Tag: Brasil

  • O bem-estar do povo brasileiro e o êxito econômico dependem da conservação do oceano

    Qual a importância da conservação marinha para o Brasil e seu desenvolvimento econômico e bem-estar da população?

    Autoria

    Juliana Di Beo

    Arquipélago de Trindade e Martim Vaz. Foto: Wikimedia Commons

    Levantamento inédito sobre a biodiversidade marinha e costeira brasileira e seus serviços ecossistêmicos alerta os tomadores de decisão sobre a importância econômica da preservação do oceano.

    Salvador (BA) – Milhares de fiéis comparecem à Praia do Rio Vermelho, com oferendas para Iemanjá, durante as comemorações de seu dia. Foto: Wikimedia Commons

    O sumário para Tomadores de Decisão do “1º Diagnóstico Brasileiro Marinho-Costeiro sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos” foi lançado no dia 23 de novembro pela Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) e pela Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano. O relatório reúne os principais resultados de forma contundente e objetiva que demonstram o papel do oceano na economia, no bem estar, na regulação climática e na geração de benefícios imateriais – relacionados à cultura, aprendizagem e experiências –  inestimáveis.

    As atividades econômicas relacionadas a regiões marinhas e costeiras respondem por 20% do Produto Interno Bruto nacional e abrangem setores distintos, como pesca, aquicultura, turismo, mineração e navegação. Por outro lado, a degradação a que o oceano vem sendo submetido ameaça os ambientes marinhos  – que abrigam a rica diversidade de espécies, responsável por sustentar processos ecossistêmicos que são a base dos benefícios providos pelo oceano.

    A fragmentação e a perda dos ambientes marinhos  – explica o diagnóstico – são causadas, sobretudo, pela transformação no uso do solo e do mar; poluição, sobre-exploração de recursos, ou seja, a exploração para além da capacidade de recuperação natural; a introdução de espécies exóticas invasoras e mudanças climáticas.

    Dentre os ambientes marinhos que são mais impactados, estão os manguezais que perderam 2% de área entre 2000 e 2022, praias e dunas sofreram diminuição de 15% entre 1985 e 2019, e as pradarias e gramas marinhas perderam entre 30 e 50% no período de 1980 até os anos 2010. A perda gradativa desses ambientes expõe a zona costeira aos danos intensificados ou provocados pela mudança climática, como erosão, aumento do nível do mar e tempestades.

    Trazer à luz a agenda oceânica

    O relatório sistematiza conhecimentos que não deixam dúvidas sobre a urgência de ações de conservação para reverter essa crise ambiental. Mas, para Alexander Turra, professor do Instituto Oceanográfico da USP e um dos autores do diagnóstico, ainda são poucas as ações dos tomadores de decisão para conservação oceânica.

    Nas palavras dele: “as pessoas e os tomadores de decisão estão mais preocupados com a temática porque isso vem sendo fortalecido no âmbito da sociedade e com isso eles se sentem pressionados. Pontualmente, vemos alguns tomadores de decisão trabalhando com isso de forma muito estruturada e consistente, mas não necessariamente isso é algo generalizado”.

    O estudo lança luz para a importância da implementação efetiva de políticas públicas para frear a degradação dos ambientes, segundo o diagnóstico “o futuro do oceano e da biodiversidade da zona marinha-costeira depende da implementação efetiva e da avaliação de políticas públicas com vistas à sua adaptação”.

    É preciso também de ações de divulgação e difusão da cultura oceânica, um movimento global que tem a intenção de fazer as pessoas reconhecerem a influência do oceano em suas vidas e a influência humana sobre o oceano, com potencial de engajamento da população tornando o conhecimento acessível e democrático. Além disso, o relatório enfatiza que o oceano sustentável depende da sinergia entre conhecimentos científicos e das comunidades tradicionais, pesqueiras e indígenas.

    “A valorização dos diferentes saberes e o fomento à pesquisa preencherão importantes lacunas de informação para a tomada de decisão, como a compreensão da estrutura e do funcionamento dos sistemas ecológicos e sociais, o monitoramento das tendências sociais e ambientais ao longo do tempo e o desenvolvimento de novas tecnologias para a inovação”, concluem os autores do relatório.

    Fonte: BPBES – Adaptado (cores)

    Agora é preciso que os tomadores de decisão pautem o relatório em suas ações políticas para consolidar uma agenda oceânica robusta. Turra comenta sobre este próximo passo, “espero que o relatório seja usado para trazer bastante objetividade na forma como a gente discute a temática de oceano, para que a transição para um oceano sustentável ocorra, considerando os princípios de governança que nós trazemos, e que aqueles indicadores, ou aquela situação que a gente colocou seja alterada.

    Eu também imagino que seria muito importante que a gente conseguisse fortalecer um sistema de indicadores que pudesse permitir uma variação mais periódica do que a gente traz no diagnóstico, que são as importâncias do ambiente marinho, as informações sobre biodiversidade que sustentam essas importâncias e os vetores que vão pressionar. Precisamos colocar isso em prática”.

    Parceria:

    Sobre quem escreveu

    Juliana Di Beo: sou bióloga pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e bolsista Mídia-Ciência Fapesp pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp. Atuo com comunicação científica para fortalecer a cultura oceânica e o acesso aberto ao conhecimento na Rede Ressoa Oceano.

    Como citar:  

    Di Beo, Juliana. O bem-estar do povo brasileiro e o êxito econômico dependem da conservação do oceano. Revista Blogs Unicamp, Vol.10, N.1, Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/revista/2024/05/02/o-bem-estar-do-povo-brasileiro-e-o-exito-economico-dependem-da-conservacao-do-oceano/, Acesso em: DD/MM/AAAA

     

    Sobre a imagem destacada:

    Foto: Por keemkai villadums no Pexels (original) e expansão generativa Photoshop

    Edição: clorofreela

  • Chikungunya no Brasil: O que sabemos sobre a última onda?

    Adicione o texto do seu título aqui

    Autores

    Texto escrito por Ana de Medeiros Arnt, José Luiz Proença Modena, Shirlene de Lima e William M. de Souza .

    Como citar:  

    de Medeiros Arnt, Ana. Proença Modena, José Luiz. de Lima, Shirlene. M. de Souza, William (2023) Chikungunya no Brasil: O que sabemos sobre a última onda?. Revista Blogs Unicamp, V.09, N.01, 2023. Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/revista/2023/08/02/chikungunya-no-brasil-o-que-sabemos-sobre-a-ultima-onda/  
    Acesso em dd/mm/aaaa
    Sobre a imagem destacada:

    Fotografia em close do mosquito Aedes aegypti sobre fundo verde, sobre o qual se lê “Chikungunya”.

    Atribuição:

    Elementos Canva Pro; arte por Clorofreela.

  • A pandemia já acabou?

    Estamos há um tempo sem conversar por aqui. Ao longo destes últimos dois anos de pandemia, nossa frequência de textos foi muito grande e precisávamos reorganizar o trabalho. Especialmente agora, já que estamos com intensas atividades presenciais. Dessa maneira, a equipe do Especial COVID-19 precisou se afastar um tempo, uma vez que nossa atenção voltou-se para outras áreas que ficaram descobertas durante este tempo todo.Aliás, é relevante falar que já tem algum tempo que todos nós estamos com um comportamento que beira a tão desejada normalidade, não é mesmo? Voltamos às salas de aula, aos bares e restaurantes, aos espaços públicos – com espetáculos e reencontros. Ufa! Realmente estamos em um momento mais tranquilo.

    Isso foi por muito tempo nossa mirada diária, e estamos felizes de não ser tão urgente tudo o que precisamos fazer e falar sobre COVID-19 atualmente. Mas (sim, há um mas), a pandemia não acabou. E ainda precisamos de atenção e cuidado, informações que nos indiquem o que é ou não seguro.

    O que nos diz a OMS?

    A Organização Mundial da Saúde segue fazendo relatórios semanais sobre a situação da COVID-19, incluindo a decisão de manter o status de pandemia à doença. Isto quer dizer que ainda vivemos uma emergência sanitária global – embora exista diferenças entre regiões dentro dos países e entre os países do mundo. Assim, os relatórios da OMS falam da doença em diferentes continentes e países, sendo um boletim geral de como a COVID-19 está neste momento (vocês podem conferir o último relatório aqui, que está em inglês).

    A situação mundial da COVID-19 no painel da OMS
+ de 513 milhões de casos confirmados (total)
527 mil casos novos nas últimas 24h
+ 6 milhões de óbitos confirmados (total)

A situação brasileira da covid-19 no painel da OMS
+ 30 milhões de casos confirmados (total)
+ 21 mil casos novos nas últimas 24h
+ 663 mil óbitos confirmados (total)
1 a cada 3 pessoas tomou dose adicional de vacina

Especial COVID-19 Blogs Unicamp
ref mapa e casos: WHO COVID-19 Dashboard Geneva, acesso em 05/05/22.

    E a vacinação em nosso país?

    Se pensarmos o cenário de 2021 em que não sabíamos se haveria vacina para todos nós, atualmente nossa situação é realmente tranquila. A vacina chegou a muitos brasileiros sim. Dessa maneira, salvou vidas e diminuiu (muito) mortes e agravamento de doenças.
    Nós temos, neste momento, uma cobertura vacinal extremamente desigual em nosso país. Muito embora a vacinação tenha chegado, não tivemos uma campanha e distribuição centralizada, que garantisse igualdade de acesso em todo o território nacional
    Se formos levar em consideração a terceira dose (ou dose adicional), vemos que a situação é mais séria ainda. Nenhum estado brasileiro – nem São Paulo que é o estado mais vacinado do país – está acima de 50% de 3ª dose aplicada!

    Painel de cobertura vacinal (rede análise): mapa mostrando a cobertura de 2 doses e 3 doses.

    Já falamos inúmeras vezes aqui no Especial COVID-19 e em grupos parceiros, como o Todos Pelas Vacinas: vacinação é um pacto coletivo. É um projeto de política pública para proteção e cuidado da saúde de todos. É fundamental compreendermos a necessidade de seguirmos comunicando a importância da vacinação em todas as faixas etárias em que as vacinas já estão disponíveis em nosso país!
    A biomédica e divulgadora científica Mellanie Fontes-Dutra, da Rede Análise, além de nossa colega e parceira, segue a pleno vapor falando sobre vacinas, variantes e COVID-19 e já falou sobre a importância da vacinação contra a variante Ômicron. Aliás, esta variante é a responsável por este último pico de casos confirmados para a doença que aparece nos gráficos que mostraremos a seguir.
    Talvez fique mais fácil entender o papel da vacinação, como um dos fatores fundamentais de controle da doença, nestes próximos gráficos, também da Rede Análise, elaborados por Isaac Schrartzhaupt e Marcelo Bragatte.

    Se a pandemia não acabou, por que não temos mais óbitos?

    Uma das maiores tristezas destes dois anos de pandemia foi perceber que nos acostumamos a ver óbitos em diferentes espaços sociais. Chegou a morrer mais de 4 mil brasileiros por dia em 2021- isso sem contar a subnotificação por falta de testes no país. Sendo assim, o cenário agora parece realmente tranquilo. Afinal, morrem apenas 100 pessoas por dia (aproximadamente).
    Primeiramente, 100 pessoas por dia por uma doença é muita gente. Ainda são perdas inestimáveis para familiares, amigos e trabalhadores. Isto de modo algum é negar que o cenário é melhor do que o que já vivemos – mas está longe de ser o cenário ideal. E isto não pode ser deixado de lado.

