Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Vacina de Pólio e a segurança dos protocolos de vacinação atuais

    Texto escrito por Flávia Ferrari

    O primeiro texto sobre vacinas, da equipe do Todos Pelas Vacinas, falou sobre Reações Adversas, com a Mellanie Fontes-Dutra! Hoje nós vamos falar sobre uma vacina especial, que é o coração do Programa Nacional de Imunização e a grande vedete dos fãs de vacina: a vacina de pólio (poliomielite ou a gotinha!).

    O que é pólio?

    Temos relatos de poliomielite (popularmente conhecida como paralisia infantil) desde a antiguidade. Não é, portanto, uma doença recente em nossa história, como humanidade. Porém, o vírus só foi descoberto no começo do século XX. A trajetória foi, portanto, longa até entendermos o que causa esta doença!

    A principal forma de transmissão é por contato com as fezes. Isto é, fecal-oral. Mas também pode ser transmitida de forma oral-oral. A paralisia infantil é assintomática em 95% dos casos. Todavia, em 1% dos casos podem se desenvolver sintomas graves, menos de 0,05% morrem.

    Se olharmos estes números, de alguma forma (curiosa até) eles colocam em xeque as discussões que temos hoje sobre a COVID. Isto porque muitos afirmam sobre os supostos “baixo riscos” que crianças têm ao contraírem a doença a COVID-19. Entretanto, nós sabemos que devemos tentar preservar o máximo de vidas possível, especialmente quando se trata de doenças e mortes evitáveis! Aliás, isso ainda intensifica-se ao refletirmos nas sequelas para toda uma vida e no impacto disso para a saúde pública. 

    Jonas Salk e a poliomielite

    Mas o assunto hoje é a pólio e a vacina! Então, quero contar um pouco sobre a história da pesquisa de Jonas Salk. Salk trabalhava desde 1941 com o vírus Influenza (gripe) e em 1947 começou seus estudos sobre a poliomielite. Em 1949, outros pesquisadores desenvolveram um método in vitro de propagação do poliovírus. Salk usou a técnica para produzir grandes quantidades de vírus e iniciar testes de inativação do vírus. Salk acreditava que a vacina poderia ser feita de vírus morto, produzindo assim anticorpos através da presença no sangue. 

    Os primeiros testes de segurança foram feitos em cerca de 5000 indivíduos. Salk chegou até mesmo a inocular a vacina experimental nele mesmo, na esposa e nos seus três filhos. 

    Após esses testes de segurança em pequena escala, realizou-se o maior estudo clínico já feito, recrutando 1,8 milhões de crianças só nos Estados Unidos, para realizar os testes de fase 3. 

    No caso da COVID, por se tratar de um vírus com transmissão muito mais comum, precisamos de grupos menores para tanto. Os testes de fase 3 não passaram de dezenas de milhares. 

    A aplicação da vacina de pólio

    Voltando ao teste de Salk, já em 1955, a vacina começou a ser aplicada em massa. Com um controle muito menos rígido que os atuais houve uma grande falha em um laboratório que não utilizou o procedimento correto para inativar o vírus. Com isso, de 380 mil doses lançadas pelo laboratório, 164 crianças ficaram paralisadas (0,043%) e 10 morreram (0,003%), uma porcentagem muito baixa, em relação ao total de vacinas aplicadas. No entanto, mesmo com uma porcentagem baixa assim, este foi considerado o maior desastre biológico da história dos Estados Unidos da América. 

    Aliás, tão desastroso que culminou na mudança de todo o padrão de checagem de segurança das vacinas, até os dias atuais no mundo inteiro. A cepa utilizada era a mais virulenta também, algo inimaginável nos dias atuais.

    Cabe ressaltar que após esse incidente, nenhum evento desse tipo ocorreu mais.  Devido às novas técnicas de segurança e ao controle de qualidade para as vacinas, que inclusive ajudaram a melhorar os procedimentos atuais.

    Hoje no Brasil, usamos a CoronaVac como vacina contra COVID-19 tendo a tecnologia de vírus inativado que possui mais de um método de inativação. Isto é, o utilizado pela vacina Salk e também métodos de radiação de alta frequência. Além disso, usamos atualmente métodos de controle muito mais efetivos.

    Como assim? Quer dizer que usam o mesmo método catastrófico do Salk? Não. Quer dizer que aprimoramos a tecnologia de inativação do vírus, construímos conhecimento sobre nossos erros

    Hoje, o método de vacinas de vírus inativado é considerado muito seguro.

    Em 1961, com a continuidade da vacinação e revisão dos protocolos, os casos reduziram 90% só nos Estados Unidos. No Brasil, a vacina começou a ser utilizada a partir de 1960.  Porém não temos dados seguros da redução, pois não havia notificação compulsória até 1968. 

    Na década de 80 surgiram os Dias Nacionais de Vacinação (e o Zé Gotinha – A gente tem um vídeo fofo disso). Em 1991 houve o último caso de pólio nas Américas! Um marco histórico de vitória de uma política pública de saúde tão importante!

    Em 1994 fomos certificados como área livre de circulação de pólio selvagem. Segundo projeções, se a queda continuar no mundo todo (hoje apenas Nigéria, Afeganistão e Paquistão e outros casos relatados em outros países), em 2024 poderemos ter erradicado o vírus no mundo, 70 anos após o desenvolvimento da vacina.

    Segundo a Organização Mundial da Saúde, erradicar a poliomielite significaria uma economia mundial de cerca de 40 bilhões de dólares, pelo menos. Este número torna-se ainda mais significativo quando levamos em conta que são países de baixa renda os afetados por esta doença. Mas mais importante do que isto, a OMS aponta que:

    Quando a pólio for erradicada, o mundo poderá celebrar a entrega de um grande bem público global que beneficiará todas as pessoas da mesma forma, não importando onde elas vivam (…) o sucesso significará que nenhuma criança voltará a sofrer os terríveis efeitos da paralisia provocados pela poliomielite ao longo da vida

    E o que isto tem a ver com a vacinação de COVID-19, o Todos Pelas Vacinas e nossa campanha de vacinação infantil?

    É importante termos noção de que a ciência não funciona em saltos com soluções inéditas. Sabemos que vivemos atualmente um momento difícil, que parece se arrastar por nossas vidas e esperamos diariamente notícias de que a pandemia acabou. Mas compreender estes processos científicos também torna-se parte da possibilidade de confiar mais ainda nos processos científicos. Isto é, compreender que a ciência funciona a partir de análises anteriores, técnicas já desenvolvidas, aprimoradas, para problemas contemporâneos e novos. A vacina para Covid, como não poderia deixar de ser, utilizou-se de plataformas, técnicas e conhecimentos prévios para ser desenvolvida com segurança para nós e para as crianças.

    Assim, reforçamos alguns pontos: Vacinas salvam vidas, mas não extinguem o vírus em um passe de mágica. A pesquisa em vacinas pode ser rápida, ainda mais se houver interesse público, financiamento e uso de plataformas já desenvolvidas. As vacinas não foram desenvolvidas rapidamente como passe de mágica, nós utilizamos saberes prévios, como são as outras usadas atualmente. Por exemplo, a vacina de RNA que já vinha sido desenvolvida para outros vírus.

