Tag: Corona

  • 2 anos de Pandemia de Covid-19

    Imagem de Clorofreela

    Hoje completamos 2 anos de Pandemia de Covid-19. No início de 2020, ainda em janeiro, víamos as notícias percorrendo o mundo, acompanhávamos atentos aos acontecimentos recentes acerca de uma pneumonia cujo patógeno era considerado novo, para nós.

    No dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde finalmente decreta que o Coronavírus, SARS-CoV-2, tinha se tornado uma pandemia. Isto é, um vírus que atinge todos os países do mundo (ou quase todos).

    Enquanto buscávamos informações seguras para realizar nosso trabalho, aqui no Blogs de Ciência da Unicamp, também víamos proliferar desinformações vindas dos locais em que mais deveríamos confiar e que ocupam postos destinados ao cuidado de nossa população. 

    Em 2 anos, enfrentamos mais de 450 milhões de casos notificados no mundo e 6 milhões de óbitos confirmados registrados. Destes, ainda que com uma subnotificação enorme, quase 11% ocorreu aqui em solo brasileiro (cuja população total é 2,6% da população mundial…). 

    Vidas que não sofrem sozinhas ao virem a termo. Foram pessoas, famílias inteiras, sofrendo com desde a infecção, até internações, cuidados paliativos e descaso ou falta de leitos hospitalares – o que aconteceu em grande parte do mundo. (Podemos analisar isto aqui, aqui, aqui, aqui e mais recentemente, aqui).

    Primeiro ano da Pandemia

    Aqui no Brasil, após um primeiro ano nitidamente marcado pela desinformação, o colapso veio junto com o início de uma lenta vacinação e muita apreensão. Nosso março de 2021 foi marcado com perdas e exaustão, que nublavam a esperança pela chegada da vacina. Uma vez que víamos despedidas de pessoas queridas que não conseguiram se afastar da infecção, semanas antes de sua tão esperada data de vacinação chegar. Este foi o maior colapso sanitário e hospitalar já vivenciado em nosso país.

    O Especial COVID-19, aliava-se ao Todos Pelas Vacinas e também ao Consulado Geral da França em São Paulo para informar sobre vacinas, Covid-19, efeitos sociais da pandemia, surgimento de variantes e muito mais temas necessários para entendermos e enfrentarmos esta doença que se agravava no cenário brasileiro.

    Assim, completamos 1 ano de pandemia no auge do colapso, após uma virada de ano literalmente sem ar, em Manaus, em um ato de descaso sem igual na história de nosso país.

    Segundo ano de Pandemia

    Iniciamos 2021 com 200 mil óbitos. Rapidamente chegamos a marcas mais tristes e devastadoras, que só desaceleraram em função da vacinação que ampliou sua cobertura ao longo do primeiro semestre, ainda que com velocidade menor do que a capacidade brasileira de negociação, compra e distribuição destas vacinas.

    Passamos por uma dolorosa CPI, que escancarou esquemas de corrupção e planejamentos que em nada relacionam-se com princípios de uma gestão pública para salvar vidas, frente a uma crise sanitária que vivenciávamos.

    Debatemos inúmeros medicamentos que não tinham efeito algum para Covid-19, enquanto notícias falsas sobre vacinas brotavam em mensagens instantâneas de aplicativos e causavam hesitação vacinal.

    Fechamos o ano de 2021 com mais de 600 mil mortes em nosso país, muitas delas evitáveis. Vimos, ainda neste final de 2021, o apagão de dados públicos do DATASUS. Sem explicações plausíveis, o que prejudicou muito o monitoramento da doença no Brasil.

    Todavia, a esperança da vacina infantil aprovada pela Anvisa trazia alento para nós, também.

    Junto com a vacina infantil, um novo levante de desinformações era visto, mais cruel e ardiloso: a frequente ameaça que, supostamente, as vacinas causavam miocardite e mal súbito em crianças é uma avalanche constante em nossos meios de comunicação de redes sociais.

    Sem qualquer fundamento ou dados concretos, causam hesitação vacinal em um grupo ainda vulnerável. Piorando, ainda, nosso cenário em que caem as últimas barreiras de cuidados básicos individuais. Por exemplo, as máscaras faciais. Além disso, acentua-se a situação em função de estados e municípios retirando a obrigatoriedade de uso em crianças em fase escolar, sem esquema vacinal completo.

