Tag: ciência

  • Como se produz um resultado científico e o que isto tem a ver com a Covid-19?

    Vocês já tiveram a impressão de que a ciência é uma bagunça esquisita? Uma hora lemos que o café faz mal, noutro momento, café salva nossos corações… O chocolate então? Passa de vilão para herói ano sim, ano não… Tudo isso faz com que a ciência, os resultados e conhecimentos científicos muitas vezes sejam desacreditados. 

    Em tempos de pandemia da Covid-19, causado pelo SARS-CoV-2 (também conhecido como “coronavírus”), isso possa ser mais difícil de entender ainda! A cada dia são inúmeros artigos publicados, em velocidades que para quem está fora deste universo pode se perder e/ou se confundir facilmente.

    No post de hoje, gostaríamos de falar um pouco sobre o processo de produção de conhecimento acadêmico-científico e sua validação. A ideia é mostrar que a ciência pode parecer sim contraditória, mas é outro o processo que a move… E para isto, vamos falar um pouco da nossa pesquisa (que aparentemente se relaciona muito pouco com a COVID-19, mas ao mesmo tempo, tem tudo a ver com isso!).

    Somos cientistas diferentes! Não usamos jalecos brancos, nem luvas ou máscaras, nem ficamos dentro de laboratórios de pesquisa cheio de estantes com vidrarias e maquinários. Produzimos alguns resultados científicos diferentes daqueles que estes cenários procuram nos mostrar. Nosso “laboratório”, muito frequentemente, é uma sala comum com uma mesa e cadeiras, nosso uniforme pode ser qualquer roupa e nossos maquinários são muitos livros e um computador simples, cujo maior barulho é o das teclas sendo digitadas. Mas como assim? Existem jeitos diferentes de fazer ciência e produzir resultado científico?

    Sim! Existem. Costumeiramente, se explica a ciência como uma série de etapas estanques: pergunta, hipótese, experimentos, resultados e conclusões. Essa série, muitas vezes, é conhecida como o método científico (embora ele seja muito mais do que apenas estas etapas). Mas as coisas não são tão simples e lineares assim… 

    No nosso caso, pesquisamos a própria ciência: como ela é produzida, em que espaços e que sujeitos a produzem e como ela chega na sociedade, por exemplo. E este campo de pesquisa que atuamos nos ajuda a entender que os resultados científicos (os impactos ambientais, o estudo de doenças como a COVID-19 e a H1N1, os alimentos mais ou menos saudáveis, as formas de ensinar melhor conteúdos de ciência etc.) são feitos com base em muitos pontos em comum. E, por isso mesmo, os resultados científicos são temporais, fruto de um contexto e, por isso, variáveis e mutáveis.

    Mas que pontos em comum seriam estes?

    – A necessidade de uma metodologia demonstrada: o que costumamos chamar de “método científico”. Este ponto diferencia um resultado científico de qualquer outro “achismo” ou “crença”. Um resultado para ser considerado científico tem que ter passado por um processo, um conjunto de etapas, com uma análise que deve ser o mais detalhada possível. Esse processo ou metodologia pode ser feita em diferentes ambientes – em laboratório, no campo, em uma biblioteca, uma escola ou outro espaço –; ser feito com a ajuda de diferente instrumentos – computadores, máquinas de PCR, de sequenciamento, livros e outros – e ter um encadeamento de etapas uma após a outra, muito bem demarcadas, para que, se necessário, possa minimamente ser refeito (nas áreas biomédicas e de saúde, das ciências naturais e da terra, chamamos isso de replicação) ou compreendido e validado por outros pesquisadores da área, a partir da análise da coerência entre objetivos, metodologia e discussão dos dados;

    – A necessidade de amparo em outros resultados já publicados: um resultado científico considerado válido, que teve uma metodologia bem detalhada, deve ser amparado por outros resultados também científicos já publicados e livres para o acesso àqueles interessados na área em questão. Todas essas pessoas interessadas e atuantes em uma dada área compõem a comunidade de pesquisadores da mesma. O que chamamos de “amparo” não é apenas confirmação de nossos dados, mas parte dos estudos já existentes para realizar novas perguntas, embasar hipóteses, testar novos experimentos, ou buscar semelhanças ou mesmo diferenças em situações ou fenômenos específicos que estão sendo estudados;

    – A necessidade de respaldo pela comunidade científica de cada área: com o crescimento das pesquisas científicas e a intensa diversificação da ciência por áreas, cada vez mais pesquisadores se envolvem com a produção de resultados científicos. Assim, são essas comunidades de pesquisadores que respaldam estes resultados umas das outras e possibilitam dizer e determinar o que é científico ou não; o que pode ser considerado válido ou não. A análise destes resultados deve seguir determinadas etapas, que são averiguar a coerência entre hipóteses, objetivos de pesquisa, rigor metodológico e, por fim, apresentação dos resultados;

    – Os resultados terem validade: que fique claro que existem diferentes comunidades científicas, diferentes metodologias de pesquisa e, portanto, obviamente, diferentes resultados científicos e modos de apresentar estes resultados. Mas se todos passaram por essas etapas, eles são resultado considerados válidos!!! Quando ressaltamos a palavra “resultados válidos” não quer dizer que eles possuem um “selo de eternidade”, porém são considerados legítimos nesse momento em que foram a público. Isto ocorre até que outro estudo também siga estes passos, traga outras respostas e/ou novos questionamentos. Então, o aceito cientificamente é SEMPRE momentâneo! E o processo de produção de um resultado científico é MUITO variável, pois depende de cada um destes pontos.

    Observem que todas essas etapas são relacionadas umas às outras, são interdependentes; e, portanto, um resultado para ser considerado científico deve passar por todo este processo!

    Quando as pesquisas científicas parecem contraditórias, muitas vezes elas estão fazendo o que consideramos básico na produção de conhecimento: questionando. É a partir da análise de conhecimentos científicos passados, da observação de fenômenos, fatos, situações e, principalmente, do questionamento disto, que conseguimos avançar na ciência. 

    E veja: questionar não é “ter uma opinião diferente” e, por isso, discordar. Questionar nem sempre é discordar… O ato de questionar uma pesquisa (resultado, premissas, metodologias) é uma forma de testar as coerências, limites e novas possibilidades de aquele resultado, muitas vezes, seguir valendo. Também é possível acrescentar fatores que ou não foram pensados anteriormente ou não tínhamos condições técnicas e instrumentais para testarmos. E, claro, também podemos nos contrapor e buscar novas testagens que contradigam alguma pesquisa. 

    Portanto, os conhecimentos produzidos pela ciência são resultados diferentes de uma opinião qualquer baseada em alguma informação aleatória “que ouvimos falar do fulano ou do beltrano” ou que foi postada em twitter/facebook ou encaminhada via whatsapp, ou colada no painel do condomínio. 

    Como confiar no que lemos sobre a ciência se ela muda o tempo inteiro?

    Para podermos responder esta pergunta, é fundamental perceber que a ciência não muda o tempo inteiro… O mais correto seria apenas dizer que a ciência não é algo único e linear; e que os resultados científicos podem mudar o tempo inteiro. Quando falamos “a ciência” estamos falando de coletivos de pessoas que produzem e debatem o conhecimento, buscando o consenso (o tempo inteiro)!

    Além disso, muitas vezes, estes grupos estão analisando aspectos diferentes do mesmo objeto, como o coronavírus, por exemplo (mas isso é pauta para outra postagem, que faremos em breve…). 

    O que acontece agora, de maneira mais específica é que estamos vivendo uma situação que é exceção. Uma doença nova que apareceu e nos desafia a compreendê-la muito rapidamente, pois sua transmissão – o contágio entre uma pessoa e outra e consequente o espalhamento na sociedade – se dá numa velocidade muito grande.

    Estas pesquisas, que costumam se desenvolver com o passar dos anos – e um bocado de investimentos e incentivos governamentais – devem, também, tentar acompanhar as características desta doença que está tirando centenas de vidas em dias, e não em anos. Além disso, essas pesquisas buscam desenvolver estratégias de cura e contenção muito mais rapidamente do que temos condições, e estamos habituados a fazer, normalmente.

    Tudo isto gera, sim, insegurança entre os cientistas. Estamos todos correndo contra o tempo buscando entender essa doença enquanto ela rapidamente nos contamina. A insegurança, no entanto, não é em relação ao conhecimento científico e sua produção. Compreendemos, assim, que não existem milagres e que a ciência se faz colaborativamente. Dialogamos o que vem acontecendo e este diálogo que gera, sim, um pouco de ansiedade pela quantidade de informações e debates sobre tratamento, cura, modos de proteção individuais etc. Este é o modo pelo qual cientistas no mundo inteiro têm produzido conhecimento sobre a COVID-19 e o Coronavírus; e estabelecido comunicação para chegar a um consenso o mais rápido possível

    O conhecimento científico, com todos os seus questionamentos (e exatamente por causa deles!), é neste momento nossa melhor ferramenta para minimizarmos os efeitos avassaladores dessa doença. 

    E como eu posso ajudar?

    É difícil sentir-se impotente frente a tudo isso… A primeira questão que é fundamental é: não espalhe desinformação nem fake news e fique em casa se possível. Só isto já é, realmente, um grande passo.

    Não divulgue receitas milagrosas de cura, que não tenha um embasamento técnico-científico e tente seguir poucos canais de informação, mas confiáveis (aqui no Blogs fizemos uma lista especial para vocês!). Os canais de Divulgação Científica (como este blog e vários outros) têm buscado trabalhar as informações de maneira mais acessível possível, para que todos compreendam melhor todo este processo de pandemia que temos vivenciado…

    Por fim, mas não menos importante, se tiveres condições financeiras, busque coletivos seguros de ajuda a grupos em fragilidade social (cuidado com os golpes, ajude quem você conhece SEMPRE), universidades e centros de pesquisa, por exemplo. Vem sendo dito nas redes sociais, parece clichê, e é clichê, mas é verdade: quanto mais a quarentena funcionar, menos ela parecerá necessária!

