Categoria: Vacinas

  • Por que precisamos tomar a segunda dose das vacinas de COVID-19

    Um levantamento do Ministério da Saúde do dia 07 de Junho de 2021 mostrou que 49.584.110 pessoas receberam a primeira dose da vacina contra o SARS-CoV-2. Deste montante, 23.026.663 receberam as duas doses. Olhando assim, parece um número muito bom. No entanto, até meados de maio, aproximadamente 5 milhões de brasileiros tomaram a primeira dose de uma das vacinas contra a COVID-19, mas não voltaram para a segunda dose.

    Será mesmo que a segunda dose é fundamental? Você sabe porque ela é importante?

    Um lembrete para o seu corpo

    A vacina funciona como uma forma preventiva para que seu corpo já saiba criar uma resposta para o agente causador da doença, no caso o vírus SARS-CoV-2. A CORONAVAC usa uma tecnologia bem conhecida, a de vírus inativado, enquanto que a vacina da ASTRAZENECA usa um adenovírus que não consegue se replicar no nosso corpo e a da PFIZER uma mensagem codificada que faz nosso corpo reconhecer a proteína spike do vírus. Vocês podem ler um texto que falamos sobre as diferenças de vacinas aqui

    Independente de qual das três vacinas você tomar, é necessária uma segunda dose. Isso acontece porque o primeiro contato com as vacinas criará uma resposta do seu sistema imune. Mas não tão forte quanto a prevenção com duas doses. A segunda dose funcionará como um lembrete para o seu corpo saber que aquele vírus segue por aí. Assim, consequentemente aumentará a sua resposta.

    Além disso, alguns estudos ainda estão sendo feitos para compreender melhor como o corpo responde a essas vacinas. Os estudos da CORONAVAC garantem a eficácia da imunização após a segunda dose, mas ainda não possui nenhum estudo de apenas uma dose. Já a vacina da ASTRAZENECA possui uma eficácia de 76% após a primeira dose, e aos poucos o corpo “esquece” essa resposta no intervalo de 3 meses, por isso é necessária a segunda dose, que eleva a eficácia para aproximadamente 82% (Fonte: FioCruz). Já a Pfizer possui uma eficácia geral de 85% depois da primeira dose e 95% após as duas doses. Vale sinalizar que inicialmente o intervalo entre as doses da Pfizer era de 21 dias, mas depois foi alterado de acordo com um novo estudo em pré-print

    Confusão entre o tempo de espera de cada tipo de vacina

    A falta de informação a respeito do porquê tomar a segunda dose da vacina não é o único problema. Os diferentes intervalos entre as doses das vacinas também causam confusão. A CORONAVAC possui um intervalo de aproximadamente 20 dias, enquanto que o intervalo das doses de ASTRAZENECA é de 3 meses. Aqui no Brasil, a vacina da PFIZER também está seguindo o intervalo de 3 meses, em acordo com o resultado do estudo citado acima. 

    Por conta da quantidade de nomes, é fácil de se confundir. A falta de padronização na escrita da carteirinha de vacinação também é um ponto crítico. Muitas vezes a CORONAVAC está escrita “Butantan” ou “Sinovac” e a vacina da ASTRAZENECA fica registrada como “OXFORD” ou “FIOCRUZ”.

    Fique atento a sua carteirinha e a de seus familiares! Se tiver dúvida, não hesite em perguntar para a pessoa que estiver aplicando. Confira a data que estiver agendada na carteirinha. Evite perder o prazo entre as doses!

    Mas e a vacina da Janssen/Johnson & Johnson?

    Essa vacina já teve seu uso aprovado em caráter emergencial no Brasil, mas ainda não chegou nenhuma dose no país. Ela utiliza uma tecnologia de adenovírus semelhante à vacina da ASTRAZENECA. Nos estudos realizados até agora, apresentou uma eficácia desejável mesmo com apenas uma dose. Caso tua intenção seja tomar só uma dose, mas tua categoria (por idade, profissão ou comorbidade) chegue antes disso: não vale esperar! Vai e te vacina logo, pois precisamos de muita gente vacinada, rápido!

    Falta de doses de vacinas

    Outro problema encontrado é a falta de vacinas. Em um primeiro momento foi orientado aos municípios que guardassem a segunda dose das pessoas que estavam sendo imunizadas, para que elas não acabassem. Depois, em 20 de março todas as doses foram destinadas à primeira imunização de um grupo maior de pessoas, uma notícia sobre isso você pode conferir aqui. No dia 25 de abril o Ministério da Saúde voltou atrás e pediu para que 50% das doses recebidas fossem guardadas, mas isso não evitou que centenas de cidades, incluindo 13 capitais estaduais, ficassem sem doses. Essa série de erros também contribuiu para que diversas pessoas não conseguissem tomar sua segunda dose.

    Nós temos reiterado que esta confusão faz com que a gente realmente fique inseguro com tudo o que está acontecendo! Por isso sempre reforçamos: pergunte, se certifique das datas, cobre por informações e, na dúvida, chegue junto que a gente tenta responder também!

    Mais doses?

    Tem mais debate por aí falando em terceira dose. Mas fique atento! Por enquanto não existem dados suficientes que comprovem a necessidade de tomar mais doses da vacina. Ou mesmo se teremos que tomar a vacina em intervalos de tempo pré-definidos, assim como tomamos a vacina da gripe, difteria, tétano e HPV.

    E se eu tomar vacinas diferentes?

    ATENÇÃO! Em alguns países, como a Espanha, a combinação de doses de diferentes vacinas já está sendo testada. Apesar disso, no Brasil a ANVISA ainda não autorizou nenhum tipo de combinação. Caso queira saber mais sobre um dos estudos preliminares, leia aqui.

    Isso se dá ao fato de que  ainda estão sendo realizados estudos que comprovem uma resposta imune melhor se misturarmos as vacinas, ou até mesmo se existe algum tipo de interação entre as vacinas que possa ser prejudicial. Caso você tenha tomado doses trocadas de vacinas, é recomendado informar no posto de saúde o problema e aguardar instruções específicas para o seu caso. 

    Eu preciso manter medidas de segurança mesmo depois da segunda dose?

    Sim! Mesmo tomando as duas doses seu corpo ainda demora alguns dias para criar uma resposta e você ainda pode ser infectado de maneira leve pelo vírus. Além disso, mesmo com as duas doses, você pode ser um agente transmissor.

    Por fim, ainda temos a questão de que a vacinação em nosso país está lenta, há poucas pessoas vacinadas (MUITO POUCAS). A vacinação é um evento efetivo QUANDO EXECUTADO EM MASSA. Isto é, em uma grande parcela da população – não estamos nem perto disso ainda! Por enquanto, no Brasil as recomendações permanecem as mesmas: Máscara e distanciamento! Além do clássico: se puder, fique em casa!

    Para Saber Mais

    Barifouse, R (2021) Covid-19: os erros que levaram centenas de cidades a suspender vacinação por falta de 2ª dose, BBC Brasil

    Callaway, E (2021) Mix-and-match COVID vaccines trigger potent immune response, Nature 593, 491 (2021) doi: https://doi.org/10.1038/d41586-021-01359-3

    Da Redação (2021) Ministério da Saúde muda orientação e libera vacinas armazenadas para uso como 1ª dose, G1

    LedFord, h (2021) Delaying a COVID vaccine’s second dose boosts immune response, Nature

    Rangel, D, Lang, P (2021) Vacina Covid-19 Fiocruz tem eficácia geral de 82%. Notícias, Fiocruz

    Voysey, Merryn (…) and Pollard, Andrew and Group, Oxford COVID Vaccine Trial, Single Dose Administration, And The Influence Of The Timing Of The Booster Dose On Immunogenicity and Efficacy Of ChAdOx1 nCoV-19 (AZD1222) Vaccine. Available at SSRN: https://ssrn.com/abstract=3777268 or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3777268 

    Este texto foi escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Personalidades da vacina: os altruístas, os fiscais e os sommeliers!

    [Sugestão é vocês lerem este texto ouvindo este som]

    Estamos em uma etapa de vacinação que inclui, além de idade (seguimos com a vacina para pessoas acima de 60 anos), comorbidades, gestantes e lactantes, além de profissões específicas.

    A vacinação, que era para trazer uma parca esperança em meio a tudo o que temos vivido em nosso país, tem sido questionada em muitos aspectos que tornam tudo ainda mais difícil.

    Sommeliers de vacina

    Por um lado, temos visto pessoas percorrendo postos de saúde atrás ‘da vacina que eu quero tomar’, seja por receio de reações adversas, seja por ter vontade de tomar “aquela que tem maior eficácia”, ou qualquer outro motivo que apareça pela frente.

    Temos chamado estas pessoas de sommelier de vacina. Sommelier são aqueles profissionais dedicados a “provar” e “degustar” produtos específicos – vinhos, queijos, cervejas, por exemplo. Parece chique, né? Na verdade é chique. 

    Mas não quando diz respeito à vacina! Entretanto, cabe a pergunta: qual vacina é boa? Há quem diga que várias vacinas são só “água com açúcar e só a fulaninha que presta”.

    Olha, quando se trata de 465.000 mortos em nosso país, a vacina boa é a que chega em nosso braço. Isto é, cobiçar a vacina de um dado fabricante e adiar sua imunização até poder acessar a queridinha do momento não é apenas descabido. É desrespeitoso. É um ato atroz com os milhares de brasileiros que aguardam sua vez no Plano Nacional de Imunização.