    Vamos olhar alguns dados?

    Estes dois gráficos nos ajudam a perceber um pouco sobre o cenário da COVID-19 em dois momentos específicos. Com a seta em amarelo, estávamos com uma quantidade de vacinados baixíssima. Recém o Brasil estava recebendo vacinas e distribuindo em território nacional. Confirmávamos cerca de 100 mil casos por dia e cerca de 3 mil óbitos. Vivíamos o colapso do sistema de saúde em vários locais do país. Em Fevereiro deste ano (seta vermelha), vemos o número de casos confirmados aumentando muitíssimo – chegando a mais de 200 mil casos diários, a maior quantidade de casos confirmados de Covid-19. O número de óbitos aumenta, mas não acompanha a proporção vista no cenário anterior.

    Em um cenário de flexibilização das normas sanitárias crescente (que favorece a transmissão), tivemos o fator vacina como ponto fundamental em 2022.

    A vacinação foi e segue sendo uma ferramenta fundamental para o combate da pandemia de Covid-19

    Sim! Estamos em um cenário de razoável tranquilidade, mas precisa-se manter os olhos abertos. Mais do que isto: olhos abertos e máscara no rosto.

    – Ah, mas ninguém mais usa, em todos os lugares a obrigatoriedade da máscara caiu!

    Exatamente, sua obrigatoriedade caiu, mas não sua recomendação. Por um lado, em espaços abertos e não aglomerados já podemos ficar com relativa tranquilidade. Por outro lado, há pontos importantes a serem pensados. Inicialmente, a transmissão de COVID-19 não acabou. A máscara, aliada às 3 doses de vacinação, é uma das maiores barreiras que podemos ter.
    Em transportes coletivos e unidades de saúde, a obrigatoriedade permanece em grande parte das cidades. Nas salas de aula, a obrigatoriedade caiu para todas as faixas etárias… Este é um dos ambientes que consideramos mais importantes de serem analisados.

    E as salas de aula?

    A sala de aula, sem ventilação adequada (o que é a verdadeira realidade de grande parte das escolas públicas e privadas do país), é um espaço privilegiado para a circulação do vírus. Sendo a máscara uma barreira eficiente, por que não manter a máscara como obrigatória, tornando o espaço escolar mais seguro em termos de saúde pública?
    A insistência neste ponto, embora pareça ser “requentar debates”, é também sobre populações específicas que ainda não estão vacinadas e estão em um local de grande circulação de pessoas. Sim! Há populações dentro das escolas que não foram vacinadas ainda! Crianças abaixo de 4 anos aguardam seu grande momento chegar também.
    Enquanto isto não acontece, esta população é vulnerável a contrair a doença, seguir o ciclo de transmissão e, também, adoecerem de COVID-19. Como está o cenário escolar em meio à pandemia de COVID-19?

    Aumento de casos

    Temos acompanhado as notícias sobre o aumento de casos entre jovens e crianças em fase escolar. Em algumas unidades escolares em São Paulo, por exemplo, já se fala em voltar à obrigatoriedade do uso de máscaras.

    Nossa posição, aqui no Blogs Unicamp, sempre foi ponderar sobre a suposta urgência de se retirar a obrigatoriedade do uso das máscaras, que é uma das principais formas de impedir a transmissão em espaços fechados.

    Além disso – reiterando o que já disse antes – na escola há pessoas que ainda não se vacinaram, em função da idade. Ou tomaram apenas duas doses (tendo em vista que não temos três doses para estas faixas etárias ainda).

    Qual a pressa em retirar o uso de máscaras, sendo que elas protegem estas pessoas que estão vulneráveis em relação ao vírus SARS-CoV-2?

    Em estudo recente, realizado aqui no Brasil, foi apontado que a presença de funcionários e docentes com máscara já reduz muito a transmissão em ambientes escolares. Além disso, a condução das aulas na modalidade integral (dois turnos) e o uso apenas de máscaras de menor qualidade (não filtrantes, por exemplo) levou a um aumento de 559% nas infecções.

    Esses dados nos mostram a grande importância que as máscaras ainda possuem no nosso cotidiano, principalmente nesses ambientes fechados e com grande circulação de pessoas, como as escolas. Retirar a obrigatoriedade das máscaras nesses lugares seria, no mínimo, ir contra tudo o que estamos fazendo desde o início das vacinações para conter a pandemia.

    Além de proteger diretamente quem está no ambiente escolar de se infectar com o SARS-CoV-2 e desenvolver alguma forma da COVID-19, o uso contínuo das máscaras ajuda a reduzir a cadeia de transmissão do vírus, impedindo que as crianças, professores e funcionários – mesmo que não tenham sintomas – transmitam o vírus para os pais, filhos, cônjuges ou outros familiares. Lembramos que, apesar da infecção de COVID-19 causada pela variante Ômicron ser mais leve comparada a outras variantes, essa é uma doença que ainda mata, inclusive vacinados com a terceira dose (lembrando também do fato que muitas crianças pequenas não foram vacinadas ainda).

    As hospitalizações não acabaram…

    Não adianta querermos que a pandemia acabe por nosso cansaço. A permanência do vírus na população e a gravidade disso é que torna a Covid-19 uma emergência sanitária ou não.

    Em Campinas, por exemplo, 29% das UTIs infantis estão ocupadas por crianças com suspeita de Covid. CRIANÇAS! Desde quando começamos a compreender sua não relevância para voltarmos a uma normalidade, com esta população vulnerável?

    O aumento de casos recente fragiliza ainda mais esta população que não tem previsão de terceira dose, com novas variantes e subvariantes aterrizando em solo nacional.

    Tanto quanto para todas as pessoas que estão sem acesso à segunda e terceira dose da vacina – seja por falta de acesso à informação, seja pela falsa sensação de segurança. Precisamos seguir vacinando, a terceira dose é fundamental para nos proteger com segurança!

    Finalizando

    Por tudo isso exposto acima, seguimos firmes na defesa do uso das máscaras para todos, principalmente para e por nossas crianças.

    Use máscaras, se proteja, proteja quem está próximo, especialmente em espaços públicos fechados e mal ventilados.

    Referências

    GENARI, Juliano; GOEDERT, Guilherme T; LIRA, Sergio, HA; et al (2022) Quantifying protocols for safe school activities. arXiv:2204.07148 [physics.soc-ph].

    FAVERO, Paulo (2022). Alta de casos de Covid faz escolas de SP suspenderem aulas e exigirem máscaras. CNN.

    JULIÃO, André (2022). Estudo brasileiro reforça a importância de manter máscaras nas escolas. Galileu.

    G1, Jornal Nacional (2022) Testes positivos de Covid mais do que dobram em um mês, alertam farmácias.

    LEITE, Gabriela (2022). Covid: O que significa o leve aumento de casos no Brasil. Outra saúde.

    G1 Campinas (2022). Campinas chega à maior fila por enfermaria pediátrica, e 29% das UTIs infantis para SRAG são de casos suspeitos da Covid-19.

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadoresAlém disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • COVID-19: faz sentido calcular um único Rt para o Brasil?

    Sempre que era noticiado no jornal que “O Imperial College de Londres recalculou a taxa R para o Brasil” eu me perguntava: mas isso faz sentido? E isso me incomodava porque parecia que cada canto do Brasil estava num momento diferente da pandemia. Moro em Belo Horizonte e, quando Manaus estava colapsando, por aqui estávamos em um momento mais tranquilo. Para mim não fazia sentido… Para responder a essa questão vamos analisar como ocorreu a disseminação da COVID-19 pelo nosso país e fazer uma reflexão sobre a taxa de transmissão do coronavírus no Brasil – o agora famoso R0 (ou seria Rt?). Vem com a gente pra entender isso aí!

    COMO A COVID-19 SE ESPALHOU PELO BRASIL?

    Marcia Castro é uma demógrafa brasileira, professora em Harvard, e publicou um artigo sobre a disseminação da COVID-19 no Brasil. Para a pesquisadora, ao falarmos em número total de casos e de mortes acabamos por esconder as grandes diferenças entre os estados

    Os gráficos abaixo, elaborados por pesquisadores da Fiocruz-MG, cobrem o período de abril a julho de 2020, conseguimos comparar a razão de transmissão (Rt) do vírus SARS-Cov-2 em diferentes cidades do Brasil.

    Vamos falar sobre essa a taxa daqui a pouco, mas aqui conseguimos observar como esse padrão é diferente entre cada um desses locais.
    Texto: número efetivo de reprodução (Re ou Rt) de acordo com a data de notificação, para 12 municípios brasileiros em 2020.
12 gráficos com o eixo vertical contendo valores de Rt (entre 0 e 3), e o eixo horizontal as datas entre 8 de abril e 17 de julho. Os gráficos representam as cidades de Belém, Curitiba, Manaus, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Porto Alegra, Salvador, Brasília, Goiânia, Recife e São Paulo. O objetivo não são os valores em si, apenas a diversidade do comportamento do Rt.

    O que poderia explicar essas diferenças no padrão de espalhamento da COVID-19? Para Marcia Castro, a falta de uma ação coordenada pelo governo federal, somada a problemas de notificação e a ações locais descoordenadas (como o fechamento de cidades), podem ter contribuído para isso. O que a professora observou em seu trabalho é que, ao longo do tempo, houve um processo de interiorização da doença. Esse processo se deu tanto nos estados quanto no país como um todo – e, também, é o esperado em uma situação de epidemia.

    Explico: A pandemia começa em São Paulo, uma capital com grande movimentação de pessoas que vêm de fora do país, mas também acaba sendo um polo de dispersão para outros estados. Assim a pandemia que chega numa metrópole como SP, inicia seu movimento da capital para o interior do próprio estado, mas também para os demais estados brasileiros. Da capital, a COVID-19 se espalha para as regiões metropolitanas e vai cada vez chegando mais ao interior. Com isso, o que se observa é que, ao longo do tempo, o número de casos e mortes caem nas capitais à medida que sobem no interior do país.

    E é isso que o gráfico abaixo mostra pra gente.
    Texto: Percentual de casos e mortes por covid nas capitais dos estados e demais municípios por semanas epidemiológicas.
Gráfico com eixo vertical contendo percentual de casos ou mortes e o eixo horizontal contendo as semanas epidemiológicas (9 a 41) de 2020. Observa-se a linha de casos e mortes nas capitais saindo de 100% e caindo gradualmente até se estabilizar por volta de 25%. A linha de casos e mortes no interior segue oposta, saindo de 0% e se estabilizando por volta de 75%. As linhas se cruzam por volta da semana epidemiológica 19.

    Observe que a inversão ocorreu a partir da semana epidemiológica 19 (entre os 03-09/05/20) e que, devido ao processo de interiorização, as cidades do interior tiveram mais tempo para se preparar para a chegada da pandemia do que as capitais – assim como, por exemplo, o Brasil teve mais tempo do que países Europeus.

     Vale ressaltar ainda, que essa não é a única forma de dispersão do vírus, ele não chega uma única vez e se espalha. A entrada do vírus numa população pode ocorrer em vários momentos. No Amazonas, por exemplo, a variante Gama do novo coronavírus circulou por um bom tempo no interior do estado e foi constantemente reintroduzida em Manaus. A capital do AM, por sua vez, foi responsável pelo movimento contrário.  

    R0: COMO A GENTE MEDE O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM A PANDEMIA? 

    Tendo entendido que a disseminação se deu de forma diferente entre cidades e estados, podemos falar no R0.

    número médio de pessoas que uma pessoa contaminada infecta é chamado de R0 (lemos R-zero) ou de razão básica de reprodução de um vírus. 