    Seguimos atentos, junto a outros grupos de divulgadores científicos e cientistas, olhando atentamente números, pesquisas, casos pelo mundo, tentando compreender o momento em que estamos vivendo da pandemia. Além disso, com esperança de dias melhores e mais amenos (como acreditamos realmente estarmos alcançando), ainda cientes de que a pandemia não acabou. Não estamos em uma endemia e temos reiterado que tornar-se uma endemia não é algo bom, se negligenciarmos mortes por Covid-19.

    Longe de alarmismos, temos tentado observar a pandemia com um otimismo atento e alerta.

    E com radares ligados para novidades que possam ser importantes para seguirmos divulgando ciência, todos os dias.

    A todes que seguem juntes a nós, nessa toada, nosso muito obrigada.

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Fake News e Auxílios em tempos de Pandemia

    Em tempos como os que temos vivenciado agora, é comum montarmos redes de apoio às instituições como hospitais, centros de saúde e de pesquisa, instâncias de distribuição de alimentos e roupas à comunidades desabastecidas e em fragilidade social. Tudo isto não só é válido, mas é fundamental, pois mesmo quando o poder público é organizado e tem ações efetivas, as emergências nos tempos de calamidade são demasiadas.

    No entanto, também é tempo de termos cuidado redobrado com golpes que se apresentam cotidianamente nas redes sociais, em especial em compartilhamentos em mensagens instantâneas, como grupos de WhatsApp, por exemplo. 

    Assim, alguns cuidados específicos em relação às doações para a unicamp são fundamentais:

    1. Desconfie de pedidos de depósitos em que a pessoa jurídica não seja diretamente a UNICAMP ou o Hospital de Clínicas da Unicamp;
    2. Confira todas as informações da mensagem: a quanto tempo as associações e fundações que estão pedindo ajuda existem? O CNPJ delas confere? É relacionado ao que está dizendo ser, na carta ou mensagem recebida? Existe rede social desta instituição? Existe informações precisas, nomes dos envolvidos? No site da Unicamp e do Hospital de Clínicas estas informações também estão presentes nos canais de ajuda?
    3. Confira sempre e toda a vez o site da Unicamp e do Hospital de Clínicas para ter certeza absoluta que esta parceria existe;
    4. A Unicamp tem um link específico para doações, se realmente quiseres ajudar, estes canais são diretamente relacionado à instituição:
      https://www.unicamp.br/unicamp/coronavirus/doacoes
      https://www.unicamp.br/unicamp/orientacoes-sobre-como-proceder-para-realizar-doacoes
      Vocês também podem se informar melhor pelos e-mails:
      amigosdohcunicamp@hc.unicamp.br
      combatecorona@unicamp.br
      Ou ainda pelo telefone (19) 3521-2020 (fixo e WhatsApp)
    5. Todos os sites têm especificações que nos ajudam a rastrear falsidades. Todas as informações da unicamp estão em endereços dentro do domínio “unicamp.br”, sempre verifique esse detalhe no seu navegador. O Hospital, por exemplo tem como endereço na internet:
      https://www.hc.unicamp.br
      o Blogs de Ciência da Unicamp, que é outro portal que tem apresentado notícias e informações sobre o covid, também apresenta o mesmo domínio:
      https://www.blogs.unicamp.br e https://www.blogs.unicamp.br/covid-19

    Em outras universidades e hospitais públicos também você deve ter o mesmo cuidado! Especialmente em um período como este, os golpes estão proliferando nas redes sociais e nem todo golpe é simples de identificar! Sempre procure os canais oficiais de comunicação das instituições que você gostaria de auxiliar, é mais seguro e eficiente.

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Solidariedade: saúde para todos

    Szachna Eliasz Cynamon (1955-2007), um dos maiores sanitaristas e pesquisadores da Fiocruz, em 1990 afirmou que “solidariedade à saúde tem de ser para todos. É um aforisma tecnicamente provado que ‘sem a saúde do vizinho, a tua corre risco’”.

    Temos visto muitas recomendações e indicações de cuidados próprios. Lavar as mãos o mais frequente possível, não passar a mão no rosto (boca, nariz, olhos…), tapar boca e nariz ao espirrar, passar álcool gel nas mãos, dentre outras prescrições.

    #fiqueemcasa

    A recomendação mais contundente de todas têm sido, entretanto, o “fique em casa”. Prescrição difícil de seguir em um país como o Brasil, aquele clássico clichê (não menos verdade por isso), “um país de dimensão continental”. Um país com o povo acostumado à rua, ao sol, às lidas diárias no campo, aos transportes públicos abarrotados nos centros urbanos, às praias no litoral, aos bares ao fim de tarde, o chimarrão na calçada com vizinhos, almoços coletivos aos finais de semana, conversas aleatórias com desconhecidos em filas de bancos e padarias… Em suma, uma vida de intensa interação social, com muitos trabalhos que não podem deixar de serem feitos… E agora? Como se cumpre isso em um país como o nosso?