    Precisamos vacinar muito e precisamos vacinar rápido.

    Estas ações atrasam ainda mais nosso calendário e fazem permanecer aberto o cronograma de vacinação para uma faixa específica que poderia estar mais avançada.

    Esta confusão toda pode, sim, ser fruto de uma comunicação truncada que dá a entender que a vacina X em relação à Y é melhor.

    Neste sentido, os resultados recentes da CORONAVAC no município de Serrana enchem de esperança o que mais acreditamos: vacina boa é vacina no braço dos brasileiros e vacinação em massa funciona E MUITO! Ademais, lembramos que ela também acabou de ser aprovada em caráter emergencial na OMS, o que indica que ela é segura, eficaz e de qualidade.

    Com 75% da população do município coberta pela Coronavac (95,7% da população vacinável), Serrana viu suas internações, óbitos e registros de doentes despencar nas últimas semanas. Todavia, sim, precisamos dos dados abertos e verificáveis e precisamos dos dados e sua distribuição por faixa etária discriminados o quanto antes para nos debruçarmos e compreendermos todo o processo. Entretanto, os dados que nos foram apresentados até o momento nos mostram que cobertura vacinal é fundamental para enfrentarmos a pandemia!

    Mas há quem não queira tomar vacina pelas reações…

    [pausa dramática, respira fundo]

    como se nunca tivesse acompanhado crianças na família e visto os choros de dor, febre ou outras reações nos pequenos. Vacina pode dar reação, febre, dor no corpo, sonolência, enjoo por exemplo. Ou seja, ninguém nega isto.

    Todavia nenhuma destas reações se compara há semanas entubado, sem contato familiar, em uma situação de quase morte. Assim como, também não se compara ao risco de contaminarmos inúmeras pessoas e, mesmo estando com sintomas leves, levarmos pessoas a serem entubadas por COVID-19 pelos contatos que seguem vigentes na nossa vida.

    E antes que me achem exagerada, é bom lembrar que família contamina família, que temos filas de espera em UTIs e que seguimos com números altíssimos de contaminações e mortes. Nenhum medo de enxaqueca e febre deveria se sobrepor à possibilidade de nos contaminarmos e contaminarmos a quem está próximo de nós.

    Em suma, é só uma febre, vai passar.

    Os altruístas

    O outro lado da moeda tem sido as pessoas que começam a despontar no PNI como as próximas a serem vacinadas. Elas podem, suas documentações pessoais a fazem legalmente vacináveis, mas elas não se vacinam. Por quê? Por terem pessoas “que merecem mais do que eu”, costuma ser a resposta. Outra bem recorrente é “não acho justo quando há outros que não se vacinaram ainda”, e, por último “eu me encaixo, mas prefiro deixar para a próxima vez quando chegar”.

    O caso comum dos altruístas são as profissões. Várias profissões dão direito à vacina. Neste caso, o PNI deixa claro que os municípios e estados devem observar os critérios que considerarem pertinentes para estabelecer a vacinação de várias destas profissões.

    Eu posso, mas não devo: altruísmos às avessas

    Assim, os altruístas são as pessoas que mesmo tendo o direito, acham que é justo pular a vez e deixar para a próxima.

    Os fiscais (que falarei mais adiante) são os que acham que estes profissionais só podem se vacinar quando eles (os fiscais) acharem que devem ser vacinar.

    Nenhum dos dois está lá muito correto. Embora vacinar-se seja uma escolha (teu corpo, tuas regras, etc.), é um ato coletivo de proteção. Dessa forma, neste momento, temos mais de um milhão de casos de COVID-19 em acompanhamento. Ontem, dia 1º de junho de 2021, tivemos 78.926 confirmações de COVID-19 em nosso país e mais do que 2 mil mortes.

    135 dias depois de começar a vacinação em nosso país, tivemos 265 mil mortes. Nestes 4 meses e alguns dias tivemos mais mortes pela doença do que o ano passado inteiro. Aceleramos as mortes e os contágios quando vários países começam a abrir comércio e vivenciar a experiência de controle da doença em seus territórios.

    Nós não estamos nem próximo disto. Não é, portanto, altruísta abrir mão de vacinas que foram contabilizadas e estão à disposição. Tua vacina está lá, te esperando. Tu achares que o PNI não é justo, não modifica o PNI, não “adianta” as datas de categorias que começam a aparecer à revelia do que pode parecer justo, bom, emergencial ou interessante. Tu não te vacinares só faz com que menos uma pessoa, agora, esteja vacinada e com condições de diminuir a circulação do vírus.

    E isto é emergencial.

    Em suma, o altruísmo, neste momento, é se vacinar quando chegar a tua vez. A vacina é um processo que funciona em uma massa de pessoas – e para isto precisamos de uma massa vacinada. Abrir mão do teu direito não faz com que a vacinação ande mais depressa, não faz uma massa ser vacinada. Este é um altruísmo às avessas por estarmos em um momento delicado, triste e que apenas denota nossa fragilidade em vencer esta doença.

    Não era para, neste momento, estarmos debatendo quais categorias deveriam ou não estar vacinadas, por um motivo muito simples: nosso país sempre foi exemplo de estrutura e organização de vacinação no mundo, com doses para todos, calendário preciso, com campanhas eficazes, bem feitas, sólidas e robustas em todas as suas etapas.

    Fiscais de fila

    É um desserviço julgarmos quem está com lugar na fila, desencorajando as pessoas a tomarem vacinas e as tomando como fura-filas SE ELAS NÃO SÃO FURA FILA.

    Concomitante ao fenômeno altruísta, há as pessoas que viraram fiscais de comorbidades e profissões e julgam qualquer pessoa que apareça com a vacina no braço – o que fortalece ainda mais quem se sente culpado por estar se vacinando.

    Primeiramente, é fundamental apontar o quanto fiscal de comorbidade e de profissão é um cargo cruel em um país que, desde que a Campanha de Vacinação por COVID-19 começou em nosso país, matou 265 mil pessoas confirmadas por COVID-19 (fora casos não confirmados para a doença).

    Há, também, aqueles fiscais de obesidade, perguntando se o IMC da pessoa ultrapassou 40. Pior ainda são aqueles que acham que obesos não devem se vacinar pois são relaxados, relapsos, dentre outros xingamentos que não caberiam em um veículo como este.

    Ainda sobre comorbidades, não é que avisemos a todos o que nos acompanham ao longo da vida quais doenças e condições temos ou deixemos de ter. Acusar levianamente é cruel, insensível e não faz sentido. Ninguém é obrigado a apontar, cotidianamente para conhecidos, amigos próximos ou até familiares, que comorbidades nos acompanham.

    Ah! Ana, mas tem gente furando fila com atestado falso.
    – Sim… verdade. E isto é horrível Mas o Brasil também tem muitas pessoas com comorbidades e não és tu, alecrim dourado, a pessoa que sabe todas as que existem e todas as pessoas afetadas por elas, é?

    A rede social virou palco de guerra com pessoas indo perguntar “qual comorbidade”? Não há muitas palavras para narrar o constrangimento que tem sido imputado às pessoas que estão celebrando a vida e celebrando um DIREITO a permanecerem vivas.

    Nós compreendemos que o PNI poderia organizado-se de forma a não ocorrerem incoerências entre municípios e estados, com datas confusas e regras divergentes.

    O que não é justo é esta confusão que já está presente nos documentos oficiais gerar culpabilização de pessoas e inadimplência no comparecimento à vacina!

    Precisamos que vocês se vacinem: quando integramos o grupo #TodosPelasVacinas não foi para que as pessoas se sentissem culpadas de terem esta oportunidade, para termos fiscais de plantão e para questionarmos os atos de vacinação. 

    Foi para que todos conseguissem acesso à vacina e, quando chegasse seu dia: SE VACINASSEM.

    Seguiremos neste propósito, firmemente. A vacinação é uma política pública, deve ser organizada pelos setores públicos – como sempre foi – e é um absurdo ser cobrado de indivíduos que estão legalmente cotados para vacina que não se vacinem por julgamentos estapafúrdios (de “diplomas velhos” à “ideias de minha cabeça” ou “não concordo pois esta comorbidade não me interessa que exista”).

    Se chegou tua vez, é teu direito, é nossa defesa, é proteção a todos: VACINE-SE

    Para saber mais

    BRASIL, Ministério da Saúde (2021a) Plano Nacional de Vacinação COVID-19 5ª Versão

    ____ (2021b) Plano Nacional de Vacinação COVID-19, 6ª Versão

    ____ (2021c) Saúde antecipa vacinação de trabalhadores de educação e autoriza imunização da população geral por idade

    ____ (2021d) NOTA TÉCNICA Nº 717/2021-CGPNI/DEIDT/SVS/MS

    CONASEMS (2021) Nota Técnica PNI 06-05-2021

    WORLDMETERS COVID-19, acessado em 1 de Junho de 2021. 

    Este texto foi escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, pares da mesma área técnica-científica da Unicamp revisaram o texto. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Para além das vacinas: a dependência tecnológica e financeira brasileira

    Por Ulisses Rubio

    Recentemente tem se comentado sobre a dependência do Brasil com relação ao desenvolvimento de vacianas e em relação à fabricação dos insumos necessários para fabricá-las, os IFAs. No entanto, não é somente em momentos de dificuldade para importar que se pode ver a dependência Brasileira. Uma maneira de evidenciar esta dependência é analisando o balanço de pagamentos.