    De uma forma mais técnica, essa definição poderia ser “o número de casos que se espera que ocorra em média em uma população homogênea como resultado da infecção por um único indivíduo, quando a população é suscetível no início de uma epidemia, antes que a imunidade generalizada comece a se desenvolver e antes que qualquer tentativa de imunização tenha sido feita”. Um ponto central, importante de ser ressaltado aqui, é a necessidade de que haja contato entre as pessoas dessa população.

    Por exemplo, se uma pessoa contaminada transmite, em média, a infecção para outras 3 pessoas (e assim por diante), temos um R0 com valor de 3. 
    Texto: Em uma situação de R0=3, uma pessoa com o vírus contamina outras 3, que por sua vez transmitem, cada uma, para outras 3.
Esquema representando uma pessoa transmitindo para outras 3. E cada uma para novas 3. Num esquema 1 -> 3 -> 9.

Texto: Ebola, Gripe (2009). R0 = 1,7
Texto: Poliomielite, Difteria, Caxumba, Rubéola, Varíola. R0 = 7
Texto: Sarampo: R0=18; Coqueluxe: R0 = 18
Para cada um dos textos, um esquema mostrando uma pessoa transmitindo vírus para 2 ou 7 ou 18 pessoas.

    É importante conhecermos o R0 de diferentes infecções virais para estabelecermos as estratégias de combate à infecção. Na imagem acima, observamos os valores estimados de R0 para diferentes doenças causadas por vírus. Ah! Veja bem, quando falamos do R0, nos referimos ao potencial de disseminação do vírus; e isso não está diretamente ligado à letalidade ou à gravidade da doença causada! Estima-se que o SARS-CoV-2 tenha um R0 de aproximadamente 2,6. 

    E quais fatores influenciam nesse valor? 

    – O tamanho da população e o contato entre os indivíduos

    – Quantos indivíduos são susceptíveis à contaminação pelo vírus

    – Capacidade de infecção do microrganismo 

    – Tempo durante o qual um indivíduo permanece transmitindo a doença

    – Taxa de remoção da infecção (por cura ou morte de indivíduos infectados)

    É importante ressaltar que o valor calculado depende da acurácia dos dados e do modelo epidemiológico utilizados. Dados ruins ou modelos pouco acurados podem distorcer muito os resultados. Desde o início de dezembro (10/12/20), quando o Ministério da Saúde foi hackeado, estamos sofrendo com um apagão de dados que está influenciando análises e estimativas sobre a pandemia no Brasil. O Observatório COVID-19 BR, por exemplo, deixa avisado no site: “Devido ao apagão de dados do Ministério da Saúde, estamos impossibilitados de atualizar nossas estimativas. Esperamos que o Ministério da Saúde reestabeleça os sistemas de informações afetados e assim possa manter a divulgação e transparência de dados em Saúde no país.

    Devemos sempre nos lembrar que: modelos não são exatos, eles são estimativas que nos orientam e devemos ter cuidado para que eles não sejam grosseiramente errados.

    MAS E O TAL Rt? NÃO É A MESMA COISA? 

    O número zero em R0 significa que o valor é calculado considerando que há imunidade zero na população – o que foi o caso do SARS-Cov-2 no início da pandemia. Mas esse valor não é adequado, quando queremos analisar a taxa de disseminação do vírus ao longo do tempo. 

    Apesar de parecido, para esses casos utilizamos o Rt ou Re (número efetivo de reprodução; R0 no tempo; velocidade de contágio no tempo), que varia ao longo do tempo e depende dos valores do momento em que foi medido, sendo, também, impactado pelo aumento da imunidade após infecção ou vacinação, bem como pelo comportamento das pessoas (distanciamento social, uso de máscaras, por exemplo).

    Assim, a variação do Rt ao longo do tempo nos ajuda a tomar decisões sobre políticas públicas durante a pandemia em curso. Isso acontece porque se o Rt é maior do que 1 (Rt>1) isso indica que a pandemia está em expansão; e se o Rt é menor do que 1 (Rt<1), a pandemia está em um momento de regressão, ou seja, a quantidade de pessoas contaminadas está diminuindo, podendo levar ao controle da doença.

    COMPARANDO OS VALORES DO Rt DE MANAUS E BELO HORIZONTE 

    Tendo estabelecido as definições dos conceitos, procurei duas cidades que imaginei terem um perfil diferente de transmissão do SARS-Cov-2. Escolhi Belo Horizonte (MG) por ser onde moro e Manaus (AM) devido ao colapso que aconteceu na cidade no final de 2020/início de 2021; além do fato de as duas cidades ficarem muito distantes entre si, havendo um baixo fluxo entre os seus habitantes. Lembrando que o objetivo aqui não é analisar as causas da melhora ou piora de indicadores.Aqui vemos os gráficos com valores de Rt das duas cidades de março de 2020 a dezembro de 2021, destacando no quadro em amarelo o período entre novembro de 2020 e janeiro de 2021. Apesar de a escala do gráfico não ser a mesma e dificultar a comparação, conseguimos observar que as curvas mostram comportamentos diferentes da pandemia nas duas cidades.

    Texto: Número reprodutivo efetivo (Rt ou Re) para covid-19 nas cidades de Belo Horizonte e Manaus.
São dois gráficos cada um para uma das cidades englobam o período de março/2020 a dezembro/2021. Novamente o objetivo não são os valores, mas o perfil do gráfico. Em Manaus o gráfico começa num Rt maior do que dois, caindo para abaixo de 0, e então apresenta picos nos meses de agosto, setembro, dezembro/20 e outubro e novembro/21. Em Belo Horizonte, o gráfico inicia com Rt próximo a 1, caindo para apresentar 3 picos de Rt aproximadamente igual 1,2 (abril a junho/20; novembro-dezembro/20 e fevereiro/21)
    Vamos agora, colocar os gráficos sobrepostos (mas apenas o recorte do período em destaque). Observe que enquanto a cidade de Belo Horizonte (azul) apresenta uma queda quase contínua dos valores de Rt, em Manaus observamos uma curva que aumenta antes de diminuir.
    Texto: Número reprodutivo efetivo (Re ou Rt) para covid-19 nas cidades de Belo Horizonte (MG) e Manaus (AM), entre os dias 01 de novembro de 2020 e 31 de janeiro de 2021.
Gráfico único plotado com os valores de Rt das duas cidades. Observa-se que Belo Horizonte tem uma queda gradual do Rt de 1,2 a 0,83. Já em Manaus, os valores flutuam em torno de 1 no mês de novembro para, então, a partir de 29/11 aumentarem. O Rt sai de 0,98 e atinge 1,38 em 20/dez. O valor permanece próximo até o dia 10 de janeiro/21, quando, então, cai rapidamente atingindo 0,84 no final do mês.

    E ENFIM, FAZ SENTIDO CALCULAR UM Rt ÚNICO PARA O BRASIL?

    Conseguimos ver que em cidades diferentes a propagação da pandemia se dá de formas também diferentes. Com isso entendemos que quanto mais ampliamos o foco da análise, mais estamos agrupando cidades com comportamentos distintos nos valores de Rt. Assim, análises de cidades são mais precisas que análises que comparam estados; e quando consideramos um país grande como o Brasil vemos valores que não retratam os detalhes e as divergências.

    Quando comentei no Twitter sobre este tema, recebi o contato do Rafael Lopes – que faz doutorado em física, é pesquisador na área de dinâmica epidemiológica e, também, membro do Observatório COVID-19 BR.

    Lopes ressalta que “calcular valores de Rt para um país grande como o Brasil é errado por definição, uma vez que o Rt é uma razão entre os casos de hoje e os casos anteriores numa dada comunidade, supondo-se, assim, que todos os indivíduos da comunidade estão em contato uns com os outros. Pessoas em Manaus não estão em contato com pessoas de Porto Alegre, por exemplo. Logo, calcular um R único para o Brasil coloca essa suposição [pessoas de diferentes cidades em contato] como verdadeira, mas ela é claramente falsa”.

    Como vemos abaixo, o Rt da COVID-19 no Brasil vem sendo calculado ao longo de toda a pandemia pelo Imperial College de Londres. Mas por qual motivo isso vem sendo feito? 
    Texto: Variação da estimativa do número efetivo de reprodução (Re ou Rt) da covid-19 ao longo do tempo no Brasil. 
Novamente o objetivo não são os valores, mas o perfil do gráfico que cobre todo o período da pandemia, destacando-se o período de 01/11/20 a 31/01/21. São dois picos nos meses de fevereiro e março/20, com Rt próximo a 4. Em seguida há uma queda entre março e maio com Rt próximo a 1,5. Os valores permanecem próximos a 1 quase todo o período, com um pico quase atingindo 1,5 em novembro/21. No período em destaque observa-se uma estabilidade do valor em torno de 1,3 com uma leve queda por quase todo o período, não se assemelhando com os gráficos de Manaus, que tem uma queda anterior, nem com Belo Horizonte que apresenta uma queda contínua no período.

    Calcular o Rt agregado pode útil pois nos permite fazer uma análise geral da situação do país e uma comparação a nível global. Mas essa abordagem, apesar de funcionar bem para países pequenos (como os da Europa, por exemplo) é, também, criticada para países grandes (como o Brasil e os Estados Unidos) pelos motivos que já levantamos no texto.

    Por fim, é importante lembrar que ao fazermos isso acabamos perdendo detalhes da pandemia e, portanto, esse valor não deve ser utilizado como única base para políticas públicas nacionais. Para essas situações, porém, devem ser consideradas as especificidades locais antes de tudo!

    REFERÊNCIAS

    Esse post foi escrito originalmente no blog Meio de Cultura

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Nosso normal: variantes, festas e aumentos de casos

    Talvez vocês tenham visto a notícia de um evento na Holanda, com 20 mil pessoas, “todos os protocolos” e resultou em, pelo menos, 1000 casos confirmados para COVID-19. Ao me deparar com esta manchete, fui ver alguns dados: como está a vacinação na Holanda, casos diários, entre outras coisinhas.

    Outra pergunta que me fiz foi: será que nunca mais poderemos fazer festivais ou grandes aglomerações, mesmo vacinados? E com a vacinação andando aqui no Brasil, estaremos finalmente a salvo? (a vacina não era, afinal, a solução que todos os divulgadores da ciência e cientistas nos venderam?).

    [pausa para recomendação de leitura com trilha sonora]

    Muitas perguntas… Sem embromação, vamos a alguns dados.

    O que podemos falar sobre a Holanda, neste momento da pandemia?

    • cerca de 17 milhões de habitantes;
    • 874 testes por milhão de habitantes;
    • 1.766.102 de casos totais;
    • 1.035 mortes por milhão de habitantes;
    • 17.773 mortes totais;
    • 67,38% da população tomou pelo menos 1 dose de vacina;
    Pessoas vacinadas com 1 dose, por país. Our World in Data

    Com base nestes dados, temos que 0,1% da população faleceu por COVID-19 e 10% da população contraiu COVID-19 ao longo de 2020 e 2021. Só a título de comparação, no Brasil temos 9% da população infectada e 0,25% de óbitos (em relação à população total do país). Isto levando-se em consideração que temos 253 mil teste por milhão de habitantes (próximo de 35% do que a Holanda faz de testes em sua população). Ou seja, temos dados bem mais complicados que estes e os testes e rastreios seguem sem serem feitos em nosso país, de forma adequada.