    Além disso, a aplicação de vacinas em massa ocorrem após testes em grupos para verificar a segurança. Erros que aconteceram no passado balizaram métodos que asseguram formas muito mais confiáveis de produção. Ou seja: Aprendemos e evoluímos muito em segurança e qualidade para que erros do passado não aconteçam mais

    Em suma, as vacinas…

    As vacinas usadas para a COVID-19, tanto em adultos, quanto as vacinas pediátricas são seguras, seguiram protocolos rígidos, aprimorados em dezenas de anos. Assim, não precisamos ter receio em relação à vacinação atual e teremos um mundo mais sadio e com menos adoecimentos, quanto mais pessoas estiverem vacinadas!

    Para Saber Mais:

    Neto Tavares Fernando. O início do fim da poliomielite: 60 anos do desenvolvimento da vacina. Rev Pan-Amaz Saude [Internet]. 2015.

    Organização Panamericana de Saúde. Poliomielite

    Paul JR. A history of poliomyelitis. New Haven: Yale University Press; 1971.

    Polio Global Erradication Iniciative

    Fiocruz. Salk versus Sabin: dois personagens e suas estratégias contra a pólio

    BBC News. ‘Incidente Cutter’: a tragédia nos EUA dos anos 1950 que resultou em vacinas mais seguras

    A autora

    Flávia Ferrari continua a série maravilhosamente bem iniciada pela Mellanie Fontes-Dutra, que falou sobre reações adversas das vacinas, contando um pouco de histórias de pesquisas em vacina, em especial de uma que todos tomaram: A pólio (ou a gotinha). Flávia é bióloga e atua como professora de ciências e autora de materiais didáticos, integra os grupos Observatório da COVID-19 Brasil e Todos Pelas Vacinas.

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Flávia é autora convidada do Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Reações Adversas e Vacinas: o que são e onde habitam?

    Texto escrito por Mellanie Fontes-Dutra

    Há muita informação e desinformação rolando por aí acerca do que é uma Reação Adversa ou eventos adversos e vacinas. Hoje resolvemos abrir a Caixa de Pandora com as informações confusas e falar sobre isto!

    O nome que usamos, técnico, é Evento Adverso Pós-Vacinação (EAPV) e significa qualquer ocorrência médica indesejada após a vacinação. Todavia, não necessariamente a EAPV possui uma relação causal com o uso de uma vacina ou outro imunobiológico (imunoglobulinas e soros heterólogos). Isto quer dizer que eventos que acontecem em nosso corpo não necessariamente são consequência da vacina.

    Vamos entender melhor?

    Existem reações mais frequentes, como a dor no local da injeção, febre e dores no corpo. Esses eventos frequentes são chamados assim porque são experienciados por muitas pessoas, com certa frequência. Mas temos os eventos raros e muito raros, que vamos defini-los abaixo:

    • Eventos adversos raros podem ser registrados de uma vez a cada 1.000-10.000 doses aplicadas.
    • Eventos muito raros podem ser registrados menos de uma vez a cada 10.000 doses aplicadas. Portanto, a ocorrência deles é muito, muito rara, e muitas vezes de difícil relação com a vacina.

    Existem razões para EAPVs acontecerem, por isso analisa-se tudo!

    A principal delas é em decorrência da falha na aplicação da vacina. Por ser a principal causa, em investigações, este deve tornar-se primeiramente descartado – portanto o primeiro analisado. É considerado um evento evitável, por isso a instrução é importante.

    Outro motivo de termos EAPVs são falhas no controle de qualidade/produção e até mesmo práticas inadequadas para a imunização. Por isso a Anvisa (aqui no Brasil) faz um controle imenso e super detalhado desses processos ao avaliar um imunizante. Quem quiser entender melhor sobre isso, pode assistir a Live que fizemos pelo Todos Pelas Vacinas e a Rede Análise, com Gustavo Mendes, que é gerente geral de medicamentos e produtos vivos da Anvisa.

    Aliás, também é por isso que todo o processo, desde as fases de segurança até a de efetividade, é examinado pela comunidade científica internacional. Além disso, todo evento torna-se alvo de analises minuciosas por órgãos fiscalizadores de cada país. Sempre que necessário – seja por que motivo for! – interrompe-se a produção e analisa-se a causa.

    Como reportar um EAPV?

    Há duas formas principais aqui no Brasil:

    Uma vez notificado, investiga-se o evento para saber se a vacina teve relação com o evento. Após a notificação, há uma sequência na avaliação. Inclusive, há uma troca internacional diária entre as farmacovigilâncias dos países. Isto tudo para alertar sobre o eventual aparecimento de um evento adverso mais grave ou inesperado.

    Todos os eventos esperados são computados e não precisam de investigação (pois são esperados). Os eventos esperados, como o próprio nome já diz, são esperados. Isto quer dizer que são comuns e não apresentam gravidade. Febre é um exemplo deles.

    Mas aqueles eventos inesperados são separados para uma maior e detalhada investigação. Assim, é super importante ressaltar a seriedade com que são estudados e analisados eventos adversos pós-vacinação. Não é uma análise banal ou trivial. Tampouco é algo que passa batido por instituições internacionais. Todo e qualquer evento reportado inicia uma análise e toma-se muito a sério cada uma das análises!

    O que é feito para os dados e análises?

    As equipes responsáveis por analisar EAPVs vão atrás de prontuários médicos, histórico de saúde das pessoas, dos familiares, novos exames e outras informações. O objetivo é entender se houve relação entre a aplicação da vacina e o aparecimento desse evento adverso de saúde.

    Por isso é de suma importância que só se estabeleça a relação se for comprovada. E aqui ressaltamos isso várias vezes exatamente para deixar clara a necessidade de tomarmos muito cuidado com desinformações propositais que nos causam receio (ou como temos chamado hesitação vacinal) ou qualquer veiculação de eventos, sem que tenham sido cumpridos os protocolos internacionais de análise. Infelizmente, vemos muitas situações até mesmo trágicas acontecerem. Mas podemos não ter evidências de que as vacinas foram as desencadeadoras. Além disso, podemos causar receio e hesitação acerca da vacinação, sem que faça sentido a relação entre eventos adversos e a vacina em si. 

    Com isso, sempre alertamos: antes de espalhar algum material que tu recebas, veja se existe algum dado científico atrelado a isto!

    Existe um fenômeno chamado associação temporal, que é quando dois eventos acontecem em tempos muito próximos. Mas podem não ter relação de causa e consequência estabelecida entre eles

    Querendo saber mais sobre isso, já escrevi um fio no Twitter sobre o tema! Olha aqui

    Caso identifiquem-se reações inesperadas graves, que se mostrem um risco à população em geral, a Anvisa pode interromper a autorização da vacina. Para isso, também se leva em conta se o eventual risco de um EAPV pode superar o benefício da vacina.

    E aqui já deixamos bem claro:

    NÃO HOUVE ISSO EM NENHUM MOMENTO NO BRASIL

    Até o dia 06 de Dezembro de 2021, nós tivemos 131.685 EAPVs. Neste mesmo período, tivemos 194 milhões de aplicações da vacina. Isto é, 0,07% das aplicações tiveram alguma notificação. Vamos lembrar que eventos raros acontecem uma vez entre 1.000 e 10.000 aplicações. Já Eventos muito raros acontecem uma vez entre 10.000 aplicações. Isto considerando um evento específico (e não qualquer evento aleatório).

    Estes dados indicam que tivemos 0,7 eventos a cada 1.000 aplicações.

    Além disso, e mais importante, não significa que a vacina é a causa. Significa que observamos os eventos observados depois da aplicação. Além disso, este dado é público e pode ser visto no Boletim Epidemiológico publicado pelo Ministério da Saúde.