    Balanço de Pagamentos é o conjunto de contas através do qual um país elenca e calcula, em valores monetários, todas as transações entre seus residentes e não residentes. Visto por certa perspectiva, este Balanço mostra quanto de Dólares está saindo do país e quanto de Dólares etá entrando no país. Quando o saldo das transações entre residentes e não residentes é positivo, o país acumula Dólares. Caso contrário, há perda de Dólares. Uma vez que praticamente tudo o que um país compra do exterior deve ser pago em Dólares, obter Dólares é imprescindível. Dito de outra maneira, exportar é imprescindível. Mas, olhar para isto é ver somente parte do problema. E, ainda assim, estaríamos olhando bem superficialmente para esta parte do problema.

    Balança Comercial

    Expliquemos mais. O que os residentes no Brasil podem comprar de não residentes se resume a bens e serviços. Mas, os residentes no Brasil também podem vender bens e serviços para não residentes. Como ilustra a Figura 1.

    Figura 1: Balança Comercial (Bens e Serviços). Estamos construindo uma ilustração simplificada para o Balanço de Pagamentos.

    No caso dos bens, até que o Brasil consegue manter um saldo positivo (vende mais do que compra). Como podemos visualizar no Gráfico 1, após 2001 o saldo foi praticamente sempre positivo. Mas este saldo não é folgado e, portanto, suscetível de se tornar um saldo negativo (isto é, perda de Dólares), como foi a tendência entre 2012 e 2014. A despeito disso, o problema mesmo é com os serviços. O saldo entre os serviços que os residentes no Brasil vendem para não residentes menos o que compram de não residentes é persistentemente negativo e em valor monetário nada desprezível (Gráfico 2). Quando juntamos bens e serviços percebemos uma oscilação entre períodos com valores negativos e períodos com valores positivos, mas com os saldos negativos sendo mais persistentes e atingindo maiores magnitudes (Gráfico 3).

    Opa! Vamos respirar um pouco. Até agora falamos de bens e serviços. O Brasil vende muitos bens. Também compra muitos. O problema maior são os serviços, que o Brasil compra bem mais do que vende. Em resumo, nestas contas podemos notar a dificuldade em evitar períodos de saídas de Dólares. E… bem… vocês sabem… nós não fabricamos Dólares. Precisamos obtê-los.

    A Conta Financeira

    Mas aí vem a outra parte do problema. Digamos que somando o que os residentes no Brasil vendem para não residentes seja inferior ao que compram. Não dá para ficar saindo Dólares do país por muito tempo né? Aí entra a conta financeira. Em resumo esta conta abrange todo o dinheiro de residentes que é investido fora do país  menos todo o dinheiro de não residentes que é investido país (Brasil). Há duas formas principais de não residentes colocarem seu dinheiro no Brasil: se eles compram ou constroem uma empresa (é o chamado investimento direto) ou se eles compram papéis no mercado financeiro (chamado investimento em carteira). A ilustração pode ser vista na Figura 2.

    Figura 2: A Conta Financeira (Adicionada à figura da Balança Comercial – Bens e Serviços). Estamos construindo uma ilustração simplificada para o Balanço de Pagamentos.

    Se estiver entrando mais dinheiro (tecnicamente chamam de capital) do que saindo, o país está obtendo mais Dólares. Repare que para esta conta os saldos negativos significa entradas de Dólates (portanto, inverso ao que é para as outras contas). Em geral, este é o caso do Brasil. Como podemos ver nos Gráficos 4, 5 e 6, os saldos são predominantemente negativos, significando que entram mais investimentos de não residentes do que saem investimentos de residentes para o exterior. Isto significa entrada de Dólares, contribuindo para contrabalançar as saídas de Dólares devido aos períodos de saldo negativo na Balança Comercial de Bens e Serviços juntos.

    A conta Rendas

    Para muitos, atrair estes capitais deve ser a meta número um do Brasil. Mas, de outro ponto de vista, podemos ver que esta necessidade de atrair capitais externos pode trazer problemas. Este dinheiro não vem de graça, não é? Eles esperam se transformar em mais dinheiro ainda. Isto é, os investidores externos esperam receber de volta ou lucro, ou juros, ou dividendos (aquilo que as empresas na Bolsa de Valores pagam para quem tem ações dela). Começamos assim a falar da conta de Rendas. Esta é o saldo daquelas rendas que os residentes no Brasil recebem por terem investido seu dinheiro (capital) em outros países menos o que os não residentes recebem por terem investido seu dinheiro (capital) no Brasil  (algumas rendas derivadas do trabalho também entram na conta de rendas, mas é valor pouco significativo). Esta relação pode ser vista na Figura 3.

    Figura 2: A Conta Rendas (Adicionada na Figura 2). Temos uma ilustração simplificada para o Balanço de Pagamentos, mas suficiente para nosso objetivo no artigo.

    No caso do Brasil, a soma de valores de renda que é recebida por não residentes é bem maior do que o valor da soma que os residentes no Brasil recebem por investirem o seu dinheiro fora do Brasil, gerando saldos negativos contínuos na conta de Rendas (isto é, saída de Dólares), como podemos observar nos gráficos 7, 8, e 9.

    Transações Correntes

    Quando a Balança Comercial (Bens e Serviços) é somada à Conta de Rendas, temos as Transações Correntes: a soma das transações de bens, serviços e rendas. Como entre estas três contas somente há saldos positivos mais persistentes nas transações de bens, este saldo positivo não é suficiente para contrabalançar os saldos negativos nas contas de serviços e de rendas. De modo que os saldos em transações correntes são persistentemente negativos (ou seja, há saídas de dólares), como podemos observar no Gráfico 10.

    E como o Brasil paga por isto? Como obtemos os Dólares para pagar estes saldos negativos? Bem.. no geral são duas maneiras: 1) ou atrai ainda mais investimentos de não residentes (investimentos externos) ou 2) tenta ter saldos positivos na balança comercial. Aí vocês olham e dizem: – Eita!! Mas tem algo aí! Onde isto vai chegar? Considerando a opção 1: vem dinheiro; para pagar a remuneração deste dinheiro precisa que mais dinheiro de fora venha pro Brasil; este círculo é infinito?

    Como resposta, só posso dizer: – pois é! Pode ser que não. E muito provavelmente não será. Pode ser que chegue um momento que os não residentes não queiram mais trazer seus dinheiros (capitais) para o Brasil. O leitor otimista certamente me chamaria a atenção: – ainda bem que ainda tem a opção 2, né? Respondo: – Sim, tem. Mas não é tão simples.

    A dependência vista pelo Balanço de Pagamentos

    O problema é que em geral o Brasil exporta bens e serviços de baixa tecnologia e importa bens e serviços de alta tecnologia. Como os preços das mercadorias de baixa tecnologia aumentam e diminuem com maior rapidez, pode acontecer que mesmo exportando mais o Brasil não consiga obter tantos Dólares porque o preço, em Dólares, baixou.

    Ainda que não aconteça de o preço dos produtos que o Brasil exporta diminuírem (ou não diminuírem muito), ainda temos outro problema. Quando se diz que a economia vai bem, em geral, se diz que o PIB (Produto Interno Bruto) está crescendo. Se diz isto porque quando o PIB cresce significa que a renda dos brasileiros está crescendo também: isto é, mais lucros e mais salários. Bem… Se o total de lucros e salários está aumentando, este aumento não vai ficar paradinho, né? Em geral, ou vai para o consumo (gastos das famílias), ou para investimentos (empresas decidindo comprar coisas para aumentar a quantidade que podem produzir).

    [porém]

    Acontece, minha cara ou meu caro leitora(o), que para aumentar a capacidade produtiva como um todo, em geral, é necessário importar máquinas e equipamentos (lembram das importações de alta tecnologia?) e muitas destas importações são acompanhadas de compra de serviços, como fretes e manutenção (lembra da balança de serviços?). Ou seja, para tudo isto precisamos de Dólares. Num momento em que pessoas de fora do Brasil não estão interessadas em trazer os seus dinheiros para cá, fica difícil de o Brasil obter os Dólares necessários para manter estas importações de bens e serviços.

    Finalmente está aí exposta a dependência financeira e tecnológica do Brasil. Não produz aquilo que é necessário para manter um crescimento do PIB. Então é necessário importar. Mas para importar precisa de Dólares. Se não entram Dólares porque os não residentes estão receosos de trazerem seus capitais para o Brasil, este país fica com dificuldades para manter suas importações. Com isto, fica difícil manter o crescimento, manter o número total de empregos. Assim, se entram Dólares através de investimentos externos, isto tende a prejudicar nossa capacidade futura para importar devido à saída de dólares para remunerar os capitais investidos (a conta de Rendas).

    O autor

    Ulisses Rubio Urbano da Silva, Graduado em Ciências Econômicas pela UNESP. Mestre e Doutor em Desenvolvimento Econômico pelo Instituto de Economia da UNICAMP, enfatizando estudos em História Econômica. Pesquisas em Pensamento Econômico Brasileiro, em diálogo com Pensamento Social Brasileiro. Atualmente leciona Economia e disciplinas da área de Administração no CECA/UFAL.

    Este texto foi escrito originalmente para o blog Sobre Economia

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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  • Ciência para Crianças! Como funcionam as vacinas

    Por Giovanna S. Veiga e Carolina S. Mantovani

    No quadrinho anterior, Dragonino ficou sabendo que os cientistas já desenvolveram vacinas contra o novo coronavírus. Não perca o videoclipe do MC Fioti e as informações que Draco trouxe sobre a vacina do Butantan! Dragonino ficou muito feliz com a novidade, mas ainda não sabe muito bem como funcionam as vacinas. Você já sabe?