    O festival e as medidas de proteção

    A Holanda, desde 26 de junho (20 dias atrás, portanto) aboliu grande parte das medidas de proteção contra o coronavírus e isto envolvia grandes eventos no país.

    No dia 27 de junho foi o dia com menor quantidade de casos, desde meados de setembro de 2020 – registraram 499 casos no país. Além disso, dez dias depois da abertura, no dia 6 de julho, foram 2.209 casos registrados. Por fim, em 10 de julho, 10.299 casos novos de COVID-19.

    Dados compilados por SCHRARSTZHAUPT, Isaac e BRAGATTE, Marcelo. Painel Casos, óbitos e taxa de crescimento. Rede Análise Covid-19/Serrapilheira. Acessado em 16/07/2021. Disponível em: http://bit.ly/Rede_CasosObitosTaxa

    20 mil pessoas participaram do festival noticiado e somente pessoas vacinadas ou com o teste negativo poderiam entrar no local. Ele era em local aberto e aconteceu nos dias 3 e 4 de julho. Já tínhamos cerca de 40% da população holandesa vacinada com 2 doses. O que poderia ter dado errado, afinal?

    É bom apontar, antes de seguirmos no texto, que todas as vacinas têm indicado que a contaminação, mesmo com duas doses, é possível de ocorrer e há (nestes casos) uma diminuição da gravidade da doença. Isto é fundamental termos em mente: a vacinação protege em massa, é segura e é eficiente. Mas sempre corremos o risco de nos contaminarmos (em qualquer vacina da história, isto não é uma exclusividade destas vacinas de COVID-19).

    Sobre os testes de detecção do vírus SARS-CoV-2

    Não que seja recente este tipo de discussão, mas sempre é bom retomar. Cada vez que um evento como este ocorre, parece que temos que voltar lá para as primeiras postagens, textos e discussões que fazíamos em 2020 (parece tão longínquo, porém necessário!).

    Voltemos então

    Entre a exposição ao vírus (o dia que nos infectamos) e o momento em que conseguimos detectar a infecção em testes de PCR (que detectam material genético de vírus) ou testes de antígeno (que detectam proteínas do vírus) existe um tempo em que não conseguimos averiguar exatamente se estamos ou não contaminados.

    Em geral, para as linhagens de SARS-CoV-2 no início da pandemia, falávamos de um intervalo entre 5 a 7 dias para detectar o vírus, com teste de PCR (para testes de antígeno falamos deste mesmo intervalo mais ou menos).

    A Mellanie Fontes-Dutra lançou ontem um fio explicando que para a variante Delta este tempo pode cair para 4 dias, em função da alta carga viral desta variante… Recomendo fortemente a leitura

    Ao passo que a Delta é detectada mais cedo que as variantes anteriores ou a cepa original, ela também é mais transmissível. Há três dias atrás o diretor geral da OMS afirmou que a Delta está presente em 104 países e se tornará a variante predominante em breve.

    Esta onda de contágios na Holanda – assim como em outros países cuja vacinação está mais avançada e a pandemia parecia controlada – é, ao que tudo indica, consequência desta variante.

    Entretanto, voltando aos testes, uma questão fundamental aqui é relembrarmos algo fundamental: existe um intervalo de tempo sem sintomas e com muita transmissão do vírus.

    No caso da variante Delta, que causa uma carga viral tão alta a ponto da detecção acontecer no 4º dia após a exposição, a transmissão também está acontecendo de forma intensa. Dessa forma, repito: sem sintomas aparentes (ou discretos demais para nos protegermos e isolarmos).

    O que eu gostaria de frisar sobre testes é: o teste é um retrato do passado (entre 4-9 dias do contágio).

    Isto é importante pois temos falado o tempo inteiro sobre testes e rastreios desde o início da pandemia. E talvez neste momento alguém possa perguntar:

    – Mas Ana, se é um retrato do passado, o que adianta fazer testes?

    Ora… é fundamental para conseguirmos isolar pessoas, comunicar a possibilidade de contágio para quem tivemos contato e isolar estas pessoas também (e possíveis contatos destas pessoas neste meio tempo).

    Além disso, em casos em que pessoas têm se exposto no ambiente de trabalho, por exemplo, os testes frequentes permitem ir acompanhando e conseguem minimizar o impacto de uma infecção em todo um grupo que atua junto. 

    Teste e rastreio são uma das medidas mais importantes de controle, pois sua constância permite monitorar a situação de um grupo de pessoas.

    Nem começarei a falar aqui das medidas não farmacológicas como máscaras, distanciamento e evitar espaços fechados e sem ventilação, afinal todos sabemos que elas são super eficientes para diminuirmos a circulação do vírus, né?

    O festival, as vacinas e os intervalos dos resultados negativos

    Retomando: pois é. Aglomerar com medidas de segurança não funcionou. Quem poderia prever que “todos os protocolos” não funcionariam? 5% das pessoas do festival positivaram. Isto nos mostra que este “olhar para o passado” que os testes nos proporcionam não nos assegura de muitas coisas – a não ser quando feito de maneira frequente e com rastreios constantes. Sem o monitoramento frequente através dos exames, vacinação completa e em massa população e os protocolos de prevenção seguidos à risca (máscara, distanciamento, espaços ventilados, sem aglomeração) não há garantias de não infecção, principalmente com o surgimento de novas variantes…

    Nós temos visto as discussões acerca da variante Delta, sua transmissibilidade é altíssima, já falei isso anteriormente. Todavia, embora ela não escape da imunização das vacinas atuais, ao que tudo indica é fundamental termos as duas doses aplicadas. Mas retomemos os dados: 63,38% de pessoas com uma dose aplicada, 40% das pessoas têm as duas doses.

    E os casos na Holanda? Subindo – como o primeiro gráfico deste texto nos mostrou.

    Até quando? Até quando seguiremos dando estas oportunidades repetidas às variantes, exercendo pressão seletiva sobre as variantes e possibilitando mais e mais infecções por uma suposta volta à normalidade?

    Estes passaportes imaginários para adentrar em mundos seguros e livres de Covid precisam de muito mais estrutura, mudanças de comportamentos e, principalmente, levar a sério a noção de que nosso mundo mudou.

    Temos nos perguntado sobre o “novo normal” há 16 meses. Também perguntamos sobre quando voltaremos ao nosso normal.

    O que é normal?

    É um mundo que segue acreditando que a única possibilidade de felicidade, extravasar energia, viver bem é juntando-se com 20 mil desconhecidos. Tanto quanto um mundo com gente que frequenta restaurantes caros. Isto tudo dividindo o espaço com profissionais nos servindo ganhando pouco mais do que o suficiente para sobreviver. Além disso, claro, estas pessoas não tem outra alternativa a não ser aglomerar em metrôs e ônibus lotados para chegar ao nosso espaço de lazer. Nosso normal tem quase 8 bilhões de pessoas, com grande parte da população passando fome e sem condições mínimas de saúde. Isto em um mesmo lugar que alcançamos vacinas em menos de um ano contra uma doença avassaladora.

    Estamos em um mundo que passa fome e explora o espaço defendendo sua democratização para quem pode pagar fortunas difíceis de caber em ideias mundanas.

    Simultaneamente, nosso normal segue pensando um mundo que os protocolos de um país o isolaria dos demais que não estão seguindo os protocolos. Enquanto isso, as variantes circulam, aumentam, e a preocupação é quando poderemos, afinal, voltar ao normal.

    Caso estejas no Brasil (como grande parte dos que leem o Blogs da Unicamp estão), vivemos como se nossos escassos vacinados possam segurar variantes que chegam em campeonatos impensados ou em férias que não podiam ser reagendadas. Talvez os vacinados segurem estatísticas que não cessam de emergir e políticos que ignoram o que este vírus têm nos mostrado de maneira didática:

    Doenças são sociais, mesmo quando são um conjunto de sintomas fisiológicos causados por um agente viral.

    Uma doença como a COVID-19 nos esfrega na face, diariamente, que nosso normal não era aceitável e não sabemos o que fazer, frente à urgência de mudarmos – como indivíduos, sujeitos, coletivos, populações, humanidade.

    Dessa forma, podemos olhar dados passados e constatar que antes da pandemia, os metrôs paulistanos transportavam cerca de 200 milhões de pessoas por mês. Isto é, o equivalente a um país inteiro como o Brasil circulava em linhas de uma das maiores metrópoles do mundo. Como estamos neste momento? Cerca de 96 milhões de pessoas mensalmente. A pandemia diminuiu a mobilidade nos metrôs para pouco menos da metade, ainda assim, é como se fosse Vietnã inteiro andando de metrô mensalmente.

    Assim, me pergunto: o centro de São Paulo representam quantos festivais de Amsterdã diariamente? De pessoas sem vacinas suficientes, nem testes possíveis, o que dirá rastreios de nossas mazelas?

    O nosso normal nos trouxe ao descaso com vidas e desapreço pelas possibilidades de a ciência ser exercida com empatia para todos e por todos (no Brasil e no mundo).

    Pensando sobre Humanidade em tempos de pandemia

    Krenak diz que “nosso tempo é especialista em criar ausências: do sentido de viver em sociedade, do próprio sentido da experiência da vida” (p.26). Esta passagem (o livro todo) nos propõe a pensarmos em Ideias para adiarmos o fim do mundo que se vinculam a novos conceitos de humanidade para podermos viver. Uma humanidade que se pense não como produto para consumo, não como objeto para trocas, não como idealizações que culminam em mortes em massa. É preciso repensar o que nos trouxe até aqui, antes de querermos voltar ao que, supostamente, existia antes.

    “Assim como nós estamos hoje vivendo o desastre do nosso tempo ao qual algumas seletas pessoas chamam de Antropoceno. A grande maioria está chamando de caos social, desgoverno geral, perda de qualidade no cotidiano, nas relações, e estamos todos jogados neste abismo” (p.72)

    Em suma, pergunto: queres voltar ao nosso normal?

    Nosso normal nos trouxe até aqui. 

    Para saber mais

    DW (2021) Quase mil pessoas se infectam em festival de música na Holanda e Premiê da Holanda se desculpa por relaxar medidas anticovid

    El Pais (2021) A variante delta do coronavírus, mais contagiosa, se espalha por países da América Latina

    Dados mundiais sobre vacinação, testes, casos e óbitos: Worldometer Coronavírus, Our World in Data

    Krenak, Ailton (2020) Ideias para adiar o fim do mundo, São Paulo: Companhia das Letras.

    Textos do Blogs sobre o tema:

    Solidariedade: saúde para todos

    Sobre o período de incubação da doença e suas relações com a quarentena…

    Passaporte Nacional de Imunização e Segurança Sanitária – Faz sentido isso?

    Este texto é original e foi produzido com exclusividade para o Especial COVID-19

    Agradecimento especial ao Isaac Schrarstzhaupt que debateu sobre os dados e ajudou a organizá-los para este post, Erica Mariosa, Carolina Frandsen e Graciele Oliveira que revisaram o texto, e minha mãe, que falou “nosso normal nos trouxe até aqui” (obrigada por tudo sempre, inclusive).

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Estratégias de vacinação: o que se leva em conta?

    Nunca se debateu tanto vacinas e vacinação: o que é eficácia, segurança, testes, grupos de risco, planos nacional, estadual, etc.

    Por muito tempo no Brasil, o Programa Nacional de Imunização ocorria anualmente, com campanhas, grupos prioritários e estratégias de imunização para diminuir a incidência de doenças evitáveis sem que houvesse qualquer polêmica atrelada a isto. 