    Para saber mais:

    LATOUR, Bruno & WOOLGAR, Steve (1997). A vida de laboratório. Rio de Janeiro: Relume Dumará.
    SCHWANTES, Lavínia. Ciência: muito se fala, pouco se define. In: MAGALHAES, Joanalira Corpes. Ensino de ciências: outros olhares, outras possibilidades. Rio Grande: Ed FURG, 2014. p. 43-50.WORTMANN, Maria Lucia Castagna (2008) A visão dos Estudos Culturais da Ciência. Com Ciência. Revista Eletrônica de Jornalismo Científico.

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Coronavírus e Fake News na Saúde

    O Coronavírus traz consigo não só o desafio de combater a proliferação da doença, mas também – e não menos importante – a necessidade de estancar a disseminação de falsas informações a respeito do assunto, que vem preocupando as autoridades e a sociedade em geral.

    Texto por Cesar Augusto Gomes

    A epidemia de um novo tipo de coronavírus, que atingiu primeiramente a China, já infectou mais de 8 mil pessoas em ao menos 18 países e levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declará-la na quinta-feira (30/01/2020) como uma emergência global de saúde pública de preocupação internacional. O fato traz consigo não só o desafio de combater a proliferação da doença, mas também – e não menos importante – a necessidade de estancar a disseminação de falsas informações a respeito do assunto, que vem preocupando as autoridades e a sociedade em geral. Circularam, nas redes sociais digitais durante a semana passada, diversas informações a respeito do tema, sendo algumas fruto da desinformação de pessoas leigas e outras, da esperteza de quem pretende se aproveitar do surto para embolsar alguns trocados com  vendas de produtos e visualizações em suas redes. Algumas das falsas notícias disseminadas foram: “O coronavírus foi espalhado propositalmente pela indústria farmacêutica para controle populacional” e “Objetos comprados na China pela internet podem estar contaminados com o novo vírus”. Um youtuber especializado em teorias da conspiração espalhou que o americano Bill Gates, dono da Microsoft, teria patenteado o vírus e trazido para o Brasil. Em outro vídeo, uma pessoa que se diz médico relaciona o aparecimento do coronavírus à falta de vitamina D no organismo. Informações não factuais ou manipuladas existem há tempos, muito antes do advento internet. O jornalista Heródoto Barbeiro escreve no texto A Revolução Francesa e o perigo do texto falso (2017), publicado no portal Comunique-se, que durante aquele período (1789-1799), o jornalista Jean Paul Marat, com seu jornal L’Ami du peuple (O Amigo do Povo) acelerou a derrubada da Bastilha com textos nem sempre verdadeiros.
    jsot @jsot Animador / Illustrator vive em Dallas, TX e é de Juarez, Chih, Mx Fonte: jayrsotelo.tumblr.com/
    No livro-reportagem de Fernando de Morais (2000), Corações Sujos, vencedor do Prêmio Jabuti em 2001, encontramos a verídica história de uma seita, a Shindo Renmei – a Liga do Caminho dos Súditos – composta por imigrantes japoneses e descendentes que espalhavam a notícia da vitória do Japão na Segunda Guerra Mundial e assassinavam a quem ousasse dizer o contrário. Com o advento da Internet o cidadão comum passa a ser produtor e distribuidor ativo de conteúdo e a competir com o jornalismo tradicional na tarefa de agendar o debate na sociedade e de fabricar o consenso. Esse protagonismo, apesar da regulação existente, tem seus lados positivo e negativo, pois, aliado a outros fatores, potencializou exponencialmente a proliferação das, popularmente chamadas, fake news, que têm sido usadas para disseminar e legitimar crenças, em detrimento de fatos científicos. Na Saúde, no entanto, a desinformação é um problema ainda mais grave, pois, provoca sobre demanda nos Sistemas de Saúde com exames desnecessários, motivados por alarmismo. Pode também levar pessoas a comportamentos extremos, a deixar de realizar tratamentos necessários, a deixar de usar remédios essenciais para sua vida, enfim, no limite, a desinformação pode matar. Uma possível consequência do fenômeno pode ser sentida mais claramente no âmbito da vacinação, uma vez que, apesar das intensas campanhas de divulgação, as autoridades de Saúde não estão conseguindo cumprir as metas de vacinação, conforme tem sido amplamente divulgado pela imprensa. Como efeito, o Brasil perdeu em 2019 o certificado de erradicação do Sarampo, concedido ao país pela Organização Pan Americana de Saúde (OPAS/OMS), em 2016. Em trabalho que apresentei no “II Seminário Internacional e VI Seminário Nacional as Relações da Saúde Pública com a Imprensa: Fake news e saúde”, na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Brasília, em 2019, analisei cinco textos que circularam entre 2016 e 2019 nas diferentes redes sociais digitais – e alguns sites apócrifos – e que traziam informações sobre vacinas. A partir dos critérios Wardle e Derakhshan (2017), foi possível classificar esses conteúdos em: Enganosos (partem de dados existentes, porém, manipulam-nos), Fabricados (conteúdo que é 100% falso, criado para ludibriar, prejudicar) e Falso Contexto.
    Selo do Serviço do Ministério da Saúde que visa a combater notícias falsas Fonte: https://drauziovarella.uol.com.br/checagens/servico-do-ministerio-da-saude-visa-a-combater-noticias-falsas/
    Uma rápida leitura nas notícias a respeito do coronavírus indicam que elas têm contornos parecidos. Para ficar num exemplo, o mesmo tipo de informação falsa divulgada pelo youtuber dando conta de que Bill Gates teria patenteado o coronavírus com o objetivo da redução populacional aparece também nas notícias sobre Vacina que analisei. Em um dos textos, uma “enfermeira” – de quem não se sabia o nome nem o hospital em que trabalhava – afirmava ser a febre amarela uma farsa inventada pelo governo para dizimar a população e que ninguém deveria tomar a vacina. Em sua maioria as fake News sobre saúde seguem o seguinte padrão: (1) sempre partem de uma fonte de confiança (o guru, o doutor, o especialista); (2) são vagos, sem datas e fontes confiáveis, pois o “Dr.” ou a “enfermeira” não têm nome, nem apresentam o hospital em que trabalham nem quaisquer registros de fonte oficial sobre o assunto; (3) são alarmistas; (4) têm pedido de compartilhamento. O jornalista norte-americano Farhad Manjoo (2008) no livro True Enough: Learning to Live in a Post-Fact Society discute a necessidade de se aprender a viver numa sociedade que escolhe a realidade em que quer acreditar, uma sociedade pós-factual. Vemos essas consequências na política, na negação da Ciência e até de fatos históricos. No entanto, quando se trata da saúde do ser humano, escolher entre ministrar um medicamento ou não, pode significar a morte. Referências BARBEIRO, Heródoto. A Revolução Francesa e o perigo do texto falso. Portal Comunique-se. São Pulo. 05 set. 2017. MANJOO, F. True Enough: Learning to Live in a Post-Fact Society. Nova Jersey: John Wiley & Sons. 2008. WARDLE C, DERAKHSHAN H. Information Disorder – Toward an interdisciplinary framework for research and policy making. Council of Europe. Estrasburgo, França. 27 out 2017.   Texto por Cesar Augusto Gomes – Mestrando em Divulgação Científica e Cultural, Labjor/IEL/Unicamp

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Contradições acima de tudo, cortes acima de todos.

    Texto por Ana Arnt, Erica Mariosa Carneiro, Eduardo Akio Sato e Graciele Oliveira

    Ontem, 8 de Maio de 2019, recebemos a notícia de que “A gestão do presidente Jair Bolsonaro (PSL) bloqueou nas últimas horas bolsas de mestrado e doutorado oferecidas pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior)”, conforme consta na publicação do Jornal Folha de São Paulo.

    Enquanto isso, nas redes sociais do Ministério da Educação, encontramos divulgada a abertura da inscrição no Exame Nacional do Ensino Médio, relacionando isso a um passo para seguir a carreira científica (como vocês podem acompanhar clicando aqui, aqui, e aqui).

    Nos comentários destas postagens do Ministério da Educação, inúmeras pessoas interrogam sobre “qual carreira científica?”, tendo em vista os cortes orçamentários anunciados ao longo de toda a gestão deste governo.

    Quais cortes?

    Ao longo da semana passada três Universidades Federais alvo de bloqueios orçamentários – UnB, UFBA e UFF. A justificativa para tal ação era o enquadramento no critério “fazer balbúrdia”,

    Exemplo de Evento de Extensão Ridículo de Instituição Científica

    segundo o Ministro da Educação Abraham Weintraub. O Ministro ainda afirmou que “A universidade deve estar com sobra de dinheiro para fazer bagunça e evento ridículo“. Complementando com dizeres de que dentro das universidades há pessoas do Movimento Sem Terra, bem como gente pelada. Estes foram os exemplos de “bagunça” usados pelo Ministro da Educação, em sua entrevista com o jornal Estado de São Paulo, que justificariam os bloqueios.

    Exemplo de Evento Universitário Ridículo

    Após repercussão negativa, em função de critérios subjetivos e completamente sem embasamento técnico, foram anunciados cortes orçamentários em universidades públicas federais de todas as regiões do país. Além do corte das verbas de custeio das universidades federais, ressaltamos que houve cortes também em todas as etapas de ensino – do infantil ao ensino médio – contrariando a ênfase do governo federal de que o orçamento priorizaria a educação básica e creches. Segundo o jornal Folha de São Paulo, os cortes na educação infantil até o ensino médio são da ordem de R$ 680 milhões. Na rúbrica relacionada à construção e manutenção da educação infantil, foram contingenciados 17% dos R$ 125 milhões do orçamento autorizado (como o exposto nesta reportagem).

    Ressoa, ainda em nossos pensamentos, a pergunta “que carreira científica é essa proposta pelo ENEM?”. A ciência, neste governo, vem sofrendo retaliações e cortes de forma sistemática. Simultaneamente a isso, as propagandas governamentais contradizem o que indica o orçamento. Como, por exemplo, seguir carreiras científicas quando vemos cortadas as verbas das instituições de ensino superior que, em nosso país, são responsáveis por 95% da pesquisa no país?

    Abaixo, o gráfico, cujo artigo pode ser lido na íntegra aqui apresenta dados que indicam o desempenho das principais universidades brasileiras em pesquisas. Figuram no topo da lista apenas instituições públicas, ao contrário do já pronunciado oficialmente por nosso presidente – fala não fundamentada em dados técnicos.