    Para resolver isso, hoje Draco vai explicar melhor sobre as vacinas! Sistema imunológico, patógenos, vírus inativados, células de defesa, anticorpos, memória imunológica… junte-se ao Dragonino e venha descobrir o que isso tudo tem a ver com as vacinas!

    Quadrinhos da série "Ciência para Crianças!", com o tema "Como funcionam as vacinas".

    Obs.: após esses quadrinhos terem sido elaborados, surgiram notícias sobre algumas vacinas já estarem sendo testadas em crianças e adolescentes também. Assim, espera-se que em breve esse grupo possa ser incluído na fila da vacinação, respeitando a ordem das prioridades.

    O que você achou das explicações do Draco sobre como funcionam as vacinas? No próximo quadrinho, vamos entender sobre a importância da vacinação em massa para gerar a “imunidade de rebanho”. Não perca!

    Fontes de informações:

    Equipe: 

    • Design, pesquisas e roteiro: Giovanna S. Veiga e Carolina S. Mantovani

    Este texto foi escrito originalmente no blog Nas Asas do Dragão

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Ciência para crianças! A vacina do Butantan

    No quadrinho anterior, pudemos acompanhar o pequeno Dragonino aprendendo sobre o que são os vírus. Antes disso, Dragonino também aprendeu sobre a importância do isolamento social para combater a pandemia de Covid-19. Hoje, Draco explicará a seu filho como a ciência deu mais um importante passo nessa batalha! Venha junto com o Dragonino para conhecer mais sobre a vacina do Butantan!

    Quadrinhos da série "Ciência para Crianças!", com o tema "A vacina do Butantan".

    Os cientistas de diversas partes do mundo estão trabalhando bastante para ajudar a combater o novo coronavírus! Algumas vacinas que foram desenvolvidas em diferentes laboratórios já foram testadas, aprovadas e estão sendo produzidas e distribuídas para a população.

    Draco e Dragonino estão muito felizes com o início da vacinação, mas sabem que ainda é preciso manter todos os cuidados. Ainda não é hora de voltar a fazer aglomerações ou sair de casa sem usar máscara! É preciso ter paciência e esperar até que a maioria da população esteja vacinada. Só assim será possível reduzir a circulação do vírus e garantir que menos pessoas fiquem doentes.

    Enquanto isso, que tal aproveitarmos para aprender mais sobre como as vacinas funcionam? Fiquem de olho nos próximos quadrinhos, pois Dragonino está muito curioso e ainda tem muitas dúvidas que precisam ser esclarecidas!

    Fontes de informações:

    Equipe: 

    • Design, pesquisas e roteiro: Giovanna S. Veiga e Carolina S. Mantovani

    Este texto foi escrito originalmente no blog Nas asas do dragão

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • P.1 e a CoronaVac: é verdade que não precisa mais vacinar? (Spoiler, precisa sim!)

    Texto escrito por Ana Arnt, Marcelo Mori, Alessandro Farias e José Luiz Modena

    Vocês devem ter escutado falar da nova linhagem P.1 de SARS-CoV-2 e como ela é fracamente neutralizada por anticorpos gerados durante infecções prévias ou vacinações. Talvez tenha recebido notícias junto de mensagens como “sinto muito para quem se vacinou” ou “não adianta mais se vacinar”. Será mesmo?

    Bom, hoje nós viemos falar sobre este estudo que está sendo muito veiculado na mídia e, mais do que isto, vamos apontar os cuidados necessários com estas mensagens que estão chegando para vocês (lá ao final do texto!).

    Mas antes, um spoiler:

    Então chegou o dia da minha vacina,
    eu devo desencanar e nem ir?
    Não! Não é isto que estamos dizendo – e já temos bastantes desinformações alarmistas a este respeito rondando e alardeando contra esta vacina! Mas calma! Os resultados precisam ser interpretados com cautela. Isto dito pelos próprios pesquisadores deste estudo! Inicialmente, em função de os anticorpos neutralizantes serem apenas um dos componentes do sistema imunológico!
    E quem somos nós na fila do pão para falar deste artigo?

    Bom, a divulgadora científica oficial do Grupo de Pesquisa EMRC e (tcharãm) os pesquisadores do EMRC que participaram do artigo (hehehe). Acho que a gente consegue falar um tantinho sobre isto sim (seja para acalmar os ânimos, seja para explicar o estudo melhor)! Vem com a gente!

    A covid, o Brasil e a ciência

    O Brasil é o segundo país mais afetado pela epidemia de COVID-19, logo atrás dos EUA. Isto em quantidade de casos e números de óbitos. Isto considerando que não fazemos a quantidade de testes e rastreio suficiente para termos dados precisos! Estamos chegando, no dia de hoje, a 260 mil mortos. Esperamos, ainda e ansiosamente, por medidas duras para contenção do vírus, tanto quanto pela vacinação em massa. Medidas que só podem ser feitas e implementadas pelas instâncias governamentais – sejam municipais, estaduais ou federal.

    Enquanto isso, a ciência não para e segue buscando compreender melhor o vírus, sua evolução, desenvolvimento e as relações entre as novas variantes e as vacinas disponíveis à população no mundo.

    A CoronaVac e a P.1

    Em estudo recente, conduzido por 10 instituições brasileiras, UNICAMP, USP e CNPEM entre elas, e em colaboração internacional com instituições como Universidade de Oxford, foram obtidos resultados ainda preliminares, mas importantes sobre a capacidade de anticorpos gerados por indivíduos recuperados da COVID-19 ou indivíduos vacinados com a CoronaVac (Sinovac) de neutralizar, ou seja inativar, a nova variante P.1 de SARS-CoV-2.

    A P.1 é a variante que emergiu no Brasil no final de 2020 em Manaus e tem sido debatida em jornais e veículos de notícias nacionais e internacionais que já apontam sua presença em todas as regiões brasileiras e vários outros países.

    O estudo ainda está em fase de preprint. No entanto, ressalta-se sua relevância em função da vacina CoronaVac ser uma das vacinas mais presentes em solo brasileiro. O estudo investiga anticorpos presentes no plasma na fase de covalescência em pessoas infectadas previamente. Os resultados indicam que estes anticorpos possuem capacidade neutralizante reduzida para a nova linhagem P.1. Isto comparando-se com resultados obtidos com uma linhagem circulante nos primeiros meses de epidemia do Brasil. O resultado foi obtido em plasma coletado cerca de 2 a 3 meses após a COVID-19.

    Sobre Plasma Covalescente já falamos anteriormente, e não vamos detalhar aqui o significado. Vocês podem conferir o texto aqui.

    O que vem chamando a atenção a este estudo, no entanto, é o resultado que os plasmas coletados 5 meses após vacinação com duas doses da CoronaVac. No caso, os resultados ainda preliminares também demonstraram uma pequena quantidade de anticorpos neutralizantes frente aos vírus isolados de SARS-CoV-2 da linhagem P.1, assim como da linhagem B, circulante no Brasil no início da pandemia. Este resultado sugere que pessoas previamente infectadas ou vacinadas podem ser infectadas com o vírus da linhagem P.1 circulante no Brasil.

    Primeiro, vale destacar que a queda de anticorpos neutralizantes alguns meses após a vacinação é um fenômeno conhecido e relatado desde os estudos clínicos da fase II da CoronaVac. Além disso, é fundamental destacar que pesquisas indicam queda de anticorpos neutralizantes meses após a infecção por coronavírus. . As reinfecções, entretanto, embora preocupem, não são em uma quantidade “gigantesca”. Isto é, não são compatíveis com a queda do anticorpo em nosso corpo. O que indica que há mais elementos de nosso sistema imune que estão funcionando. Tudo isto são indicadores de apenas UM fator relacionado à resposta imune.

    (reprise do spoiler) Então chegou o dia da minha vacina, eu devo desencanar e nem ir?

    (pelamor não é isso) Não! Não é isto que estamos dizendo – e já temos bastantes desinformações alarmistas a este respeito rondando e alardeando contra esta vacina! Mas calma!

    Os resultados precisam ser interpretados com cautela. Isto dito pelos próprios pesquisadores deste estudo! Inicialmente em função de os anticorpos neutralizantes serem apenas um dos componentes do sistema imunológico!

    Como assim?

    Ora, outros elementos como o sistema imune celular pode proteger as pessoas inclusive contra as formas mais graves da doença! E estes elementos não foram avaliados neste estudo!

    É importante destacar que o sistema imune celular é fundamental para a eliminação de infecções virais – muito embora sempre ressaltemos o papel dos anticorpos e estes sejam popularmente mais conhecidos (embora definitivamente não os únicos envolvidos na defesa de nosso corpo nas infecções).

    O sistema imune é “um mundo a parte” nas ciências biológicas e de saúde. E tem, sim, um grau de complexidade para conseguirmos esmiuçar estes resultados e informações todas as vezes que precisamos falar disso!!!

    Claro que em momentos como este, entendemos a apreensão de todos. Mas ressaltamos: não podemos nos deixar levar por tudo o que chega nos famigerados grupos de whatsapp e grupos de outras redes sociais. Muita calma SEMPRE ao compartilhar estes conteúdos.