    Talvez uma das perguntas que agora fundamentais de responder: existem critérios para a escolha dos grupos prioritários para a vacinação? A ciência possui metodologias e estudos que apontem como isto deveria organizar-se?

    Estas perguntas são importantes. Por um lado, já temos indicação de quais grupos podem se vacinar – pelos testes tanto de segurança, quanto de eficácia. Por outro lado, por toda a estrutura de vacinas ser muito recente, não teremos vacinas imediatamente para todo o mundo. Sendo assim, é preciso priorizar, montando listas de acordo com algum critério.

    Considerando que estamos vivendo uma pandemia, de uma doença altamente contagiosa, os profissionais de saúde ocupam um dos postos prioritários para a vacinação. Por quê? Ora! É fundamental que estes profissionais mantenham-se saudáveis e bem, para seguir trabalhando na urgência que temos precisado.

    A discussão ronda o “segundo lugar” das prioridades – e todos os lugares que se sucedem ao segundo… Montar uma lista de prioridades, neste caso que vivemos, é basear-se em modelos epidemiológicos e matemáticos de como a doença avança e como podemos interromper este avanço, com a vacina.

    Nós sabemos que a função prioritária da vacina é fazer com que os indivíduos vacinados consigam gerar uma proteção contra as doenças. Mas também já conversamos aqui no Blogs sobre como isto não é sobre um indivíduo protegido, mas sobre bloquear o avanço da doença na população.

    Pois bem: é sobre isto que estes modelos tratam.

    Um estudo publicado em preprint em dezembro de 2020 (1), mostra que para a COVID-19, vacinas com acima de 50% de eficácia já reduziriam muito o avanço da doença. Além disso, evitaria-se 50% de mortes com pelo menos 35% da população vacinada (fenômeno conhecido como Cobertura Vacinal) – comparando-se com o cenário de não termos tratamentos para a doença. Vacinas com esta eficácia e ampla cobertura vacinal, já atingiriam a meta (nos Estados Unidos) de ocupação dos leitos de UTI dentro das demandas passíveis de serem atendidas.

    Assim, no modelo proposto pelos autores, uma cobertura vacinal de 70% da população, com uma vacina que apresentasse 60% ou mais de eficácia, conteria a pandemia de Covid-19. (Este dado leva em conta uma baixa transmissão na população!). *Atualização: este texto foi elaborado antes do debate sobre as novas variantes. Tal dado tem sido revisto em novas análises e deve ser levado em consideração para um debate mais preciso [nota da autora].

    Tudo isto parece bem interessante e já temos visto bastantes notícias sobre a importância da cobertura vacinal… Todavia, como priorizar quem será vacinado primeiro?

    Depende…

    Ué! Como assim?

    Temos dito aqui no Blogs: a vacinação é uma estratégia de governo, uma política do país, para minimizar efeitos de uma doença na população. Por ser estratégica, ela deve possuir metas específicas a serem atingidas – e estas metas são organizadas a partir de estudos técnicos pelas instâncias de gestão de saúde pública. No nosso caso: Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.

    Como não teremos vacinas para toda a população desde o início, existe a necessidade de estabelecimento destas metas e objetivos. Por exemplo, neste modelo indicado anteriormente, os autores dizem que dependendo da eficácia das vacinas (e outros fatores): 

    • Se a meta consiste em diminuir infecções sintomáticas e hospitalizações fora da UTI, deveria-se priorizar os grupos jovens, pois interrompe-se a transmissão em um dos grupos que mais circula;
    • Entretanto, se a meta é diminuir infecções em UTIs, com possibilidade de agravamento e morte, idosos devem ser prioridade de vacinação;

    Sugere-se estes modelos de modo generalista e os próprios autores propõem que novos parâmetros devem adicionarem-se adicionados, dependendo da realidade do sistema de saúde pública de cada país e, além disso, as questões de desigualdade social.

    Em outra pesquisa, também em preprint(2), os cientistas reforçam a ideia dos critérios de vacinação por idade, devido à alta mortalidade vista neste grupo.

    Mas então os critérios se restringem à idade?

    Também não. Para compreender como controlar a doença, as pesquisas usam esses modelos matemáticos elaborados a partir de modelos anteriores. Por exemplo, usamos modelos de gripe, mas vamos inserindo características da Covid-19 – até que esse novo modelo seja funcional para a nova doença e a represente com mais fidedignidade. Da mesma forma,  a Covid-19 servirá de modelo para alguma outra doença respiratória viral que  iremos enfrentar no futuro.

    As modelagens para controle da doença, via vacinação, levam em conta as taxas de infecção por idade e grupo de risco. Todavia, também buscam compreender e calcular a partir do desenvolvimento da doença em cada país ou região. Além disso, é preciso considerar a eficácia das vacinas, a cobertura vacinal para cada faixa etária e grupo de risco analisado.

    Por exemplo, países com populações que vivem abaixo da linha da pobreza ou em situação de vulnerabilidade, precisam ter incluídas na conta  como a transmissão e o risco de infecção atingem estas populações. Com isto, elaboramos as estratégias de vacinação a partir de riscos específicos. O mesmo pode ser dito e pensado acerca das prioridades de trabalhos e demandas sociais – escolas, transportes, setores alimentícios, populações urbanizadas ou rurais, etc.

    Cada um destes itens pode (e na medida do possível, deve) ser adicionado aos modelos que calculam o avanço da doença – ou sua contenção – junto com instrumentos como a vacina.

    A vacinação e as políticas públicas

    É sempre bom retomar a ideia de que sendo a vacinação da Covid-19 um acontecimento recente (por motivos óbvios), é imprescindível que ela seja planejada e estruturada para atingir não apenas uma grande cobertura vacinal, mas também grupos prioritários que vão diminuir a pressão em leitos hospitalares.

    Isto é, os grupos prioritários também são pensados em função de ocupação de leitos hospitalares e, portanto, diminuição de mortes de Covid-19, de outras doenças que atualmente estão sem leitos hospitalares e custos elevadíssimos para a saúde pública.

    Vacinar se torna, assim, uma ferramenta crucial para diminuir contágios e mortes, mas também gastos com a saúde de toda a população. Vou falar novamente, pois acho fundamental lembrar e bater nesta tecla:

    Para saber mais

    1. Matrajt, L; Eaton, J; Leung, T; Brown, E. (2020) Vaccine optimization for COVID-19: who to vaccinate first? 
    2. Bubar, K; Reinholt, K; Kissler, SM; Lipsitch, M; Cobey, S; Grad, YH; Larremore, DB (2020) Model-informed COVID-19 vaccine prioritization strategies by age and serostatus

    Outras Referências

    Brasil (2020) Programa Nacional de Imunização

    Brasil (2020) PLANO NACIONAL DE OPERACIONALIZAÇÃO DA VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19

    Kornfield, M (2020) When will children get a coronavirus vaccine? Not in time for the new school year, experts fear. The Washington Post

    Outros textos do Especial sobre vacinas:

    Vacinas: se eu quiser eu tomo!                           

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os produziram-se textos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, os textos passaram por revisão revisado por pares da mesma área técnica-científica na Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • 1.000.000, 272, 200

    Sugestão para escutar enquanto a leitura segue
    Um milhão um mil quatrocentos e setenta e sete

    Duzentos e setenta e dois

    Duzentos.

    O quê? Mortos, dias de anúncio da China, dias de anúncio da Organização Mundial da Saúde (OMS).

    Não sabe do que se trata ainda?

    Do assunto que se tornou o grande tema a ser debatido neste ano. Coronavírus, também conhecido como SARs-CoV-2, o causador da COVID-19. Portanto, o protagonista de várias de nossas conversas atuais.

    Hoje ultrapassamos a marca de 1 milhão de mortos no mundo, aos 200 dias de pandemia decretada pela OMS, 272 dias do anúncio oficial do governo Chinês (31 de Dezembro de 2019) sobre o vírus.

    No Brasil, hoje foram mais 300 mortes registradas no site worldmeters, com 141.741 mortes acumuladas. Estamos em segundo lugar no mundo em mortes totais. Somos o terceiro país em quantidade de infectados, com 4.732.309 – oficialmente. Estamos em terceiro lugar em novos infectados confirmados HOJE, mais 14.194. Terceiro lugar, também, em “mortes novas” (ocorridas no dia de hoje, 27 de setembro). Temos 539.731 casos ativos confirmados, sendo 8.318 destes casos críticos.

    Em casos relativos, por milhão de habitantes, estamos em sétimo lugar (ufa, não é mesmo?), com 666 mortes por milhão. Somos o sexto país do mundo que fez mais testes (17.900.000) o que parece bastante. No entanto, isto representa estarmos em 82ª posição no mundo em quantidade de testes por milhão de habitantes.

    As mortes do Brasil representam 14% das mortes totais por coronavírus no mundo.

    São números.

    Como assim? Pois é, temos nos acostumado a eles, os assombros das primeiras semanas foram tornando-se nubladas e sem muito sentido ao longo destes 200 dias de pandemia. Não te parece?

    Com bares abertos, praias lotadas, kits covid sem comprovação científica sendo distribuídos, dizeres anti-vacina propagados pelo alto escalão do governo, dinheiros de pesquisa cortados em todos os âmbitos do governo (este ano e ano que vem também) e relativização dos riscos como pauta para abertura de escolas.

    O mundo apresenta o cenário perfeito para qualquer grande conto de ficção científica. Isto é, descrenças em cientistas, pânico moral pelo simples abraço, assujeitamento às condições de clausura ou às necessidades imperativas de pôr alimento à mesa. Vocês conseguem imaginar a narrativa?

    Nós poderíamos descrever com detalhes como vislumbramos uma cena. Mas pareceria cruel tal descrição e, claro, talvez não pareça ficção.

    [pausamos a escrita. respiramos fundo]

    Recarregamos a página com o placar Covid-19 do site Worldmeters. Enquanto escrevíamos até este ponto, mais 261 pessoas morreram – só com a Covid-19.

    Às vezes parece uma realidade paralela “Justo na nossa vez, na nossa vida”, podemos pensar… Mais mortes, mais vidas. No entanto, se estamos reclamando é por estarmos vivos. Mas não adianta esconder, o pensamento volta:

    Justo na nossa vez, na nossa vida

    A resiliência segue e parece pífio falar em necropolítica, em ACE2 ou Spike. Pífio pelo cansaço de uns, pela evidente resistência dos corpos que, no dia a dia, vivem desde o dia 1 de isolamento social, sem isolamento. Que trabalham, vivem, morrem cotidianamente.

    Tampouco parece funcional bradarmos por verbas para a ciência, seguirmos batalhando para que não cedamos para grandes abates por políticas públicas. Contudo, sei lá, montar notas de repúdio e tuitaços falando de nossa auto-importância não ajudou.

    Dessa forma, parece banal falar de esperança. Sentimos como se isso fosse minimizar as mortes até agora sentidas. Assim, destacamos, em um editorial de divulgação científica, que não há ciência suficiente para explicar a dor que estamos vivendo. Um milhão de mortes confirmadas de uma causa que, antes de 31 de Dezembro de 2019, não existia para o mundo.

    Um milhão de mortes!

    Todavia, mesmo não havendo ciência que explique toda a dor sentida pelas perdas desta doença (mortes reais e simbólicas) é através destes conhecimentos científicos produzidos nestes últimos 272 dias – que são também resultado de centenas de anos de busca pela compreensão dos fenômenos naturais, sociais e culturais – que temos conseguido permanecer firmes e avançar. E é nos passos destes conhecimentos, e por todas as pessoas que existem e por todas as que se despediram de nós este ano, que seguiremos batalhando para chegar a soluções mais justas e éticas, para a saúde de todos, com e pela ciência.

