Categoria: ESPECIAL COVID-19

  • Cenários Pós-Pandemia

    O novo Coronavírus (SARS-CoV-2) relacionado à Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) está causando uma pandemia que já ultrapassou 3 milhões de infectados e 200 mil mortos. Durante essa primeira onda de pandemia, muitos países estão enfrentando problemas relacionados à falha da capacidade dos seus sistemas de saúde. Por causa disso, vários países adotaram medidas de distanciamento social, quarentena e rastreio de infectados, enquanto tentam desenvolver vacinas e medicamentos.

    Alguns países como a China, Coreia do Sul e Dinamarca, tem aliviado aos poucos tais medidas após conseguir níveis adequados do controle da transmissão e o número de mortes ter começado a diminuir. Contudo, para acabar com a possibilidade de ressurgir infecções, períodos prolongados ou esporádicos de distanciamento social ainda são necessários.

    Após a primeira onda de pandemia, o SARS-CoV-2 pode apresentar dois panoramas.

    O primeiro, o vírus ser erradicado assim como sua parente, a SARS-CoV-1 (o vírus do surto de 2003), com medidas de saúde pública intensivas. Ou pode – assim como a vírus Influenza e outros coronavírus (os chamados HCoV – Coronavírus de Humanos) – recircular pela população de forma sazonal, causando surtos durante o outono e inverno nas zonas temperadas. Se conseguirmos saber em qual desses cenários se encaixa esse novo vírus, será possível propor medidas públicas de saúde para combater futuras crises referentes a ele.

    Como é o cenário atual de outros coronavírus?

    O SARS-CoV-2 faz parte da família Coronaviridae e do gênero betacoronavírus, que inclui outros parentes dele como: o SARS-CoV-1, o MERS-CoV (responsável pelo surto no oriente médio em 2012), e dois outros coronavírus de humanos, o HCoV-OC43 e HCoV-HKU1.

    O SARS-CoV-1 e MERS-CoV são vírus mais perigosos, causando doenças severas com uma taxa de mortalidade de 9 e 36% respectivamente. Contudo, sua transmissão é bem mais difícil de acontecer do que a do vírus causando a atual pandemia.

    Quanto aos HCoVs, as infecções causadas por eles são um tanto quanto mais leves, sendo que tais vírus são os segundos mais comuns em causar o resfriado. Os surtos de HCoVs acontecem geralmente no inverno nas zonas temperadas, o que pode sugerir que o clima frio e nosso comportamento de nos aglomerar nessas situações para nos aquecer pode facilitar sua transmissão, assim como acontece com o vírus influenza.

    Apesar da imunidade causada pela infecção dos HCoV durar pouco (aproximadamente 1 ano), a imunidade contra os vírus mais sérios, como o SARS-CoV-1, é de longa duração, o que nos permite combatê-lo mais rápido em um segundo contato. Uma boa notícia é que o contato com um desses vírus gera anticorpos que ajudam a combater os outros, em um processo chamado Imunidade Cruzada

    Resumidamente: entre 10 e 12 dias após entrarmos em contato com um desses vírus, começamos a produzir anticorpos. Isso nos ajuda a combater aquela infecção inicial e gera a tão falada memória imunológica, que em um segundo contato com o vírus, causará uma resposta mais rápida e eficiente no seu combate.

    A Imunidade Cruzada acontece quando um anticorpo produzido contra uma parte X de um desses vírus do gênero betacoronavírus (que são parecidos em sua estrutura), acaba se ligando a essa mesma parte X de outro vírus do mesmo gênero, ajudando a combatê-lo de forma mais rápida e eficiente.

    Quais são os fatores que podem influenciar novas ondas epidêmicas ou pandêmicas do SARS-CoV-2?

    A partir de todas essas informações, um grupo de pesquisadores de Harvard publicou na Revista Science um modelo matemático da transmissão considerando os seguintes fatores que poderiam influenciá-la:

    • O grau de transmissão durante variações sazonais, isto é, como seria a contaminação das pessoas dependendo das variações climáticas;
    • A duração da imunidade, gerada pelo SARS-CoV-2
    • O grau de imunidade cruzada entre o SARS-CoV-2 e outros coronavírus já em circulação na população

    A partir destes fatores, os cientistas chegaram às seguintes possibilidades:

    1. O SARS-CoV-2 pode voltar a proliferar a qualquer momento do ano. Infecções no outono/inverno favorecerem surtos mais agudos com um maior número de infectados, enquanto infecções no inverno/primavera, apesar de ainda ocorrer, vão levar a surtos menores; 
    2. Se a imunidade do SARS-CoV-2 não for permanente ou de longa duração, ele pode  voltar a entrar em circulação assim como acontece com o Influenza e os HCoV. Uma imunidade de curto período levaria a surtos anuais de SARS-CoV-2, enquanto uma imunidade um pouco mais duradoura, 2 anos por exemplo, levaria a surtos bienais;
    3. Em lugares onde há uma alta variação sazonal (como as zonas temperadas, no Sul do Brasil) a transmissão teria uma incidência menor durante o verão, mas também haveria surtos mais recorrentes e maiores durante o inverno. Isso aconteceria porque durante os meses de verão, quando a transmissão seria menor, há um acúmulo de indivíduos suscetíveis (ou que não foram infectados na última onda ou que “perderam” a imunidade com o passar dos meses);
    4. Se a imunidade do SARS-CoV-2 for permanente, o vírus pode desaparecer por 5 anos ou até mesmo antes de causar um surto maior. Além disso, se ele gerar imunidade cruzada contra outros HCoV, estes podem virtualmente desaparecer também;
    5. Já se a imunidade cruzada de outros betacoronavirus contra SARS-CoV-2 for baixa, isso pode ajudar que o  SARS-CoV-2   desapareça por poucos anos, podendo ressurgir depois. Por exemplo, se considerarmos que a imunidade contra SARS-CoV-2 pode durar apenas dois anos, os baixos níveis de imunidade cruzada dos HCoV poderia nos ajudar a  prolongar o tempo de ressurgimento do SARS-CoV-2, voltando a aparecer depois de 3 anos, ao invés de 2.

    Quais são os possíveis futuros cenários? 

    Vamos considerar o pior cenário possível: não há imunidade cruzada entre outros HCoV contra o SARS-CoV-2, não há como aumentar a capacidade dos sistemas de saúde, remédios e vacinas vão requerer meses ou até alguns anos para o desenvolvimento e teste, restando somente intervenções não farmacológicas para conter a transmissão do vírus. Nesse cenário, a pandemia de COVID-19 poderia durar até 2022, com possíveis duas ondas de contaminações que teriam seu pico durante o inverno no hemisfério norte, e com a necessidade de  novos períodos de isolamento social de 25 até 75% do tempo. Durante esses dois anos, possivelmente o vírus contaminaria todo o mundo. Neste caso, as contaminações aconteceriam como aconteceu com o influenza entraria em um ciclo sazonal de infecções (ocorrendo principalmente no inverno).

    Caso a capacidade dos sistemas de saúde seja aumentada (e isto já está ocorrendo, mesmo que mais lentamente do que gostaríamos neste momento), facilitaria à população a ganhar imunidade contra o vírus, levando a redução do tempo da pandemia, dos isolamentos e distanciamentos sociais. Essa imunidade não ocorre por termos mais hospitais, mas por termos mais capacidade de suporte para atender pacientes, assim, estes têm mais chances de sobreviver, ficando imunizados (ao menos, ao que tudo indica) por um tempo. Junto a esse fato, com a descoberta de algum potencial medicamento eficaz, a pandemia e as medidas de isolamento poderiam ser totalmente relaxadas por volta do primeiro semestre de 2021.

    Mas, como dito, esse seria o pior dos cenários. A maioria dessas alegações feitas pelos pesquisadores foram baseadas em modelos matemáticos, então muitas pesquisas ainda precisam ser feitas para se comprovar algumas dessas modelagens como o grau de imunidade cruzada causada pelos vírus e o tempo da imunidade das pessoas contra o SARS-CoV-2.




    Referências:

    https://time.com/5822470/countries-lifting-coronavirus-restrictions-europe/

    https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/situation-reports/

    https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2020/04/15/interna-brasil,844824/brasil-anuncia-droga-com-94-de-eficacia-contra-coronavirus-em-laborat.shtml

    Kissler, S. M., Tedijanto, C., Goldstein, E., Grad, Y. H., & Lipsitch, M. (2020). Projecting the transmission dynamics of SARS-CoV-2 through the postpandemic period. Science.

    Neher, R. A., Dyrdak, R., Druelle, V., Hodcroft, E. B., & Albert, J. (2020). Potential impact of seasonal forcing on a SARS-CoV-2 pandemic. Swiss Medical Weekly, 150(1112).

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Conheça algumas divulgadoras científicas brasileiras que estão produzindo conteúdo de qualidade durante a pandemia do novo coronavírus

    Camila Laranjeira, Virgínia Mota, Laura de Freitas, Ana Bonassa e Tabata Bohlen. Arquivos pessoais.

    Para dar início ao nosso ciclo temático sobre Epidemias, decidi escrever sobre a importância da divulgação científica especificamente durante a pandemia do novo  coronavírus (SARS-CoV-2, do inglês Severe acute respiratory syndrome coronavirus 2).

    A Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a pandemia de COVID-19 (do inglês Coronavirus Disease 2019), doença infecciosa causada pelo novo coronavírus, em 11 de março deste ano e, desde então, a colaboração entre a comunidade científica mundial para a compreensão, diagnóstico e tratamento do novo coronavírus tem sido essencial.