    Assim, ressaltamos ENFATICAMENTE, que esta vacina analisada neste estudo apresentou uma eficácia elevada na proteção contra formas clínicas graves da COVID-19 e estes resultados seguem válidos e, portanto, VACINAR-SE SEGUE SENDO A RECOMENDAÇÃO!

    Por fim, destacamos que, dentre outras características relacionadas a este estudo, o nosso “N amostral”, ou seja, o número de indivíduos analisados, é PEQUENO. Além disso, outras vacinas precisam ser avaliadas contra a P.1 – bem como outras variantes já em circulação e que provavelmente surgirão.

    Há necessidade de desenvolver estudos mais amplos e abrangentes, com um N amostral maior, que visem avaliar outros aspectos da resposta imunológica. Bem como realizar estudos similares com pessoas que receberam outras vacinas, frente às novas variantes de SARS-CoV-2 no Brasil.

    Tá, mas se o estudo é incipiente, qual o motivo de publicarem?

    Se estivéssemos em um bar, descontraídos numa sexta, essa seria a hora que daríamos um tapa na mesa e diríamos: “mas aí é que tá…”

    Bom, mas estamos cumprindo as normas de distanciamento social e estamos falando sério sobre o artigo sobre a P.1 e a CoronaVac com uma mensagem fundamental.

    Aqui está o paradoxo de trabalhar com ciência… Em primeiro lugar, não estamos aqui para publicar só o que nos agrada e guardar a sete chaves os resultados que não gostamos.

    Este resultado é relevante e pode ser considerado assim para outros cientistas que também trabalham com pesquisas similares. Inclusive, outros estudo pelo mundo, com outras formulações vacinais, têm demonstrado resultados muitos semelhantes ao nosso estudo. Isto é, temos testado todas as vacinas para as variantes, para exatamente ver o que estamos cobrindo, como estamos cobrindo a doença e os cuidados que ainda precisamos ter.

    Relevante não para nos gerar pânico – mas por nos fazer entender alguns aspectos da doença, da vacina e seus efeitos. Relevante, também, pois nos indica os cuidados que devemos seguir tendo – e de maneira URGENTE – para conter o vírus!

    A vacina é fundamental e ainda é nossa maior aposta!

    Mas precisamos seguir medidas que estão sendo regulamentadas e indicadas como seguras e eficazes desde o início da pandemia: usar máscaras (preferencialmente PFF2 ou N95), manter as medidas de higiene do ambiente e, primordialmente, distanciamento social, mesmo em indivíduos vacinados!

    Estas medidas são simples, eficazes e precisam seguir sendo defendidas com empenho de todos – e cobrança para serem efetivas, pelo poder público!

    Assim, lembramos também que novas variantes surgem exatamente pelo vírus seguir circulando descontroladamente e estas medidas ajudam na contenção do vírus. Além disso, aliado às vacinas (especialmente se conseguirmos aumentar a quantidade de vacinas aplicadas mais rapidamente),teremos cada vez menos vírus circulando e consequentemente menos pessoas infectadas: e esta é nossa prioridade!

    Uma nota sobre preprints

    A outra questão sobre publicar este artigo em preprint é que ele tem um “endereço” certo – que são cientistas, como já falamos. Ah! Quer dizer que não cientistas não podem ler agora? Não é isso. Nossa ênfase segue: lembrar que os resultados precisam ser lidos com cautela, sem aligeiramentos e ansiedades, especialmente em momentos como este. Por isso nos artigos existem ressalvas, existe também palavras como “resultados SUGEREM”. E isto indica que não são 100% conclusivos, mas apontam caminhos a serem pensados, analisados e, eventualmente, replicados em N amostrais maiores!

    Ainda é fundamental apontar, neste sentido, que as principais revistas tem recomendado fortemente (ou até obrigam) a inserção de dados relacionados à COVID-19 em preprint. A ideia atual é disseminar o conhecimento rapidamente justamente para que ele seja submetido à escrutínio científico público o mais rápido possível. Isso permite algumas questões:

    – primeiro maior transparência do processo científico;
    – ajuda a guiar os cientistas na busca do conhecimento, pois nenhuma pesquisa é pautada por apenas um estudo, mas conjuntos de observações independentes
    – proporciona que outros grupos que estejam pesquisando dados similares, possam reforçar, revisar ou repetir partes dos experimentos para já apontar inconsistências ou coerências dos estudos.

    Em tempos de pandemia, os preprints servem para cientistas acessarem estudos o mais rápido possível, para gerar mais respostas viáveis de compreensão da doença e solucionar problemáticas possíveis. O preprint é uma ferramenta da ciência para cientistas. E isto não quer dizer que não cientistas não podem ter acesso, mas quer dizer que é um tipo de leitura diferente que precisa ser feita, antes de decisões e publicações apressadas!

    Ah, então os resultados não devem ser levados em consideração?

    Hehehe não! Calma. O que estamos dizendo: que não existe 8 ou 80. Estes resultados são preliminares – indicam que precisamos analisar mais, “repetir a dose de análises”, compreender melhor o que está acontecendo. Assim, NADA DISSO invalida resultados anteriores.

    É falaciosa, portanto, qualquer notícia que diga que “não adianta nada ter tomado vacina”. Seguimos indicando a vacina como fundamental para este momento.

    Dessa forma, ressaltamos que existem mais de um sistema de proteção que são estimulados pelas vacinas. Entretanto, mais do que tudo isso, seguimos afirmando que MESMO ANTES DESTES RESULTADOS já existia o indicativo CONSTANTE de “precisamos seguir isolados e com distanciamento social, uso de máscaras e sem aglomeração até atingirmos a vacinação em massa!”

    Estes resultados não mudaram esta perspectiva e indicação de medidas! Seguimos fortemente recomendando a mesma coisa desde os primórdios da pandemia!

    Portanto, se cuidem, cuidem dos seus, não aglomerem, usem máscara, saiam de casa APENAS PARA O ESSENCIAL E INEVITÁVEL. Seguimos, com este estudo, endossando a vacina e dizendo a todos: vacinem-se assim que a data de vocês chegar!

    Artigo na íntegra:

    Souza, W, Amorim, M, Sesti-Costa, R, Coimbra, L … Proença-Modena, JL (2021) Levels of SARS-CoV-2 Lineage P.1 Neutralization by Antibodies Elicited after Natural Infection and Vaccination

    Outros artigos deste grupo de pesquisa no Blogs

    Amorim, Mariene. Diversidade viral e surgimento de novas variantes do SARS-CoV-2

    Bonora Junior, Maurílio E aqueles resultados das vacinas? – Parte 2: Memória Imunológica

    ___. Covid-19: um exército invisível combatendo a doença!

    ___. Imunidade Celular: um exército de soldados invisíveis

    ___. Plasma Convalescente: tratamentos a partir de anticorpos

    ___. O que são Anticorpos?

    Esta pesquisa recebeu apoio de diversas agências de fomento e órgãos nacionais e internacionais, como a FAPESP, o Medical Research Council, Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, FINEP, CNPq, FAEPEX, CAPES e NIH. Membros ativos de redes de pesquisa nacionais, em especial a Rede Corona-ômica.BR/MCTI, filiada à RedeVírus MCTI, assinam o estudo e demonstra-se a importância dos esforços de investigação científica de Univesidades e Centros de Pesquisa nacionais para o enfrentamento da pandemia.

    Este texto foi escrito originalmente no blog EMRC

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Conheça a Dra. Katalin Karikó, a cientista que desenvolveu a técnica da vacina de RNAm para a COVID-19

    Katalin Karikó durante o doutorado em 1980 no Laboratório de RNA do Centro de Pesquisa Biológica na Academia de Ciências Húngara. Imagem retirada de https://www.telegraph.co.uk/global-health/science-and-disease/redemption-one-scientists-unwavering-belief-mrna-gave-world/

    Texto escrito em colaboração por Carolina Francelin e Gabriela Mendes, com contribuições de Juliana Lobo.

    No final do ano passado, em meio às notícias de que as primeiras vacinas para a COVID-19 haviam sido aprovadas ao redor do mundo, começamos a pesquisar sobre a Dra. Katalin Karikó, pioneira no uso da tecnologia de RNAm, que prontamente foi escolhida para ser o tema do primeiro texto da categoria “Colírios Científicos” no Ciência Pelos Olhos Delas em 2021.

    Diante da pandemia causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), a ciência provou sua magnitude no século XXI e vários laboratórios pelo planeta lançaram, em tempo recorde, diferentes tipos de vacina com eficácia comprovada. Em meio a uma verdadeira corrida contra o relógio para frear o avanço pandêmico, não há como não destacar o trabalho inovador da Dra. Katalin Karikó na criação da vacina de RNA mensageiro (RNAm), a molécula responsável por produzir as proteínas codificadas pelo DNA dentro das células.

    A tecnologia desenvolvida pela Dra. Karikó está nas vacinas aplicadas pelas empresas de biotecnologia Moderna (EUA) e BioNTech (Alemanha), sendo que essa última atua em acordo de produção e distribuição da vacina com a farmacêutica Pfizer. Por causa da extensa pesquisa feita por Katalin e por seus colegas nas últimas décadas, e também devido à tecnologia disponível atualmente, a produção da vacina de RNAm específica para o novo coronavírus foi feita num curtíssimo espaço de tempo (de dezembro de 2020 a janeiro de 2021) e doses dela já foram distribuídas e aplicadas em vários países, como Estados Unidos e Inglaterra. 