    Não compreendemos as razões que fundamentam a ideia de incentivar carreiras científicas, concomitantemente à promoção de cortes que inviabilizam a formação destes profissionais – tanto no Ensino Superior, quanto na Pós-Graduação (formação necessária a cientistas ao redor do mundo…). Sem bolsas, sem financiamentos de pesquisa, sem universidades com energia elétrica e contas de água em dia, com museus sem verbas para custeio, manutenção para suas estruturas, acervo técnico-científico, pesquisadores e curadores que carreira científica existiria para seguir?

    Vale lembrar que o investimento científico se faz via manutenção de universidades federais e museus – via Ministério da Educação – mas também há editais de pesquisa, programas e ações de outra instância do governo que são essenciais e complementares. O Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação – MCTIC também vem sendo sucateado (42,27% do orçamento, conforme consta nesta nota de entidades e sociedades científicas brasileiras). Ao contrário do que tem sido veiculado pelo governo, as balbúrdias universitárias se relacionam mais a um aumento significativo da produção científica a partir do aumento dos investimentos públicos em ciência e tecnologia, do que bagunças e atuação inócua.

    Revista Nature 8 de Abril de 2019

    Internacionalmente esta situação tem recebido destaque em revistas de alto impacto científico, como a Nature e Science, e cientistas do mundo inteiro assinaram uma petição em defesa da ciência brasileira. Tais ações mostram consternação com nossa situação e indicam o quanto perderemos como país – e mundo – se seguirmos este caminho.

    Revista Science 12 de Abril de 2019

    Apenas um parênteses sobre a produção científica e a soberania nacional (algo tão enfatizado nesta gestão atual). A máxima “conhecer para governar” parece-nos cada vez mais um provérbio esquecido de tempos passados. A atual gestão pública se faz sem que a produção de conhecimentos seja fomentada e sirva como base para a tomada de decisões para o futuro da população, do território, a fim de manter nossa soberania nacional. Um país que não investe em ciência, tecnologia e produção de conhecimentos sociais e culturais é um país que perde condições de planejamento futuro, de compreensão das dinâmicas sociais, ambientais, políticas e econômicas de si mesmo. Nos tornamos, cada vez mais, um país que decreta que dados técnicos e conhecimento não são importantes para a soberania nacional, para a sociedade em que vivemos atualmente, para a vida das pessoas que constituem nossa nação.

    Simultaneamente a isso, vinculamos ao ensino escolar conteúdos e conhecimentos científicos completamente produzidos por nações estrangeiras – mais uma vez colocando em risco a noção de soberania por submetermo-nos à importação de todos os saberes técnicos-científicos a serem pensados em nossa pátria.

    Voltando às contradições de cortes orçamentários e incentivos educacionais, após o corte orçamentário no MCTIC, foi anunciado uma chamada pública que é uma parceria entre MEC-MCTIC, nomeado Programa Ciência na Escola. Ao lançar este edital, o Ministro Abraham Weintraub afirmou que “a ciência é a melhor vacina contra o obscurantismo”, na sequência, pronunciou ainda que “todos nós brasileiros, como nação, temos que fazer escolhas, e esse tipo de escolha, de alocar nossos recursos escassos numa iniciativa dessa, de valorizar a ciência, é justamente o que a gente quer fazer: manter investimento em educação, em pesquisa, em conhecimento”.

    Longe de criticar a iniciativa, o que interrogamos aqui é a contradição de indicar a ciência como saída do obscurantismo e o investimento em educação e conhecimento em um lado da moeda, enquanto evidentes cortes orçamentários se fazem presentes, cerceando as atividades universidades federais e as bolsas e projetos de pesquisas científicas. Além disso, ainda nos interrogamos sobre a contínua depreciação das instâncias produtoras de saber científico de nosso país, de docentes e pesquisadores universitários e sua contribuição histórica – mesmo com parcas verbas – para a construção de um espaço democrático de ciência e produção científica.

    Para saber mais:

    ABC, ANDIFES, CONFAP, CONSECTI, SBPC. (2019). Corte Orçamentário Atinge Desenvolvimento e Soberania Nacionais.

    Agostini, Renata. (2019) MEC cortará verba de universidade por ‘balbúrdia’ e já enquadra UnB, UFF e UFBA. Estado de São Paulo.

    Amparo, Thiago. (2019). Alvos de corte, universidades federais deram salto de produção em 10 anos. Folha de São Paulo.

    ANDES-SN. (2019). Só instituições públicas fazem pesquisa no Brasil, afirma organização

    Assessoria de Comunicação Social do MEC. (2019). No Senado, ministro Weintraub defende recursos para a educação básica. Ministério da Educação.

    Assessoria de Comunicação Social do MEC. (2019). MEC e MCTIC lançam Programa Ciência na Escola com o objetivo de modernizar o ensino de Ciências. Ministério da Educação.

    Moura, Mariluce. (2019). Universidades públicas realizam mais de 95% da ciência no Brasil. Unifesp.

    Oliveira, Regiane. Os primeiros efeitos da asfixia financeira de Bolsonaro sobre as ciências do Brasil. El Pais. 6 de maio de 2019.

    Pinho, Ângela; Saldanha, Paulo; Gentile, Rogério. (2019) Gestão Bolsonaro faz corte generalizado em bolsas de pesquisa no paísFolha de São Paulo. 8 de Maio de 2019.

    Pinho, Ângela; Saldanha, Paulo; Gentile, Rogério. (2019). Bloqueio de verba de universidade por motivo ideológico fere Constituição. Folha de São Paulo.

    Saldanha, Paulo. (2019). Bloqueios no MEC vão do ensino infantil à pós-graduaçãoFolha de São Paulo. 5 de Maio de 2019.

    Saldaña, Paulo (2019). Alfabetização será avaliada por gestão Bolsonaro só em amostra de escolas. Folha de São Paulo. 2 de maio de 2019.

    Saldaña, Paulo. (2019). Ministro da Educação ironiza reitores ao falar de tolerância e pluralidade. Folha de São Paulo.

    Saldaña, Paulo. (2019). MEC estende corte de 30% de verbas a todas universidades federais. Folha de São Paulo.

    UNESP. (2019). Universidades públicas realizam mais de 95% da ciência no Brasil

    Watanabe, Phillipe. Agências de apoio à pesquisa internacionais defendem ciências humanasFolha de São Paulo.

    *Este texto foi elaborado em conjunto com Ana Arnt, Erica Mariosa Carneiro, Eduardo Akio Sato e Graciele Oliveira*

  • As Propostas para Ciência dos Candidatos à Presidência de 2018, Segundo Seus Programas de Governo

    Texto por Lucas Rosa

    Esse ano, toda a nação se reunirá para decidir seu governante pelos próximos 4 anos. É a época onde diversas das questões são trazidas à mente do brasileiro; saúde, educação e segurança são amplamente discutidas na televisão. Historicamente, a ciência tem ficado de lado nesses debates, raramente sendo o ponto focal de qualquer candidato. Esse ano, mais do que nunca, a ciência brasileira precisa estar em pauta. 2018 e os próximos anos serão cruciais para decidir o destino do país pelas próximas décadas; com os cortes recentes da verba de ciência e tecnologia, o desenvolvimento brasileiro se tornará irreversivelmente defasado caso esses cortes não sejam revertidos. Se o próximo presidente não estiver disposto a priorizar a restauração dessa verba, podemos dar adeus às perspectivas de um Brasil desenvolvido no futuro próximo.

    Recentemente, tivemos uma iniciativa excelente para tentar mudar esse cenário, que foi a Sabatina com os Presidenciáveis organizada pelo Disperciência e o Science Vlogs Brasil. Essa sabatina contou com a presença de quase todas as candidaturas, seja na figura do candidato em si ou através de um representante (com três exceções: Manuela D’Ávilla (que não é mais candidata) e Geraldo Alckmin, que alegaram incompatibilidade de horários, e Jair Bolsonaro, que sequer respondeu ao convite da organização). Caso você não tenha visto, sugiro fortemente que veja o debate CLICANDO AQUI.. Ele é longo, sim, mas o seu país precisa que o seu voto seja informado. Vá assistindo ao longo de vários dias se necessário, mas faça-o.

    Essa semana, tivemos a divulgação dos planos de governo de todos os principais candidatos à corrida presidencial. Assim, resolvi dar uma olhada em todos eles e averiguar o que cada candidato tem em mente para resolver a situação da ciência no país.

    Farei o possível para afastar os meus viéses (Afinal, não sou uma máquina – tenho meus candidatos favoritos e, principalmente, os que sou veemente contra). O intuito aqui será avaliar as propostas conforme estão no plano de governo, emitindo a minha opinião. Peço aos leitores que façam o possível para fazer o mesmo – e, acima de tudo, evitem cair no fanatismo. Se eu falei mal do plano de governo do(a) seu(ua) candidato(a), não significa necessariamente que eu estou tendo favoritismos, que eu sou [insira aqui seu rótulo favorito] ou que eu sou incapaz de entender a genialidade do(a) candidato(a). Às vezes a ideia é só uma merda mesmo. E você precisa estar apto à avaliar criticamente o(a) seu(ua) candidato(a) e ser capaz de reconhecer que ele(a) é capaz de errar. Cultos à personalidade, historicamente, são uma cilada tremenda (vide Mussolini, Hitler, Mao Zedong, Stalin, etc)

    Sem mais delongas, vamos aos planos. Clicando no nome do candidato, você terá acesso ao plano de governo completo do mesmo. Os candidatos estão ordenados por ordem de intenção de votos NESSA pesquisa recente, e ordem alfabética em caso de empate.

    Haddad (PT)

    ATENÇÃO: Essa seção foi feita antes da impugnação da candidatura do Lula e anúncio do Haddad como candidato. Assim, a análise abaixo é do programa de governo do Lula (E suponho que o do Haddad seja similar)

    A primeira aparição da palavra “ciência” no programa é em um parágrafo falando sobre políticas visando promover representatividade feminina na sociedade de forma geral, onde menciona “o
    incentivo à produção de ciência e tecnologia pelas mulheres”. Obviamente é positivo expandir a participação feminina no mundo científico. Também propõe o Programa Escola com Ciência e Cultura, que, segundo o programa,  transformará “as unidades educacionais em espaços de paz, reflexão, investigação científica e criação cultural”. Bonito, mas os termos são vagos – significa ensinar metodologia científica no ensino fundamental e médio? Significa ampliar laboratórios de ciências nas escolas? Significa colocar alunos em contato com cientistas e trabalhos científicos? Não sabemos.