    Além disso, tem-se visto também uma maior colaboração entre os comunicadores de ciência no Brasil, visando  mostrar como a ciência é feita e os seus  benefícios à sociedade. A análise de dados e artigos científicos em época de pandemia da COVID-19 por divulgadores de ciência e pesquisadores de diferentes áreas popularizaram terminologias como “achatar a curva” e “distanciamento social”. Isso só foi possível a partir do uso de metodologia científica sólida e a tradução desses conceitos de forma clara e precisa para a população.

    Entretanto, algumas páginas de divulgação científica chegaram a sofrer ataques nas redes sociais por seguirem as recomendações da OMS ao falarem sobre o novo coronavírus (como mostra a  reportagem da Folha de São Paulo publicada em 7 de abril).

    Por sermos uma página de divulgação científica que celebra e difunde a contribuição das mulheres nas diversas áreas da ciência, eu trago neste texto o trabalho de algumas mulheres que, além de pesquisadoras, são divulgadoras científicas e estão desempenhando um papel importante, especialmente durante a atual pandemia, esclarecendo dúvidas e nos ajudando a interpretar dados e informações disponíveis sobre o novo coronavírus e a COVID-19.

    Canal Peixe Babel

    Camila Laranjeira e Virgínia Mota, criadoras do Canal Peixe Babel. Arquivo pessoal.

    O Canal Peixe Babel foi criado em 2014 no YouTube por Camila Laranjeira, como uma forma de divulgar e falar mais sobre seu próprio projeto de pesquisa e seu interesse em robótica e inteligência artificial, além de ser uma maneira de conhecer mais pessoas interessadas pelo tema. Graduada em Sistemas de Informação pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e mestre em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), atualmente Mila Laranjeira é professora no Departamento de Ciências da Computação da UFMG.

    Na época da criação do Peixe Babel, Mila ainda não conhecia o significado de “divulgação científica”. O Canal cresceu e, em 2016, se tornou membro do Science Vlogs Brasil, o selo de qualidade que reúne os canais de divulgação científica no YouTube. Segundo Mila, o potencial do Peixe Babel ficou muito mais claro e ela então passou a investir mais em “formatos e assuntos que enriqueciam a divulgação científica”. No ano seguinte, em 2017, o canal trouxe uma convidada para falar sobre seu trabalho como professora no Colégio Técnico da UFMG sobre o tema de Saúde Mental entre adolescentes e jovens adultos.

    A convidada era Virgínia Mota que, um ano depois, passaria a integrar o Peixe Babel junto com a Mila. Vivi Mota é formada em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), tem mestrado pela França (2010) e pelo Brasil (2011), e doutorado (2018) também em Ciências da Computação (UFMG). Atualmente, Vivi é professora no Departamento de Informática da UFMG e atua como pesquisadora nos grupos Núcleo de Processamento Digital de Imagens (NPDI) e Pattern Recognition and Earth Observation (PATREO).

    Como as duas divulgadoras científicas têm interesse na área de tecnologia e são duas mulheres LGBTQ+, Mila e Vivi usam o espaço do canal “para lembrar que tecnologia deve ser feita por todos e para todos”. O alcance do Canal Peixe Babel também rendeu um importante reconhecimento para o trabalho das duas, que passaram a receber financiamento do Serrapilheira, instituto privado que apoia a pesquisa e a divulgação científica no Brasil.

    No contexto da atual pandemia de COVID-19, Mila Laranjeira e Vivi Mota utilizaram sua curiosidade científica sobre os dados que eram liberados a respeito da doença no Brasil e no mundo para implementar algoritmos e gerar gráficos. Ao divulgarem o conteúdo que produziam e interpretarem os dados para os seguidores, outros divulgadores e cientistas também passaram a se interessar pela forma como as duas estavam divulgando as suas análises.

    Dentre eles, vale citar o biólogo e doutor em Microbiologia Átila Iamarino, que utilizou alguns dos gráficos gerados por elas em duas de suas lives no YouTube, de grande repercussão  na internet, para facilitar a explicação e visualização dos dados. De forma mais específica, os dados analisados por Vivi e Mila se referem principalmente ao Brasil e incluem número de casos, óbitos, leitos de UTI, e letalidade.

    Ainda, de acordo com as pesquisadoras e divulgadoras, “o principal objetivo nesse momento é conscientizar o brasileiro de que é um momento delicado, precisamos pensar com muita calma e muito carinho sobre cada uma de nossas atitudes. O acompanhamento dos dados acaba ajudando no diálogo.”

    O Canal Peixe Babel está em várias plataformas incluindo YouTube, Instagram, Facebook, Twitter, Medium, GitHub, e, ainda, o Podcast “Bit de Prosa”, com um alcance de 23 mil seguidores no Instagram e mais de 74 mil inscritos no YouTube. No momento, Mila e Vivi têm utilizado principalmente suas contas no Twitter e no Instagram para atualizações diárias dos dados liberados oficialmente pelo Brasil. Para conhecer mais e acompanhar o trabalho da Mila Laranjeira e Vivi Mota siga o Canal Peixe Babel no Instagram, no Twitter e no YouTube.

    Nunca vi 1 cientista

    Laura de Freitas e Ana Bonassi, idealizadoras do Nunca vi 1 cientista. Arquivo pessoal.

    “A gente está aqui para te aproximar da ciência e dos cientistas! Mostrar como a ciência funciona e como você pode aplicar no seu dia-a-dia!” – é assim que o Nunca vi 1 cientista se apresenta no seu canal do YouTube. O projeto surgiu em 2018 durante o FameLab Brasil, uma das maiores competições de divulgação científica do mundo, quando a Laura de Freitas decidiu recrutar alguns dos colegas participantes e a Ana Bonassa topou se juntar à equipe, dando a ideia do nome.

    A Ana é bióloga, mestre e doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP), e a Laura é farmacêutica-bioquímica, mestre e doutora em Biociências e Biotecnologia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Atualmente, as duas são pós-doutorandas na USP.

    Ana e Laura já utilizavam as redes sociais para desmentir informações falsas espalhadas pela internet e dar explicações baseadas em evidências científicas sobre temas variados. Entretanto, desde o começo da pandemia de COVID-19 no Brasil, elas têm focado em desmistificar notícias falsas como a “prevenção” da doença por erva doce, receitas caseiras de álcool gel, cloroquina na água tônica como “tratamento”, entre outras.

    Além disso, no canal do YouTube elas têm trazido conteúdo sobre estudos envolvendo tratamentos e vacinas para a COVID-19 com embasamento científico, além de esclarecer reportagens que citam cloroquina e hidroxicloroquina como um tratamento definitivo para a doença, ou que falam de vacina contra o coronavírus para cachorros. Por isso, elas afirmam que “é fundamental sempre preferir os jornais que consultam especialistas ou até mesmo os canais de cientistas especialistas”.

    Quando começaram o projeto, Laura e Ana tinham a intenção de levar informação científica de qualidade de forma divertida e acessível para quem não é cientista, utilizando as redes sociais. Hoje em dia, a equipe conta com 13 colaboradores na produção de conteúdo e 1 editor de vídeo voluntário.

    Nas redes sociais, o Nunca vi 1 cientista tem mais de 70 mil seguidores no Instagram e mais de 42 mil inscritos no canal no YouTube que, assim como o Canal Peixe Babel, também entrou para o selo do Science Vlogs Brasil depois de passar por um processo de seleção em 2019. O Nunca vi 1 cientista também tem contas no Facebook e no Twitter. Para conhecer mais sobre o projeto idealizado por Laura de Freitas e Ana Bonessa, siga o Nunca vi 1 cientista no YouTube, no Twitter ou no Instagram.

    Dragões de garagem

    Luiz Bento, Tabata Bohlen e Lucas Camargos fazem parte do Dragões de Garagem. Arquivo pessoal.

    O Dragões de Garagem surgiu em 2012 como um podcast de divulgação científica, com o objetivo de falar sobre ciência de forma mais acessível e descontraída. Atualmente a equipe conta com 14 integrantes produzindo conteúdo para o podcast e também para o canal deles no YouTube. O Dragões é formado majoritariamente por mulheres – a equipe conta com 8 colaboradoras no momento – e eu decidi falar mais sobre o trabalho da Tabata Bohlen, que entrou para o Dragões há aproximadamente 3 anos, depois de várias conversas sobre o projeto com o Luciano Queiroz, um dos criadores do Dragões de Garagem.

    A Tabata é bióloga formada pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), mestre e doutora em Ciências pela USP, e há 2 anos é coordenadora e responsável pelo canal do Dragões no YouTube. Além disso, ela participa do programa semanal “Notícias da Garagem”, que fala sobre descobertas científicas no canal. Entre os temas abordados no programa, está a questão do financiamento de Ciência e Pesquisa no país, para que as pessoas entendam a sua importância.

    Por conta da pandemia causada pelo novo coronavírus, a programação do podcast e do conteúdo do canal no YouTube teve de ser alterada. Por ser um grupo formado por pessoas de várias áreas, o Dragões tem tentado abordar aspectos diferentes sobre a COVID-19 e as consequências do isolamento. Por isso, eles criaram as “Pílulas da Garagem” para o podcast, em que falam sobre assuntos relacionados à COVID-19 em programas de até 30 minutos. Já para o canal no YouTube, a Tabata tem feito as “Pílulas de Corona” com pequenos trechos sobre as lives semanais que ela faz com convidados, a fim de que mais pessoas assistam e recebam informação de qualidade.