    Com esse texto sobre a Dra. Katalin Karikó, queremos ressaltar o quão importante foram a perseverança e a resiliência dessa cientista que, durante décadas, trabalhou incansavelmente em um tema de pesquisa que ela acreditava ter um grande potencial terapêutico. Além disso, compartilhamos também um pouco da sua vida pessoal e trajetória como imigrante nos Estados Unidos.

    A vida e o início da carreira da Dra. Katalin Karikó

    Katalin Karikó nasceu na Hungria em 1955, logo após a reinstalação do regime comunista no país. Assim que concluiu seu doutorado pela University of Szeged, ela se viu limitada a continuar a pesquisa em seu país por dois motivos: a Hungria passava por uma recessão financeira que restringia o incentivo à pesquisa, e seu tema de estudo, já então sobre o RNA¹, era menosprezado e até mal visto frente às novidades acerca do DNA². Dessa forma, em 1985 ela migrou com seu esposo e sua filha de dois anos para os Estados Unidos para assumir um cargo de pós-doutorado na Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia. 

    Mesmo enquanto cientista nos EUA, a insistência e o interesse de Katalin na pesquisa envolvendo terapias com base no RNAm fizeram com que ela fosse desprezada muitas vezes durante a sua carreira. Na vida científica – e principalmente no meio acadêmico – isso significa ter pedidos de financiamento para desenvolver a pesquisa negados diversas vezes, tanto por agências federais quanto privadas. 

    Essas negativas prejudicaram a produção de artigos da Dra. Karikó, e também resultaram em  descrédito pelos colegas da área. Durante o seu trajeto para alcançar uma posição como professora da Universidade da Pensilvânia, a pilha de pedidos de financiamento negados aumentava e a instituição recusou a promoção de Katalin. Mas ela foi persistente e o sonho de salvar vidas por meio da terapia com RNAm sintético a fez insistir e seguir adiante a cada crítica negativa recebida.

    Katalin trabalhando em um laboratório. Image retirada de https://nypost.com/2020/12/05/this-scientists-decades-of-mrna-research-led-to-covid-vaccines/

    Os 40 anos de pesquisa sobre RNAm 

    Em uma época em que o DNA tinha acabado de ser sequenciado, por volta de 1962, a descoberta do RNAm abriu novas oportunidades para terapias pontuais. Naquele tempo, Katalin já acreditava que para tratar algumas doenças não era necessário mudar os genes, no DNA,  e sim somente produzir, ou deixar de produzir, a proteína de interesse por um determinado momento, durante um tratamento terapêutico, por exemplo. 

    Para isso, ela desenvolveu a terapia de RNAm, que consiste em injetar uma sequência de RNAm no paciente através de uma injeção intramuscular. O RNAm consegue entrar nas células e, uma vez dentro delas, induzirá a produção da proteína de interesse. Contudo, os experimentos de Katalin não traziam resultados satisfatórios, principalmente porque após o RNAm ser injetado, as células do sistema imune do paciente reconheciam a molécula como estranha, e tentavam combatê-la e eliminá-la antes mesmo dela conseguir desempenhar sua função de produzir a proteína específica dentro de uma célula. 

    A mudança de trajetória e o sucesso da vacina de RNAm para a COVID-19

    Durante esses anos difíceis, sem resultados concretos e sem financiamento, a Dra. Karikó foi rebaixada de cargo na Universidade da Pensilvânia e somente ao se encontrar com o Dr. Drew Weissman, em 1997, que ela ganhou novos ânimos. O trabalho de 7 anos da dupla culminou na descoberta do método para prevenir a resposta do sistema imune do organismo ao RNAm sintético. Eles descobriram que ao mudar apenas uma letra do código genético do RNA, as células do sistema imune do paciente não reconheciam mais a molécula como estranha, permitindo sua ação dentro da célula. 

    Essa descoberta ocorreu em 2004 e gerou para a Universidade da Pensilvânia a venda de patentes da metodologia para criar o RNAm modificado e, com isso, a reputação da Dra. Katalin se transformou. Com a venda das patentes, um grupo de cientistas estadunidenses fundou a Moderna, em 2010, e comprou os direitos sobre as patentes de Karikó e Weissman. O rumo da carreira de Katalin mudou de direção e além do cargo de professora e pesquisadora da Universidade da Pensilvânia, em 2013 ela começou a trabalhar na empresa BioNTech, que também adquiriu as patentes da biotecnologia de RNAm sintético, e onde atualmente é vice-presidente

     A inovação da vacina de RNAm é que não há partícula viral ativando o sistema imunológico para produzir anticorpos e células de memória para combater uma possível infecção. Essa partícula de RNAm sintética é o código para a produção de proteína viral, que sozinha não é capaz de causar doença, mas que ativa células do sistema imune a ficarem de prontidão para a eventual contaminação com agente infeccioso. Ou seja, o RNAm induz nosso sistema imune a produzir anticorpos contra o patógeno em questão – nesse caso, o novo coronavírus. 

    O primeiro RNAm sintético foi criado em 1961 e o objetivo dos cientistas era utilizar as células tratadas com ele para produzirem substâncias de interesse terapêutico. Somente em 2020, quase sessenta anos depois, essa tecnologia foi efetivamente aplicada como a vacina para combater a COVID-19.

    Foto recente de Katalin trabalhando em home office durante a atual pandemia. Imagem retirada de https://www.statnews.com/2020/11/10/the-story-of-mrna-how-a-once-dismissed-idea-became-a-leading-technology-in-the-covid-vaccine-race/

    Sem dúvidas, a história da Dra. Karikó é um verdadeiro exemplo de resiliência de uma cientista que, em meio a tantas dificuldades, persistiu com a pesquisa do RNA mensageiro, cuja importância ela sempre acreditou. Em entrevista recente para o The New York Post, ela afirmou que “ninguém deveria ter medo de tomar a vacina”, frase que pode soar simples, mas que é extremamente simbólica ao considerarmos não só o trajeto de Katalin, como também a necessidade de ressaltar o valor da ciência e de combater desinformações a respeito da vacinação. Tanto ela quanto o Dr. Weissman foram as primeiras pessoas a receber a vacina produzida pela BioNTech. 

    Começamos 2021 com mais esperança de que a pandemia chegará ao fim com a imunização das pessoas ao redor do mundo, conquista possibilitada pela pesquisa fundamental da Dra. Katalin Karikó. Depois de uma trajetória com altos e baixos, hoje vários cientistas, incluindo os fundadores da Moderna, opinam que a Katalin deve receber o Prêmio Nobel de Química por sua contribuição à ciência. 

    Notas:

    ¹ RNA: Molécula complementar ao DNA que, ao ser decodificada, produz as proteínas necessárias para o funcionamento do nosso organismo.

    ² DNA: Conhecido também como código genético, a molécula de ácido desoxirribonucléico fica dentro do núcleo da célula e é responsável por codificar todas as informações sobre as células do nosso corpo. 

    Referências:

    https://nypost.com/2020/12/05/this-scientists-decades-of-mrna-research-led-to-covid-vaccines/

    https://www.telegraph.co.uk/global-health/science-and-disease/redemption-one-scientists-unwavering-belief-mrna-gave-world/

    https://edition.cnn.com/2020/12/16/us/katalin-kariko-covid-19-vaccine-scientist-trnd/index.html

    https://www.theguardian.com/science/2020/nov/21/covid-vaccine-technology-pioneer-i-never-doubted-it-would-work

    https://www.timesofisrael.com/the-hungarian-immigrant-behind-messenger-rna-key-to-covid-19-vaccines/

    Este texto foi escrito originalmente no blog Ciência Pelos Olhos Delas

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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  • Vacina Oxford-AstraZeneca. Já sabe tudo sobre ela?

    Por Laís Granato

    Este texto foi produzido originalmente no blog Descascando a Ciência

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Tudo vale a pena por vacinas e divulgação científica? Sobre Cultura e Cultura Científica

    Lembra do quanto amanhecemos
    Com a luz acesa
    Nos papos mais estranhos
    Sonhando de verdade
    Salvar a humanidade
    Ao redor da mesa

    (Por Aí, Nei Lisboa)

    A semana de 18 a 22 de Janeiro, com destaque para o dia 21 de Janeiro (quando lançamos oficialmente a campanha #todospelasvacinas) foi intensa.

    Grandes grupos de divulgação científica e divulgadores científicos trabalhando juntos desde o início de 2021 para esta semana dedicarem-se à visibilidade de uma causa que é, indiscutivelmente, importante ao nosso país e à população brasileira.

    Hoje eu vim falar mais uma vez da campanha em relação à noção de “Cultura” e “Cultura Científica” e a relevância de ações conjuntas e entre diferentes setores da sociedade.

    Cultura? O que isso tem a ver com Divulgação Científica?

    Pois é… Parece óbvio o que vou falar, mas é importante eu fazer uma observação neste texto. Normalmente, quando trabalhamos em um meio acadêmico e científico, vamos formando um círculo de contatos cada vez mais fechado entre pessoas que são formadas ou em etapas de formação acadêmica. Aos poucos, naturalizamos a visão de que “todo mundo tem graduação hoje em dia”. O que é completamente fora da realidade brasileira.

    Vamos destacar o relatório Education at a Glance, publicado em 2019 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), ao avaliar 45 nações. Neste relatório, o Brasil consta como um dos com menores médias de pessoas formadas em Ensino Superior (cerca de 21%, contra 44% de média geral). Porém, fica pior… Quando chegamos em formações em nível de mestrado temos cerca de 0,8% da população e para doutorado 0,2% (pessoas entre 25 e 64 anos). Isto significa estar entre as 3 piores colocações entre 35 países que forneceram os números para estas etapas.