    Então, o programa do PT promete ampliar os investimentos em ciência, tecnologia e inovação – mas não diz para quanto, nem que medidas específicas pretende tomar para isso. Isso é repetido posteriormente no Programa. Também propõe ” intensificar o diálogo da cultura com outros campos, como a educação, a ciência e tecnologia, a comunicação, o esporte, a saúde, a economia e o turismo”. Novamente, o que isso significa, especificamente?

    Em parágrafo posterior, reconhece a necessidade de investimentos em ciência e tecnologia como pré-requisito para um modelo de desenvolvimento.

    Finalmente, chegamos à uma seção específica para falar de ciência e tecnologia, o que é bastante positivo (e presente em surpreendentemente poucos dos planos de governo). Reafirma nessa seção a importância de investimentos significativos no ramo, e propõe algumas ideias. A primeira é a criação do Sistema Nacional de Ciências, Pesquisas e Inovação (C,P&T) que, pelo que eu entendi, seria um sistema para integrar a produção científica pública e privada, aproximando as duas. Sinceramente não entendi bem a proposta. A segunda proposta é sobre a ampliação do comércio externo e utilização cooperativa de recursos com outros países. Não fica 100% claro a relação deste item com ciência – pesquisas colaborativas? Exportação de tecnologia? Enfim. Também propõe recriar o Ministério de Ciência e Tecnologia (atualmente fundido ao de comunicações), uma decisão acertada ao meu ver (seria bom preenchê-lo por mérito e não por jogo político, mas essa é outra história…); por fim, o programa propõe retomar o direcionamento de recursos do Fundo Setorial do Petróleo ao Fundo Nacional de Ciência e Tecnologia. Essa proposta me agrada não só por ser maior financiamento para ciência, mas por ser uma proposta concreta.

    No geral, não achei o programa ruim, mas também não achei dos melhores. Ele reforça várias vezes o compromisso de aumentar o orçamento, mas não diz para quanto. Gostaria de uma porcentagem razoável do PIB (2 ou 3%) sendo fixada para isso. No mais, achei o plano meio vago. Parece estar com boas intenções, mas não com a atenção devida para o tema, e a estruturação devido.

    Jair Bolsonaro (PSL)

    O candidato possui uma seção dedicada à ciência e tecnologia no plano de governo, o que é um ponto positivo, bem como uma estruturação de um plano de fato, invés de apenas promessas – outro ponto positivo. A seção se debruça principalmente sobre a intenção do candidato de melhorar a relação da ciência com o mercado privado, tomando como exemplo hubs tecnológicos de países mundo afora. O programa realça a importância (na opinião do candidato) dos universitários terem uma formação empreendedora, buscando transformar os conhecimentos adquiridos em produtos e negócios, e a importância de aproximar a academia do mercado. Por fim, também destaca a importância do Brasil aproveitar os seus recursos e oportunidades – como o desenvolvimento de formas sustentáveis de energia (assunto que, de fato, somos um país com plenas condições de nos tornamos líderes) e procurando novas e inovadoras aplicações com nióbio e grafeno, dois produtos naturais abundantes no Brasil.

    Vamos começar pelos pontos positivos. O plano me surpreendeu positivamente. De fato, o Brasil se beneficiaria bastante de uma melhor integração entre a academia e a iniciativa privada e um maior aporte de recursos da iniciativa privada em pesquisas de tecnologia aplicada. Realmente no mundo inteiro há investimentos privados no setor de ciência e tecnologia, e o Brasil é deficiente nessa integração. Também fiquei feliz em observar essa valorização das capacidades energéticas do Brasil. Essa é uma tecla que eu bato bastante: nós estamos com a faca e o queijo na mão para nos tornarmos líderes do setor energético mundial conforme a mudança da matriz energética for se solidificando no século XXI (E isso é inevitável, graças ao aquecimento global. Negacionistas podem chorar e mentir à vontade, quando as temperaturas começarem a trazer malefícios econômicos ao setor agrário, por exemplo, os países serão forçados a procurar alternativas aos combustíveis fósseis). O Brasil precisa correr atrás, e logo, de desenvolver formas alternativas de energia ou aperfeiçoar as já existentes (hidrelétrica, eólica e solar são todas possíveis de serem aplicadas no país e, portanto, de serem estudadas e aperfeiçoadas por nós), estabelecendo-se assim como líder nesse mercado para poder aproveitar essa demanda que vai chegar mais cedo ou mais tarde. E, por mais que muitos zoem o Bolsonaro por ele botar fé demais no nióbio e no grafeno (não, eles não são a fórmula mágica para a solução de todos os problemas), vale a pena sim estudar esses materiais e procurar novas e inovadoras aplicações – porque, novamente, se conseguirmos, nós seríamos os líderes imediatos do mercado, por possuirmos amplas reservas desses recursos.

    O problema do programa do Bolsonaro não é o que ele contém, mas sim o que falta. O foco excessivo na iniciativa privada é preocupante porque, ainda que eu ache sim que o Brasil precisa melhorar nesse aspecto, a iniciativa privada jamais pode substituir os investimentos públicos em ciência, e sim complementá-los. Simplificando um pouco: A ciência se divide em ciência básica e ciência aplicada. A ciência aplicada pode e deve receber investimentos da iniciativa privada; isso é útil para liberar os recursos públicos para serem aplicados majoritariamente na ciência básica, que é a ciência que estuda os fenômenos meramente para entendê-los, não necessariamente para gerar uma tecnologia deles. E essa relação é simbiótica: A ciência básica é o pântano de ideias que a ciência aplicada extrai a sua “matéria prima intelectual”, por assim dizer; a ciência aplicada, por sua vez, fornece ao público leigo a justificativa para os investimentos públicos para manter a ciência básica.

    É importante entender que ciência básica não é ciência inútil. Primeiro porque o propósito da ciência não é (só) gerar tecnologia, mas sim entender o mundo em que vivemos; e segundo porque, como eu expliquei, a ciência aplicada depende da existência da ciência básica. Ilustrando com um exemplo: As tecnologias de comunicação que possuímos hoje (rádio, TV, computador, etc) só se tornaram possível quando James Maxwell conseguiu compreender o fenômeno do eletromagnetismo. Maxwell era um cientista de ciência básica – ele não estudava o eletromagnetismo com o intuito de criar rádios e televisões, e sim para entender esse fenômeno da natureza. Porém, quando o fenômeno foi entendido, essa aplicação se tornou possível por outros cientistas. Ou seja, o governo precisou sustentar as pesquisas “inúteis” de Maxwell para que nós tivéssemos uma base sólida o suficiente para tornar possível o desenvolver aparelhos de comunicação.

    E esse é o tipo de investimento que a iniciativa privada jamais faria, porque os ganhos são incertos e, muitas vezes, à longuíssimo prazo. Por isso é preciso tomar cuidado com essa noção que a solução para a ciência é deixar a iniciativa privada cuidar dos investimentos. Essa deve sim ser uma prática complementar, permitindo assim uma maior liberação de recursos públicos. O programa de Bolsonaro só menciona a primeira metade, sem mencionar seus planos para a pesquisa básica e sem se comprometer a manter os investimentos públicos em ciência. Esse silêncio é preocupante.

    Com essa ressalva, porém, eu diria que o plano de Bolsonaro é aceitável. É certamente melhor que o silêncio ou promessas vagas de alguns candidatos supracitados.

    Geraldo Alckmin (PSDB)

    A única referência à ciência no Programa é uma proposta de estimular parcerias entre universidades e empresas, trazendo o setor privado para próximo do setor científico de forma a aumentar a produtividade e competitividade brasileira. O programa especifica que essa aproximação seria para o setor aplicado, mas não diz nada sobre o que pretende fazer com o setor de ciência básica, ou quais serão as medidas tomadas para combater os catastróficos cortes recentes no orçamento científico. Na minha opinião, o programa está incompleto no que diz respeito às necessidades do setor científico neste momento do país.

    Marina Silva (REDE)

    O programa de Marina reconhece logo no início a importância dos investimentos em ciência e tecnologia para o desenvolvimento do país. Chega até a pincelar um reconhecimento da importância de difundir esse conhecimento na sociedade, mas não fica claro se ela fala especificamente da divulgação científica, ou apenas do acesso da sociedade aos frutos desse conhecimento. De qualquer forma, ambos são importantes.

    O programa possui uma seção específica sobre ciência e tecnologia – o que, como repeti várias vezes nessa matéria, é um ponto positivo, demonstrando que a candidata reconhece a importância do tema. A seção começa com um reconhecimento do problema, chamando-o de a maior crise da história da ciência brasileira (o que, de fato, é). Marina afirma que seu governo reconhece a ciência como investimento, e não gasto (uma visão acertada). A candidata se compromete a trabalhar para tentar garantir 2% do PIB para financiamento de ciência e tecnologia, e propõe recriar o Ministério de Ciência e Tecnologia (separado do de Comunicações). Além disso, Marina afirma que a inovação brasileira é precária, se referindo aqui especificamente à empresas, que tem poucos retornos em investimentos de pesquisa e desenvolvimento. Ela propõe combater isso reduzindo tarifas e remoção de barreiras e entraves burocráticos para a importação de materiais, serviços e equipamentos a serem usados em ciência, tecnologia e inovação. Por fim, Marina pretende facilitar a vinda de cientistas de fora do Brasil pra cá (uma “fuga de cérebros” ao contrário) e fortalecer a relação universidade-empresa.

    Gostei muito do que vi no programa da Marina. Ele é sucinto, mas direto ao ponto, reconhece efetivamente o problema e tem boas propostas para solucioná-lo, algumas bastante específicas. Um dos melhores programas, ao meu ver, para a ciência e tecnologia.