    São tempos de solidariedade, como nos disse Cynamon. Há quem, realmente, não possa parar de transitar. Há quem não tenha sabão para se limpar. Também há quem não tenha acesso e condições de aferir informações… Vamos pensar juntos sobre isso?

    Sobre as informações e nossas ações…

    Temos publicado aqui no blogs, assim como temos visto em diversos outros espaços de jornalismo científico e divulgação científica, inúmeros materiais sobre cuidado de si e informações que nos possibilitam compreender melhor o que é o vírus e como ele se dissemina. 

    Uma das grandes dificuldades em tempos de pandemia é filtrarmos informações, não cairmos na tentação de nos agarrarmos em promessas de curas rápidas e discursos sedutores de que tudo vai melhorar ali, logo após a curva. 

    São montantes de informações que vocês (e nós), leitores e consumidores de notícias, recebem diariamente. E são vários e vários artigos e relatórios científicos publicados também apressadamente para ampliarmos a rede de debate e compreensão da doença e de como combatê-la.

    Veja, a informação deve ser filtrada (seja nos grupos de whatsapp, lives com especialistas, jornais televisionados, em rádios, seja de youtubers e, até, dos blogs de ciência, óbvio!) de modo a gerar uma eficiência em nossa vida. Como assim? Que eu compreenda a doença e os cuidados necessários para mim e quem está próximo, mas que não potencialize a ansiedade de cada um de nós (para saber mais sobre excesso de informações, pode ler aqui). 

    E as implicações sobre as informações não se restringem à “biologia” da doença. Cada fala nossa diz respeito a vidas humanas, com complexidades que, quando em nosso âmbito privado, falam de todos e de ninguém ao mesmo tempo. Dizemos isto pois números, definitivamente, não são e não representam as pessoas. Mas falam das suas vidas, seus adoecimentos e suas mortes.

    Sobre a solidariedade…

    Ser solidário é, dentre outras coisas, compreender que não somos nós, individualmente, que a doença atinge. Cuidar da saúde dos outros é cuidar da nossa, como disse Cynamon em 1990. Ademais, a máxima “conhecer para governar” nunca fez tanto sentido. Não é possível governar com base em opiniões pessoais. É preciso debate com decisões rápidas sim, com corpo técnico, com grupos e redes de consultas e conhecimento acumulado também, para uma decisão que vise ao bem de todos e não de pequenas parcelas.

    O isolamento social, por exemplo, é historicamente uma ação prática e efetiva em doenças em que o contágio se dá pelo toque entre pessoas (já falamos disso aqui). É, à primeira vista, prejudicial socialmente e economicamente, mas salva vidas na prática imediata. Viabiliza que contenhamos o espalhamento da doença, enquanto ganhamos tempo para compreendê-la melhor e aprimoremos os modelos epidemiológicos já existentes para pandemias e epidemias anteriores.

    Há exemplos de silenciamento dos casos e de não disponibilizar informações seguras à população que pioraram, e muito, o quadro de adoecimento em epidemias que poderiam ter matado menos pessoas (como o caso da epidemia de meningite no Brasil, entre 1971 e 1975). Há modelos sendo pensados, a partir de negligências e acertos sobre a pandemia da gripe espanhola, em 1918.

    Nenhum destes modelos fará com que vidas parem de serem exterminadas pelo SARS-Covid-2, causador da Covid-19. Mas nos possibilita olhar comportamentos que potencializaram ou minimizaram perdas. Semana passada, por exemplo, tivemos a notícia do auxílio emergencial (aprovado hoje, dia 30/03, no Senado Federal). Também emergem no país diversas ações solidárias para bairros e populações com menor condição financeira para manterem-se neste período de isolamento.

    E aí? O que fazer de tudo isto?

    Ao fim e ao cabo, nossa fala não diz respeito a tirar esperança das pessoas com números mais ou menos assustadores. Mas mostrar que não há milagre, fora a teimosia cotidiana de seguirmos vivos.

    Nesta semana que passou, ouvimos relatos de São Paulo – a maior capital brasileira e o maior epicentro do coronavírus, esvaziar e encher – mesmo sem lotar – de gente novamente (como nas fotos abaixo da rua São Bento, destacando para o dia 27/03, após discurso público minimizando a importância da quarentena). 