    Contudo, parece-nos fundamental apontar ainda que a grande maioria (92%) dos eventos adversos são reações sem gravidade. Por exemplo: dores de cabeça, dores no local de aplicação, febre e tosse.

    Calma, ainda tem mais sobre EAPVs

    No Brasil tivemos 9.896 reações consideradas graves. Isto significa cerca de 5 eventos a cada 100 mil doses aplicadas. Dessa forma, é algo menor que 0,005%. E tudo isto, destrinchando apenas os eventos em si, sem analisar especificamente se a reação grave teve como causa a vacina! Em suma, ao fim das análises, na verdade, a maioria das reações nada tem a ver com a vacina (ver o link do Boletim Epidemiológico).

    Ainda não está convencido? 

    Existem mais dados a respeito da vacina, os EAPVs e o coronavírus. Todos eles têm apontado que os riscos da infecção viral mostram-se MUITO mais elevados do que os riscos causados pela vacina. Por exemplo, o risco de alguém que tenha sido internado por COVID-19 desenvolver trombose é 41.000x maior que o da vacina.

    Se estiver difícil de entender estes números, podemos explicar com fatores do dia-a-dia. Assim, é muitíssimo mais fácil ter trombose por tomar anticoncepcional (0,05%) ou fumar (0,18%) do que por tomar a vacina contra a COVID-19 (0,0001% – Janssen a 0,0004% – AstraZeneca). Colocando assim, fica claro que quaisquer riscos de EAPVs mais sérios não são nem próximos de serem superiores aos riscos que corremos no nosso cotidiano, e principalmente pensando na infecção pelo coronavírus (COVID-19).

    Segundo o boletim do Ministério da Saúde, o risco de pegar a COVID-19 e morrer é 56,6 vezes maior que o de ter algum efeito adverso após tomar a vacina (seja leve ou grave). Se olharmos estes números, parece bem estranho ter qualquer hesitação vacinal. Mais ainda causar algum debate enfatizando o cuidado tão exacerbado sobre tomar vacina – incentivando que não se tome a vacina como têm sido feito em nosso país!

    Mas e as crianças? E a Miocardite???

    Ah, sim. O tema do momento: e a miocardite em crianças? O risco de uma criança de 5-11 anos ter miocardite ao pegar COVID-19 é 40 vezes maior do que o risco de essa criança ter miocardite ao ser vacinada. Em suma: os riscos são muito maiores para quem não toma a vacina. 

    Portanto, tome sua vacina! Aliás, se estiver sentindo algum efeito, notifique nos links citados. Mas, ressaltando ainda, se tiver dúvidas, não deixe de enviar para nós! Tanto eu, Mellanie Fontes-Dutra, quanto os parceiros Todos Pelas Vacinas, Rede Análise, Observatório COVID-19 e nós, do Blogs Unicamp); estamos sempre disponíveis para ajudar. Vacine-se e se (nos) proteja! 

    Saiba Mais

    Documentos Oficiais:

    Manual de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinação

    Boletim Epidemiológico Nº 90 – Boletim COE Coronavírus

    Reportagens

    Mali, Thiago (2021) Poder Explica: reações adversas às vacinas contra a covid

    A autora

    Mellanie Fontes-Dutra é biomédica, doutora em neurociência e pesquisadora na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Divulgadora Científica na Rede Análise COVID-19. Autora convidada no Especial COVID-19 e parte do projeto Todos Pelas Vacinas.

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Mellanie é autora convidada do Especial COVID-19. 

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os produziram-se textos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, os textos passaram por revisão revisado por pares da mesma área técnica-científica na Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • COVID-19: faz sentido calcular um único Rt para o Brasil?

    Sempre que era noticiado no jornal que “O Imperial College de Londres recalculou a taxa R para o Brasil” eu me perguntava: mas isso faz sentido? E isso me incomodava porque parecia que cada canto do Brasil estava num momento diferente da pandemia. Moro em Belo Horizonte e, quando Manaus estava colapsando, por aqui estávamos em um momento mais tranquilo. Para mim não fazia sentido… Para responder a essa questão vamos analisar como ocorreu a disseminação da COVID-19 pelo nosso país e fazer uma reflexão sobre a taxa de transmissão do coronavírus no Brasil – o agora famoso R0 (ou seria Rt?). Vem com a gente pra entender isso aí!

    COMO A COVID-19 SE ESPALHOU PELO BRASIL?

    Marcia Castro é uma demógrafa brasileira, professora em Harvard, e publicou um artigo sobre a disseminação da COVID-19 no Brasil. Para a pesquisadora, ao falarmos em número total de casos e de mortes acabamos por esconder as grandes diferenças entre os estados

    Os gráficos abaixo, elaborados por pesquisadores da Fiocruz-MG, cobrem o período de abril a julho de 2020, conseguimos comparar a razão de transmissão (Rt) do vírus SARS-Cov-2 em diferentes cidades do Brasil.

    Vamos falar sobre essa a taxa daqui a pouco, mas aqui conseguimos observar como esse padrão é diferente entre cada um desses locais.
    Texto: número efetivo de reprodução (Re ou Rt) de acordo com a data de notificação, para 12 municípios brasileiros em 2020.
12 gráficos com o eixo vertical contendo valores de Rt (entre 0 e 3), e o eixo horizontal as datas entre 8 de abril e 17 de julho. Os gráficos representam as cidades de Belém, Curitiba, Manaus, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Porto Alegra, Salvador, Brasília, Goiânia, Recife e São Paulo. O objetivo não são os valores em si, apenas a diversidade do comportamento do Rt.

    O que poderia explicar essas diferenças no padrão de espalhamento da COVID-19? Para Marcia Castro, a falta de uma ação coordenada pelo governo federal, somada a problemas de notificação e a ações locais descoordenadas (como o fechamento de cidades), podem ter contribuído para isso. O que a professora observou em seu trabalho é que, ao longo do tempo, houve um processo de interiorização da doença. Esse processo se deu tanto nos estados quanto no país como um todo – e, também, é o esperado em uma situação de epidemia.

    Explico: A pandemia começa em São Paulo, uma capital com grande movimentação de pessoas que vêm de fora do país, mas também acaba sendo um polo de dispersão para outros estados. Assim a pandemia que chega numa metrópole como SP, inicia seu movimento da capital para o interior do próprio estado, mas também para os demais estados brasileiros. Da capital, a COVID-19 se espalha para as regiões metropolitanas e vai cada vez chegando mais ao interior. Com isso, o que se observa é que, ao longo do tempo, o número de casos e mortes caem nas capitais à medida que sobem no interior do país.

    E é isso que o gráfico abaixo mostra pra gente.
    Texto: Percentual de casos e mortes por covid nas capitais dos estados e demais municípios por semanas epidemiológicas.
Gráfico com eixo vertical contendo percentual de casos ou mortes e o eixo horizontal contendo as semanas epidemiológicas (9 a 41) de 2020. Observa-se a linha de casos e mortes nas capitais saindo de 100% e caindo gradualmente até se estabilizar por volta de 25%. A linha de casos e mortes no interior segue oposta, saindo de 0% e se estabilizando por volta de 75%. As linhas se cruzam por volta da semana epidemiológica 19.

    Observe que a inversão ocorreu a partir da semana epidemiológica 19 (entre os 03-09/05/20) e que, devido ao processo de interiorização, as cidades do interior tiveram mais tempo para se preparar para a chegada da pandemia do que as capitais – assim como, por exemplo, o Brasil teve mais tempo do que países Europeus.