    Ciro Gomes (PDT)

    O programa de Ciro Gomes possui uma seção específica para lidar com ciência e tecnologia, o que é bastante positivo. Nela, o candidato faz um bom resumo dos problemas enfrentados pela ciência brasileira – a fuga de cérebros, a falta de modernização, a burocracia. Então seguem-se uma série de propostas – elaborar um plano nacional de ciência e tecnologia, buscando tornar o esforço científico mais eficiente e mais próximo do setor privado; colocar a ciência e tecnologia nacional para fomentar o setor produtivo; fortalecer o CNPq, estimular a aplicação do conhecimento ao setor tecnológico e aproximar o setor empresarial das universidades. Neste último item, ele propõe ideias mais concretas: auxiliar empresas que atuam no país a construir centros de pesquisa por aqui, e estimular a contratação de pesquisadores por essas empresas, permitindo o pagamento de bolsas à esses pesquisadores, pelo que entendi. Se for isso, seria excelente; você permitiria que as agências de fomento fornecessem bolsas à pesquisadores trabalhando no setor privado, o que significa que a empresa receberia um profissional altamente qualificado para desenvolver pesquisa e desenvolvimento à custo baixo, e o pesquisador teria mais opções de carreira além de simplesmente se tornar professor universitário.

    Também propõe uma divisão de recursos para investimento em ciência; parte iria diretamente para a universidade para ela alocar onde achar melhor (Basicamente como é hoje), mas a outra parte seria direcionada à estimular pesquisas em assuntos estratégicos que “atendam as demandas da sociedade”. Se isso for associado a um aumento nos investimentos de forma geral, pode ser uma boa ideia. Ela respeita a importância da ciência básica, mas também trabalha para aproximar a academia da iniciativa privada, que é uma excelente medida, ao meu ver, como já discorri acima. O programa menciona também criar um conselho superior de política de ciência e tecnologia, o que pode ser uma boa ideia se for composto de cientistas – e uma péssima ideia se for composto de políticos. Reforça como dois setores chaves o setor de fontes de energia renovável (que concordo, como disse acima no item do Bolsonaro) e da “indústria 4.0” – a digitalização e automação dos meios de produção, outro setor absolutamente crítico para este século.

    O programa também discorre um pouco sobre a importância de estabilizar o financiamento científico – absolutamente crucial, como disse na introdução – e propõe novas maneiras de viabilizar financiamento científico, incluindo a criação de fundos de investimento. Também propõe algo extremamente importante: A desburocratização da importação de materiais para ciência, algo que prejudica extremamente o andamento eficaz da ciência brasileira. Por fim, Ciro promete melhoras no sistema de patentes e propriedade intelectual, buscando desburocratizar e aumentar a segurança jurídica do processo, facilitando a integração entre universidades e empresas.

    No geral, achei o programa do Ciro extremamente positivo. Ele reconhece a importância do investimento em ciência básica, mas também procura maneiras de estimular o investimento privado em ciência aplicada. Só tenho uma crítica, mas bem pequena: Faltou formalizar uma porcentagem do PIB para investimento em ciência. O Ciro já declarou intenção de investir 2% do PIB – meta brasileira há anos, nunca alcançada – em outras ocasiões, mas eu queria ver isso no papel. Ainda assim, um dos melhores planos entre os analisados.

    Álvaro Dias (PODEMOS)

    Uma das grandes propostas de Álvaro Dias nos debates tem sido o seu “Plano de Metas”, contendo 19 metas divididas em Sociedade, Economia e Instituições. A Ciência aparece como a Meta 4 dentro das Metas de Sociedade, junto de Cultura e Turismo. Me é um pouco estranho colocar a ciência junto desses outros dois itens, uma vez que eles não tem muita relação com a Ciência. Também passa aquele ar de “segundo plano”. Mas isso talvez seja só uma interpretação errônea minha.

    A próxima vez que a palavra ciência aparece no documento é nas diretrizes do plano de metas; o item “Ciência, Cultura e Turismo” propõe um “Programa Nacional de Inovação”, mas não explica o que seria esse programa, nem como ele vai ajudar a ciência brasileira.

    Não tem muito material para abordar aqui. O programa diz que tem ciência como uma das prioridades (Uma das 19, pelo menos…), mas não traz nenhum plano, nenhuma proposta concreta. Gostaria de ouvir mais do candidato sobre o que é esse Programa Nacional de Inovação.

    Cabo Daciolo (PATRIOTA)

    Em seu programa de governo, o candidato Daciolo reconhece a importância de políticas públicas em diversas áreas, entre elas a ciência. Também afirma que apenas 8% das escolas públicas do país possuem laboratório de ciências, e permite alocar mais recursos públicos para aumentar esse índice (entre outros citados no mesmo parágrafo). Em outro parágrafo, se compromete a valorizar ciência e tecnologia, mas não desenvolve o raciocínio, concluindo com uma promessa de aumentar o número de institutos federais de formação técnica. Por fim, no final do programa, afirma que quer tornar o Brasil um país utilizador de matérias-primas invés de exportador das mesmas, citando que podemos então aplicar essas matérias-primas em áreas de ciência e tecnologia para produzir bens finais de consumo interno. Conclui o parágrafo dizendo que ” IREMOS FIGURAR ENTRE OS PAÍSES MAIS DESENVOLVIDOS DO PLANETA.” (Com caps-lock ligado mesmo).

    Também acho que o Brasil pode ser um dos países mais desenvolvidos do planeta (com caps-lock opicional), e explico melhor como no parágrafo sobre o programa do Bolsonaro. Quanto ao programa do Cabo Daciolo, senti falta de propostas concretas e de um compromisso claro com a restauração dos níveis de investimento público em ciência.

    João Amoedo (NOVO)

    A palavra ciência só aparece uma vez no texto, em uma proposta que diz “Novas formas de financiamento de cultura, do esporte e da ciência com fundos patrimoniais de doações.”. Fundos patrimoniais são basicamente grandes montantes de dinheiro, geralmente doados por alguém, que são investidos e seus rendimentos usados para investir em objetivos diversos. Um exemplo famoso são a Fundação Rockfeller e a Fundação Bill e Melinda Gates. O candidato também menciona a ciência na proposta “Universidades: melhor gestão, menos burocracia, novas fontes de recursos não-estatais e parcerias com o setor privado voltadas à pesquisa.”

    A ideia de fazer isso no Brasil não é ruim. De fato, o Instituto Serrapilheira, fundado ano passado, é basicamente isso, e eu adoraria ver mais iniciativas do tipo se proliferando. Porém, é o mesmo que eu falei acima: Essa é uma prática complementar, não fundamental. Essa não pode ser a espinha dorsal do financiamento científico no país, ou a ciência brasileira quebra. Acho ótimo visar aproximar o setor privado da academia e das pesquisas aplicadas brasileiras, mas a ciência está em crise por falta de financiamento público, e a falta de comentários do candidato sobre isso é preocupante. Não será suficiente aproximar a iniciativa privada da ciência e se dar por satisfeito; é necessário também restaurar – ou, se possível, ampliar – o financiamento público em pesquisa.

    Henrique Meirelles (MDB)

    A palavra “Ciência” sequer aparece em todo o documento. Eu dei uma lida geral e realmente não encontrei nada. Acho bastante triste o candidato do maior partido do país não dedicar uma linha do seu programa de governo à ciência. Gostaria de ver um compromisso formalizado com a ciência por parte do candidato.

    Vera Lúcia (PSTU)

    As palavras “ciência”, “pesquisa”, “tecnolgia” e “inovação” sequer aparecem no texto em momento algum. Booo.

    Eymael (DC)

    O eterno democrata cristão, do jingle que gruda feito chiclete (você está cantando agora, não está?) só menciona uma vez alguma coisa relacionada à ciência, até onde pude ver: Ele propõe a criação do Plano Nacional de Apoio à Pesquisa, “tanto em seu aspecto de investigação pura, como no campo da pesquisa aplicada”. Fico feliz que o candidato reconheça a distinção e a importância de ambas, mas ele não diz o que é esse plano e como isso vai ajudar a ciência, tampouco menciona qualquer coisa sobre a crise orçamentária atual. É melhor do que o nada de alguns candidatos, mas gostaria de ter mais detalhes sobre esse Plano.

    Guilherme Boulos (PSOL)

    O plano de Guilherme Boulos é campeão absoluto em comprimento – 228 páginas, bem mais que o dobro dos outros programas extensos como o de Bolsonaro, Haddad/PT e Ciro. O programa reconhece a crise de investimentos na ciência, culpabilizando os cortes na área pela grave recessão que o país enfrenta. O programa realça que deseja combater a prática da Cura Gay e similares, que classifica (acertadamente) de pseudocientíficas. No item 4 do Programa, o candidato que a produção do conhecimento será um dos eixos do desenvolvimento do país. Reafirma o compromisso em manter a autonomia universitária e o aumento dos investimentos. Propõe a criação de um programa de fomento à inovação, pesquisa e desenvolvimento, buscando articular as áreas econômicas e sociais com a científica – o que, ao meu ver, é meio vago. A seção critica pesadamente os cortes e a dissolução do ministério de ciência e tecnologia através da sua fusão com o ministério de comunicações. Reconheceu o papel da luta política dos cientistas, que se fortaleceu esse ano, contra os cortes. Propõe fortalecer a cooperação internacional, promovendo mobilidade de pesquisadores e facilitando o reconhecimento de títulos entre os países. Por fim, faz três propostas: Refazer o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, ampliando seu orçamento; aplicar o Marco Legal da Ciência, já aprovado no Congresso (Se quiser saber mais sobre o marco, leia AQUI); e elaborar um Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, articulando sociedade, setores produtivos e academia, estabelecendo uma política estratégia de pesquisa com metas a curto, médio e longo prazo, e estruturado de forma a não ficar vulnerável às mudanças de governo posteriores. Afirma que esse programa deve possuir mecanismos de controle para evitar uso irresponsável de dinheiro, mas reconhece a necessidade de autonomia acadêmica – o que é ÓTIMO. Deixe a ciência para os cientistas, e apenas mantenha o olho neles. Dito isso, queria mais detalhes de como esse plano vai ser elaborado – suponho que o candidato não tenha essas metas já em mente (o que é um acerto – novamente, deixe os cientistas decidirem isso), mas não fala quem vai compôr a elaboração desse projeto, etc.