    Um aspecto muito importante sobre a atuação dos cientistas durante a pandemia, que mencionei no início do texto, é a colaboração entre eles para que as informações corretas sobre o  momento atual cheguem até mais pessoas. E um ótimo exemplo disso é a colaboração que a Tabata do Dragões tem feito em lives no YouTube com a Laura do Nunca vi 1 cientista para responder algumas perguntas frequentes em relação ao novo coronavírus e à COVID-19, e com a Mila e a Vivi do Canal Peixe Babel sobre gráficos, estatísticas e o novo coronavírus.

    Tabata destaca os benefícios da colaboração entre mulheres na divulgação científica: “A Mila, a Vivi, a Laura e tantas outras, além de serem inspirações, nós nos tornamos suportes umas para as outras nesse mundo difícil de mulher fazendo ciência e divulgação.”

    Se quiser conhecer mais sobre o trabalho da Tabata Bohlen e do Dragões de Garagem, no website deles você encontra diversos conteúdos sobre ciência, além de ter acesso ao podcast. Eles também estão no Instagram, no Twitter, e no YouTube, com o selo Science Vlogs Brasil, onde a Tabata participa do corpo diretor.

    Ao acompanhar o trabalho que essas cientistas e divulgadoras têm feito na internet, percebemos que o objetivo em comum entre todas elas é a vontade de falar sobre ciência de forma acessível, didática e descontraída, a fim de levar a ciência onde as pessoas estão – nas diversas redes sociais – e de aproximar a população do que fazemos nos laboratórios das universidades públicas e de outras instituições de pesquisa.

    Assim, aproveito a chance de novamente parabenizar a Mila Laranjeira, a Vivi Mota, a Laura de Freitas, a Ana Bonassa, e a Tabata Bohlen pelo excelente trabalho de divulgar e comunicar ciência de forma tão didática e trazer informação de qualidade de maneira acessível à população. Agradeço imensamente a atenção e contribuição de vocês para a construção deste texto!

    Referências:

    Para escrever este texto eu utilizei informações fornecidas pelas próprias divulgadoras científicas, além das fontes abaixo:

    https://medium.com/@canalpeixebabel

    https://noticias.r7.com/educacao/nunca-vi-um-cientista-esta-com-inscricoes-abertas-15102019

    http://dragoesdegaragem.com/video/coronavirus-noticias-da-garagem/

    Lives do Atila Iamarino utilizando dados do Canal Peixe Babel: https://www.youtube.com/watch?v=9GT9zqme9Mo e https://www.youtube.com/watch?v=vEwDdXim8bQ

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Ensino Remoto Emergencial: não é só sobre acesso e equipamentos…

    Se a disponibilidade de tecnologias já limita quem pode ter acesso ao ensino remoto, o problema se torna ainda mais complexo quando analisamos as condições deste novo contexto de aprendizagem. É fundamental, neste momento, compreendermos que o ensino proposto está longe de ser o que se preconiza como educação, tanto quanto Educação à Distância. Vivemos um momento em que as escolas foram fechadas por uma situação de saúde pública. As escolas (e todos os serviços) foram fechados enquanto tentávamos (e ainda tentamos) entender tudo o que acontece e buscamos nos adequar da melhor maneira possível – individual e coletivamente.

    Helder Gusso é professor e pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e tem refletido sobre a aprendizagem do ensino remoto emergencial. O pesquisador concedeu uma entrevista à Natália Flores (que assina esta postagem), e demonstrou preocupação com o ensino remoto emergencial, uma vez que a realidade das famílias brasileiras é muito heterogênea. Isto pode acarretar na falta de condições em proporcionar um ambiente favorável para o estudo de crianças e adolescentes. Inúmeros fatores entram em jogo, como a mudança na rotina, o aumento de demandas da casa, a preocupação excessiva com a contaminação, entre outros.

    Gusso aponta que mesmo que consiga acompanhar as atividades remotas, um estudante cuja família tem que lidar com problemas financeiros por conta da pandemia, parentes doentes ou o risco eminente de contaminação, caso familiares estejam trabalhando durante o período de quarentena, pode ter seu rendimento escolar comprometido. Entra na lista dos possíveis problemas, o fato de que muitos estudantes que não têm um lugar calmo e isolado para estudar, caso comum nas periferias urbanas.

    Atividades pedagógicas remotas e questões legais

    É importante pontuar que quando se fala em acesso há um grande abismo entre ter equipamentos, ter serviço de internet (com um sinal adequado para ver os materiais escolares sem restrição de dados já discutido em postagem anterior) e ter condições de acompanhar as atividades propostas pelas escolas e professores.

    E tudo isto ainda envolve um empenho público que não apenas legitime as ações, mas dê suporte técnico, legal e didático pedagógico para não aprofundarmos ainda mais as desigualdades sociais que virão em função da pandemia causada pela COVID-19.

    No dia 29 de Abril, o Conselho Nacional de Educação (CNE)* lançou o Parecer Com Diretrizes Para Reorganização dos Calendários Escolares e Realização de Atividades não presenciais pós retorno. Há vários pontos que são pauta para outras postagens. Ressaltaremos apenas que o citado Parecer aponta que atividades “não presenciais” podem ou não ser mediadas por tecnologias digitais, citando outras alternativas.

    No entanto, mais do que isso, o parecer enfatiza a necessidade de comunicação entre escola e comunidade escolar (pais e alunos) e produção de guias que orientem não apenas os estudantes, mas seus responsáveis legais, sobre o planejamento e rotina de estudos, enquanto este período durar.

    Embora o texto traga avanços e legalidade para ações necessárias, indique a comunicação como imperativa e que as atividades não presenciais não precisam ser mediadas por tecnologias digitais, não indica saídas para isto, apontando, inclusive, uso de redes sociais como whatsapp e outros comunicadores instantâneos. Além disso, no Parecer a ênfase em conteúdos e atividades que supram conteúdos regulares se faz presente, especialmente na orientação para as séries Finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio.

    Novamente, as preocupações do pesquisador Gusso se fazem relevantes, pois existe a necessidade de nos atentarmos que este não é um momento de suprirmos “todos os conteúdos” que seriam trabalhados normalmente em sala de aula presencial. Não há condições de os docentes acompanharem os estudantes com a qualidade e a efetividade necessária.

    Além disso, ignora-se a possibilidade de excessos de atividades e falta de interatividade que, especialmente para as crianças mais novas, pode ser até mais importante do que toda a centralidade no conteúdo que comumente acaba sendo o foco nestes debates.

    Segundo Luiz Carlos de Freitas, professor e pesquisador aposentado da Faculdade de Educação da Unicamp, é preciso ter cuidado com a sobrecarga de responsabilidade atribuída aos pais (que têm sido chamados de tutores em alguns casos, neste processo). A sobrecarga diz respeito às condições dos pais em atuarem de forma didática e pedagógica em relação às atribuições que comumente são não somente de docentes e escolas, mas de órgãos públicos governamentais. Freitas cita, especificamente, a situação das provas padronizadas que cobram conteúdos formais (aqui em São Paulo temos a SARESP, por exemplo). 

    Como o ensino emergencial deve ser encarado, então?

    Diante dos limites das tecnologias, muitos professores e pesquisadores da área da educação acentuam o fato do ensino remoto emergencial ser uma solução momentânea para a situação que estamos vivendo. Estamos em situação de emergência e é deste modo que temos que encarar, também, a situação no ensino. O Ensino Remoto Emergencial funciona como ferramenta para distrair e ocupar os estudantes com atividades complementares e não obrigatórias nas agendas escolares. 

    Essa é a posição defendida por vários especialistas da educação, entre eles, o próprio Helder, que estuda as razões do fracasso escolar. “Achar que os estudantes estão aprendendo o que estava previsto para eles aprenderem neste mês de março/abril e voltar, depois da pandemia, ao ensino presencial com essa suposição talvez nos coloque numa posição bastante complicada”.

    Segundo o pesquisador, alunos que não conseguem acompanhar as primeiras aulas de um semestre letivo têm grandes chances de fracassar, pois não conseguem aprender a base necessária para temas mais complexos que vêm na sequência.

    O que vai fazer a diferença é a forma como as escolas vão atuar, assim que as atividades presenciais forem restabelecidas. Formular estratégias para recuperar o que o que não foi aprendido durante esses meses, atuar de forma coletiva e compreensiva – fornecendo suporte emocional aos estudantes, que voltarão abalados pela situação – podem ser algumas soluções.

    Também neste blog:

    Desigualdade social e tecnologia: o ensino remoto serve para quem?

    Para saber mais

    BRASIL. CNE. (2020). Parecer Com Diretrizes Para Reorganização dos Calendários Escolares e Realização de Atividades não presenciais pós retorno.

    FREITAS, Luiz Carlos. (2020) Pais Defendam Seus FilhosAvaliação Educacional, publicado em 04 de Abril de 2020.

    GUSSO, Helder. Entrevista concedida à Natália Flores no dia 03 de abril de 2020 .

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Desigualdade social e tecnologia: o ensino remoto serve para quem?