    Fotos de arquivo pessoal de alguém que (ainda) não foi liberado de seu trabalho, tiradas no mesmo ponto da rua São Bento (Centro Histórico, São Paulo/SP), entre os dias 23 e 30 de Março de 2020.

    Reiteramos, aqui, nossa crítica a qualquer fala que amenize a gravidade da situação e proporcione um aumento da circulação de pessoas às ruas. Afirmamos, assim, que a solidariedade, a que nos remete Cynamon, se faz debatendo ciência – questionando-a também (visto que é com questionamento que avançamos e este é o pressuposto mais básico e fundamental da ciência). Solidariedade se faz combatendo “milagres que curam” (mas não curam nada) e vãs esperanças, notícias falsas e opiniões fraudulentas. Solidariedade se faz, por fim, ficando em casa também, batalhando para poder ficar e cobrando (inclusive de órgãos competentes e do poder público) para que possamos ficar, possibilitando uma diminuição do contágio.

    Leia também neste blog

    Alguns questionamentos sobre governo, um vírus e a fome

    Para saber mais:

    CYNAMON, Szachna Eliasz. (1990). Saúde Pública, qualidade de vida. Cadernos de Saúde Pública, 6(3), 243-246. https://doi.org/10.1590/S0102-311X1990000300001.

    FOUCAULT, Michel. (2002). Em defesa da Sociedade. São Paulo: Martins Fontes.

    ___. (2008). Segurança, Território e População. São Paulo: Martins Fontes.

    GENSINI, Gian Franco; YACOUB, Magdi H.; CONTI, Andrea A. (2004). The concept of quarantine in history: from plague to SARS. Journal of Infection. 49(4), 257-261. https://doi.org/10.1016/j.jinf.2004.03.002

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Alguns questionamentos sobre governo, um vírus e a fome

    “Eu tenho quase certeza que não vou morrer por causa desse vírus aí, mas se eu parar de trabalhar eu e toda a minha família vamos morrer de fome”.

    “Eu tenho quase certeza que não vou morrer por causa desse vírus aí, mas se eu parar de trabalhar eu e toda a minha família vamos morrer de fome”.

    Foi no dia 18 de março que ouvi pela primeira vez essa frase, dita por um motorista de Uber, e que logo depois se tornou tão popular na mídia conjuntamente à progressão da pandemia de COVID 19 no país. Naquele dia fui à São Paulo para participar em um programa de rádio sobre Fome e Direitos Humanos. A universidade na qual eu realizo minha pesquisa de doutorado, Unicamp, havia cancelado todas as atividades até o dia 14 de abril e eu já estava em uma quarentena auto imposta pois tinha participado de muitos eventos com pessoas recém chegadas da Europa.  Por esses e outros motivos, a ida para São Paulo me deixava um pouco ansiosa, principalmente ao saber que a cidade se configurava como o epicentro da doença no Brasil. Depois de confirmar com os organizadores do programa que a entrevista ia acontecer de qualquer maneira, me preparei para a viagem tentando seguir ao máximo as medidas de higiene recomendadas.

    No entanto, ao entrar na cidade fui percebendo que a vida por ali estava beirando a normalidade. Pessoas estavam trabalhando em lojas, havia vendedores de água e salgadinhos nos semáforos, os restaurantes estavam cheios e os ônibus municipais estavam tão lotados como usual. Assim, temendo contaminar alguém com a doença que nem sabia se tinha, resolvi chamar um Uber e, no caminho, comecei uma conversa que resultou na frase com a qual iniciei este texto.

    A afirmação do motorista ficou martelando na minha cabeça durante todo o dia. Mais do que isso, foi essencial para me fazer pensar na relação entre a fome, os direitos sociais básicos e a epidemia que estávamos por enfrentar – o que acabou sendo o principal tópico de discussão da entrevista naquela manhã.

    A comida sempre foi boa para pensar, como afirmou Lévi-Strauss (1929). Mas em relação à pandemia do COVID-19, a comida é objeto essencial para entendermos melhor os efeitos desta doença, não apenas compreendendo-a como epifenômeno de relações sociais mais amplas. Principalmente, porque o novo coronavírus tem suposta origem no consumo de animais exóticos e porquê sua epidemia impôs quarentena e distanciamento social para um número massivo da população mundial. E isto acabou impedindo ou alterando o acesso a direitos sociais mais básicos, tais como alimentação, habitação e saúde, que a atenção ao tema da comida e à garantia de acesso a ela é de extrema relevância.