    Em outro ponto do Programa, Boulos propõe o desenvolvimento de uma política de ciência e tecnologia para o setor farmacêutico, com laboratórios e instituições públicas como pilares centrais, que atenda às demandas do SUS. Isso me parece uma ideia arriscada. Laboratórios públicas não devem ser fábricas de remédio – isso quase aconteceu no caso desastroso da fosfoetanolamina, com consequências catastróficas. No caso de alguns candidatos, eu expressei preocupação que eles quisessem integrar a iniciativa privada em coisas onde ela não serve; aqui temo que seja o caso contrário, colocar a iniciativa pública em algo que fica melhor nas mãos do mercado.

    De qualquer forma, achei um plano sólido, bem-fundamentado. Gostaria de mais especificidade em alguns pontos, mas poucos programas delineiam tão bem o problema atual de financiamento da ciência quanto o programa do PSOL.

    João Goulart Filho (PPL)

    Sim, isso mesmo, o filho do ex-presidente João Goulart está concorrendo. Eu descobri isso pesquisando para este texto. Vivendo e aprendendo.

    O plano de governo do candidato possui uma seção extensa dedicada à ciência e tecnologia. Nessa seção, ele prioriza a restauração do ministério de Ciência e Tecnologia, desfazendo a fusão com o Ministério de Comunicações que foi realizada no governo anterior, e que o candidato João Goulart chama de “desastrosa”. Além disso, o candidato se compromete à ampliar o percentual de investimento em ciência e tecnologia para 3% do PIB, tal qual boa parte dos países desenvolvidos. O plano de governo do candidato aponta especificamente quais áreas ele pretende priorizar: microeletrônica, informática, telecomunicações, materiais estratégicos, engenharia genética, biomédica, nuclear, aeroespacial e a indústria da defesa, de forma a assegurar a independência nacional. Outro compromisso é o de fortalecer o Programa Espacial Brasileiro, bem como a indústria nuclear nacional, em cooperação com a comunidade internacional. Também reforça o desejo de aproximar universidade e setor privado, principalmente nos setores nucleares, agricultura, medicina e indústria. Por fim, propõe uma taxa de 1% sobre exportações agrárias, dinheiro esse a ser aplicado especificamente em ciência e tecnologia desse setor.

    Eu estou absolutamente chocado com a altíssima qualidade desse plano de governo. As ideias são estruturadas e muito bem planejadas – fica claro que o candidato (ou, mais provável, sua equipe) pesquisaram ostensivamente o assunto. A especificidade do plano me agrada muito. Não é uma promessa vazia e generalista – é uma promessa específica, dizendo onde e porque quer investir, e até bolando planos para tornar esse desejo possível. Pretende trazer investimentos da iniciativa privada aos setores que se beneficiariam dela, mas sem abrir mão da importância da ciência básica. Eu honestamente não consigo ver um defeito relevante para criticar. O candidato definitivamente está no meu radar agora.

    Considerações finais

    Os programas que me deixaram uma impressão positiva foram (em ordem do “pior” para o “melhor”, mesmo considerando todos positivos): Haddad/PT e Bolsonaro (empate técnico), Boulos, Ciro, Marina e João Goulart. Menção honrosa para o do Amoedo, que tá no caminho certo, mas falta algumas coisas. Lembrando que essa classificação é meramente opinião pessoal minha.

    Estou positivamente chocado com a do João Goulart. É uma pena que o candidato seja tão pouco conhecido e não tenha participação nos debates, porque suas pautas para a ciência são muito bem-embasadas. Marina é uma segunda-colocada muito próxima, ao meu ver. O espaço entre o programa de Ciro é um pouco maior, e entre o do Ciro e do Haddad/PT ou Bolsonaro ainda maior. Obviamente, essa é apenas minha opinião baseada no que eu li, e você pode interpretar as coisas de forma diferente.

    Nenhum dos planos de causou revolta (novamente, analisando o que os programas falam apenas sobre ciência). Os programas que me decepcionaram não o fizeram por falar besteira, mas por não falar nada.

    Naturalmente, essas são minhas impressões analisando apenas o programa. Se o candidato efetivamente acredita no que escreveu (ou no que sua equipe escreveu), são outros quinhentos.

    No mais, é isso e espero que tenham gostado, deu um trabalho razoável de fazer.

    Lucas Rosa é colaborador e administrador do blog Mural Científico.

  • O compromisso político de fazer ciência no Brasil hoje

    Texto por Cláudia Alves

    Hoje o dia amanheceu chuvoso em muitas cidades, e aqui em Roma também. Andando pelas ruas, reparei em quantas pessoas carregavam seus guarda-chuvas. Não pude evitar o pensamento: nenhuma delas estava com medo de levar um tiro e morrer por causa do que carregavam. Esse post é em memória de Rodrigo Serrano, brutalmente assassinado no dia 17 de setembro de 2018 pela polícia militar do Rio de Janeiro.

    O compromisso político de fazer ciência no Brasil hoje

    Quem escolhe ser pesquisador em nosso país (e no mundo todo) acaba se acostumando com o questionamento recorrente sobre a utilidade prática do que faz, do seu trabalho. Nas ciências humanas, esse questionamento é talvez ainda mais frequente porque nossas pesquisas não produzem, na maioria das vezes, resultados imediatos, pragmáticos, mensuráveis pelos parâmetros da sociedade de consumo. Estudar as diversas perspectivas da representação literária ao longo dos anos na literatura brasileira não parece ter o mesmo prestígio que compreender a reprodução de uma bactéria a fim de criar um novo remédio, por exemplo. E por que será que isso acontece? Arrisco um palpite: porque, nessa sociedade, pesquisas que não geram patentes, sobretudo porque não geram lucros, não despertam muito interesse.

    Sempre que posso, faço questão de começar meus textos por aí, porque acredito que precisamos lembrar – e relembrar quantas vezes pudermos – que estamos vivendo em uma época em que a formação e a reflexão de tipo humanística correm o risco de cair em desuso. Atualmente, a ideia de trabalho e produção de conhecimento está ligada a valores capitalizados, tecnocráticos, pouco ideológicos ou apolíticos, e, nesse espaço, a maturação de reflexões humanas não tem tempo suficiente para acontecer. Tudo precisa ser rápido e funcional. Já deu para perceber que a conversa é tensa, né? Mas todo esse preâmbulo é para pensarmos juntos como a ideia de produção científica se encaixa nesse contexto – e como fazer ciência, em todas as áreas, principalmente dentro de uma universidade pública, só pode ser entendido como um gesto político.

    Nos estudos literários (e talvez posso afirmar que no âmbito das pesquisas sobre linguagem em geral), existe um esforço em se pensar os poderes que estão em disputa. Nosso trabalho muitas vezes se volta à desnaturalização de ideias consolidadas e de pensamentos enraizados em nossa cultura. Nesse sentido, fica difícil imaginar como uma pesquisa desse tipo pode ser considerada apolítica: estamos constantemente exercitando nossa reflexão crítica ao olhar para o mundo e estudar suas diversas manifestações ao longo do tempo.

    É por esse caminho que muitos estudiosos pensam na capacidade transformadora que a própria literatura exerce. Escrever seria um gesto de colocar no papel aquilo que precisa ser revisto em nosso mundo e, a partir daí, gerar no leitor um pensamento com potencial para se tornar atitude. Estamos então em um terreno em que a literatura pode ser vista como um espaço público de politização e também de disputa de histórias. Por meio dos livros, seria possível contar uma história que sistematicamente determinadas esferas de poder quiseram (e querem) calar, assim como poderia despertar nos leitores uma reflexão. Ou seja: quanto mais a gente lê, mais a gente se depara com versões diferentes para uma mesma história e dificilmente sairemos dessas leituras da mesma forma que entramos.

    Jean Paul Sartre, importante filósofo e escritor francês do século XX, publicou em 1948 o livro Que é a literatura? (Editora Ática, 2004, tradução Carlos Felipe Moisés), no qual discute, após o final da Segunda Guerra Mundial, o que, por que e para quem escrever literatura. Depois das atrocidades cometidas pelos governos fascistas e nazistas nos anos anteriores, Sartre e tantos outros intelectuais voltaram seus pensamentos em direção às ainda possíveis perspectivas de existência humana – e como o ato de pensar e escrever sobre essa existência ainda poderia ter alguma função.

    Foto por Daniel Frank.

    Sartre defende a ideia de que “através da literatura (…) a coletividade passa à reflexão e à mediação, adquire uma consciência infeliz, uma imagem não equilibrada de si mesma, que ela busca incessantemente modificar e aperfeiçoar” (2004, p. 217). Sua posição parece estar entre dois caminhos já bastante trilhados quando se pensa no fazer literário: a ideia de que a literatura vai salvar a humanidade, despertando-lhe a consciência necessária para isso, mas também a ideia de que essa consciência é infeliz, desequilibrada, mediada, o que significa que não necessariamente ela atingirá seu potencial de conscientização nos indivíduos.

    Muito complicado? É mais ou menos pensar que ler não é sinônimo de caráter – há muitos exemplos por aí de gente que já leu muito, mas continua tendo comportamentos questionáveis. E também que nem toda literatura é questionadora e progressista, afinal é também no âmbito literário que versões opressoras da história se consolidam. O ponto principal é que, repito, parece que estamos diante do potencial de reflexão e de crítica que pode emanar da literatura. A ideia de que, com esse esforço de leitura, a coletividade pode tomar conhecimento de si mesma, reconhecer onde estão suas falhas e, a partir daí, buscar modificá-las e aperfeiçoá-las. Em outras palavras, escrever e pensar a literatura como pequenos movimentos de transformação.

    O lugar que ocupamos como pesquisadoras e pesquisadores, me parece, passa também por essas mesmas questões. A ideia de produzir ciência, ou seja, de produzir conhecimento, em um país com tantas desigualdades (sociais, econômicas, culturais) como o nosso não deve estar isenta de sua potencialidade de reflexão e de transformação social. Porque são ausências políticas em momentos conturbados como os que estamos vivendo ultimamente que podem criar monstruosidades históricas com as quais certamente não queremos conviver.