    O ensino remoto emergencial foi uma das opções encontradas para contornar a falta de aulas em escolas e universidades durante a pandemia. Ainda que seja uma solução interessante para aproximar alunos e professores, o uso de plataformas virtuais e atividades escolares a distância coloca luz sobre a desigualdade de acesso a tecnologias de comunicação e informação – e pode aprofundar o abismo social da educação no Brasil. E hoje neste post, nos propusemos a apresentar um breve panorama sobre a Educação à Distância, as políticas públicas e o acesso à internet no Brasil.

     

    A educação à distância e as políticas públicas no Brasil.

    Muito embora a educação informatizada não seja um debate novo no Brasil e no mundo – tendo sua história marcada no período após a Segunda Guerra Mundial (década de 1950) e com as possibilidades sendo maiores após o advento dos computadores pessoais (na década de 1980), o acesso aos equipamentos de informática e computação e o acesso às tecnologias de internet só recentemente tornaram-se viáveis para uma parcela grande da população. As Tecnologias Digitais de Comunicação e Informação (TDCI) aparecem neste cenário como ferramentas que são grandes promessas para a educação, no Brasil e no mundo. 

    A educação de um país, de modo geral, deveria seguir preceitos constitucionais e legais, pautados em políticas públicas que proporcionassem ao máximo uma igualdade de oportunidades, independente de condições socioeconômicas. Neste sentido, a educação à distância, regulamentada e estruturada a partir de políticas públicas, serviria para criar condições não apenas de trabalhar o que entendemos como conteúdo escolar (ou os conteúdos das disciplinas clássicas, digamos assim), mas também o desenvolvimento intelectual e a habilidade com diferentes estratégias e ferramentas de ensino e aprendizado.

    O uso de equipamentos como celular e computador seriam, deste modo, mais do que apenas uma porta de acesso ao conteúdo, mas um modo de aprendizado vinculado ao manuseio do próprio equipamento de múltiplas maneiras. Tudo isto, inicia-se não apenas com a pesquisa relacionada à educação à distância, mas também (e a partir destas pesquisas) com o estudo e a implementação de políticas públicas específicas.

    De modo geral, as políticas públicas de inclusão digital na educação se pautam não apenas na existência de conteúdos acessíveis, mas também na alfabetização da população sobre as TDCIs e na infraestrutura que garanta a disponibilidade de acesso a este conteúdo.

    As políticas públicas com este fim específico, no Brasil, vinham sendo discutidas e estavam previstas no Plano Nacional de Educação, e seria implementado via Programa de Inovação Educação Conectada, instituído em 2017, cujo objetivo principal era “apoiar a universalização do acesso à internet em alta velocidade e fomentar o uso pedagógico de tecnologias digitais na educação básica”. Nesta lei, argumentava-se sobre a importância de implementar políticas de acesso à internet, especialmente em populações com vulnerabilidade socioeconômicas e baixo desempenho em indicadores educacionais. O Programa previa, ainda, apoio técnico e financeiro para as escolas.

    Em pesquisa recente, constatou-se que em nosso país cerca de 82% das escolas privadas e 73% das escolas públicas do meio urbano possuem acesso à internet. No meio rural, este percentual cai para 42% para escolas privadas e 13% para escolas públicas. Só por este panorama breve das escolas, poderíamos questionar se existe condições e se os professores das escolas tiveram acesso às ferramentas antes deste momento que vivemos hoje. 

    Mas… Não estamos falando de escolas e suas condições de conexão. A Educação à Distância é diferente do que temos neste momento, pois preveria um planejamento anterior, com treinamento adequado e estrutura escolar e dos estudantes. O que temos neste momento poderia ser chamado de ensino remoto emergencial. E aí uma das questões é qual a condição desta educação mediada por tecnologias para que todos fiquem em casa enquanto durar a pandemia aconteça no Brasil?

    O acesso à internet no Brasil

    O primeiro dado que precisamos lembrar é que nem todo mundo tem equipamentos que possibilitam o acesso à internet. Em 2017, segundo dados do IBGE, 43,4% dos domicílios brasileiros possuíam computadores pessoais e 13,7% tablets. O percentual de telefones móveis, neste mesmo ano, estava presente em 93,2% dos domicílios (ao menos um por residência).

    Os dispositivos mais disponíveis para os brasileiros são, portanto, os telefones celulares. Em 2019, tínhamos 420 milhões de dispositivos digitais (computadores e smartphones) circulando no Brasil, o que dá 2 dispositivos por habitante. A distribuição desses dispositivos, no entanto, nem sempre é igualitária. Destrinchando estes números, a partir da pesquisa do CEDIC de 2018, percebemos que apesar de 83% dos brasileiros terem telefone celular, 16% ainda estão fora dessa realidade. Temos computadores portáteis em apenas 27% das residências, computadores de mesa em 19% e tablets em 14%. 

    Voltando ao IBGE, esta mesma pesquisa (que é por amostragem de domicílios) aponta que em 2017, 74,9% das residências brasileiras utilizavam internet. Este número chega a 80,1% em residências urbanas e 41% em residências rurais. Cabe ressaltar que a pesquisa do IBGE também buscou levantar os motivos pelos quais 25,1% dos domicílios brasileiros não tem (ou não tinham naquele momento) acesso à internet… As respostas variam entre: falta de interesse no serviço, valor do serviço de acesso, ninguém da residência sabe usar internet e o equipamento para acessar é muito caro, conforme gráfico abaixo (retirado na íntegra da publicação de IBGE, 2017).

    Além destes pontos levantados anteriormente, outra questão se refere à qualidade da conexão, que também pode ser um entrave para que estudantes acompanhem vídeo-aulas e conversas com a turma e professores nas plataformas virtuais.

    Neste primeiro texto da série sobre Educação e ensino remoto emergencial, buscamos apresentar um pouco sobre algumas problemáticas quanto ao acesso às Tecnologias Digitais de Comunicação e Informação – enfatizando equipamentos e serviços de internet em domicílios brasileiros. 

    Mais do que dizer que estas estratégias não deveriam ser usadas pelas escolas, a ideia era brevemente apresentar um pouco as dificuldades de se implementar isto em tempos anteriores à pandemia (trazendo alguns dados históricos de políticas públicas brasileiras) e que são acentuados no atual cenário que vivemos.

    Agora é necessário, mesmo que de forma urgente, buscar formas de não acentuar desigualdades sociais que já são históricas e profundas na sociedade, em função de políticas de acesso à informação no país.

     

    Para saber mais:

    BRASIL. IBGE. (2018) PNAD – Acesso à Internet e à televisão e posse de telefone móvel celular para uso pessoal 2017. Brasília: IBGE.

    HAYASHI, C.; SOEIRA, F.S.; CUSTÓDIO, F.R.; (2020) Análise sobre as políticas na Educação à Distância no Brasil. Research, Society and Development, v.9, n.1.

    MOREIRA, E. S.; LIMA, E.O.; BRITO, R.O. (2019). Estudo comparado das políticas públicas educacionais de inclusão digital: Brasil e Uruguai. Revista da Faculdade de Educação.

     

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Alimentação em tempos de Isolamento Social

    Em época de pandemia de Covid-19 e isolamento social, a rotina pessoal, profissional e familiar de muitas pessoas tem se modificado. A mudança de rotina altera o comportamento e o hábito alimentar que também são influenciados pelo estado de saúde mental e emocional.

    Pesquisas mostram que a ansiedade e o estresse podem provocar o aumento da ingestão calórica e do ganho de peso em curto prazo devido ao alto consumo de alimentos ricos em carboidratos e gorduras.

    Nesse contexto atual, além do isolamento social, ouvir ou ler continuamente sobre a pandemia aumentam o nível de ansiedade e estresse.

    Isso pode levar as pessoas a comerem em maior quantidade e a buscarem alimentos chamados “comfort food”. Esses “alimentos que confortam” são aqueles que remetem a memória afetiva e que causam prazer e bem estar.

    O consumo de tais alimentos – muitas vezes ricos em carboidratos/açúcares (como doces, chocolates, bolos e tortas, por exemplo) – estimula a produção de serotonina que, por sua vez, tem um efeito positivo no humor e na redução momentânea do estresse e no aumento do bem estar mental.

    Esse comportamento chamado de “comer emocional” é influenciado diretamente pelo estresse e pela ansiedade.

    Por isso, é importante reconhecer a presença excessiva dessas emoções e perceber se estão influenciando o comportamento alimentar. Seja pelo aumento do consumo de doces, massas e pães, por exemplo, ou pelo aumento da quantidade de alimentos e bebidas consumidos no dia-a-dia.

    Uma orientação prática para cuidar da alimentação em tempos de isolamento/distanciamento social é criar estratégias de planejamento alimentar.

    PLANEJAMENTO ALIMENTAR

    O primeiro passo é planejar a alimentação (diária/semanal/mensal). A partir desse planejamento fazer a lista de compras;

    Manter a dispensa e geladeira organizadas para saber o que tem e evitar o desperdício de alimentos;

    Estabelecer horário para as refeições como café da manhã, almoço, jantar e lanches intermediários, evitando “pular” refeições e “beliscar” durante o dia e à noite;

    Ter uma alimentação variada composta, de uma forma geral, por cereais integrais, leguminosas, oleaginosas, frutas, verduras e legumes, carnes, frangos, ovos e peixes, leites e derivados.  (Lembrando que pessoas que tenham alguma alergia/ intolerância alimentar ou indivíduos vegetarianos/veganos precisam ter um planejamento alimentar específico).