     Vale ressaltar ainda, que essa não é a única forma de dispersão do vírus, ele não chega uma única vez e se espalha. A entrada do vírus numa população pode ocorrer em vários momentos. No Amazonas, por exemplo, a variante Gama do novo coronavírus circulou por um bom tempo no interior do estado e foi constantemente reintroduzida em Manaus. A capital do AM, por sua vez, foi responsável pelo movimento contrário.  

    R0: COMO A GENTE MEDE O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM A PANDEMIA? 

    Tendo entendido que a disseminação se deu de forma diferente entre cidades e estados, podemos falar no R0.

    número médio de pessoas que uma pessoa contaminada infecta é chamado de R0 (lemos R-zero) ou de razão básica de reprodução de um vírus. 

    De uma forma mais técnica, essa definição poderia ser “o número de casos que se espera que ocorra em média em uma população homogênea como resultado da infecção por um único indivíduo, quando a população é suscetível no início de uma epidemia, antes que a imunidade generalizada comece a se desenvolver e antes que qualquer tentativa de imunização tenha sido feita”. Um ponto central, importante de ser ressaltado aqui, é a necessidade de que haja contato entre as pessoas dessa população.

    Por exemplo, se uma pessoa contaminada transmite, em média, a infecção para outras 3 pessoas (e assim por diante), temos um R0 com valor de 3. 
    Texto: Em uma situação de R0=3, uma pessoa com o vírus contamina outras 3, que por sua vez transmitem, cada uma, para outras 3.
Esquema representando uma pessoa transmitindo para outras 3. E cada uma para novas 3. Num esquema 1 -> 3 -> 9.

Texto: Ebola, Gripe (2009). R0 = 1,7
Texto: Poliomielite, Difteria, Caxumba, Rubéola, Varíola. R0 = 7
Texto: Sarampo: R0=18; Coqueluxe: R0 = 18
Para cada um dos textos, um esquema mostrando uma pessoa transmitindo vírus para 2 ou 7 ou 18 pessoas.

    É importante conhecermos o R0 de diferentes infecções virais para estabelecermos as estratégias de combate à infecção. Na imagem acima, observamos os valores estimados de R0 para diferentes doenças causadas por vírus. Ah! Veja bem, quando falamos do R0, nos referimos ao potencial de disseminação do vírus; e isso não está diretamente ligado à letalidade ou à gravidade da doença causada! Estima-se que o SARS-CoV-2 tenha um R0 de aproximadamente 2,6. 

    E quais fatores influenciam nesse valor? 

    – O tamanho da população e o contato entre os indivíduos

    – Quantos indivíduos são susceptíveis à contaminação pelo vírus

    – Capacidade de infecção do microrganismo 

    – Tempo durante o qual um indivíduo permanece transmitindo a doença

    – Taxa de remoção da infecção (por cura ou morte de indivíduos infectados)

    É importante ressaltar que o valor calculado depende da acurácia dos dados e do modelo epidemiológico utilizados. Dados ruins ou modelos pouco acurados podem distorcer muito os resultados. Desde o início de dezembro (10/12/20), quando o Ministério da Saúde foi hackeado, estamos sofrendo com um apagão de dados que está influenciando análises e estimativas sobre a pandemia no Brasil. O Observatório COVID-19 BR, por exemplo, deixa avisado no site: “Devido ao apagão de dados do Ministério da Saúde, estamos impossibilitados de atualizar nossas estimativas. Esperamos que o Ministério da Saúde reestabeleça os sistemas de informações afetados e assim possa manter a divulgação e transparência de dados em Saúde no país.

    Devemos sempre nos lembrar que: modelos não são exatos, eles são estimativas que nos orientam e devemos ter cuidado para que eles não sejam grosseiramente errados.

    MAS E O TAL Rt? NÃO É A MESMA COISA? 

    O número zero em R0 significa que o valor é calculado considerando que há imunidade zero na população – o que foi o caso do SARS-Cov-2 no início da pandemia. Mas esse valor não é adequado, quando queremos analisar a taxa de disseminação do vírus ao longo do tempo. 

    Apesar de parecido, para esses casos utilizamos o Rt ou Re (número efetivo de reprodução; R0 no tempo; velocidade de contágio no tempo), que varia ao longo do tempo e depende dos valores do momento em que foi medido, sendo, também, impactado pelo aumento da imunidade após infecção ou vacinação, bem como pelo comportamento das pessoas (distanciamento social, uso de máscaras, por exemplo).

    Assim, a variação do Rt ao longo do tempo nos ajuda a tomar decisões sobre políticas públicas durante a pandemia em curso. Isso acontece porque se o Rt é maior do que 1 (Rt>1) isso indica que a pandemia está em expansão; e se o Rt é menor do que 1 (Rt<1), a pandemia está em um momento de regressão, ou seja, a quantidade de pessoas contaminadas está diminuindo, podendo levar ao controle da doença.

    COMPARANDO OS VALORES DO Rt DE MANAUS E BELO HORIZONTE 

    Tendo estabelecido as definições dos conceitos, procurei duas cidades que imaginei terem um perfil diferente de transmissão do SARS-Cov-2. Escolhi Belo Horizonte (MG) por ser onde moro e Manaus (AM) devido ao colapso que aconteceu na cidade no final de 2020/início de 2021; além do fato de as duas cidades ficarem muito distantes entre si, havendo um baixo fluxo entre os seus habitantes. Lembrando que o objetivo aqui não é analisar as causas da melhora ou piora de indicadores.Aqui vemos os gráficos com valores de Rt das duas cidades de março de 2020 a dezembro de 2021, destacando no quadro em amarelo o período entre novembro de 2020 e janeiro de 2021. Apesar de a escala do gráfico não ser a mesma e dificultar a comparação, conseguimos observar que as curvas mostram comportamentos diferentes da pandemia nas duas cidades.

    Texto: Número reprodutivo efetivo (Rt ou Re) para covid-19 nas cidades de Belo Horizonte e Manaus.
São dois gráficos cada um para uma das cidades englobam o período de março/2020 a dezembro/2021. Novamente o objetivo não são os valores, mas o perfil do gráfico. Em Manaus o gráfico começa num Rt maior do que dois, caindo para abaixo de 0, e então apresenta picos nos meses de agosto, setembro, dezembro/20 e outubro e novembro/21. Em Belo Horizonte, o gráfico inicia com Rt próximo a 1, caindo para apresentar 3 picos de Rt aproximadamente igual 1,2 (abril a junho/20; novembro-dezembro/20 e fevereiro/21)
    Vamos agora, colocar os gráficos sobrepostos (mas apenas o recorte do período em destaque). Observe que enquanto a cidade de Belo Horizonte (azul) apresenta uma queda quase contínua dos valores de Rt, em Manaus observamos uma curva que aumenta antes de diminuir.
    Texto: Número reprodutivo efetivo (Re ou Rt) para covid-19 nas cidades de Belo Horizonte (MG) e Manaus (AM), entre os dias 01 de novembro de 2020 e 31 de janeiro de 2021.
Gráfico único plotado com os valores de Rt das duas cidades. Observa-se que Belo Horizonte tem uma queda gradual do Rt de 1,2 a 0,83. Já em Manaus, os valores flutuam em torno de 1 no mês de novembro para, então, a partir de 29/11 aumentarem. O Rt sai de 0,98 e atinge 1,38 em 20/dez. O valor permanece próximo até o dia 10 de janeiro/21, quando, então, cai rapidamente atingindo 0,84 no final do mês.