    E assim chegamos ao Brasil do ano de 2018, onde ainda é preciso debater machismo, racismo, homofobia e tantos outros preconceitos enraizados na nossa história. Esse debate, que perpassa todas as esferas públicas de produção de conhecimento (e por isso também todas as universidades, programas de pós-graduação e institutos de pesquisa), não pode ser diminuído ou silenciado, pois estamos disputando a história que se fará daqui por diante. A reflexão humanística, que deveria ser uma guia aos estudos literários e também às demais ciências, reafirma sua importância nesse processo como aquela que não nos deixa esquecer os momentos em que a humanidade se viu ameaçada por seu próprio desenvolvimento e capacidades destrutivas. Posicionar-se politicamente em todas as esferas que nos cabem é então reconhecer a função pública que cada indivíduo carrega em si e estimular a reflexão crítica em todas as frentes imagináveis. Resistir em todos os espaços que ocupamos: esse é o compromisso científico e político do qual não podemos nos isentar.

    Publicado originalmente em Marca Páginas.

  • Motivação entre a ciência e a política

    Texto por Gustavo

    O papel da ciência na sociedade atual vai além de gerar novas tecnologias. Apesar de bem vinda, a busca por inovação – palavra tão exaltada e incensada – nas áreas produtivas não pode ser o único motivo pelo qual a ciência existe. Fabricar celulares e computadores mais rápidos, carros mais econômicos e materiais mais resistentes é algo que certamente tem seu valor, assim como produzir medicamentos mais eficazes, métodos eficientes e não poluentes de controle de pragas agrícolas ou de geração de energia é, sem dúvida, indispensável. No entanto, a produção de novas maneiras de aplicar a ciência no cotidiano prático não esgota a função da própria ciência, ou, pelo menos, não deveria.

    Além da função filosófica, que coloca a ciência enquanto explicação possível para o mundo (o que daria assunto para um texto exclusivo) e de outras que lhe podem ser atribuídas, a Ciência tem a fundamental função de guia – ou ao menos conselheira – para a tomada de decisões no âmbito político. Como gerir melhor a sociedade, aplicar políticas públicas e descontinuar ações ineficazes ou danosas é algo que demanda conhecimento sobre as dinâmicas do mundo natural, área de atuação da Ciência – seja no campo das humanas, exatas ou biológicas.

    Se a ciência tem se dado bem na primeira função – a produção de tecnologia -, o que se pode dizer desta última? Frente ao que temos observado em muitos países e contextos, parece que, infelizmente, a conselheira está sendo solenemente ignorada.

    Como isso se dá?

    No panorama global, o caso que parece mais claro é a recusa do governo do país mais importante economicamente em aceitar os incontáveis alertas científicos quanto ao aquecimento do planeta e o provável caos global que se aproxima de nós. A saída dos EUA do acordo do Clima de Paris é uma demonstração flagrante de desdém para com o conhecimento científico, que apresenta o problema e propõe as soluções nunca aplicadas. A insistência na caça de baleias por países como Japão e Dinamarca, a despeito dos avisos de impacto ecológico e até mesmo econômico, merece também ser citada.

    No Brasil, arrisco dizer, a situação é ainda mais complicada. Não é só a destruição do Museu Nacional e os contínuos cortes no orçamento de C,T&I que mostram o descaso com a Ciência e o conhecimento em nosso país. Em termos práticos, o conhecimento científico tem sido sistematicamente ignorado por nossos representantes político.

    Um exemplo patente foi a discussão sobre o Novo Código Florestal Brasileiro, no começo desta década. Apesar das inúmeras críticas contrárias feitas por pesquisadores reconhecidos nacional e internacionalmente na área e da manifestação oficial de algumas das maiores entidades científicas do país contra a aprovação do projeto, o novo código foi sancionado em Os resultados, como previsto, têm sido desanimadores.

    Para não ficar só neste, podemos citar o exemplo de Belo Monte, onde um cenário semelhante de discussão se configurou, ou o da nova lei sobre liberação de químicos agrícolas – talvez o mais novo capítulo.

    Como motivar-se?

    Fazer pesquisa no Brasil, frente a todos os desafios, não é tarefa fácil. É preciso acreditar no que se faz para se dedicar ao tema que se quer abordar, a despeito de bolsas minguantes e estrutura muitas vezes insuficiente. Depende, portanto, de muita motivação. E é esse o questionamento neste texto. Tanta dedicação está sendo aproveitada por quem deveria? Sua pesquisa sobre a redução dos peixes da Amazônia em decorrência da instalação de barragens, ou sobre a perda dos solos em áreas de agricultura predatória, ou, ainda, a respeito do aumento de doenças causadas pela poluição do ar, por excelentes e incríveis que sejam, irão impactar e influenciar alguém mais que os cientistas da área? Alguma decisão relevante (à nível nacional, estadual, municipal) será tomada levando-a em conta? É difícil motivar quem faz ciência (seja pesquisador, docente ou pós-graduando) frente a este cenário, mas é preciso.

    Tudo começa com a valorização da ciência em toda a sua complexidade, e não apenas o potencial da tecnologia: a relevância desigual dada à ciência aplicada em detrimento da básica é um sintoma bem claro deste panorama. Além disso, a maneira como, frequentemente, as parcerias com a iniciativa privada são colocadas como a única salvação da pesquisa nas universidades é preocupante, pois, ainda que essa interação seja uma opção bem-vinda em muitos casos, a exclusividade deste tipo de financiamento traria impactos negativos inegáveis à produção de conhecimento básico e a temas que, a curto prazo, são “não-lucrativos”, como é o caso de boa parte das pesquisas em áreas como paleontologia ou história medieval, para ficar nestes dois exemplos.

    Mudanças dependem, em um regime democrático, de mobilização política e, obviamente, do voto consciente. Em tempos de eleições, o mínimo que devemos fazer é levar em consideração as propostas de governo dos candidatos em temas que dizem respeito à Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente, Agricultura, etc (veja aqui e aqui). Junto a isso, trazer a população para mais perto da Ciência é a única maneira de esperar que o dedicado trabalho dos cientistas seja levado em conta pelos representantes públicos.

    Publicado originalmente em Ciência em Si.

  • Política e Ciência: Newton morde a maçã

    Texto por Jefferson Picanço

    Não se pode pensar Ciência sem Política. Ciência pressupõe pesquisa, busca, invenção. Politica significa antes de mais nada fazer escolhas. No mundo em que vivemos, uma convive com a outra, se interconecta com a outra. No Brasil também sempre foi assim, com as suas peculiaridades. Existem muitos problemas a serem resolvidos e enfrentados usando ciência e usando política. Isso é fazer política. E isso também é fazer ciência.

    CIÊNCIA, NEWTON E A MAÇÃ

    Uma maçã caindo no chão é somente uma maçã. Para que essa maçã vire ciência, é preciso Newton observando a maçã cair. Para que Newton observe a maçã cair e isso vire ciência, Newton precisa subir no ombro de gigantes: isso pressupõe escolas, professores, despesas com educação. E isso é política: escolhas que devemos ter sobre quais escolas, quais professores e qual financiamento devermos controlar para que possamos ter Newton vendo a maçã cair e isso vire ciência.

    Newton e a maçã: uma alegoria (e uma lenda) da Ciência…

    Você não precisa de ciência para viver. Isso é uma escolha. Política. Podemos viver naturalmente, tendo o que a natureza nos dá. Alguém se habilita? Nós também não precisamos fazer Ciência. Se tivermos recursos, comprar ciência, comprar tecnologia. Como fizemos no passado, podemos vender borracha e comprar pneus. Vender ferro e comprar navios. É uma escolha política sem muitos riscos. Claro que continuaremos pobres. Alguns, que possuem o seringal e a mina de ferro, viverão confortavelmente. Aos demais, restará o trabalho duro e uma subsistência difícil. Mas, como sempre, é uma escolha política da ciência que queremos ter em nossas vidas.

    QUE CIÊNCIA QUEREMOS?

    Mas, e se nós quisermos ter Ciência? Ciência de verdade? Que tal não viver com a lenda de Newton e a maçã, a qual, como já mostraram seus biógrafos, não passa de uma lenda? O que precisamos para ter nosso próprio desenvolvimento cientifico? O que precisamos para vencer nossos problemas de educação, saúde, produção industrial, produção intelectual?

    Não existe milagre na ciência. Ciência requer trabalho. Leitura, estudo, experiencia. Como recentemente disse uma colega, horas-bunda na cadeira. E isso requer que tenhamos pessoas que façam isso como profissão. Pessoas que possam cada vez mais viver disso. E que tenham condições de fazer suas pesquisas, discutir livremente os seus resultados e suas ideias com outros cientistas, com os políticos, com a sociedade.

    QUE CAMINHOS TRILHAR?

    Todos os países que tem um nível razoável de vida para seu povo fizeram e fazem isso. A Inglaterra, desde o século XVIII tem uma cultura de manutenção e financiamento de pesquisas. A Alemanha, desde que era Prússia, reformulou a sua universidade a partir de 1811 e num século deixou de ser um país atrasado que era para se tornar uma potencia mundial.

    No século XX tivemos a Coreia, um país pobre e arrasado por guerras. Em 1960, os índices de vida e renda da Coreia eram inferiores aos do Brasil. No entanto, o país investiu firmemente em educação e hoje é uma das principais potencias industriais do planeta.

    Tudo isso são escolhas. Tudo isso é política. A forma como escolhemos nossa Ciência, por outro lado, impacta nossa maneira de ser e estar no mundo.

    O BRASIL CONSTRÓI SUA CIÊNCIA

    Nos últimos 100 anos, o Brasil também investiu em ciência. Neste tempo, erradicamos diversas doenças de nossas cidades. Ainda falta muito, mas a medicina brasileira progrediu. Hoje, conquistamos, com ajuda da ciência, solos que até então não eram férteis, e os fizemos produzir. Se hoje há agronegócio no Brasil, é porque houve pesquisa agropecuária, é porque houve a Embrapa.

    No início do século XX, éramos um país que não conseguia se desenvolver porque não tínhamos fontes de energia suficientes e boas. Hoje, graças ao esforço de varias gerações de geólogos, temos uma reserva de petróleo das maiores do Mundo, a qual só é possível explorar com altíssima tecnologia.