    Estou certa, assim como diversos pesquisadores e cientistas das mais variadas áreas, que a atual pandemia pode ser compreendida como um momento crucial para repensarmos categorias  estruturais de nossa vida em sociedade como a economia, a política, o governo e o Estado. Assim, a discussão sobre o acesso à comida enquanto necessidade básica para a sobrevivência parece ser um bom ponto de partida.

    Em 1948, com a criação das “Nações Unidas”, após o fim de uma das maiores crises globais até então vivida, foi assinado a “Declaração Universal dos Direitos Humanos”, na qual o artigo 24 afirma:

    “Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle” (ONU, 1948).

    Essa declaração, apesar de não constituir uma obrigação jurídica para os Estados, se propunha como uma resolução com o objetivo de evitar uma nova situação catastrófica como aquela experienciada durante a Segunda Guerra Mundial. 

    No momento atual, ao prestarmos atenção nas implicações que a epidemia de COVID-19 pode trazer para a sociedade como um todo, somos incitados a questionar se esses direitos foram em algum momento realmente garantidos, pelo menos para parte da população mundial.

    Retomando a afirmação do motorista de Uber, mas também considerando o que os trabalhadores das mais diversas áreas têm reivindicado nesse momento, podemos nos atentar para a precariedade de muitas vidas. Talvez, grande parte da população nunca teve garantido “o direito à segurança em caso de perda dos meios de subsistência fora de seu controle” (ONU, 1948).

    Penso, então, que o que essa pandemia está nos ensinando reside precisamente nos efeitos do vírus para além do tempo da ‘declarada pandemia’, modificando ou questionando ideias acerca do próprio conceito de ‘vida’ e subsistência.

    A comida que é usualmente um objeto renegado ao setor privado de nossas vidas, o domínio do oikos, vista como parte de uma esfera afastada da política, define agora, talvez mais do que nunca, aqueles que podem viver ou os que são deixados para morrer. E nesse processo, acaba por definir também o que é entendido por economia (oikos) e qual a sua importância na ‘feitura do Estado’ (Lima, 2012).

    De acordo com o Ministro da Saúde, Luis Henrique Mandetta, “a vida não se resume a uma doença, a um vírus”. Essa afirmação pode sim ser um consenso, no entanto, podemos questionar, a que se resume a vida então? Quais são os mínimos vitais que precisam ser estabilizados para que algo possa ser definido como vida? Que vida é essa que seguiremos tendo após a resolução dessa pandemia (e aqui não penso uma resolução no sentido de fim ou cura do problema)?

    Um dia após essa constatação do Ministro da Saúde, o presidente Jair Bolsonaro aprovou uma medida provisória (MP) que buscava soluções para a crise econômica decorrente do COVID-19. Um dos pontos mais polêmicos da medida permitia a suspensão de contratos de trabalho por até quatro meses durante o período de calamidade pública no país, desde que fossem disponibilizados cursos de formação online para os trabalhadores. Esse ponto foi rapidamente removido da MP após grande mobilização virtual da população, mas o poder executivo federal segue tentando barrar toda possibilidade de criação de medidas que garantam um padrão de vida adequado para todos os cidadãos, com a justificativa de que essas ações poderiam quebrar a economia do país. 

    No entanto, se nos atentarmos aos dados sobre trabalho no país percebemos que a taxa de informalidade é de 41%, o que equivale à 38,8 milhões de trabalhadores sem carteira registrada. Esses números sugerem então um baixo impulso na economia, pois normalmente o trabalho informal está associado à baixos salários, além de não permitir a garantia de estabilidade e segurança no provimento familiar. Em um contexto de crise são esses trabalhadores e suas famílias que são colocados, de uma hora para outra, em condição de total precariedade.

    Face a esse problema, no dia 24 de março, o presidente Jair Bolsonaro, fez um pronunciamento oficial televisionado em todo o país, mostrando sua preocupação com a atual situação econômica. Em sua fala, tentando minimizar os efeitos da crise, afirmou que o COVID-19 não passa de uma “gripezinha” e que por isso somente os idosos e os casos suspeitos deveriam ser mantidos em quarentena e o resto da população deveria continuar vivendo normalmente, isto é, produzindo e consumindo.

    A oposição entre economia e vida parece ser elemento central na forma de gestão do atual governo, o que nos incentiva a questionar então, como garantir um padrão de subsistência adequado para toda a população se o Estado não está disposto a manter grande parte dos cidadãos protegidos do vírus?