    E enquanto produzíamos este texto, ao fim, recarregando o painel mundial, 1.002.402 mortes. Isto é, 925 óbitos por coronavírus, enquanto cerca de 800 palavras foram escritas, lidas, revisadas, reescritas.

    Mas ‘Blogs’, são só números!

    Todavia, se os números te parecem monótonos e sem sentido, recomendamos a visita no projeto INUMERÁVEIS. Um memorial dedicado a cada uma das pessoas mortas pela Covid-19. Ou seja, Não são números: são pessoas, famílias, amigos. Com nomes, sorrisos, força, trabalho, frugalidades, e é disso que se trata. 

    Cópia de tela do projeto Inumeráveis.https://inumeraveis.com.br/

    E é por isso, também, por estes nomes, pessoas, sorrisos, forças e frugalidades que viveram e se despediram que, hoje, gostaríamos de acabar o texto com esperança, no meio de todo este pesar. Esperança pelos saberes que temos e produziremos pela ciência. E esperança, por respeito a todos os que nos deixaram este ano, de que seguiremos lutando, por outros dias que nos aguardam. Por ímpetos e intenções de esperança, mas sem tirar os pés do chão, com o som e a voz de Milton Nascimento, quando ele diz:

    E o que foi feito é preciso conhecer para melhor prosseguir
    Falo assim sem tristeza, falo por acreditar
    Que é cobrando o que fomos que nós iremos crescer
    Nós iremos crescer, outros outubros virão
    Outras manhãs, plenas de sol e de luz 
    (O que foi feito deveras (de Vera) letra de Fernando Brant)

    Para ler mais

    Academia Brasileira de Ciência (2020) CNPq pode sofrer novo corte em meio à pandemia

    Amado, Guilherme (2020) Depois da Capes, governo corta bolsas também do CNPq: redução chega a 85%. Revista Época

    Bessa, Eduardo (2020) Kits de HCQ e ivermectina são ilusão perigosa na pandemia; Instituto Questão de Ciência, 2 de Julho de 2020.

    Brasil, Ministério da Saúde (2020) Portaria nº 1.565 de 18 de Junho de 2020, Diário Oficial da União, ed 116; seção 1; p 64; 19/06/2020

    Bonora Junior, Maurilio (2020) Se o coronavírus é um vírus pulmonar, como ele infecta outros órgãos? (parte 1) Blogs de Ciência da Unicamp, Especial Covid-19

    Gallas, Daniel (2020) Coronavírus na escola: o que diz a ciência sobre os riscos da volta às aulas? BBC News Brasil, 7 de agosto de 2020.

    Oliveira, Leonardo (2020) Da fatalidade epidemiológica à ferramenta de extermínio: a gestão necropolítica da pandemia Blogs de Ciência da Unicamp, Especial Covid-19

    UOL (2020) Marcos Pontes diz que órgãos de pesquisa devem sofrer cortes no ano que vem

    Este texto é original e foi produzido com exclusividade para o Especial Covid-19, em nome da equipe editorial

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e que são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • As não intermitências dos leitos de UTI

    Desde janeiro deste ano, estou participando de um clube de leitura com alguns amigos. Escolhido há meses, o livro da vez é As intermitências da morte”, de José Saramago.

    Nesse livro, num belo dia, a morte simplesmente resolve tirar um período sabático e ali, naquele país, ninguém mais morre. Maravilha né? Na verdade, nem tanto. Um caos é instalado naquele lugar, com direito a crise religiosa, crise funerária… E, claro, crise no sistema hospitalar…

    E era sobre isso que eu queria falar com vocês. Mas antes, leia abaixo um trecho que fala da crise que se instaura nos hospitais. Se você não conhece o livro, não se preocupe, não é spoiler e é um trecho pequeno e do início do livro – ah, e o texto é em português de Portugal!

    Também os directores e administradores dos hospitais, tanto do estado como privados, não tardaram muito a ir bater à porta do ministério da tutela, o da saúde, para expressar junto dos serviços competentes as suas inquietações e os seus anseios, os quais, por estranho que pareça, quase sempre relevavam mais de questões logísticas que propriamente sanitárias. Afirmavam eles que o corrente processo rotativo de enfermos entrados, enfermos curados e enfermos mortos havia sofrido, por assim dizer, um curto-circuito ou, se quisermos falar em termos menos técnicos, um engarrafamento como os dos automóveis, o qual tinha a sua causa na permanência indefinida de um número cada vez maior de internados que, pela gravidade das doenças ou dos acidentes de que haviam sido vítimas, já teriam, em situação normal, passado à outra vida. A situação é difícil, argumentavam, já começámos a pôr doentes nos corredores, isto é, mais do que era costume fazê-lo, e tudo indica que em menos de uma semana nos iremos encontrar a braços não só com a escassez das camas, mas também, estando repletos os corredores e as enfermarias, sem saber, por falta de espaço e dificuldade de manobra, onde colocar as que ainda estejam disponíveis. – As intermitências da morte. José Saramago, Companhia das Letras.

    Quando li esse trechinho não tive como não comparar com a situação que observamos em vários hospitais do país… Situação agravada pela COVID. Quando pensamos em leitos de enfermaria e UTI, pensamos em rotatividade: um fluxo contínuo de entrada e saída de pacientes. No caso dessa história contada por Saramago, as pessoas chegam doentes, às vezes em estado grave. Alguns provavelmente se curam e deixam os hospitais, mas outros com certeza chegam em estado muito grave, tão grave, que esses pacientes deveriam morrer – mas não morrem (afinal, a morte deu uma trégua). Assim, os leitos passam a ser ocupados por esses pacientes e acabam não são liberados… A consequência é que a ocupação, por esse motivo, atinge seu máximo em pouco tempo e pronto: está instaurado o caos descrito no trecho.

    Voltando a nossa realidade, o que observamos na Itália (em março) e estamos vendo agora em alguns estados do Brasil é que, além de um grande influxo de pacientes ao mesmo tempo (pacientes estes que não estavam sendo esperados, afinal pacientes com COVID não estavam no fluxo dos pacientes hospitalares até três meses atrás) nos hospitais, o período de internação, inclusive nas UTIs é bem maior. De acordo com a AMIB (Associação de Medicina Intensiva Brasileira) um paciente na UTI permanece internado, em média, por cerca de 6 dias, enquanto para um paciente com COVID a duração da internação na UTI é de aproximadamente 14-21 dias. Soma-se a isso os profissionais da saúde que acabam se contaminando e devem ser afastados e os leitos ocupados pelos pacientes do fluxo normal (afinal derrames, acidentes, câncer e outras emergências continuam acontecendo mesmo com a pandemia!).

    Em reportagem do dia 19/06/2020, a BBC Brasil apresentou a figura abaixo com as taxas de ocupação de leitos de UTI nos Estados Brasileiros, com dados das secretarias de saúde dos estados até o dia 17/06. Alguns estados (n=14) apresentaram sinais de queda devido às medidas de distanciamento social adotadas (AM, AP, CE, ES, MG, PA, PB, PE, PI, RJ, RN, SC, SP e TO), seis estados estão com as taxas de internação estabilizadas ou com sinais de estabilização (AC, AL, BA, GO, MA, RR) e 6 estados (MS, MG, PR, RS, RO, SE) + o Distrito Federal (DF) estão com taxas em ascensão ou com sinais de alta.

    Apenas como exemplo, de acordo com a reportagem, o principal hospital de Roraima (HGR) em uma semana teve um pulo de 71% para 110% da capacidade. Aqui, em Belo Horizonte (onde moro), estamos vendo um aumento relativamente rápido das ocupações de leitos após a abertura de quase todo o comércio; a Santa Casa BH, por exemplo, está se preparando para, nos próximos dias, dobrar de 50 para 100 os leitos de UTI. Isso nos leva a inferir que alguns locais ainda não entraram em colapso por estarem conseguindo abrir novos leitos em tempo de atender à população.

    Essas taxas de ocupação de leitos são um dos principais indicadores para os dirigentes tomarem as decisões sobre abrir ou não os comércios locais. Mas pela dinâmica da infecção, geralmente esses dados refletem as taxas de infecção com 2 semas de atraso. Assim, as decisões devem ser tomadas com cautela e previsão estimada da situação da contaminação em cada cidade individualmente. Comparar dados de cidades diferentes, em momentos diferentes da curva, e de países diferentes talvez não seja uma boa ideia. A Ana Arnt faz uma reflexão sobre isso nesse post: “Podemos comparar estas duas cidades? Exercícios complexos para uma pergunta simples” (parte 1) e (parte 2).

    DICA DE LIVRO!

    Para terminar, queria voltar na indicação do livro As intermitências da morte”, de José Saramago. Neste livro, Saramago, laureado com o prêmio Nobel de Literatura em 1998, parte de uma premissa simples para escrever um livro fantástico: e se as pessoas parassem de morrer?

    Uma pergunta que parece irrelevante, mas que quando analisada mais a fundo traz consigo grandes questões… Economia, saúde e até mesmo a religião são afetadas. O que parece ser um grande acontecimento feliz, a vida eterna se transforma, em pouco tempo, numa situação de difícil resolução.

    Apesar de estar esgotado na editora em sua versão física, o livro pode ser comprado em ebook. Clicando e comprando por este link você é direcionado para a Amazon e pode ajudar o blog: As intermitências da morte”, de José Saramago.

    REFERÊNCIAS:

    Reportagem da BBC Brasil: Coronavírus: 14 Estados têm queda de internações após isolamento social; DF e outros 6 Estados enfrentam alta.

    Comunicado da AMIB, disponibilizado no site da SOMITI: COMUNICADO DA AMIB SOBRE O AVANÇO DO COVID-19 E A NECESSIDADE DE LEITOS EM UTIS NO FUTURO

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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  • Da fatalidade epidemiológica à ferramenta de extermínio: a gestão necropolítica da pandemia

    Texto escrito por Leonardo Oliveira*

    O crescente número de infectados e mortos pelo novo Coronavírus (Sars-Cov-2) ao redor do mundo tem gerado preocupação e exigido a tomada de atitudes inéditas entre governos e cidadãos para frear a pandemia. As medidas de distanciamento social e isolamento recomendadas pela Organização Mundial da Saúde, até então o meio mais eficaz de diminuir o ritmo de disseminação da doença e amenizar o iminente colapso dos sistemas de saúde, têm causado mudanças drásticas nos hábitos e comportamentos da população. O esforço dos agentes públicos e da mídia para efetivar o isolamento não tem surtido o efeito desejado (SÃO PAULO, 2020). Cultivando o desejo de retorno a uma normalidade cotidiana potencialmente mortal, ainda é possível verificar aglomerações e ruas com intensa circulação de pessoas, mesmo com a suspensão de todos os eventos e reuniões públicas e interrupção dos serviços não essenciais. Uma realidade alarmante diante da célere escalada da curva de infecções no Brasil.

    A campanha “#FicaEmCasa” tem buscado conscientizar a população sobre a importância de sair às ruas apenas para as atividades estritamente necessárias e o respeito ao isolamento como uma atitude cidadã. Entretanto, como irão aderir à campanha aqueles que não possuem uma casa?