    E ENFIM, FAZ SENTIDO CALCULAR UM Rt ÚNICO PARA O BRASIL?

    Conseguimos ver que em cidades diferentes a propagação da pandemia se dá de formas também diferentes. Com isso entendemos que quanto mais ampliamos o foco da análise, mais estamos agrupando cidades com comportamentos distintos nos valores de Rt. Assim, análises de cidades são mais precisas que análises que comparam estados; e quando consideramos um país grande como o Brasil vemos valores que não retratam os detalhes e as divergências.

    Quando comentei no Twitter sobre este tema, recebi o contato do Rafael Lopes – que faz doutorado em física, é pesquisador na área de dinâmica epidemiológica e, também, membro do Observatório COVID-19 BR.

    Lopes ressalta que “calcular valores de Rt para um país grande como o Brasil é errado por definição, uma vez que o Rt é uma razão entre os casos de hoje e os casos anteriores numa dada comunidade, supondo-se, assim, que todos os indivíduos da comunidade estão em contato uns com os outros. Pessoas em Manaus não estão em contato com pessoas de Porto Alegre, por exemplo. Logo, calcular um R único para o Brasil coloca essa suposição [pessoas de diferentes cidades em contato] como verdadeira, mas ela é claramente falsa”.

    Como vemos abaixo, o Rt da COVID-19 no Brasil vem sendo calculado ao longo de toda a pandemia pelo Imperial College de Londres. Mas por qual motivo isso vem sendo feito? 
    Texto: Variação da estimativa do número efetivo de reprodução (Re ou Rt) da covid-19 ao longo do tempo no Brasil. 
Novamente o objetivo não são os valores, mas o perfil do gráfico que cobre todo o período da pandemia, destacando-se o período de 01/11/20 a 31/01/21. São dois picos nos meses de fevereiro e março/20, com Rt próximo a 4. Em seguida há uma queda entre março e maio com Rt próximo a 1,5. Os valores permanecem próximos a 1 quase todo o período, com um pico quase atingindo 1,5 em novembro/21. No período em destaque observa-se uma estabilidade do valor em torno de 1,3 com uma leve queda por quase todo o período, não se assemelhando com os gráficos de Manaus, que tem uma queda anterior, nem com Belo Horizonte que apresenta uma queda contínua no período.

    Calcular o Rt agregado pode útil pois nos permite fazer uma análise geral da situação do país e uma comparação a nível global. Mas essa abordagem, apesar de funcionar bem para países pequenos (como os da Europa, por exemplo) é, também, criticada para países grandes (como o Brasil e os Estados Unidos) pelos motivos que já levantamos no texto.

    Por fim, é importante lembrar que ao fazermos isso acabamos perdendo detalhes da pandemia e, portanto, esse valor não deve ser utilizado como única base para políticas públicas nacionais. Para essas situações, porém, devem ser consideradas as especificidades locais antes de tudo!

    REFERÊNCIAS

    Esse post foi escrito originalmente no blog Meio de Cultura

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Campanha #VouVacinar

    A campanha #VouVacinar, do Movimento Todos Pelas Vacinas, tem como proposta o combate à desinformação sobre a COVID-19 e os efeitos e riscos da vacina infantil, a partir da divulgação científica, articulada com a cultura, a arte e a sociedade! Contamos com seu apoio, colaboração e participação na campanha #VouVacinar, que acontecerá ao longo de Janeiro de 2022.

    O movimento #TodosPelasVacinas é organizado pela ABRASCO, Blogs de Ciência da Unicamp, COSEMS/SP, Equipe Halo/Nações Unidas (ONU), Núcleo de Pesquisas em Vacinas da USP (NPV-USP), Observatório COVID-19 BR, Rede Análise COVID-19, Núcleo de Pesquisas em Vacinas da USP, ScienceVlogs Brasil e a União Pró-Vacina.

    E lá vamos nós falar de vacinas!

    Sim! Cá estamos novamente para falar de vacinas contra Covid-19, dessa vez para crianças de 5 a 11 anos!

    No Brasil e em vários países do mundo tivemos uma diminuição drástica de óbitos desde que o esquema vacinal completo foi sendo alcançado por uma grande parcela da população. Sabemos que ainda são necessários cuidados, mesmo vacinados, mas nossa vida definitivamente tem o mesmo pesar do primeiro semestre de 2021.

    Agora é chegado o momento de as crianças adquirirem a imunização, através da vacina! Sabemos que a vacinação sempre foi, historicamente, exemplar em nosso país, com a erradicação da Poliomielite (desde 1989) e da Varíola (desde 1977!!!). Sabemos também que a vacinação é um projeto coletivo de proteção.

    As vacinas destinadas às crianças não são experimentais, elas já passaram pela etapa de análise e são seguras e eficazes para esta faixa etária indicada. Além disso, são fundamentais para o enfrentamento da COVID-19, para o retorno mais seguro das aulas e do convívio social, tão esperado por todas as crianças, que sofreram tanto com os distanciamentos impostos ao longo de 2020 e 2021.

    O tempo de vacinar, agora, é com a leveza que só a infância é capaz de nos proporcionar. A esperança renovada para as crianças, com ciência, conhecimento e políticas públicas de saúde que, historicamente, nosso país tem tradição mundial, tem sua vez na luta contra a COVID-19.

    Nossos materiais estão disponíveis (e serão atualizados com a nova campanha) no Portal: www.todospelasvacinas.info, também vamos lançar textos aqui e vocês podem nesse link aqui

    Mais informações podem ser obtidas nos contatos:

    Ana Arnt (Blogs Unicamp): blogs@unicamp.br; (19) 98364-0054

    Flávia Ferrari (Observatório COVID-19 BR): obscovid19br@gmail.com; (11) 99111-6455

    Todos Pelas Vacinas: todospelasvacinas@gmail.com

  • Passaporte Nacional de Imunização e Segurança Sanitária – Faz sentido isso? – Updated

    Texto escrito por Marina Fontolan e Ana de Medeiros Arnt

    Há alguns meses, fizemos um texto comentando o Projeto de Lei 1674/2021 que trata do Passaporte Nacional de Imunização e Segurança Sanitária (PSS). No entanto, com o avanço da vacinação no Brasil e no mundo, precisamos revisitar essa questão. Aqui, argumentamos ser indispensável a exigência do passaporte vacinal, não apenas nas fronteiras do país, mas mesmo internamente.

    Antes de argumentarmos sobre isso, vamos retomar alguns dos principais pontos que discutimos no texto passado:

    A vacinação não é compulsória;

     Sim! É verdade. A vacinação não é compulsória e defendemos isto! A vacinação, mesmo sendo obrigatória, não é compreendida como sendo uma ação que o Estado brasileiro pode efetuar de forma coercitiva. Existe diferença substancial entre estas duas noções. A vacinação, por ser obrigatória, pode se vincular a atos restritivos a serviços públicos quando não tomarmos. Por exemplo, pode-se restringir nosso acesso a concursos ou serviços públicos específicos, por meio de lei, impossibilidade de matrícula em escolas e universidades, entre outros serviços.