    E o que isto tem a ver com cultura?

    Cultura, ao contrário do que muitas vezes é debatido – enquanto o “melhor já produzido por seres humanos” nas artes – é um termo em disputa e que precisa ser pensado como espaço humano de vivências e práticas cotidianas.

    Neste sentido, cultura não se vincula apenas a grandes óperas em pomposos teatros. Tampouco às tragédias gregas, tão lindamente descritas – e atualmente pouco lidas. E, antes que cancelem este blog, também não quero dizer que isto não é cultura.

    Mas, certamente, cultura é muito mais do que isto. São práticas humanas, compartilhadas e vivenciadas, ensinadas e aprendidas na rotina, em atos cotidianos. E, sim, relacionam-se à arte. Todavia, relacionam-se ao hábito da leitura, das conversas, dos ensinamentos entre anciãos e crianças em diferentes sociedades.

    Também é cultura as práticas patriarcais e opressoras das sociedades, as resistências de povos minoritários aos discursos hegemônicos, a vivência científica e aprendizados do método dentro de universidades e laboratórios, o letramento nas escolas, a compreensão do que é ser menina e menino em sociedades com lógica binárias e cisnormativa (senhoras e senhores, ela adora uma polêmica mesmo). Assim, a versão curta da definição de cultura poderia ser “tudo aquilo que vivemos em nosso cotidiano e tem significado na sociedade”.

    Isso inclui, para uma pequeníssima, minúscula, quase insignificante (numericamente falando), parcela da população: fazer, estudar, pensar a partir do método científico todos os dias.

    Cultura científica e Ciência enquanto prática cultural

    Não é recente o debate sobre a noção de cultura científica e sua importância na sociedade, no meio acadêmico. Em 1982, por exemplo, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), vai lançar a Revista Ciência Hoje com o

    “intuito de estimular um debate mais amplo em torno da ciência e de seu impacto social, bem como de integrar a atividade de divulgação ao cotidiano dos pesquisadores como parte importante de suas responsabilidades profissionais e sociais”.

    Eu, particularmente, gosto muito desta citação. Ela traz um ideia necessária à ciência: responsabilidade social como parte de seu cotidiano. Aqui, não apenas a ciência amarra-se fortemente com a relação de cultura. Mas principalmente de executar isto a partir de princípios éticos.

    Vogt e Morales (2018) consideram que a cultura científica, na contemporaneidade, pode ser conceituada não como a ciência “em si”, mas um ato de pensamento da ciência sobre si mesma, sua produção, sua organização e prática cotidiana. A cultura científica, assim, seria parte constitutiva do que é ciência também.

    Isso provavelmente não possa ser compreendido exatamente como sinônimo de ciência enquanto prática cultural. Embora tenha sim vínculos. Vamos ver… Esta noção se aproximaria mais, talvez, da ideia de que a ciência, enquanto prática humana, possui rotinas, vivências, rituais que são próprios e circunscritos a determinados espaços e grupos sociais.

    Tá, e daí?

    Vocês devem estar se perguntando “dessa vez ela tá enrolando mais do que o usual…”. Então vamos ver sobre o que isso tudo se trata… Entender ciência enquanto prática cultural nos possibilita pensar nos limites que a própria percepção humana, incluindo intelectualidade, pensamento situado histórica e socialmente, tem.

    E é aqui que o debate ético é importante: perceber nossos limites é admitir falibilidade do que fazemos. E sem isto, a ciência não passaria de um dogma. A ciência pode (e deve) ser questionada, pois este é o ponto de partida e, também, compreensão de limites – nossos mesmo! Humanos. Nada de errado nisso. E, claro, questionar não é dizer que temos que voltar ao tempo antes de resultados obtidos. Apenas situa que há muito mais a compreender e precisamos rebuscar nossas ferramentas. Simples assim (ao menos idealmente… na prática precisamos de tempo, amadurecimento e um pouco de suor e humildade).

    Quanto à cultura científica seria a busca por essa reflexão da ciência sobre si mesma, percebendo-a como necessária para a sociedade. Entretanto, não sendo feita de qualquer modo e não olhando para nós mesmos como seres messiânicos que salvaremos a todos. A cultura científica, a partir de um pensamento ético e empático, com responsabilidade social, se percebe, também, falho no diálogo. A cultura científica olha para a comunicação como ferramenta.

    Tal como nos diz Vogt e Morales

    ainda que parte integrante da própria ciência, a comunicação, quando voltado para o público que não participa do processo científico, do ponto de vista técnico, – que se dá com a sociedade de um modo geral -, atua como elemento transformador da ciência, inserindo-a na cultura e configurando, assim, o terceiro elemento dessa relação, a cultura científica. Na outra ponta, o conhecimento científico poderia ser considerado o elemento de transformação da cultura com as características próprias da contemporaneidade. Ou seja, os produtos da pesquisa científica, na forma do conhecimento por ela produzido – trazendo consigo a sua racionalidade, práticas e procedimentos -, transformam a cultura imprimindo-lhe as formas e os conteúdos como hoje os vivenciamos e conhecemos.

    #TodosPelasVacinas

    Que tolos fomos nós, que bom que foi assim
    Que achamos um lugar pra ter razão
    Distantes de quem pensa que o melhor da vida
    É uma estrada estreita e feita de cobiça
    Que nunca vai passar por aqui

    (Por aí, Nei Lisboa)

    Todos Pelas Vacinas teve como proposta falar de ciência a partir de perguntas, de danças de funk, de artes resgatando o nosso tão querido Zé Gotinha (personagem brasileira que qualquer criança da década de 80 conhece tão bem!). Seja por um apelo emocional e saudoso, seja por aspectos que temos dentro de nós – músicas de balada funk, melodias como samba e choro, paródias de músicas consagradas – cientistas e divulgadores buscaram um pouco de si mesmos fora dos espaços formais dos jalecos, números e livros.

    E nada disso nos fez menos científicos. Tampouco menos divulgadores. Talvez tenha feito pensarmos o quanto é necessário lembrar cotidianamente que ciência precisa fazer parte da cultura para fora destes espaços.

    A cultura – essa que é vivida cotidianamente na sociedade – tem muito a nos ensinar, quando queremos entender sobre coletividade, impacto social e comunicação. Estudar comunicação não é comunicar-se. Fazer ciência não basta para falar de ciência. Trabalhar com divulgação científica é aprender, mais do que falar.

    Foi gratificante ver vários colegas apontando o dia 21 de janeiro como um marco para a “história da Divulgação Científica”, tanto quanto foi gratificante receber tantos e tantos vídeos de músicos de diferentes gerações lutando por uma causa que, nós cientistas, acreditamos ser fundamental.

    Estaria a comunicação científica, salva?

    Não né gente. Tem chão ainda. A humildade é prato que tem que ser comido diariamente nesta vida, igual arroz e feijão.

    Mas foi relevante esta visibilidade para a ciência perceber a si mesma. Quanto às ações sociais, talvez tenha chamado a atenção, também, internamente à divulgação científica, o quanto temos sim o dever de ter impacto social, de dialogarmos com a sociedade (em sua diversidade), entendermos suas perguntas, dúvidas, incertezas e inseguranças.

    Todos pelas vacinas e Vacinas para todos

    Mais do que um clichê barato (mas bem bonitinho, vai…) virou um mantra em falas sobre responsabilidade social da ciência. Saúde não é produto, conhecimento tão pouco. Ou nós batalhamos e nos juntamos, compreendendo o papel político de cientistas e divulgadores científicos, ou sucumbiremos. Não por ser nosso dever salvar a todos, em tom messiânico e dogmático.

    Mas por nos abrirmos e nos percebermos como parte de tudo isso – e talvez também assumindo que nos afastamos e deixamos de lado por tanto tempo estas questões, achando que conhecimento é dever dos outros buscarem e não parte de um compartilhamento entre pares e extrapares entre indivíduos e grupos sociais.

    Entre distopias, poesias e insanos (e fatídicos) caminhares cotidianos, espero seguir ao lado dessa gente toda que optou por dançar até o chão com zé gotinha, em prol do bem de todos, tuitando com kpopers não pela ciência, mas por todos e cada um da nossa população.

    Seremos sempre assim, sempre que precisar
    Seremos sempre quem teve coragem
    De errar pelo caminho e de encontrar saída
    No céu do labirinto que é pensar a vida
    E que sempre vai passar
    Sempre vai passar por aí

    (Por Aí, Nei Lisboa)

    Para saber mais

    ARNT, Ana Tudo vale a pena por vacinas e divulgação científica? Funk e Kpop (aqui neste blog!)

    HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo. Educação & realidade, v. 22, n. 2, 1997.

    INSTITUTO CIÊNCIA HOJE (2020) História do Instituto.

    LISBOA, Nei Por aí (escute esta música que foi carro chefe da quarentena desta que vos escreve)

    LISBOA, Nei Em casa e ao vivo, 23/01/2021

    PORTO, CM., org. Difusão e cultura científica: alguns recortes. Salvador: EDUFBA, 2009. A internet e a cultura científica no Brasil: difusão da ciência. 149-165.

    VIANA, B; QUEIROZ, C (2020) Ciência cidadã para além da coleta de dados. Revista ComCiência.

    VOGT, C; MORALES, A (2018) Cultura Científica, Revista ComCiência.