    Somente em São Paulo, epicentro da epidemia no Brasil, são mais de 24 mil pessoas vivendo nas ruas em situação insalubre e vulnerável, segundo dados da própria prefeitura (SÃO PAULO, 2020). Como poderão evitar aglomerações pessoas que vivem em uma favela como Paraisópolis, que ostenta a maior densidade populacional do país? (EBC, 2016). Isso, claro, sem contar a carência de tratamento do esgoto e fornecimento de água, numa situação onde o vírus pode ser transmissível pelas fezes (TORMENTE, 2020) e a lavagem das mãos em água corrente é a forma mais eficaz de evitar o contágio. E o que dizer dos mais de 770 mil presos que compõem população prisional nas penitenciárias brasileiras superlotadas? (BRASIL, 2020). Um prato cheio para o vírus e uma bomba relógio para a sociedade. A situação de rua, a favelização e o encarceramento constituem ‘mundos de morte’ (MBEMBE, 2018), espaços de concentração de um determinadas parcelas populacionais sujeitas à uma situação de sobrevida, ao estatuto de mortos-vivos. Lugares submetidos ao império da necropolítica (MOREIRA, 2019). 

    Enquanto o vírus se alastra pelo território nacional, o atual mandatário da Presidência da República tem cultivado crises institucionais entre os poderes e dentro do próprio governo. Em entrevistas, ao comentar sobre a mortandade causada pela pandemia, Bolsonaro declarou: “Alguns vão morrer? Vão morrer. Lamento, é a vida”; “Brasileiro precisa ser estudado, pula no esgoto e nada acontece” e “E daí? Lamento. Quer que eu faça o que? Sou Messias mas não faço milagre”. Estas e tantas outras falas de flagrante descaso com a saúde e com a vida da da população se alinham sob a ordem necropolítica.

    O termo necropolítica, cunhado pelo filósofo camaronês Achille Mbembe (2018), visa elucidar como a regimentalização do poder de matar nas sociedades modernas funciona como uma política de controle social. A distribuição desigual das oportunidade de vida e de morte que são base do modelo capitalista de produção impõe uma hierarquia em que uns valem mais que outros e aqueles que não têm valor são simplesmente descartados. Trata-se de uma radicalização e reinterpretação da biopolítica de Foucault, em que a administração da vida divide espaço com a dministração da morte (ESTÉVEZ, 2018).

    Segundo Valencia (2010) quando a morte, mais do que a vida, se encontra no centro da biopolítica ela se converte em necropolítica. Através de estratégias de exploração e destruição de corpos como a execução, o feminicídio, a escravidão, o sequestro, o tráfico de pessoas, o encarceramento; práticas legitimadas por dispositivos jurídico-administrativos, são ordenados e sistematizados os efeitos, as causas e as justificativas das políticas de morte. O poder atua para a manutenção do sujeito vivo, mas em estado de marginalização aguda, injúria e intensa crueldade, implementando uma forma de morte em vida até que se alcance a morte de fato.

    Mbembe parte do pressuposto de que a expressão máxima do poder soberano consiste em deixar viver, matar ou expor à morte. A partir do momento em que a soberania escolhe quem vive e quem morre, o próprio viver se torna uma manifestação do poder soberano (MBEMBE, 2003).

    E no Brasil?

    No Brasil a necropolítica não é algo inusitado, nem recém inaugurado. Na verdade não existe história do Brasil apartada das políticas de morte. Estamos falando do país com a polícia que mais mata e mais morre no mundo (CÂMARA, 2019). Estamos falando do país que lidera o ranking mundial de homicídios em números absolutos (UNODC, 2019). Estamos falando do país que registra o maior número de linchamentos no mundo (MARTINS, 2015). Estamos falando do país que mais mata LGBTs no mundo (GGB, 2018). Estamos falando de um país em que a legislação contra a violência doméstica, uma conquista histórica, faz diminuir os casos de morte entre mulheres brancas e disparar os casos de feminicídios das mulheres negras (IPEA, 2018). Este cenário não surgiu de forma mágica ou repentina.

    Estamos falando de uma nação inaugurada pelo genocídio dos povos originários, sustentada por séculos à base da mão de obra escravizada. Um território colonizado e arquitetado por um patriarcado conservador latifundiário e aristocrata (SADER, 2011). Não houve, nem haverá no curto prazo, um dia em que, neste país, não esteja em curso um plano de genocídio, extermínio, marginalização, encarceramento, subjugação de algum ou de vários segmentos da sociedade. Sejam índios, negros, mulheres, travestis ou comunistas. O discurso do inimigo interno é parte estruturante da necropolítica de “segurança” nacional (MENDONÇA, 2015). 

    Quando, em um país com estas características, chegam ao poder políticos que em meio a manifestações, negam a ciência e a importância dos setores públicos na promoção da equidade social, a partir de dados técnicos, científicos e sociais, torna-se notória a iminência da catástrofe. Um exemplo do caráter funesto que revestiu a política nacional, coadunando com vários setores e grupos sociais, pode ser observado na popularidade do fetiche punitivista: bandido bom é bandido morto (PRADO, 2020).

    Ao traçar como objetivo político a aniquilação daqueles classificados como inimigos, a imposição da soberania se dá pelo exercício do poder de matar, como ocorre em um contexto de guerra.  Está em andamento uma investida deliberada de necroempoderamento visando a institucionalização da necropolítica como estratégia de poder consolidada no senso comum. Trata-se de um esforço de deformação da moralidade para a difusão, naturalização, aperfeiçoamento e perpetuação da necrofilia como pressuposto de um projeto nacional.

    No escopo deste projeto, o Estado não monopoliza a soberania, mas disputa o poder com entidades privadas necroempoderadas, como as milícias e as facções que funcionam como um estado paralelo, controlando a população, o território, a segurança e a política; se apropriando criminalmente dos elementos fundamentais da governamentalidade, administrando a vida e a morte para exploração de recursos e obtenção de lucro nas lacunas e nos limites do poder Estatal (VALENCIA, 2010; ESTÉVEZ, 2018).

    A Necropolítica e a COVID-19: algumas considerações

    Embora os aspectos sanitários e econômicos tenham tomado a centralidade na pauta da pandemia, outras questões de cunho político, social e cultural estão imbricadas nesta crise sem precedentes. Certamente sequelas e traumas próprios da nossa realidade nacional irão impor singularidades sobre a manifestação da Covid-19. Considerando a capacidade de atendimento hospitalar do país, o pico agudo de infectados e o colapso dos sistemas de saúde, questionamos: quem morrerá com falta de ar e quem continuará respirando? Quantos milhares de pessoas irão morrer? Quem serão estes mortos, suas classes, cores, idades e identidades? Como estes corpos adoecidos estão sendo inscritos na ordem do poder?

    Quando governantes explicitam que não é preocupação política central garantir que cada cidadão tenha condições de continuar respirando, estão assumindo a responsabilidade de escolher quem vai ter a chance de lutar pela vida entubado num leito de UTI e quem vai ser lançado à própria sorte até o último suspiro. Esta gestão da morte deixa cristalino o funcionamento da necropolítica, pois nem todos são afetados da mesma forma.

    Se o último grau de expressão do poder político soberano consiste em determinar quem pode viver e quem deve morrer, porquê e como, no Brasil desde sua fundação, à luz de sua história, fica nítido quem são os corpos selecionados para viver e quem são os corpos selecionados para sobreviver antes de morrer. Esta noção continua válida e certamente será acentuada nesta situação de crise, convertendo o que seria tão somente uma fatalidade epidemiológica em uma ferramenta de extermínio. 

    Se até então a escolha sobre quem vive ou quem morre era exclusividade do poder soberano, a pandemia transformou este cenário. Segundo Mbembe, a Covid-19 democratizou o poder de matar (BERCITO, 2020). Qualquer pessoa que tenha contraído o vírus, potencialmente mortal, tem condições de transmiti-lo inconsciente ou deliberadamente. Todos temos, neste contexto, o poder de matar. O isolamento e distanciamento social seriam, portanto, uma forma de regular este poder. Analisando através deste prisma, as manifestações Brasil afora que reivindicam o fim do isolamento pretendem justamente a revogação da regulação deste poder de matar.

    Enquanto é amplamente reconhecia a possibilidade de diminuição da letalidade da doença através do isolamento e do distanciamento, estes grupos reacionários querem justamente o oposto: usufruir do direito de usar o próprio corpo como arma biológica, fazem questão de assumir o papel de vetores genocidas. Agentes voluntários da perversa administração necropolítica da pandemia.

    Ainda não é possível estimar a dimensão dos impactos que esta pandemia irá causar no mundo moderno capitalista globalizado e financeirizado. Mas é certo que este lúgubre evento abre uma janela de possibilidades para a introdução de pautas que contribuam para a redução da desigualdade, proteção e seguridade social. A emergência de uma doença que afeta mais severamente os pobres e os idosos evidencia que o envelhecimento e a pauperização da população não se resolvem com reforma da previdência, mas com fortalecimento dos sistemas públicos de saúde, assistência e seguridade.

    Mais do que nunca o SUS demonstra sua importância e reivindica a urgência de financiamento massivo. O subfinanciamento e sucateamento para o desmonte da saúde pública que estava a todo vapor encontra um enorme obstáculo e o fortalecimento do SUS deve assumir a centralidade na pauta progressista e no senso comum.

    Além disso, ideias como a renda básica universal, a taxação de grandes fortunas, auditoria cidadã ou moratória da dívida pública, reforma tributária progressiva, que anteriormente eram tidas como pautas da esquerda, passam a ser consideradas medidas necessárias até por setores liberais. Dinheiro não é problema para a oitava economia mundial, mas as prioridades precisam ser revistas. Nunca foi razoável e agora é ainda mais absurdo escoar uma fatia gigantesca do orçamento da união na amortização de uma dívida nada transparente enquanto o povo perece.

    Certamente iremos resistir e superar este doloroso teste de resiliência. Até lá nos resta cultivar a biofilia (FROMM, 1996): nos cuidar, cuidar de quem a gente ama e nos fortalecermos enquanto sociedade, para que a normalidade inaugurada pós pandemia seja melhor que normalidade por ela encerrada.

    Para saber mais

    BRASIL. Governo do. Dados sobre população carcerária do Brasil são atualizados. Segurança, 2020. Disponível em: <https://www.gov.br/pt-br/noticias/justica-e-seguranca/2020/02/dados-sobre-populacao-carceraria-do-brasil-sao-atualizados>

    BERCITO, Diogo. Pandemia democratizou o poder de matar, diz autor da teoria da ‘necropolítica’. Folha de São Paulo, 2020. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/03/pandemia-democratizou-poder-de-matar-diz-autor-da-teoria-da-necropolitica.shtml>

    CÂMARA, Olga. Polícia brasileira: a que mais mata e a que mais morre. Jus, 2019.

    EBC, Agência Brasil. IBGE divulga Grade Estatística e Atlas Digital do Brasil. Economia, 2016. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2016-03/ibge-divulga-grade-estatistica-e-atlas-digital-do-brasil>

    ESTÉVEZ, Ariadna. Biopolítica y necropolítica:¿ constitutivos u opuestos?. Espiral (Guadalajara), v. 25, n. 73, p. 9-43, 2018.

    FROMM, Erich. Ética e psicanálise. Minotauro, 1996.

    GGB. Grupo Gay da Bahia. Mortes violentas de LGBT+ no Brasil: Relatório 2018. Bahia, 2018. Disponível em: <https://grupogaydabahia.files.wordpress.com/2019/01/relatório-de-crimes-contra-lgbt-brasil-2018-grupo-gay-da-bahia.pdf>

    IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Atlas da Violência 2018. Disponível em: <www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/180604_atlas_da_violencia_2018.pdf>

    MARTINS, José de Souza. Linchamentos: a justiça popular no Brasil. Editora Contexto, 2015.