    Podemos seguir sem tomar as vacinas que decidimos não tomar. Todavia, aquelas que são consideradas obrigatórias, podem ter medidas de restrição para acesso de serviços fornecidos pelo nosso país. Essa lógica vale para qualquer outro tipo de decisão que tomamos. Por exemplo: não podemos dirigir sem nossa CNH, mas há pessoas que o fazem e que podem ser punidas por isso se forem pegas. Por exemplo: o voto é obrigatório. Se não votarmos e não justificamos, temos uma pendência com o governo, alguns serviços também ficam suspensos até que paguemos a multa. Não somos PRESOS por isso, mas temos uma restrição legal para acessar espaços e serviços.

    Não deveria ter discriminação de espaços por ações individuais e opções relacionadas ao nosso corpo;

    Este é um ponto interessante e repleto de vieses. Não existe discriminação no sentido de preconceitos contra a pessoa que não quer se vacinar. Mas existe, no pressuposto da lei, a intenção de que pessoas vacinadas ou imunizadas estão seguras e, portanto, podem circular sem prejudicar outras ao seu redor.

    Nestes casos, a idealização da lei poderia ser entendida pelo bem coletivo, mais do que pela criminalização do que se faz com o corpo individual e as decisões acerca disso… O que nos leva para o próximo item. 

    O estado não deveria controlar nossos corpos;

    A princípio não. Mas esta fala é perniciosa em tantos sentidos, não é mesmo? A liberdade sobre os nossos próprios corpos é um debate absolutamente profundo e necessário. Que não se restringe à vacinação. Ela diz respeito a termos o direito de assumirmos quem nós somos – diz respeito à nossa identidade como cidadão de uma sociedade, de uma nação. Assim, o direito ao nosso próprio corpo é parte da minha condição humana e de minha vivência neste país.

    Eventualmente esta liberdade é cerceada quando eu coloco em risco a vida e a segurança dos outros. De qualquer modo, a noção de risco à sociedade é mais vago e difícil de delimitar do que pode parecer.

    Existem várias pessoas que vêm lutando pelo direito de ser quem são, juridicamente, em nosso país há décadas. Direito de ir e vir, casar com quem quiserem, beijar, transar, ter filhos com quem quiserem, quando (e se) quiserem.

    O Estado, ao tornar a vacina obrigatória, não controla o teu corpo – ele te dá a opção de usar diversos serviços públicos ou te restringir acesso a eles.

    Ninguém tem qualquer direito de agir coercitivamente em relação ao teu corpo, vacinando-te. Tens razão, o estado não deveria controlar nossos corpos. Mas não é em processos de vacinação que isto acontece, mesmo quando isto é obrigatório.

    A segurança sanitária coletiva está acima da individual;

    Sim! A segurança sanitária diz respeito à coletividade. A vacina, individualmente, não faz sentido. Se você está vacinado sozinho, não existe qualquer vantagem em relação ao controle da doença e sua circulação. A vacina é um projeto público de controle de doenças em nossa sociedade. E é por isso que, idealmente, ela é obrigatória. Pois visa à saúde da humanidade, acima de indivíduos isolados.

    É fundamental um indivíduo se vacinar, junto com os milhões que vivem próximo a ele. A vacinação, mais do que nos proteger isoladamente, faz com que os vírus não circulem. Neste sentido, quem não pode vacinar por alguma questão de saúde particular, também está protegida! E a vacinação de algumas doenças – talvez a COVID-19 se encaixe aí (ainda precisamos de alguns dados sobre isso) – precisam ser periódicas. Como a gripe, por exemplo.

    • Existe controle de doenças altamente infecciosas com documentos “teste de detecção negativo” com teste de validade

    Por que um passaporte vacinal faz sentido então?

    Há vários pontos que temos que considerar sobre o assunto. O primeiro deles é que a vacinação está avançando muito em muitos países do mundo, ainda que de forma muito desigual. O acesso à vacinação, pelo menos dentro do Brasil, está muito mais facilitado na atualidade e não tomar vacina – na maioria dos casos – está mais ligada à falta de vontade da população de tomá-las do que à falta de acesso. 

    Também é importante notar que o pouco acesso às vacinas fez com que uma nova variante surgisse, a Ômicron. Assim, se quisermos realmente voltar às nossas atividades normais, precisamos exigir a vacinação para que possamos nos proteger contra a Covid e controlar melhor o surgimento de novas variantes.

    Por fim, temos que lembrar sempre que o Brasil continua não fazendo testagem em massa da população. Seguimos ocupando um lugar irrisório no hanking mundial em relação à testagem por milhão de habitantes. Ainda que os números de internações estejam diminuindo no país, não temos como saber com exatidão como a pandemia está no país e, por isso, não temos como ter certeza quando poderemos ter um abrandamento de medidas restritivas. Exigir o passaporte vacinal, assim, vai ajudar o país no controle da pandemia já que sabemos que as vacinas dificultam que o vírus se espalhe com a mesma facilidade de antes. No entanto, é importante notar que o passaporte vacinal não deve substituir testagem em massa, essa sim a forma mais correta de levantar dados para estudar abrandamento das medidas restritivas.

    Lembrem-se: já existe passaporte para outras doenças, quando viajamos para o exterior!

    Outro ponto importante desta questão está relacionado à entrada em outros países. Não é de hoje que alguns países exigem que as pessoas estejam vacinadas para determinadas enfermidades. Um exemplo disso é o México, um país que exige que as pessoas que entrem em seu território estejam vacinadas contra febre-amarela. No entanto, é importante notar que, mesmo estando vacinados, há países que continuam não aceitando a entrada de pessoas de determinadas nacionalidades ou que tenham certos países de origem. Este é o caso dos brasileiros já totalmente vacinados contra a Covid-19. Afinal, os países temem a circulação de variantes e a morosa vacinação no Brasil está sendo fator decisivo nisso. Assim, mesmo que o governo brasileiro crie seu próprio ‘passaporte vacinal’, ele pode não ser aceito em outros países.

    Por outro lado, o passaporte entre países com as doenças sob controle – ou no caso de inexistência da doença há muitos anos (mas ainda existência de hospedeiros intermediários, como no caso da febre amarela) o passaporte adquire outro sentido: a da tentativa de manter a doença erradicada naquela localidade. Um passaporte contra a febre amarela entre fronteiras de países (como Brasil e México) faz mais sentido do que um passaporte interno entre localidades de uma cidade, no caso da COVID-19. Estamos habitando os mesmos espaços e circulamos em espaços conjuntos, antes de adentrar um território cujo acesso seja restrito. Enquanto não controlarmos a circulação do vírus com medidas não farmacológicas, além da vacina em conjunto, e mantivermos a transmissão alta na população, este passaporte tem pouca efetividade na prática.

    Finalizando

    Considerando o avanço da vacinação no país e no mundo, consideramos que o uso do passaporte vacinal é essencial. É ele que garante que a pessoa realmente tomou a vacina e, por isso, não transmite o coronavírus com a mesma facilidade que uma pessoa não vacinada. Além disso, é esse documento que vai proteger nossa população na circulação de novas variantes, como o caso da Ômicron. Por fim, é esse documento que vai proteger a população contra o negacionismo científico e contra os antivax.

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19, em 21/06/2021 e atualizado nesta versão em Dezembro de 2021.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • [CARTA ABERTA] CONSULTA PÚBLICA SECOVID/MS Nº 1, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2021

    CONSULTA PÚBLICA SECOVID/MS Nº 1, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2021

    Ref.: 25000.184618/2021-87, 0024471968

    Exmo. Sr. Ministro da Saúde,

    Viemos, respeitosamente, por meio deste documento ressaltar não apenas a importância, mas a necessidade crítica de iniciar com urgência, no Brasil, a vacinação de crianças entre 05 e 11 anos de idade, com a vacina Comirnaty, produzida pela Pfizer e BioNTech o mais rápido possível. 