    Priorizar alimentos in natura como frutas, verduras e legumes;

    Utilizar ervas aromáticas e especiarias para cozinhar;

    Experimentar algum alimento novo que não tenha o hábito de comer;

    Valorizar alimentos regionais, produtores locais e pequenos comércios;

    Cozinhar mais, aprender novas receitas e aproveitar esse momento de isolamento para cultivar novos hábitos alimentares.

    ATITUDES ALIMENTARES POSITIVAS

    Além do planejamento alimentar, é importante adotar atitudes alimentares positivas para desacelerar a mente e comer com atenção plena.

    Nesse sentido, seguem algumas orientações para serem usadas antes e durante as refeições:

    • Perceba e acolha suas emoções e sentimentos antes das refeições. Se estiver muito ansioso, pare e respire lenta e profundamente para então começar a comer (use técnicas de respiração e meditação);

    • Desconecte-se da TV, computador, celular e redes socias no momento das refeições;

    • Coma com atenção plena (mindful eating) e concentre-se no ato de se alimentar. Sente-se para comer e apenas coma, não faça outras atividades ao mesmo tempo.

    • Feche os olhos e observe o aroma, a temperatura, a textura e o sabor dos alimentos, e coma sem culpa;

    • Mastigue lentamente os alimentos. Apoie os talheres na mesa entre as garfadas, fazendo uma leve pausa no momento das refeições. Uma outra forma de comer mais devagar é tentar comer com a mão não dominante;

    • Perceba os sinais de fome e saciedade para evitar comer em excesso.

    Por fim, manter uma alimentação equilibrada em nutrientes e em quantidade de alimentos, além do planejamento das refeições associado a atitudes alimentares positivas são estratégias para combater os efeitos negativos do isolamento social na alimentação e na saúde.

    Referências: Guia Alimentar para População Brasileira, 2014. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf

    Santos, et al. Emotional eating is related to carbohydrate intake in active women. Motriz: rev. educ. fis. vol.22 no.4. 2016

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • De soluções milagrosas a desinfetantes: alguns perigos no combate ao coronavírus

    E é exatamente devido à simplicidade de sua produção e, portanto, a facilidade de acesso, que devemos compreender como esta mistura funciona no organismo e esclarecer o porque o MMS NÃO serve no combate a doenças, sendo na verdade um produto com potencial risco de intoxicação

    Produto milagroso, com potencial para o tratamento das mais diversas enfermidades conhecidas e até mesmo de condições ainda não compreendidas pela medicina e que, obviamente pode ser utilizado no tratamento da COVID-19. Sim, é desta forma que tem sido divulgado, em diferentes canais, a chamada solução mineral milagrosa (ou MMS – Mineral Miracle Solution). Recentemente, até mesmo o presidente do país de maior economia mundial fez referência ao uso de substâncias similares (os desinfetantes). 

    Nos referimos aqui a uma recomendação grave, de uma substância com potencial tóxico e que tem sido ofertada de forma criminosa por diferentes sujeitos. Mas o que é o MMS, qual a origem de seu uso e quais seriam seus possíveis efeitos? Este tema poderia entrar para a série: dos absurdos que recebi nesses últimos tempos.

    Não há relatos precisos a respeito da origem da indicação do uso do MMS, mas atribui-se as primeiras recomendações de uso a Jim Humble, que se auto-intitula ex-profissional da engenharia aeroespacial e, atualmente, cientologista. Inicialmente, o MMS foi sugerido, sem validação científica, no tratamento de malária e HIV. Atualmente, indivíduos de formação duvidosa continuam a sua recomendação no tratamento de dores lombares, envenenamento por picada de animais venenosos, como agente antimicrobiano diverso e incrivelmente no combate a condições como a Síndrome do Espectro Autista. Obviamente com todas essas promessas, houve quem acreditasse e  começasse a indicar tal  substância no combate ao vírus que tem causado a pandemia, o SARS-CoV-2

    Até aqui você já pode questionar: Teríamos então um remédio contra a COVID-19? Vamos tentar entender um pouco mais sobre o MMS do ponto de vista químico para fornecer subsídios que refutem o uso desta suposta solução milagrosa. 

    Do que é feito o MMS e qual  é a sua ação?

    O MMS constitui-se de uma solução formada por uma substância chamada dióxido de cloro (ClO2) – um gás, dissolvida em água. Tal solução pode ser produzida utilizando-se clorito de sódio (NaClO2) ou hipoclorito de sódio (NAClO) misturados a uma solução ácida, a qual as receitas recomendam que seja da ácido cítrico (C₆H₈O₇). 

    Talvez você reconheça os nomes citados e os associe a produtos presentes nas residências. De fato, o hipoclorito de sódio está presente na água sanitária (produto de limpeza que em algumas regiões é chamada simplesmente de cloro) e o ácido cítrico está presente em diferentes frutas ácidas (como limão e acerola) bem como pode ser adquirido em farmácias. Talvez, você também esteja se perguntando: então se eu misturar água sanitária com o ácido proveniente das frutas cítricas eu tenho o MMS? Sim, é isso que se recomendam as receitas de produção desta substância.

    O clorito e o hipoclorito de sódio são agentes oxidantes, ou seja, reagem com substâncias tendendo a degradá-las por meio de reações que conhecemos como oxidorredução. É por isso que a água sanitária é utilizada na remoção de manchas e na desinfecção de superfícies. O dióxido de cloro produzido e presente no MMS tem potencial ainda maior de oxidar compostos, principalmente moléculas orgânicas que contêm, além de carbono e hidrogênio, átomos de nitrogênio (N) e enxofre (S). Essas moléculas orgânicas fazem parte de um grande número de biomoléculas que compõem nosso organismo.

    Deste modo, o produto contido no MMS pode sim degradar as camadas proteicas presentes em vírus, assim como diversas outras moléculas presentes em nosso organismo, como as presentes em nossas células saudáveis. Isso acontece porque a degradação não apresenta seletividade1. Ou seja, o MMS irá degradar todas as substâncias com as quais tiver o contato e que sejam menos oxidantes do que ele. 

    Mas o que isso quer dizer? Se alguém ingerir a solução descrita, essa pessoa estará expondo seu organismo a um produto extremamente tóxico que poderá degradar tanto partes saudáveis do seu organismo como aquelas não saudáveis. 

    Mas o uso do MMS é permitido? 

    Não. A Organização Mundial da Saúde (OMS) em relatório publicado sobre o efeito da substâncias em cobaias mamíferas aponta os perigos diversos do uso do MMS que compreendem estresse respiratório, enfisemas e edemas pulmonares na dose mínima e morte de parte dos grupos nas doses superiores (no caso da inalação do gás)2 . Quando administrado oralmente, metade das cobaias morreu com a dose máxima, e outras duas com a dose intermediária passadas 48 horas da ingestão. Todas elas apresentaram irritação e  corrosão gastrointestinal. 

    Ainda, outros estudos mostraram que camundongos expostos à baixas doses de dióxido de cloro em filhotes tiveram problemas neurocognitivos, com atrasos no neurodesenvolvimento e redução na formação de sinapses cerebrais, bem como possíveis problemas que o produto pode causar na tireoide, estômago, intestino, e até na diminuição do número de hemácias.

    Todos estes dados impulsionaram a proibição do MMS em vários países e, no Brasil, tal proibição foi realizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em junho de 20183 .

    Portanto, produtos a base de clorito e hipoclorito de sódio são recomendados apenas para limpeza externa de superfícies, não sendo recomendados nem mesmo o uso na pele. Quanto ao derivado dióxido de cloro que  gera a “solução milagrosa”, seu uso não é recomendado e, nem sequer existe algum produto comercial a venda que contenha essa composição. 

    Conclusão, administrar o MMS é o mesmo que ingerir veneno imaginando que o veneno irá atuar apenas nos microorganismos que causam doenças e não em células saudáveis, o que é completamente equivocado. Ou ainda, seria como pensar “Bom se a água sanitária mata as bactérias na pia, se eu tomar um pouco ela irá matar as bactérias do meu organismo” desprezando todos os outros efeitos que esta substância poderia causar.

    Referências

     ASCOM/ANVISA. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Autismo: falso medicamento é proibido. 2019. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/noticias/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/medicamento-falso-para-autismo-e-retirado-do-mercado/219201>

    DOBSON, Stuart. CARY, Richard. Chlorine Dioxide (GAS). Concise International Chemical Assessment Document 37. World Health Organization. 2002. Disponível em: <https://www.who.int/ipcs/publications/cicad/en/cicad37.pdf

    EPA. U.S. Environmental Protection Agency. Chlorite (sodium salt); CASRN 7758-19-2. National Center for Environmental Assessment. Disponível em: <https://cfpub.epa.gov/ncea/iris/iris_documents/documents/subst/0648_summary.pdf

  • Diagnóstico por RT-qPCR, o que é isso?

    Em tempos como os atuais, temos visto muitos termos técnicos específicos na mídia e em notas de instituições que falam tanto da doença COVID-19, quanto do SARs-Cov-2 (o novo Coronavírus), quanto de sintomas e testes de diagnósticos.

    Em meio a todas estas informações, embora nos habituemos a ver os termos, não necessariamente compreendemos do que se trata. Em especial sobre os diagnósticos da doença, temos visto que há mais de um tipo de teste possível de ser feito.

    A Força Tarefa da UNICAMP anunciou que fará o teste chamado RT-qPCR, o qual foi considerado o principal teste de COVID-19 pela Organização Mundial da Saúde. Este texto busca explicar um pouco melhor sobre este teste e, também, o motivo pelo qual ele é importante no diagnóstico da doença.