    Apesar de parecer um questionamento um tanto inocente, penso que o novo coronavírus pode trazer a possibilidade de repensarmos algumas oposições dadas como ‘naturais’ que operam em nossa vida em sociedade, sendo a principal delas a oposição entre a esfera da economia e a da política. Acredito que o direito à comida ou próprio fenômeno da fome podem nos ajudar a trazer luz aos aspectos mais materiais que informam esse dualismo.

    Se pensamos a economia enquanto diretamente associada à manutenção da vida, isto é, como instrumento de produção e reprodução das condições materiais necessárias à existência humana digna, essa oposição entre economia e vida, ou entre economia e política se desmancha. Mas se seguirmos entendendo essas esferas como separadas continuaremos presos a uma ideia de vida totalmente desnuda de humanidade. O vírus terá então nos ensinado muito pouco sobre nós mesmos.

    Leia também:

    Solidariedade: saúde para todos

    Para saber mais:

    Lévi-Strauss, Claude.[1929] (1965) Le triangle culinaire. L’Arc.

    Lima, Antonio Carlos de Souza, (2012). O estudo antropológico das ações governamentais como parte dos processos de formação estatal. In: Dossiê. Fazendo Estado. Revista de Antropologia. Vol. 55, N. 02 de 2012, São Paulo, USP.

    ONU. (1948) Declaração Mundial dos Direitos Humanos. Paris: III Assembléia das Nações Unidas, 10/12/1948. Res. No 217 A. Disponível em: http://www.onu -brasil.org.br/documentos_direitos humanos.php.

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Máscaras caseiras são eficientes contra o coronavírus?

    Com medo de contrair o coronavírus, ou COVID-19, várias pessoas estão costurando e comprando máscaras caseiras para usar na rua, principalmente quando vão às compras. Esses equipamentos de proteção produzidos em casa sem embasamento científico têm tudo para dar errado. Nesse texto, explico o porquê com um exemplo histórico.

    A máscara de gás foi criada na Primeira Guerra Mundial como uma forma de proteger os combatentes no front, pois foi em um ataque em 1915 que as armas químicas passaram a ser utilizadas em massa pela primeira vez. Os primeiros ataques foram realizados com o gás cloro, mas ao longo do conflito outros tipos de gases mais letais foram desenvolvidos, como por exemplo o gás fosgênio e o mostarda.

    As primeiras máscaras eram bastante simples e consistiam basicamente em um pedaço de tecido embebido em soluções neutralizadoras que deveria ser atado ao nariz e a boca. Uma bastante conhecida é o respirador feito com véu negro desenvolvido por John Scott Haldane, o black veil respirator. Chegar ao design de uma máscara aparentemente tão simples não foi uma tarefa fácil. Como o tecido deveria necessariamente ser embebido com soluções neutralizadoras, ele precisava permitir a passagem de ar quanto úmido, já que muitas vezes os combatentes vestiam a máscara logo após mergulhá-la na substância neutralizadora e também ser capaz de neutralizar os efeitos dos gases quando seco.

    Por isso a black veil respirator era feita com um tipo específico de fibra de algodão, além de utilizar como faixa fixadora um véu – negro porque era o mais produzido no momento, já que era usado por viúvas ou mulheres como símbolo luto. Mas nem todos os tecidos permitem a passagem de ar quando estão molhados e desconhecer essa informação causou a morte de muitos soldados. 

    Em uma tentativa de auxiliar nos esforços da guerra, o governo britânico fez uma chamada para que civis fizessem um mutirão para confeccionar máscaras. Milhares delas foram confeccionadas da noite para o dia e enviadas para o front. Como se verificou da pior maneira, elas eram não só inúteis, como perigosas. Como foram confeccionadas com o tipo inadequado de fibra de algodão, essas máscaras não protegiam do gás quando secas e molhadas não permitiam a passagem do ar. Como consequência, no meio de um ataque muitos soldados ficaram desprotegidos ou precisaram tirar a máscara úmida e acabaram sendo feridos ou mortos pelos gases. A partir desse episódio, a produção de máscaras e outros equipamentos de proteção passou a ser centralizada por um departamento criado especificamente para lidar com as questões das armas químicas: o Gas Service. Além de produzirem equipamentos, esse destacamento era responsável por treinar os combatentes para que eles pudessem usar o equipamento de forma correta, já que só assim ele seria efetivo.