    MBEMBE, Achille. Necropolítica.. 3. ed., São Paulo, 2018.

    MBEMBE, Achille; MEINTJES, Libby. Necropolitics. Public culture, v. 15, n. 1, p. 11-40, 2003.

    MENDONÇA, Thaiane. Política de segurança nacional e a construção do conceito de “inimigo interno” no Brasil. UFRGS, Porto Alegre, 2015. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/sicp/wp-content/uploads/2015/09/Thailane-Mendonça_Política-de-segurança-e-a-construção-do-conceito-de-inimigo-interno-no-Brasil-Thaiane-Mendonça.pdf>

    MOREIRA, Rômulo Andrade. A Necropolítica e o Brasil de ontem e de hoje. Justificando, 2019. Disponível em: <https://www.justificando.com/2019/01/08/a-necropolitica-e-o-brasil-de-ontem-e-de-hoje/>

    PRADO, Monique Rodrigues do. O fetiche punitivista: bandido bom é bandido morto? Âmbito Jurídico, 2020. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/noticias/o-fetiche-punitivista-bandido-bom-e-bandido-morto/>

    SADER, Emir. O Maior massacre da história da humanidade. Disponível em: <https://www.viomundo.com.br/voce-escreve/emir-sader-o-maior-massacre-da-historia-da-humanidade.html>

    SÃO PAULO, Governo do Estado de. Isolamento social em SP é de 49%, aponta Sistema de Monitoramento Inteligente. Portal do Governo, 2020. Disponível em <https://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/isolamento-social-em-sp-e-de-49-aponta-sistema-de-monitoramento-inteligente/>

    SÃO PAULO, Prefeitura de. Prefeitura de São Paulo divulga Censo da População em Situação de Rua 2019. Secretaria Especial de Comunicação, 2020. Disponível em: <http://www.capital.sp.gov.br/noticia/prefeitura-de-sao-paulo-divulga-censo-da-populacao-em-situacao-de-rua-2019>

    TORMENTE, Fabiana Vieira. O vírus da Covid-19 pode ser transmitido através das fezes? Microbiologando. UFRGS, 2020. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/microbiologando/o-virus-da-covid-19-pode-ser-transmitido-atraves-das-fezes/>

    UNODC. Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Estudo Global sobre Homicídios, 2019. disponível em: <https://dataunodc.un.org/GSH_app>VALENCIA, Sayak. Capitalismo Gore. 2010.

    Sobre o autor

    Leonardo Oliveira é Biólogo, professor de Biologia e mestrando em Ensino de Ciências e Matemática (UNICAMP).


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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


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  • Coronavírus no Brasil, o que fazer?

    Postagem publicada originalmente em 26 de fevereiro de 2020.

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    Em 25 de Fevereiro tivemos o primeiro caso de coronavírus confirmado no Brasil. E 26 de fevereiro foi marcado como o primeiro dia em que a OMS registrou mais novos casos fora da China do que dentro dela, o que indica que a epidemia está se espalhando. Estamos entrando no momento onde a doença se espalha para o mundo.
    O que fazer a respeito? Atualizo meu Twitter e meu Instagram constantemente com novas informações. E segue um texto com o material a respeito. Se você prefere vídeos, aqui vão dois episódios e uma live de 1h sobre o tema:
    https://www.youtube.com/watch?v=e-JaQOeFxtI
    https://www.youtube.com/watch?v=X1IamY2uTbo
    https://www.youtube.com/watch?v=xARmN9qurAY
    Essa live foi gravada dia 26/02 e é a mais atualizada.
    Aqui também tem um vídeo que você pode baixar e compartilhar.

    O que é o coronavírus?

    O coronavírus ou SARS-CoV-2 (nome oficial) é um vírus respiratório que provavelmente saltou de morcegos para humanos e começou a circular em Wuhan, na China. E causa a infecção respiratória por coronavírus, com o nome oficial de COVID-19. Suspeitamos que ele tenha vido de pangolins, mas pelas adaptações que o vírus que encontramos em pangolins já tem, é um vírus que está muito bem adaptados para humanos e possivelmente veio de outra fonte. Não temos nenhuma evidência de que é uma arma biológica nem escapou de um laboratório.

    Quem é afetado pela COVID-19?

    Severidade dos casos de acordo com a idade. Dados do Centro de Controle de Doenças da China.
    Severidade dos casos de acordo com a idade. Dados do Centro de Controle de Doenças da China.

    A mortalidade do vírus é relativamente baixa, entre 2% e possivelmente menos de 1% se o número de pessoas infectadas sem sintomas for grande. Isso é menor do que a SARS de 2003 (que chegou a 10%), mas é uma mortalidade maior do que a gripe anual (menos de 0,1%) que pode se tornar séria se o número de infectados chegar aos milhões como acontece com a gripe. A maioria das pessoas que pega o vírus não tem sintomas ou tem sintomas leves (81% dos casos). Essa estimativa é bem sólida e foi feita com base nos 72 mil casos analisados pelo CDC Chinês.
    O tratamento prevê internação e cuidado dos sintomas. Não temos remédio ou vacina contra o vírus ainda, precisamos cuidar da dificuldade respiratória e prevenir pneumonia ou complicações para dar tempo do próprio corpo cuidar do vírus. O mais preocupante são os outros 19%, que precisam ser internados. Essa severidade e a mortalidade também dependem da idade e de condições pré-existentes. São dois grupos mais preocupantes. Idosos, como o gráfico de cima mostra, e pessoas com problemas crônicos como doenças cardíacas, hipertensão, doenças respiratórias como asma e diabetes a mortalidade pode chegar a 10%.
    Apesar de quase o mesmo número de homens e mulheres infectados, quase o dobro de homens morreram. Levantam a possibilidade de isso ter a ver com fumo, já que mais da metade dos homens chineses fumam, enquanto só 2% das mulheres têm esse hábito.

    Quais os sintomas?

    Segundo o estudo com o registro médico de 1100 pacientes chineses, os sintomas mais comuns foram febre (89%), tosse (68%), náusea ou vômito (5%) e diarréia (4%). O período de incubação foi de 2 a 7 dias, com uma mediana de 4. Cerca de 5% deles precisaram de internação na UTI.

    O que muda se novos casos aparecerem por aqui?

    Fases de Emergência da COVID-19, em 25 de fevereiro entramos no 3º nível.
    Fases de Emergência da COVID-19, em 25 de fevereiro entramos no 3º nível.

    Como disse o Ministério da Saúde, em 25 de fevereiro, entramos na fase de Emergência de Saúde Pública, onde temos um caso confirmado no país. Caso a transmissão aconteça dentro do Brasil, entre pessoas que não estão voltando de outros países, entraremos na fase seguinte, que é a de contenção.
    Segundo o plano de contingência, se passarmos de 100 casos confirmados no país, entra a fase de mitigação. Onde não tentamos mais impedir que o vírus entre, mas sim que ele circule. O ponto dessa fase é tomar medidas que fazem a doença se espalhar o mais lentamente possível, para que todos possam ter atendimento médico.
    Sua empresa tem um plano para como deixar as pessoas trabalharem remotamente? Qual a equipe que precisa estar presencial? A creche ou a escola dos seus filhos vai fechar? Quem vai ficar com as crianças se seu trabalho não deixar você em casa? Sua faculdade terá aulas suspensas? Seu maior preparo não é comprar máscara ou estocar comida, ao que tudo indica só em algumas regiões da China chegaram a esse extremo. A preocupação é: vou trabalhar de casa? A faculdade vai fechar? A escola vai parar? Isso tudo acontece muito antes. Nos outros países como Itália e Coréia do Sul, que já estão nessa fase, nas regiões afetadas comércios não essenciais fecham, escolas e creches fecham, o transporte público fica restrito ao essencial. Muitas companhias mandaram os funcionários trabalharem de casa. Se quiser se prevenir, pense em como vai ser se o mesmo acontecer aqui.

    Como não se contaminar? E o caso de pessoa reinfectada?

    É um vírus transmitido por saliva e muco. Limpar bem as mãos, lavar constantemente e usar álcool gel, proteger o rosto quando for espirrar e evitar aglomerações.
    Sobre os possíveis casos de reinfecção pelo vírus e a japonesa que pegou coronavírus mais de uma vez, os próximos passos são descobrir o que tem de extraordinário aí, se a imunidade dela (incompleta) ou o vírus. Se for algo particular dela ou de algum grupo de infectados, menos mal. Se for o vírus, e pelo genoma dele podemos ter uma noção, vamos descobrir conforme mais casos de reinfectados aparecerem (aguardemos). Pode ser que o vírus não desperta uma imunidade protetora o suficiente ou que ele já mudou o suficiente para escapar (daí olhar pro genoma). Só temos um caso registrado e alguns relatos ainda, não dá para se ter uma noção do tamanho do problema. Se reinfecção se tornar algo comum, o potencial de infectados pela doença se mantém enorme e a vacina provavelmente vai encontrar dificuldades. Pesquisadores chineses publicaram um artigo sobre algumas pessoas que continuam testando positivo para o coronavírus depois de dispensadas da quarentena, até 2 semanas depois. Elas não transmitiram o vírus para ninguém, mas parecem continuar produzindo um pouco de vírus no pulmão, o que explicaria a impressão de que foram infectadas de novo.

    Tem tratamento?

    É bem difícil de ter um remédio contra vírus, porque a maior parte do que eles usam para se reproduzir vem das nossas células. Então, mesmo os compostos que agem contra um vírus como o HIV geralmente agem só contra ele. Algumas vezes damos sorte e o uso é mais geral. Esse é o caso do remdesvir. Um composto desenvolvido contra o Ebola que atrapalha polimerases que copiam RNA. Nós não copiamos RNA, só fazemos ele a partir do nosso DNA, então esse tipo de droga não nos afeta. Como o coronavírus também é um vírus de RNA que copia o próprio genoma, o remdesvir pode atrapalhar ele nessa fase. É um resultado que já corta muito caminho, pois esse composto foi um dos mais eficientes contra o coronavírus e já havia sido testado para uso em humanos. Estão avançando os testes para tratar coronavírus agora. O irônico é que temos pesquisa no Brasil com compostos parecidos com o remdesvir contra zika e dengue, potencialmente melhores até, mas faltou a grana para mais testes por aqui.

    Quer mais informação? Participei de vários podcasts discutindo o coronavírus:

    Dragões de Garagem
    Mamilos
    Nerdcast
    Xadrez Verbal (com um pouco de coronavírus e muito sobre minha trajetória)

    Material de referência

    Estudo falando da Origem do SARS-CoV-2 e como não parece ser pangolim:
    The Proximal Origin of SARS-CoV-2 – http://virological.org/t/the-proximal-origin-of-sars-cov-2/398
    Dúvidas sobre diagnóstico e tratamento: https://www.saude.gov.br/saude-de-a-z/coronavirus
    Notificação de casos suspeitos e conformados no Brasil: http://plataforma.saude.gov.br/novocoronavirus/
    Acompanhamento dos casos confirmados no mundo: https://gisanddata.maps.arcgis.com/apps/opsdashboard/index.html#/bda7594740fd40299423467b48e9ecf6
    Boletim do CDC Chinês sobre os 72 mil primeiros casos: http://weekly.chinacdc.cn/en/article/id/e53946e2-c6c4-41e9-9a9b-fea8db1a8f51

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

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