    Arte: HUB Campinas

    Por que a Organização Mundial de Saúde indica o RT-qPCR como o principal diagnóstico?

    O diagnóstico feito pela técnica RT-qPCR foi preconizado para se realizar o diagnóstico do COVID-19 em pacientes suspeitos por ser capaz de verificar a presença de até mesmo uma única cópia do material genético do vírus (como veremos em seguida) e, também ser uma técnica amplamente estabelecida dentro de laboratórios de biologia molecular ao redor do mundo. Isto é, por ser uma técnica que grande parte dos laboratórios do mundo inteiro já conhece o protocolo e que é usado de maneira usual em suas pesquisas.

    E o que significam estas siglas? O que é, afinal, uma PCR e uma RT-PCR? 

    Desde quando foi criada até os dias atuais, as técnicas de PCR têm sido usadas em uma grande gama de pesquisas científicas, desde estudos sobre expressão gênica a detecção de variações genéticas dentro de uma população. Vamos compreender um pouco mais das etapas desta técnica e porque ela é importante para a detecção do novo Coronavírus?

    A PCR é a sigla que significa, em português, Reação em Cadeia de Polimerase. É uma técnica de biologia molecular muito usada para analisar a presença ou ausência de um gene no DNA de um ser vivo. Polimerase é a enzima responsável, dentro das células, por catalisar a adição de novos nucleotídeos a uma cadeia de DNA ou RNA. Isto é, ela proporciona agilidade e eficácia na duplicação ou transcrição de moléculas de DNA ou RNA.

    Arte: HUB Campinas

    Ao usarmos a enzima polimerase em uma reação em cadeia, dentro de um ambiente controlado (tal como na técnica que estamos explicando), conseguimos “amplificar” o material genético de uma amostra coletada. Isto é, conseguimos multiplicar o número de material a partir de uma pequena quantidade de DNA ou RNA, e assim analisar a presença de trechos específicos – como a de vírus, por exemplo. 

    A técnica PCR acontece com a adição de várias moléculas diferentes, para desempenhar papéis definidos na identificação do material genético que queremos multiplicar. Para realizar a PCR, nós misturamos: uma enzima capaz de duplicar o DNA, resistente a altas temperaturas; bases nitrogenadas (os “tijolos” que formam o DNA); primers (pequenos moldes de RNA que grudam no começo do gene ou segmento gênico de interesse) e, por fim, o DNA do organismo que se quer analisar. Ao submetermos todos estes elementos a ciclos de altas e baixas temperaturas, somos capazes de multiplicar de forma exponencial a quantidade de cópias daquele pedaço de DNA que temos interesse.

    No caso de um teste diagnóstico, ao se aplicar esta técnica, saberemos se existe o DNA do organismo (vírus) que estamos tentando detectar, após executar outra técnica chamada eletroforese em gel de agarose/poliacrilamida, que permite a visualização dos trechos de material genético que foram multiplicados. Isto é, se a pessoa está infectada, o DNA em questão será amplificado e o diagnóstico será positivo (mas ainda não é deste protocolo que se trata o diagnóstico do Coronavírus! Calma que chegaremos lá!).

    O DNA e o RNA possuem pequenas diferenças, quimicamente. O SARs-CoV-2, que é o material que queremos analisar em nossas amostras, é um vírus cujo material genético é uma molécula de RNA. E isto faz diferença no protocolo que temos que estabelecer… Para isso, usamos a técnica RT-PCR, que é a Reação em Cadeia de Polimerase de Transcrição Reversa.

    A grande diferença da PCR para a RT-PCR é que antes de fazermos todo o processo dito acima, nós pegamos o RNA do vírus e convertemos em um DNA complementar a ele mesmo, o chamado cDNA, (um processo que ficou famoso quando o HIV começou a ser estudado) e adicionamos esse cDNA a reação, no lugar do DNA genômico do organismo.

    E, por fim, qual a diferença para o RT-PCR quantitativo (RT-qPCR)?

    Geralmente as RT-PCR estão associadas a PCR quantitativa. Este processo nos permite saber quanto um gene ou o material genético de um vírus ou patógeno dentro da célula está sendo produzido.

    Nesse modelo, um fluoróforo (uma molécula capaz de emitir luz) é preso a uma sonda que se liga ao gene ou pedaço de DNA de interesse. Enquanto essa molécula fluorescente estiver ligada a essa sonda, a sua luz não é emitida, mas uma vez que ela é solta, a molécula começa a emitir fluorescência.

    Arte: HUB Campinas

    Quando a enzima responsável por duplicar o DNA chega a esse segmento onde a sonda está ligado, ela corta-a, liberando o fluoróforo, que dessa forma começa a emitir luz(2). A partir de um sensor na máquina onde está acontecendo essa reação, somos capazes de captar a luz emitida pelo fluoróforo a cada ciclo de duplicação do DNA, e por fim, quantificar sua expressão.

    Arte: HUB Campinas

    No começo da reação, há poucas cópias do DNA de interesse, e dessa forma a fluorescência emitida é pouca, mas com o passar dos ciclos, onde 2 cópias se tornam 4, 8, 16, e assim por diante de forma exponencial, a quantidade de luz emitida cresce também de forma exponencial e somos capaz de contar a quantidade inicial de moléculas que tínhamos no começo. 

    Quais as etapas para realizar o diagnóstico da COVID-19?

    Arte: HUB Campinas

    A Força Tarefa da Unicamp realizará testes diagnósticos que incluem 5 etapas:

    1. Coleta do material dos pacientes (células da mucosa da boca e do nariz), 
    2. Extração do RNA viral da amostra do paciente
    3. Conversão em DNA complementar (cDNA) ao RNA
    4. Duplicação exponencial do cDNA por RT-qPCR
    5. Análise do resultado por especialista para o diagnóstico

    Todo este processo demora algumas horas, normalmente. No entanto, estamos vivendo um período atribulado, com muitos testes sendo solicitados simultaneamente. Por enquanto, a FT-Unicamp têm a previsão de disponibilizar o resultado dos testes entre 24 e 48 horas. Mas este tempo pode aumentar dependendo da demanda que tivermos durante toda a pandemia.

    Direção de arte desta postagem:
    Anatália Oliveira Santos – Diretora de arte do HUB Campinas

    Texto feito para a Força Tarefa da Unicamp

    Nossos sites institucionais:

    Força Tarefa da Unicamp

    Unicamp – Coronavírus

    Para saber mais:

    Organização Mundial de Saúde. (2020). Coronavirus disease (COVID-19) technical guidance: Laboratory testing for 2019-nCoV in humans

    Arya, M., Shergill, I. S., Williamson, M., Gommersall, L., Arya, N., & Patel, H. R.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp.
    Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

    (2005). Basic principles of real-time quantitative PCR. Expert review of molecular diagnostics, 5(2), 209-219.

  • Covid-19, SRAG e quantidade de testes diagnósticos no Brasil

    Temos visto muitas discussões sobre a reabertura do comércio em várias cidades que tinham optado pelo distanciamento social. Também tem aparecido dados de que a previsão que tínhamos de sobrecarga hospitalar não se efetivou (pelo efeito do distanciamento social, mesmo que parcial). 

    No post de hoje, vamos falar sobre alguns dados do Ministério da Saúde, de casos confirmados e óbitos por COVID-19 e, também, um outro registro que têm despontado – muito embora tenha sido pouco discutido – que deveria ser levado em consideração ao pensarmos nas ações individuais e coletivas para este momento em que vivemos…

    Então, antes de nos animarmos e sairmos (literalmente) comemorando os dados, é importante compreender um pouco sobre o que tem sido noticiado e alguns dados oficiais para pensarmos se já é hora de deixarmos o isolamento de lado ou, pelo contrário, se não seria hora de buscarmos medidas mais severas de isolamento para evitar que a sobrecarga chegue logo ali ao dobrar a esquina.

    Os dados do dia 21 de abril indicavam que no Brasil tínhamos 43.079 casos de COVID-19 confirmados, com 2.741 mortos confirmados. As projeções, no entanto,  se mostravam muito mais assustadoras. Para se ter uma ideia, em São Paulo por exemplo, o governo anunciou no dia 12 de março a projeção de 1% da população infectada em alguns poucos meses (cerca de 460 mil pessoas) em um cenário otimista, chegando a 10% da população do estado infectada em uma projeção pessimista (4,6 milhões de pessoas). Hoje, dia 21 de abril, temos a confirmação, no Estado de São Paulo, de 14.580 casos e 1037 óbitos.

    Então, será que podemos dizer que tudo anda bem?

    Vários estudos nos mostram muitos cenários possíveis para compreender os dados confirmados que temos sobre a COVID-19 e a infecção pelo novo Coronavírus (SARS-CoV-2). Primeiro, é fundamental lembrar que o Brasil tem a marca de uma das menores quantidades de testes para a confirmação ou não da  infecção pelo novo coronavírus por número de habitantes, no mundo. Comparado com dados de países como Itália, esse número é irrisório, pois lá tem-se 27,164 testes para cada 1 milhão de habitantes, segundo a Worldometers

    Também precisamos registrar aqui que os testes estão sendo feitos em doentes que apresentam sintomas mais severos. Isso O que não pode ser considerado uma “testagem maciça da população” , tal como preconizado pela OMS para direcionar políticas mais seguras no país.