    Desenvolver um equipamento exige muita pesquisa e muitos testes. As coisas não funcionam porque elas parecem funcionar, mas sim porque elas acumulam tecnologias desenvolvidas a partir de muitas pesquisas e experiências. E eles só funcionam quando são utilizados de forma adequada, seguindo protocolos rigorosos de uso estabelecidos após numerosos testes.

    As máscaras que estão sendo criadas em casa ou vendidas por costureiras – e até mesmo aquelas cirúrgicas – não impedem a inalação do COVID-19. Elas somente são efetivas quando usadas por pessoas contaminadas, já que impedem a dispersão do vírus no ar através de gotículas. A pessoa saudável que usa uma máscara caseira está, na verdade, criando uma armadilha para concentrar o vírus (e outros microrganismos) no próprio rosto. Além disso, tocar na máscara, deslocá-la pelo rosto até a área dos olhos ou abaixá-la no pescoço para falar acabam, na verdade, aumentando as chances de contaminação. Por isso essas máscaras podem ser tão perigosas: elas criam uma sensação falsa de segurança, o que acaba aumentando as chances de contaminação.

    As únicas máscaras capazes de impedir a inalação dos vírus são aquelas que possuem um sistema para barrar partículas minúsculas, biológicas ou não, dispersadas por aerossol. E como dito anteriormente: elas só funcionam quando usadas de forma rigorosamente correta e por tempo limitado. Se não conhecemos o comportamento e o tamanho do vírus e as especificidades dos tecidos, e se não sabemos quais são os protocolos de segurança no uso, criar e usar máscaras caseiras é irresponsável e perigoso. Não existe equipamento milagroso contra a contaminação. Para diminuir os riscos de contrair a doença devemos ficar em casa e evitar aglomerações, lavar frequentemente as mãos com água e sabão por pelo menos 20 segundos, não tocar a face e manter ambientes ventilados.

    Se você não apresenta sintomas, não compre máscara de nenhum tipo! Deixe para as pessoas que trabalham na área da saúde e seus familiares, que estão expostos cotidianamente ao vírus, e para as pessoas que precisam cuidar de familiares e amigos doentes. Somente use máscaras se você estiver contaminado.

    Um último lembrete: precisamos proteger e investir na ciência brasileira, pois é somente através de pesquisas e experiências que encontraremos soluções eficientes para os nossos problemas, como é o caso da atual pandemia.

    Update 06/04/2020 (Coordenação do Blogs de Ciência da Unicamp): Até o presente momento a Organização Mundial de Saúde segue sem recomendações de uso de máscara por pessoas não contaminadas. O MS e o CDC mudaram suas recomendações, especialmente em função de pessoas que podem estar infectadas mas não sabem. Todas as recomendações mais recentes são apenas para usar máscara como barreira mecânica de quem está infectado. O Blogs de Ciência da Unicamp decidiu manter este post no ar, uma vez que traz um panorama histórico importante dos riscos de produções sem cuidados técnicos e científicos. Quaisquer recomendações feitas por este veículo de Divulgação Científica estão e estarão, sempre, de acordo com preceitos científicos e embasados teoricamente. Reiteramos, ainda, que quaisquer comentários desrespeitosos com a autora, ou o blogs, não serão aceitos. 

    Para Saber mais

    AULD, S. J. M. Gas and flame in modern warfare. Nova York: George H. Doran, 1918.

    FRANKE, I. A fotografia e a máscara: uma antropologia da imagem. 2019. 109 f. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

    GRAYZEL, S. R. Defence against the indefensible: the gas mask, the State and British Culture during and after the First World War. Twentieth Century British History, vol. 25. n. 3, 2014, pp. 418-434.

    JONES, S.; HOOK, R. World War I gas warfare tactics and equipment. Colchester: Osprey, 2007.

     

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Uma mão lava outra com sabão no combate ao COVID-19.

    Na nossa pele, a sujeira, que pode conter vírus, como o COVID-19, fica rodeada por uma camada de gordura. Lavar as mãos apenas com água não é eficaz para remover a gordura das mãos ou destruir o COVID-19, isto é, usar apenas água não é uma forma adequada de limpar as mãos. Precisamos usar o sabão/sabonete para lavar as mãos.

    Daí fica a importância do uso de uma invenção bem antiga, o sabão. 

    Mas afinal, o que é o sabão?