    Todos pelas Vacinas
    Grupos que participaram:
    Observatório Covid-19
    Blogs de Ciência da Unicamp
    Rede Análise Covid-19
    UPVacina
    Equipe Halo
    Projeto Divulga
    Eu e as Plantas

    Este texto foi escrito originalmente no blog PEmCie

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • QUANDO O MÉDICO DESINFORMA: o caso das vacinas

    Existem médicos contra as vacinas desde o século XVIII

    Figura 1: Edward Jenner e dois colegas eliminando três oponentes antivacinação, as vítimas mortas da varíola estão espalhadas a seus pés. FONTE: Isaac Cruikshank, 1808 (Wellcome Collection). Creative Commons

    Há quem estranhe o silêncio dos conselhos de medicina ante a posicionamentos de alguns de seus membros contrários à imunização por vacinas contra a Covid-19 e favoráveis à utilização de medicamentos sem eficácia comprovada (até o momento). Embora hoje não haja dúvidas sobre a eficácia e segurança das vacinas, dados históricos mostram que, desde o século XVIII, sua utilização como tratamento profilático é combatida por alguns médicos.

    Século XVIII

    Nos Estados Unidos (EUA), entre 1721 e 1722, uma grande epidemia de Varíola atingiu a cidade de Boston, à época com 11 mil habitantes, registrando mais de 6 mil casos, levando 850 deles a óbito. O pesquisador Matthew Niederhuber, da Harvard Medical School, escreve que “o uso da inoculação durante essa epidemia e o acalorado debate que surgiu em torno da prática foi uma das primeiras aplicações importantes da inoculação na sociedade ocidental, abrindo caminho para que Edward Jenner (o descobridor da vacina contra a varíola em 1796) desenvolvesse a vacinação contra a varíola até o final do século” (1).

    INOCULAÇÃO
    É a exposição deliberada ao vírus da varíola usando material de uma crosta de varíola – por exemplo, esfregado em um pequeno corte na pele. Geralmente resulta em uma forma mais branda de doença, mas ainda apresenta risco de morte.

    No entanto, conseguir sua aprovação não foi uma tarefa simples, uma vez que a comunidade médica de Boston se posicionou contra essa autorização, tendo o Dr. William Douglass (1691-1752), um dos únicos médicos da cidade que realmente possuía um diploma de medicina, como liderança do movimento anti-inoculação. Seu principal argumento era o de que a inoculação não fora suficientemente testada e seria baseada em folclore.

    Contudo, no início de 1722, os líderes da campanha de inoculação, o médico Zabdiel Boylston e o reverendo Cotton Mather, apresentaram dados que atestaram a eficácia da inoculação: enquanto a taxa de mortalidade entre os não inoculados foi de 14,8%, entre os inoculados, foi de apenas 2%. (1)

    Século XIX

    Na Inglaterra, em meados do século XIX, os historiadores Dorothy Porter e Roy Porter (1988), escrevem que surgiu uma fonte de oposição científica à vacinação liderada por um grupo anticontagionista que defendia ser a remoção da “sujeira” o caminho para a prevenção de doenças e que negava teorias sobre a especificidade de doenças.

    O médico britânico Charles Creighton (1847-1927) expoente do grupo foi um exemplo de antivacinacionista que fundamentou sua rejeição ao método profilático em uma teoria anticontagionista de propagação de doenças. 

    • O médico afirmava que a vacina em si era uma causa de sífilis e dedicou um livro ao assunto, A História Natural da Varíola Bovina e da Sífilis Vacinal (2), no qual argumenta que a vacinação era um envenenamento do sangue com material contaminado, que não poderia fornecer proteção contra uma doença causada por eflúvios decorrentes de matéria orgânica em decomposição. 
    • No livro Jenner e Vacinação: um capítulo estranho da história médica (3) Creighton descreve Edward Jenner como pouco melhor do que um criminoso e ganancioso que enganou o Parlamento e os mundos científico e médico para que acreditassem em seu método mítico (4).

    Século XX

    Em 1998, o então médico britânico Andrew Wakefield, consultor honorário em gastroenterologia experimental no London’s Royal Free Hospital, publicou um artigo na conceituada revista The Lancet em que ilustrou um estudo de vinte pacientes e concluiu que a administração da vacina MMR causava autismo e algumas formas de colite (inflamação do intestino grosso). Segundo Tafuri (2011), quando o artigo foi revisado pelos pares, a conexão entre vacina e autismo não foi comprovada e a publicação foi desacreditada. No entanto, o estudo do britânico passou a ser utilizado por grupos antivacina como argumento para não vacinar os filhos. Em 2004, a revista reconheceu que não devia ter publicado o estudo de Wakefield e, em 2010, retirou-o de seus arquivos, sendo que, no mesmo ano, ele teve seu registro cassado pelo Conselho Geral de Medicina (GMC) do Reino Unido, acusado de agir de forma “desonesta”, “enganosa” e “irresponsável”.

    Século XXI

    Mais recentemente, em 2003, o artigo “Timerosal em vacinas infantis, distúrbios do neurodesenvolvimento e doenças cardíacas nos Estados Unidos” (GEIER e GEIER, 2003) publicado por Mark Geier, doutor em genética, e David Geier, bacharel em biologia, alegam que o conservante timerosal, usado em certas vacinas, causa autismo. Segundo a premiada jornalista científica, Megan Scudellari (2010), Mark Geier testemunhou em apoio ao vínculo timerosal-autismo como testemunha especialista em testes de vacinas nos EUA, porém, numerosos estudos rigorosos descartaram esse vínculo. 

    Atualidade

    Como se percebe, não é de hoje que esse lugar de fala vem sendo disputado por atores que, em teoria, têm notório saber específico ou são detentores de conhecimento reconhecido e que usavam, cada um a seu modo, a mídia disponível em seu contexto para divulgar suas ideias, nem sempre apoiados no devido rigor científico. Por isso, não chega a ser surpresa o atual silêncio dos conselhos de medicina, visto que, em sua maioria, são compostos por profissionais que têm interesses políticos, conforme mostra recente reportagem do site The Intercept Brasil.

    Em outro aspecto, o jornalismo profissional – em nome da imparcialidade, da necessidade de ouvir “o outro lado” e, evidentemente, em busca de mais audiência (isto é, retorno financeiro) – tem dado destaque a vozes dissonantes que, muitas vezes, contradizem as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), da ciência e/ou da própria medicina. o que tem causado na sociedade uma sensação de que a eficácia e a segurança das vacinas ainda é um debate aberto, quando na verdade não é. O quadro se agrava num contexto em que as mídias sociais replicam essas vozes, elevando exponencialmente o seu alcance.

    Nesse sentido, vale atentar para a ponderação do biólogo Atila Iamarino, para quem “numa questão científica onde centenas de especialistas chegaram num consenso, dar o mesmo peso para o questionamento, não faz sentido” (5). Agora, mais do que nunca, o papel da Divulgação Científica se faz necessário para que se possa mitigar a maré de desinformação que contribuiu para que o Brasil atingisse a lamentável marca de mais de 200 mil mortes. 

    Referências

    (1) NIEDERHUBER, Matthew. The fight over inoculation during the 1721 Boston smallpox epidemic. Science in the News, 2014. Disponível em: http://sitn.hms.harvard.edu/flash/special-edition-on-infectious-disease/2014/the-fight-over-inoculation-during-the-1721-boston-smallpox-epidemic/ Acesso em 31 jan. 2021

    (2) CREIGHTON, Charles. The Natural History of Cowpox and Vaccinal Syphilis. London: Cassell, 1887.

    (3) CREIGHTON, Charles. Jenner and Vaccination: A strange chapter of medical history. London, 1889.

    (4) PORTER, Dorothy; PORTER, Roy. The politics of prevention: anti-vaccinationism and public health in nineteenth-century England. Medical history, v. 32, n. 3, p. 231-252, 1988. (p. 237) Disponível em: https://www.cambridge.org/core/journals/medical-history/article/politics-of-prevention-antivaccinationism-and-public-health-in-nineteenthcentury-england/160A0FE00C0D60AC0AF87DCC3D444523 Acesso em 31 jan. 2021.

    (5) IAMARINO, Atila, Aquecimento Global. Canal Nerdologia. (05m 35s a 05m 46s) 01 jun. 2017. Disponível em: https://youtu.be/8sovsUzYZFM. Acesso em 31 jan. 2021.

    Para Saber Mais:

    CRUIKSHANK, Isaac. Edward Jenner e dois colegas eliminando três oponentes antivacinação, as vítimas mortas da varíola estão espalhadas a seus pés. British Museum, Catalogue of political and personal satires, vol. VIII, London, 1947, n°. 11093. Wellcome Collection. 20 Jun. 1808. Disponível em: https://wellcomecollection.org/works/x7kbxaef Acesso em 01 fev. 2021.

    GEIER, Mark R.; GEIER, David A. Thimerosal in childhood vaccines, neurodevelopment disorders, and heart disease in the United States. J Am Phys Surg, v. 8, n. 1, p. 6-11, 2003.

    SCUDELLARI, Megan. State of denial. Nature Medicine 16, 248. 2010. Disponível em https://doi.org/10.1038/nm0310-248a. Acesso em 31 jan. 2021.

    TAFURI, Silvio. et al. From the struggle for freedom to the denial of evidence: history of the anti-vaccination movements in Europe. Annali di igiene: medicina preventiva e di comunita, v. 23, n. 2, p. 93-99, 2011. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21770225/ Acesso em 31 jan. 2021.

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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