    Tendo dito isso, como podemos analisar qual a quantidade de pessoas infectadas e óbitos em nosso país e região de fato? Existem alguns dados que nos ajudam a ver isto. 

    O Ministério da Saúde publica rotineiramente Boletins Epidemiológicos, que são documentos públicos técnico-científicos periódicos (mensais e semanais), de doenças variadas, para controle e monitoramento. Pois bem, o BE13 – Boletim COE Coronavírus, publicado no dia 20 de abril, Semana Epidemiológica 17 (19-25/04/2020), apresenta a situação epidemiológica dessa infecção no mundo e, também, no Brasil.

    Ao analisarmos este boletim, vemos que além dos casos de COVID-19, há outros dados que nos ajudam a perceber monitoramentos de outras patologias que que têm relação com os sintomas causados pelo novo Coronavírus (SARS-CoV-2).

    Os coronavírus causam infecções respiratórias, também chamadas Síndromes Gripais e em casos mais graves Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). A Síndrome Gripal se caracteriza por: febre, tosse e/ou dor de garganta e ao menos um dos seguintes sintomas: mialgia, cefaléia, artralgia, dispnéia conjuntivite, mal estar geral e perda do apetite. Já a Síndrome Respiratória Aguda Grave, além dos sintomas anteriormente citados, apresenta-se também dispnéia ou saturação de oxigênio menor que 95% em ar ambiente ou sinais de desconforto respiratório.

    Ambas as síndromes podem ter causas diversas, incluindo uma variedade de vírus Influenza, conhecido como vírus da gripe. Em humanos, tivemos a epidemia da SARS em 2003 m Hong Kong (China), cuja letalidade atingiu a marca de 10% e, também, a síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS), que ocorreu na Arábia Saudita em 2012, com uma letalidade de 30%. 

    E por que é importante entender isto para debatermos os casos de COVID-19?

    Voltando ao BE 13 – Boletim COE Coronavírus, na página 14 há um gráfico que mostra os registros de casos e óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave, comparativamente em 2019 e em 2020. A imagem abaixo foi retirada na íntegra do Boletim BE 13, citado anteriormente (página 14).

    Fonte: Ministério da Saúde, Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública, Boletim Epidemiológico 02.

    Ao somarmos a quantidade de casos de SRAG, de cada uma das 16 primeiras Semanas Epidemiológicas de 2019, observamos 12.017 casos de internação por SRAG. Neste mesmo período de 2020, foram registradas 55.980 internações com este diagnóstico. Deste total de casos de 2020, 8.318 (15%) foram de casos confirmados para COVID-19 e outros 42.817 estão em investigação (77%).

    Até a Semana Epidemiológica 49 de 2019, foram notificados 39.190 casos de SRAG, com 4.939 óbitos, sendo diferentes vírus Influenza (vírus da gripe) os principais responsáveis pelas internações e óbitos.

    O que estes dados nos dizem?

    O Ministério da Saúde indica um aumento de 366% de internações por SRAG. Do total de internações, 77% ainda não apresentam um resultado conclusivo sobre suas causas. Se considerarmos um cenário pessimista ao olhar este número, em que todos estas internações fossem confirmadas para COVID-19, praticamente dobraríamos a quantidade de casos confirmados no país.
    No entanto, sabemos que até a liberação desses dados os testes estão sendo feitos apenas em casos suspeitos que apresentam severidade de sintomas. A maioria das pessoas infectadas pelo novo coronavírus apresenta apenas sintomas brandos, ou até mesmo não apresentam sintomas (assintomáticos). E isto não seria um problema, a princípio! Afinal, não parece ruim que um vírus que nos infecte não cause danos a grande parte da população, não é mesmo? A questão, portanto, é: estas pessoas que não desenvolvem a doença com sintomas graves são infecciosas. Isto é: contagiam outras pessoas, mesmo não adoecendo gravemente da COVID-19. 

    Os testes diagnósticos não são importantes somente para termos noção se nós fomos infectados, individualmente. Mais do que isto, são uma ferramenta fundamental para gerar políticas públicas que embasem como agiremos no país, regiões, estados, municípios e bairros. Ao termos grande parte das infecções por SARS-CoV-2 não documentadas, acabamos por não reconhecer a dimensão do problema e um cenário fiel do espalhamento do vírus, o que pode levar a uma exposição ainda maior da população à doença.

    Em um estudo sobre a infecção não documentada de COVID-19 em Wuhan (China), apresenta dados que indicam que o isolamento destes casos é a medida mais eficaz para contenção da doença. É importante ressaltar aqui que o conceito de não documentados difere de assintomáticos. Isto é: infectados não documentados são aqueles sintomáticos ou assintomáticos que não foram testados e, portanto, não entram nas estatísticas mais precisas para o monitoramento da doença e seu contágio.

    Considerando que os sintomas (mesmo os mais brandos), aparecem em média no 5º dia após a infecção (mesmo os mais brandos), mas que há registros de estarmos na fase infecciosa de forma pré-sintomática (ou seja: contaminamos outras pessoas, mesmo antes dos primeiros sintomas aparecerem), não há como prever quem foi contaminado e quando essa contaminação aconteceu enquanto não minimizarmos o contato social – próximo (amigos e parentes) ou não (espaços de trabalho e comércio não essencial, por exemplo). 

    Estas análises citadas nos mostram que diferentes estratégias provavelmente foram responsáveis pela alteração das características epidemiológicas após o surto de 23 de janeiro, na China. Quais medidas? Inicialmente, aquilo que têm sido apontado em qualquer caso relacionado à COVID-19: medidas de restrição de circulação interna nas cidades com grande quantidade de casos confirmados e externa entre as cidades (o que chamamos de bloqueio total ou lockdown). Além disso, e que é o foco de debate aqui neste post de hoje, o aumento de casos diagnosticados (aumento de testes na população, saindo da estatística de “não documentados” para “confirmados”). Estes dados também são corroborados por outra pesquisa, também usando como modelo a COVID-19 na China. 

    Ao observar os dados da transmissão na China e todo o cenário brasileiro – que inclui aparentemente uma enorme quantidade de dados não documentados, pode parecer repetitivo o que seguimos afirmando, embora essencial. A letalidade da COVID-19, embora seja menor do que grande parte de outras doenças que acometem nossa sociedade, nos acarreta problemáticas que se vinculam à quantidade de pessoas infectadas. Isto é, um número aparentemente baixo, representando letalidade (2% ou menos dos casos infectados, ao que vários estudos vêm indicando), representam muitas pessoas no mundo inteiro quando percebemos que temos 2.831.513 de pessoas infectadas (casos confirmados no mundo inteiro, no dia 24 de abril de 2020).

    Todavia, temos também outra questão importantíssima: a quantidade de pessoas infectadas ao mesmo tempo e que precisam de internações e cuidados intensivos ao mesmo tempo. É exatamente por se alastrar muito, rapidamente e muito facilmente, que esta doença tem sido central em como vivemos os últimos meses e como viveremos nos próximos meses. Ter uma dimensão exata do número de infectados é, portanto, fundamental para sabermos os próximos passos de como vamos agir em nosso país/estado/município/bairro. 

    Projeções e estimativas

    Há alguns estudos que buscam realizar uma estimativa mais precisa do número de infectados no Brasil. Um grupo de pesquisadores da USP elaborou uma análise para avaliar a subnotificação, a partir de modelos epidemiológicos da COVID-19 em diferentes países (em que os testes diagnósticos foram realizados em uma proporção da população muito maior) e chegaram no valor de 93,45% de subnotificação, no dia 11 de Abril, Isto equivaleria dizer que tínhamos cerca de 313 mil pessoas infectadas com o coronavírus (repetindo: dia 11 de abril). Vocês podem conferir a projeção deste estudo aqui.

    Tomando como base estes dados todos elencados acima, considerando o número de óbitos da COVID-19, mas também as mortes por SRAG que não foram investigadas, há muito o que se pensar sobre a subnotificação e seu impacto em uma aparente “tranquilidade” na transmissão da doença, que provavelmente não condiz com o cenário real no Brasil.

    “Em suma”: o que tudo isto nos indica?

    Tem sido discutida a possibilidade relaxamento nas medidas de distanciamento social hoje adotadas por alguns municípios, de forma controlada. Não debateremos aqui, hoje, sobre a questão da economia – o que já foi apresentado em uma postagem específica no especial. Mas tendo em vista as pesquisas apresentadas e os dados brasileiros, com a possível subnotificação sem que haja uma discussão mais ampla publicamente, talvez seja muito cedo para pensarmos em um afrouxamento do distanciamento social e espacial…

    Em um próximo post (em breve), discutiremos de modo mais específico sobre o isolamento, no Brasil e em outros países do mundo…  

    Para saber mais:

    BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. (2013) Síndrome Gripal/Síndrome Respiratória Aguda Grave. Classificação de Risco e Manejo do Paciente.

    BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. CENTRO DE OPERAÇÕES DE EMERGÊNCIA EM SAÚDE PÚBLICA (COE). (2020). BE 13 – Boletim COE Coronavírus.

    BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE (2019). Boletim Epidemiológico 38. Influenza: Monitoramento até a Semana Epidemiológica 49 de 2019.

    GODOY. D. (2020). Brasil é o segundo país com mais pacientes graves do novo coronavírus. Revista Exame, 21 de abril de 2020.