    Tá OK. Mas e a parte vazia deste copo?

    Ainda precisamos avançar. Como ter uma indústria competitiva e inovadora? Como ter uma Ciência de alto impacto? Como resolver os grandes problemas de nossa sociedade, como saúde, segurança, trabalho? Como resolver isso?

    POLÍTICA E CIÊNCIA. CIÊNCIA E POLITICA

    Precisamos de uma politica que invista mais, e não menos, em ciência. Se queremos realmente um futuro, devemos plantar as sementes hoje. Investimos pouco, e mal. Nossa despesa com ciência em 2015 (um ano ainda “rico”) foi de U$199 dólares por habitante. Empatamos com a Turquia. Perdemos feio para os países do Leste Asiático, Europa, América do Norte.

    E isso apesar de termos uma das maiores comunidades cientifica da América Latina. Uma comunidade briosa, que vem aumentando sua participação no quinhão da ciência nos últimos 15 anos. Mas que, como uma flor sensível, ainda corre sérios riscos.

    A participação publica vem diminuindo sua participação no financiamento da ciência desde 2015. E a política, que poderia trazer soluções, só nos tem trazido pesadelos. Claramente, ciência e a tecnologia não são prioridade de governo. As ameaças vêm de todos os lados.

    PARA ONDE VAMOS?

    Há os que sonhem com uma ciência sem estado. Houve o assessor de um candidato que chegou a dizer que “as pessoas subestimam o poder da filantropia”. Com isso, o douto senhor está nos dizendo que a contribuição privada para a ciência era uma fonte que nós não exploramos direito. Por outro lado, o financiamento privado é hoje irrelevante no financiamento da ciência.

    Entre os candidatos a presidente, qual deles menciona em seu programa a palavra ciência? E dos que o fazem, quais deles confundem ciência com ensino? Embora sejam parceiras, ciência e educação são coisas distintas, com pautas necessidades distintas. Não se faz ciência tirando dinheiro do ensino.

    A política vai ditar a ciência que queremos. Será que vamos escolher seguir um caminho de mais financiamento e uma busca maior de eficácia na resolução de nossos problemas? Ou será que vamos achar que não precisamos fazer ciência?

    São Heisenberg, rogai por nós!


    Publicado originalmente em PaleoBlog.

  • A importância da ciência para o estudo da energia

    Texto por Rafael Henrique

    Vocês já devem estar familiarizados com a notícia do corte de bolsas da CAPES previsto para agosto de 2019, correto?

    Certamente quando eu li isto foi como se fosse um soco no estômago. Por causa disto, eu decidi fazer um texto sobre o porque a ciência é importante para o estudo da energia, da mesma forma de o porque de conscientizar as pessoas sobre o prejuízo que os ataques a ciência podem causar para quem estuda nesta área. Como o caso de Engenheiros de Energia ou áreas relacionadas.

     

    O que é ciência?

    A definição de ciência em si já explica a sua importância no estudo da energia. Ciência é o conhecimento obtido através da prática ou estudos. Basicamente, através da pesquisa. Logo, a ciência é necessária para o aprofundamento das mais variáveis áreas, inclusive a que o Blog é focada(8;9).

    Energia Eólica

    É incerto o tempo exato da criação da energia eólica. Existem evidências que o modelo de eixo vertical tenha surgido em volta de 200 antes de cristo no Irã. Outras demonstram que teria sido originada na Persia. Mas uma coisa é certa. A metodologia para o desenvolvimento do uso dos ventos, foi baseado em conhecimento científico. Considerando também que antigamente era estudado o uso do vento para outros usos, como irrigação. O estudo dos moinhos de vento também é um antecessor para as atuais torres eólicas. Da mesma forma que sua evolução feita por vários países, em especial a Holanda e na Dinamarca (na qual os modelos para geração de eletricidade foram criados)(2).

    Turbina eólica Charles Blush (1888)

    No Brasil, também há estudos para aplicação da energia eólica. Através de metodologias em diferentes estados (envolvendo instituições diferentes), foram feitos diferentes atlas eólicos, com o intuito de avaliar o potencial eólico nestes estados. Inclusive, o estudo destes projetos pode auxiliar inclusive na geração de empregos e aumentar a segurança energética do país(6).

    Energia Solar

    Muitos métodos foram desenvolvidos para captar energia dos raios de sol. Um experimento feito por Georges Louis Leclerc (Comte de Buffon), focalizava os raios de sol em um único ponto, com este intuito. Assim como a eólica, o descobrimento desta fonte renovável foi baseado em viés científico. Da mesma forma que o estudo foi evoluindo, como William Grylls Adams e seu estudante Richard Evans Day fizeram em 1876, na qual introduziram a relação da energia solar com a geração de eletricidade(3).

    Fonte: Gardner (2010)

    No Brasil o governo procura investir no uso da energia solar. Estudos são feitos, por exemplo, sobre o Payback que regiões tem após aderirem a um sistema de aquecimento solar, feito pela SWERA. Inclusive, há estudos para a aplicação da energia solar em regiões, cujos painéis não estão localizados. Em outras palavras, utilizar a energia solar para abastecer uma região distante de seu local de instalação. Todos estes estudos são possíveis graças a magica da ciência(6).

    Biodiesel

    Não apenas para o diesel, mas também para o biodiesel, foi utilizado de métodos científicos. Os motores a diesel, por exemplo, estão relacionados com os motores a vapor. Isto tendo como base um modelo conhecido como “Hero of Alexandria”. O ciclo a Diesel foi sendo desenvolvido com o tempo, a partir de pesquisas com queima de combustíveis, idem parâmetros necessários, como o volume e o tipo de combustível. Da mesma forma que foram necessárias adaptações, como reduzir os ruídos do motor e até mesmo as emissões. E o avanço também permitiu o uso de combustíveis alternativos ao motor a diesel, como é o caso do biodiesel atualmente(7).

    No Brasil o uso do biodiesel encontra-se bastante incentivado. Inclusive, busca aumentar a porcentagem de biodiesel em conjunto com o diesel ano após ano. Mas antes, busca-se testar a mistura, na qual utiliza-se de métodos científicos. E o Brasil possui uma quantidade grande de insumos para o biodiesel, o que faz a área de estudos de biodiesel ter inúmeras possibilidades. Como por exemplo, os estudos feitos para o aumento na mistura do biodiesel, considerando a redução de emissões, idem o não esgotamento de tais recursos(5).

    Conclusão

    O avanço da ciência foi crucial para a criação e avanço, não só das fontes citadas, mas também de outras não citadas neste texto (tanto renováveis quanto não renováveis). Se o Brasil investir em ciência, certamente poderá fazer mais estudos de aplicações das fontes de energia, inclusive resolver soluções de seus problemas. Por isto qualquer ataque a ciência é também uma afronta ao desenvolvimento de novos estudos de energia. Desta forma, peço que divulguem esta mensagem final a todos aqueles que visam estudar sobre a energia. E para os mesmos não deixarem isto acontecer, pois isto afeta a todos desta área(1,4).

    E nestas eleições (ou nas próximas) cobrar dos seus candidatos uma posição sobre a ciência no Brasil. Sugiro votar em candidatos que estimulam a pesquisa cientifica no Brasil, e não votar em quem pensa o oposto. Caso o seu candidato não tenha nenhum interesse na pesquisa científica (e que deveria ter), mas você discorda deste posicionamento e ainda assim irá votar nele (o que eu desaconselho), COBRE uma satisfação sobre o ocorrido para evitar tal acontecimento.

    E este foi mais um texto. Os links para este texto estão na descrição, e vou pedir para verem e compartilhar especialmente o item 1, porque ele fala do assunto de uma forma mais ampla até mesmo para quem não é da área em que o blog é focado. E aproveitem e curtam o Blog em suas redes sociais (Facebook e Twitter).

    Referências:

    (1) FERNANDES, S. Os cortes na CAPES e a pesquisa no Brasil | 030. Brasil, Youtube, 2018. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=yaA2bIqNUww>

    (2) FLEMING, P. D.; PROBEN, S. D. The Evolution of Wind-Turbines : An Historical Review. Applied Energy, v. 18, p. 163–177, 1984.

    (3) GARDNER, L. The sun’s power went into battle for the Greeks and now heats homes. Professional Engineering, n. 31 March 2010, p. 21, 2010.

    (4) MORI, L. Corte de bolsas da Capes afetará vacinas, energia, agricultura e até economia, diz presidente da SBPC. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45063428>. Acesso em: 4 ago. 2018.

    (5) OLIVEIRA, F. C. DE; COELHO, S. T. History , evolution , and environmental impact of biodiesel in Brazil : A review. Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 75, n. July 2015, p. 168–179, 2017.

    (6) RAMOS, F.; PEREIRA, E. B. Enhancing information for solar and wind energy technology deployment in Brazil. Energy Policy, v. 39, n. 7, p. 4378–4390, 2011.

    (7) SHRINIVASA, U. The Evolution of Diesel Engines. Resonance, n. April, p. 365–377, 2012.

    (8) Significado de Ciência. Disponível em: <https://www.significados.com.br/ciencia/>. Acesso em: 4 ago. 2018.

    (9) Significado de Ciência. Disponível em: <https://www.significadosbr.com.br/ciencia>. Acesso em: 4 ago. 2018.

  • Grandes extinções: um dia da caça, outro do caçador

    Extinção é para sempre, como casar pela igreja … mas no último caso, os interessados combinam a hora, dia, mês e ano. Mas no caso das extinções, o processo precisa da conjunção de vários fatores e os principais envolvidos … bom… não estão assim muito felizes! O que define uma extinção em massa?

  • O santo padroeiro dos cientistas

    Por mais frio, racional e calculista que um ser humano possa pensar ser, na hora que a coisa fica preta, como quando a FAPESP rejeita a sua prestação de contas ou quando a revista rejeita seu artigo na reta final para a defesa do Doutorado, vale tudo! Até apelar para a ajuda dos santos católicos. Por isso não se desespere jovem cientista. Você tem sim a quem recorrer: São Alberto Magno, o padroeiro dos cientistas.

plugins premium WordPress