    Neste documento, apresentamos não só evidências apontando a segurança e eficácia da vacina Comirnaty para este público, mas também dados epidemiológicos que embasam a necessidade de iniciar essa campanha de vacinação o mais rápido possível. Afirmamos que não há controvérsias/dissenso na comunidade científica sobre a segurança e a eficácia desta vacina para a faixa etária estipulada. Tampouco existem divergências sobre a importância de iniciar imediatamente a oferta de imunizantes às crianças de 5 a 11 anos.

    Expressamos também nossa contrariedade em conduzir a avaliação desta iniciativa por meio de consulta pública, uma vez que tanto a agência regulatória ANVISA quanto a câmara técnica de assessoramento em Imunização da Covid-19 (CTAI-COVID), além de diversos outros órgãos científicos, já emitiram parecer amplamente favorável. Reiteramos nosso apoio e confiança nessas instituições, que são constituídas para avaliação técnico-científica do tema a partir de profissionais técnicos competentes que exercem a função. Em contexto de crise sanitária mundial, temas como este devem ser avaliados pelo Ministério da Saúde mediante consulta restrita às autoridades e sociedades técnico-científicas que possuem capacidade para tal, critério já garantido nas instâncias citadas.

        Entendemos ainda que a escolha por encaminhar uma consulta pública, após aval da ANVISA e do CTAI-COVID, (ação sem precedentes na história do Programa Nacional de Imunizações (PNI/MS)), abre caminho para o aumento da hesitação vacinal na população e para o fortalecimento do movimento antivacina no país. Inclusive o próprio PNI, recentemente, externou preocupação com essa situação quando  realizou ação neste sentido, um encontro com diversos especialistas em imunização e hesitação vacinal. A Organização Mundial de Saúde (OMS) listou, em 2020, a hesitação vacinal como uma das dez ameaças globais à saúde pública. Sendo assim, o questionamento das decisões cientificamente embasadas das agências competentes, externado através da consulta pública instaurada pelo Ministério da Saúde brasileiro, boicota o árduo trabalho de construção da cultura vacinal em nosso país, realizado pelo PNI/MS, que é historicamente exemplar no mundo inteiro. Tais ações colocam em risco o calendário vacinal, tão relevante para a saúde preventiva no país.

    Ressaltamos que estamos vivendo  um tempo de incertezas e medo, em uma pandemia ainda em curso. Medo da própria doença, suas complicações e sequelas. Medo de perder quem se ama. Medo de variantes vindouras e de novas restrições que mudem ainda mais  nossa realidade diária. Nossa maior preocupação é saber que o sentimento de medo é um solo fértil para que cresçam a insegurança e a desinformação. Em uma era de amplo acesso a informações, muitas vezes sem filtro de qualidade ou veracidade das mesmas, conteúdos de todas as partes do mundo podem chegar a milhões de pessoas em poucos minutos. Notícias sem embasamento científico, sem crivo de especialistas ou sociedades científicas, vindas de todas as partes do mundo, contribuem para o aumento  da hesitação.

    SOBRE OS DADOS EPIDEMIOLÓGICOS

        Segundo estudos realizados pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), quase metade das crianças e adolescentes brasileiros mortos por Covid-19 em 2020 tinham até 2 anos de idade; um terço dos óbitos até 18 anos ocorreu entre os menores de 1 ano e 9% entre bebês com menos de 28 dias de vida. Os dados analisados foram obtidos da plataforma Sistema de Informação sobre Mortalidade Infantil (SIM), do Ministério da Saúde (MS). As taxas de mortalidade por COVID-19 em crianças e adolescentes no Brasil (2.453/58 milhões entre 2020 e 2021) são substancialmente mais altas do que em países como os Estados Unidos da América (800/79 milhões) e Reino Unido (68/15 milhões), conforme apresentado recentemente.

        Observando os dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), no ano de 2020, 10.356 crianças entre 0 e 11 anos foram notificadas com diagnóstico de  Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) por Covid-19, das quais 722 evoluíram  para  óbito. Em 2021, as notificações se elevaram para 12.921 ocorrências na mesma população, com 727 mortes, totalizando 23.277 casos de SRAG por Covid-19 e 1.449 mortes desde o início da pandemia. Ainda, dentre  esses casos, 2.978 ocorreram em  crianças de 5 a 11 anos, com 156 mortes, em 2020. E em 2021, já foram registrados 3.185 casos nessa faixa etária, com 145  mortes, totalizando 6.163 casos e 301 mortes desde o início da epidemia. Os dados são da plataforma SIVEP-Gripe.

    O CONASS destaca que, no Brasil, a experiência com os casos de Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P), que pode ser desencadeada pela infecção por SARS-CoV-2, mostrou que 64% das crianças/adolescentes acometidos tinham entre 1 e 9 anos de idade (mediana: 5 anos). Entre as crianças hospitalizadas, a necessidade de internação em UTI ocorreu em 44,5% dos casos e a letalidade foi de 6% (cerca de 5 vezes superior à relatada nos Estados Unidos) (RELVAS-BRANDT  et  al.,  2021). O número de mortes por Covid-19 em crianças supera o total de mortes por doenças para as quais temos vacinas disponíveis, que somaram 955 vítimas entre 2006 e 2020 no país, de acordo com o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. 

        Em recente manifestação, as Sociedades Brasileiras de Imunizações (SBIm), Pediatria (SBP), Imunologia (SBI) e Infectologia (SBI), além de instituições como a Academia Nacional de Medicina (ANM), Academia Brasileira de Ciências (ABC) e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) tornaram público o apoio à  vacinação de crianças de 05 a 11 anos no Brasil, destacando a relevância da carga da doença nesta população, as milhares de hospitalizações e centenas de mortes pela Covid-19, além de outras consequências da infecção nesta faixa etária, como a Covid longa.

        Dados publicados demonstram que crianças têm risco de desenvolver  quadro clínico grave de Covid-19, mesmo as que não apresentam  comorbidade, imunocomprometimento ou que fazem uso de imunossupressores por longo prazo. Até julho de 2021, 16.000 crianças nos Estados Unidos da América foram hospitalizadas e mais de 300 morreram. Ainda, as crianças infectadas pelo SARS-CoV-2 também correm o risco de desenvolver uma doença rara, chamada Síndrome Inflamatória Multissistêmica, que envolve a inflamação de várias partes do corpo. Cerca de 4.100 casos de SIM-P foram registrados apenas nos EUA. Considerando os dados disponíveis na literatura sobre Covid longa, estima-se que mais da metade das pessoas diagnosticadas para Covid-19 possam experienciar algum sintoma da Covid longa, a curto e  longo prazo.

    Na emergência de variantes com maior transmissibilidade, como a Ômicron (B.1.1.529), os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Doenças Transmissíveis da África do Sul indicam um aumento de hospitalizações em menores de 19 anos. O pico de crescimento é mais acentuado na faixa etária de crianças menores de um ano, conforme o gráfico abaixo, apontando uma tendência de crescimento para as próximas semanas: 

    Dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (Centers for Disease Control and Prevention – CDC) dos EUA também mostram um aumento considerável de hospitalizações por Covid-19 em crianças após julho de 2021, consistente com um aumento de mobilidade populacional, em um cenário no qual as crianças, por não estarem vacinadas, estão mais expostas aos riscos atrelados a doença:

    O CDC também indica que há uma sobreposição entre a SIM-P e os casos de Covid-19, trazendo preocupação para um potencial aumento após as festividades de fim de ano no Brasil, período conhecido pelo aumento de mobilidade e diminuição de adesão ao distanciamento social.