    LANA, R.M.; COELHO, F.C.; GOMES, M.F.da C.; CRUZ, O.G.; BASTOS, L.S.; VILLELA, D.A.M.; CODEÇO, C.T. (2020) Emergência do novo coronavírus (SARS-CoV-2) e o papel de uma vigilância nacional em saúde oportuna e efetiva. Cad. Saúde Pública [online]. vol.36, n.3.

    PARANÁ. SECRETARIA DE SAÚDE. (s/d). Fluxograma de Síndrome Respiratória Aguda Grave.

    ROCHA, C. (2020). A dificuldade do Brasil de aplicar testes em massa na pandemia. Nexo Jornal, 10 de abr de 2020.

    TIAN, H; LIU, Y; LI, Y; WU, C-H; CHEN, B; KRAEMER, M.U.G; LI, B; CAI, J; SU, B; YANG, Q; WANG, B; YANG, P; CUI, Y; SONG, Y; ZHENG, P; WANG, Q; BJORNSTAD, ON; YANG, R; GRENFELL, B.T; PYBYS, O.G; DYE, C. (2020). An investigation of transmission control measures during the first 50 days of the COVID-19 epidemic in China. Science, 31 de Março. DOI: 10.1126/science.abb6105

    YANG, P., WANG, X. (2020). COVID-19: a new challenge for human beings. Cell Mol Immunol. https://doi.org/10.1038/s41423-020-0407-x

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp.
    Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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  • Como se detecta o coronavírus?

    A necessidade da realização de testes para o COVID-19 foi identificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) [1] devido a crescente pandemia mundial. Os testes a fim de detectar a presença do coronavírus (SARS-COV-2) são importantes, pois ajudam a mapear os epicentros virais de contaminação e, dessa forma, auxiliam na melhor escolha da estratégia de contenção do espalhamento do coronavírus. A detecção rápida e precisa do COVID-2019 é crucial no controle do surto.

    Tipos de testes para o Covid-19

    Basicamente, dois tipos de testes são realizados para diagnosticar a COVID-2019: um teste sorológico e um teste molecular denominado Reação em Cadeia da Polimerase — Transcriptase Reversa (RT-PCR).  [1]

    Teste sorológico

    Os testes sorológicos são teste rápidos capazes de identificar anticorpos em amostras de sangue ou saliva. Ou seja, eles não identificam diretamente o coronavírus. Eles detectam a resposta imunológica natural do nosso corpo que acontece na forma de anticorpos devido a presença do vírus. 

    testeCORONAVIRUS

    Teste molecular RT – PCR

    O teste molecular RT-PCR (Transcrição Reversa seguida de Reação em Cadeia da Polimerase) faz a detecção direta do material genético do coronavírus em amostra de secreção respiratória. O RT-PCR é capaz de detectar o vírus até mesmo em portador viral assintomático. Embora, esse teste seja recomendado para pessoas que possuam sintomas da Covid-19, com duração entre 3 e 7 dias.  

    Os testes de anticorpos também conhecidos como testes de sorologia não foram feitos para diagnosticar a infecção ativa pelo coronavírus.  Em vez disso, eles verificam se há proteínas no sistema imunológico, conhecidas como anticorpos. Sua presença significa que a pessoa foi exposta ao vírus e, por essa razão desenvolveu anticorpos a fim de combatê-lo. O que pode significar que a pessoa tem pelo menos alguma taxa de imunidade, embora os especialistas ainda não tenham certeza de quão forte a imunidade possa ser ou até quanto tempo ela durará. 

    Por outro lado, os testes para diagnóstico de COVID-19, até agora, usaram principalmente a técnica de laboratório conhecida como teste RT-PCR. Esse teste pode diagnosticar infecções ativas através de amostras de mucosas da boca ou nariz. Esse teste verifica a presença ou ausência do RNA do coronavírus. Por isso, é o teste de diagnóstico mais indicado para saber se há contaminação do SARS-COV-2. Para obter detalhes sobre o teste molecular RT-PCR do coronavírus, por favor, assista ao vídeo “Como detectar o coronavírus?”. 

    Por que usar RT-PCR em tempo real para detectar o coronavírus?

    A técnica de RT-PCR em tempo real é altamente sensível e específica [2] e, pode fornecer um diagnóstico confiável em apenas quatro horas. Embora, geralmente os laboratórios demorem em média entre 6 a 8 horas. Comparado a outros métodos de isolamento de vírus disponíveis, o RT-PCR em tempo real é significativamente mais rápido e tem um potencial menor de contaminação ou erros, pois todo o processo pode ser realizado em um tubo fechado. 

    Para detectar infecções passadas, o que também é importante para entender o desenvolvimento e a disseminação do vírus, o RT-PCR em tempo real não pode ser usado, pois os vírus estão presentes apenas no corpo por uma janela específica de tempo. Portanto, os testes de RT-PCR em tempo real não podem dizer se você já teve COVID-19 no passado; o teste foi projetado apenas para detectar a infecção viral em andamento.

    Textos do Especial sobre testes:

    Diagnósticos por RT-cPRC: o que é isso?

    Referências Bibliográficas

    1. Wang, Yishan, Hanyujie Kang, Xuefeng Liu, and Zhaohui Tong. “Combination of RT‐qPCR Testing and Clinical Features for Diagnosis of COVID‐19 Facilitates Management of SARS‐CoV‐2 Outbreak.” Journal of Medical Virology 92, 6, 538–39, 2020. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/jmv.25721
    2. “Polimerase Em Tempo Real e Métodos Para a Quantificação Do DNA.” Portal Educação, 2020. https://siteantigo.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/medicina/polimerase-em-tempo-real-e-metodos-para-a-quantificacao-do-dna/33826

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp.
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  • Lendo gráficos sobre a COVID-19

    Vemos cada vez mais nos jornais e outras mídias o uso de gráficos das mais variadas formas. Porém, uma pergunta relevante é: todo mundo sabe ler e interpretar estes gráficos? Conheça os principais tipos neste post!

    Estamos em uma época em que a troca de informações de forma rápida e eficiente é mais que necessária, não somente para pesquisadores que estão lutando para lidar com os problemas causados pelo coronavírus, mas para administradores públicos que precisam se organizar e para a população em geral que quer se manter informada. Logo é importante saber interpretar estes dados, para não acabar com visões distorcidas da realidade.

    Gráficos lineares

    Vamos pegar um exemplo:

    Gráfico de casos de COVID-19 no Brasil. Fonte: MonitoraCovid-19 (Icict/Fiocruz)

    Para a leitura de qualquer gráfico, começamos por identificar o que cada eixo representa. Neste exemplo, o eixo vertical representa o número de pessoas infectadas com o SARS-CoV-2 e no eixo horizontal representa a data desde o início da epidemia.

    Cada ponto neste gráfico representa um dado oficial de casos, isto é, são dados observados que mostram a situação real em um determinado instante. Já a curva formada pela ligação dos pontos é conhecida como interpolação linear, ela serve para termos uma noção do comportamento do número de casos entre cada medida experimental e dar uma idéia do comportamento geral dos dados, porém tem pouco poder preditivo sobre casos futuros.

    Gráficos logarítmicos

    Como o crescimento do número de casos é bastante rápido, sendo aproximadamente exponencial, é comum usar uma escala chamada “logarítmica” para mostrar os mesmos dados. Veja os mesmos dados em uma escala logarítmica:

    Gráfico semi-log de casos de COVID-19 no Brasil. Fonte: MonitoraCovid-19 (Icict/Fiocruz)

    Note a escala do eixo vertical. A cada trecho o valor é multiplicado por 10, essa é a principal característica que distingue um gráfico “linear” (isto é, uma escala proporcional) como caso anterior, e um gráfico em escala logarítmica. Neste tipo de gráfico distâncias iguais no eixo vertical não representam o mesmo acréscimo nos valores totais representados!

    Em especial, como somente o eixo vertical está em escala logarítmica, tendo o eixo horizontal sendo mantido em escala linear, este gráfico é comumente chamado de “semi-logarítmico” (ou semi-log).

    Quanto mais próximo de uma reta, mais o comportamento dos dados se aproxima de um comportamento exponencial. Podemos ver que nos primeiros dias o número de casos se multiplica por dez aproximadamente a cada oito dias, já nas últimas semanas temos uma diminuição na velocidade de aumento dos casos. Esta perda de força pode ser um bom sinal, isto é, que o número de pessoas sendo contaminadas pelos já doentes está diminuindo, ou um problema nos dados devido a subnotificação, uma vez que a falta de testes faz com que apenas casos graves sejam testados.

    Regressões

    Alguns gráficos, além de mostrar os pontos experimentais, mostram uma curva que representa uma função matemática que melhor descreve os dados reais. Esta curva é chamada regressão (ou projeção), e ajuda a ter uma ideia do comportamento geral dos dados e dá um poder preditivo maior em relação a uma simples interpolação linear.

    Gráfico linear com número de casos (linha sólida) e previsão para os próximos dias (linha pontilhada). Fonte: Painel Coronavírus Brasil (Fiocruz Bahia e UFBA)

    A confiabilidade dessas previsões depende muito do modelo matemático implementado, então é necessário buscar gráficos de fontes confiáveis como a Fiocruz.

    Conclusão

    Com a imensa chuva de informações que recebemos nesta época de pandemia, é necessário ter cuidado dobrado ao interpretar estes dados. Confira como estes dados estão passados para que você possa ter uma idéia concreta da situação e busque sempre fontes confiáveis para se informar!


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