    SOBRE A VACINAÇÃO EM CRIANÇAS

        Segundo dados analisados e apresentados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) no dia 16 de dezembro de 2021, a vacina ComirnatyⓇ, desenvolvida pelas farmacêuticas Pfizer Inc. e BioNTech SE, tem uma apresentação diferenciada em relação à vacina aplicada nos indivíduos acima de 16 anos: a vacina apresenta uma concentração reduzida de ácido ribonucleico (RNA) mensageiro, além do volume de aplicação também ser reduzido e o veículo ser diferente. Esta vacina indicada ao público alvo de 05 a 11 anos não se mostrou inferior, quanto a sua imunogenicidade (isto é, a indução de anticorpos neutralizantes após a vacinação), quando comparada com a vacina utilizada no público de 16 a 25 anos. Esta imunogenicidade se manteve elevada, mesmo considerando variantes de preocupação, como a variante Delta. 

    Os dados também estão disponíveis na publicação online na revista New England Journal of Medicine (NEJM), que apresenta dados de elevada eficácia (90,7%) em casos de Covid-19 com início de sete dias ou mais após a segunda dose, relatada em três crianças vacinadas e em 16 crianças do grupo placebo. Quanto ao perfil de segurança da vacina, nenhum caso grave foi relatado no público entre 05 e 11 anos, sendo a dor no local da injeção (leve a moderada) o efeito adverso mais frequentemente relatado, com resolução completa em poucos dias.  

    Segundo os dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, até o dia 16 de dezembro de 2021, foram reportados oito casos de miocardite  num total de mais de 7 milhões de crianças de 05 a 11 anos que receberam o imunizante acima referido (cerca de 0,00011%). Segundo o CDC, todos os anos, registram-se um a três casos de miocardite por cada 100.000 crianças e adolescentes sem relação com a Covid-19 (cerca de 0,003%). No entanto, a Covid-19 aumenta em cerca de 36 vezes o risco de miocardite para indivíduos menores de 16 anos. Um estudo recente aponta que entre 255 pacientes que desenvolveram SIM-P após a infecção pelo vírus da Covid-19, 75% tiveram miocardite. Mesmo considerando os relatos após a vacinação, segundo os dados apresentados pela ANVISA em reunião, o maior risco observado para miocardite após a vacinação não excedeu 0,07% (em meninos na faixa dos 16 a 17 anos). Portanto, este consenso em um número majoritário de estudos permite concluir que, quaisquer riscos de eventos adversos graves, com possibilidade de relação com a vacinação a ser confirmada, são significativamente inferiores aos benefícios promovidos pela própria vacinação. Isto é, a vacinação é segura, com baixíssimos riscos de eventos adversos e a melhor medida de combate à doença que temos neste momento.

    Segundo dados públicos das investigações conduzidas em Israel, os casos de miocardite relatados após a vacinação (cerca de 2,3 a cada 100.000 indivíduos – 0,0023%) em indivíduos maiores de 16 anos tiveram evolução benigna, sendo a grande maioria de intensidade leve a moderada. Não houve mortes relacionadas aos eventos de miocardite. 

    Em epidemias, as medidas de controle incluem a vacinação e o alcance da cobertura vacinal adequada, de acordo com o curso das doenças. Ainda, quando doenças podem ser prevenidas pela vacinação, esta é a principal medida de saúde coletiva para a proteção da população. Historicamente, a vacinação de populações tem sido um fator fundamental para o controle das epidemias. No caso da Covid-19, a vacinação é uma estratégia importante para a faixa etária de 05 a 11 anos, conforme os dados aqui mencionados apontam, visto que apesar de vacinas não serem produtos farmacológicos isentos de efeitos adversos, os riscos da infecção por SARS-CoV-2 superam amplamente os riscos de efeitos adversos. Dessa forma, pelos benefícios da vacinação das crianças de 05 a 11 anos serem evidentemente superiores aos riscos de efeitos adversos, conforme os dados demonstram, é necessário e urgente o início da vacinação também deste grupo etário.

    Por fim, considerando que a vacinação em massa diminui o número de internações hospitalares, incluindo ocupação de leitos em UTI, e diminui significativamente a transmissão do vírus, a campanha infantil vem de encontro à consolidação da tão esperada cobertura vacinal. A campanha de vacinação infantil terá impacto direto na diminuição de óbitos de crianças, sequelas advindas da doença e, além disso, impactos econômico e social positivos/relevantes ao diminuir o uso de leitos hospitalares e a transmissão do vírus no retorno às atividades escolares e encontros sociais.   

    CONCLUSÕES

        Considerando os dados acima citados, bem como as análises realizadas por agências reguladoras internacionais e do Brasil, as quais já emitiram a aprovação para o uso do imunizante desenvolvido pela Pfizer Inc. e BioNTech SE para o público de 05 a 11 anos;

        Considerando a alta carga viral que a Covid-19 pode oferecer a crianças de 05 a 11 anos, as consequências da infecção como a SIM-P, o risco de hospitalização e óbito, além do risco de manifestações pós-infecção aguda na Covid Longa;

        Considerando as análises e cartas em prol da vacinação da faixa etária de 05 a 11 anos, de sociedades brasileiras, como a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), entre outras sociedades de grande relevância;

        Considerando a emergência de uma variante com potencial de maior transmissibilidade, somado aos dados epidemiológicos da África do Sul e de outros países, os quais estão enfrentando a aceleração de casos decorrentes da variante Ômicron (B.1.1.529);

               Considerando a tendência de aumento de carga da doença nessa população não-vacinada com a nova variante Ômicron  (B.1.1.529), aumentando ainda mais as hospitalizações e os óbitos entre crianças;

        Considerando o retorno completo das aulas presenciais em 2022, fato que pode ampliar a transmissão da doença entre esse grupo de 05 a 11 anos;

        Considerando as hospitalizações analisadas e apresentadas nas semanas epidemiológicas apontadas e o fato de os números de óbitos já superarem valores observados para outras doenças preveníveis por vacinas, no período de 2006 a 2020;

        Considerando que os benefícios da vacinação superam os riscos de quaisquer eventos adversos graves raros que possam ser observados após a vacinação;

        Considerando o extenso monitoramento que será realizado durante a campanha de vacinação para crianças de 05 a 11 anos, como já afirmado pela ANVISA e como parte da farmacovigilância do país;

        Ressaltamos a necessidade crítica e a importância de iniciar, com urgência, a campanha de vacinação para crianças de 05 a 11 anos no Brasil com o imunizante ComirnatyⓇ, conforme estabelecido pelo parecer e análise da agência reguladora brasileira – a ANVISA – com toda a exigência de monitoramento e compartilhamento de dados colocada pela agência à farmacêutica.

    ASSINATURAS

    As assinaturas estão sendo atualizadas no site:

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    O Documento foi originalmente publicado e elaborado por pessoas do movimento Todos Pelas Vacinas, com assinatura de colegas que apoiam a carta aberta. A publicação foi feita com anuência do movimento.

    Se você quer colaborar com esta carta, você pode compartilhar este documento – ou o site original do Todos – e, também, na rede social Twitter do Todos Pelas Vacinas

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

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