    O sabão pode ser classificado como um sal de um ácido carboxílico de cadeia carbônica longa: um composto orgânico com vários átomos de carbono e hidrogênio na sua estrutura, como o estearato de sódio

    O efeito disso é que a cadeia longa de carbono no sabão forma uma cauda que não se mistura com a água, uma cauda hidrofóbica,  enquanto a “cabeça” , no exemplo com o carboxilato (perceba a carga negativa), é hidrofílica, é capaz de ser solvatada, ou dissolvida pela água. 

    Em água, cada uma das moléculas que compõem o sabão não fica isolada. Elas se juntam e formam um aglomerado esférico em que a parte carregada negativamente fica voltada para a superfície. Esse aglomerado organizado é chamado de micela.

    Como o sabão age?

    Quando lavamos as nossas mãos com sabão/sabonete líquido/sabonete e água, estamos expondo as nossas mãos e as sujeiras presentes nela a essas micelas, que se re-organizam e interagem tanto com a água quanto com a gordura. 

    O coronavírus têm um estrutura protetora ao seu redor formado basicamente por lipídios (“gordura”) e proteínas. O sabão é eficaz contra o coronavírus, pois é capaz de interagir com a gordura presente na membrana (ou envelope). O sabão separa os componentes individuais presentes na estrutura que recobre o vírus, destruindo essa estrutura e, consequentemente, destruindo o vírus. 

    As partículas de sabão se organizam de novo, e toda a sujeira grudada na gordura e os pedacinhos do que foi o vírus vão para dentro dmidascelas, que acabam sendo levadas pela água quando você enxagua a mão. 

    O sabonete e os detergente sintéticos também são capazes de destruir o coronavírus. Todos eles têm a longa cadeia formada de carbono e hidrogênio (também chamada de alquílicas), que se esconde da água, e outra extremidade que “gosta” da água.  

    A diferença do detergente sintético em relação ao sabão preparado a partir de gorduras e óleos vegetais, é que no lugar do grupo carboxilato, os detergentes sintéticos contém grupos formados por sulfonatos de sódio e sulfato de sódio, todos hidrofílicos.

    Referências

    Burrows, A. et al. Química: Introdução à Química Inorgânica, Orgânica e Físico-Química. Volume 3. Rio de Janeiro: LTC. 2013

    Solomons, TWG; Fryhle, C.B. Química Orgânica. 10 Edição. Rio de Janeiro: LTC. 2013.

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Coronavírus: conhecendo o vilão COVID-19 e combatendo a infecção

    O que é o vírus, como ocorre a sua disseminação e por quê devemos mudar nossos hábitos para combatê-lo

     

    Tempo de leitura: 3 min

     

    O que é um vírus?

    O vírus é formado por uma cápsula de proteínas contendo material genético e que é capaz de se multiplicar dentro das células de organismos. As partículas virais infecciosas são montadas em uma célula hospedeira, geralmente são partículas metaestáveis e robustas o suficiente para proteger o genoma viral fora da célula1. Para explicar melhor, o Blogs de Ciência da Unicamp fez um vídeo explicativo e didático explicando o que é um vírus e como ele se propaga.

    Fonte: Conteúdo científico e roteiro – Luisa Fernanda Rios Pinto; Narrativa-Paula Penedo; Arte e animação- Carolina Frandsen; Produção-Equipe Blogs de Ciência da Unicamp.

    Mas o que é o COVID-19?

    O COVID-19, ou Sars-Cov-2, é uma doença infecciosa causada por um vírus recém descoberto e pertencente a família corona. O nome corona vem do fato de que quando os cientistas olham para o vírus pelo microscópio, o vírus parece ter uma “coroa” em volta de si.

    Fonte:Wikimedia Commons

    Existem vários tipos de coronavírus em humanos e animais, e a razão pela qual o COVID-19 tem ganhado tanta atenção é que este vírus foi detectado em humanos pela primeira vez em dezembro de 2019 e, até o momento (24/03/2020), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS)2 já infectou mais de 370 mil pessoas ao redor do mundo. Sua capacidade de contágio é bastante alta comparada aos vírus anteriormente descritos e a severidade da síndrome respiratória causada (uma forte pneumonia) tem alertado o mundo para o perigo desta pandemia. Os dados ainda são bastante insipientes e a cada dia novas informações são descobertas a respeito dessa doença. 

    Nos Estados Unidos, a porcentagem das pessoas infectadas que desenvolvem os sintomas mais severos, necessitando tratamento intensivo (UTI), varia entre a faixa etária, sendo em média 10,5%3 e até 30,1%4 para pacientes entre 75-84 anos, segundo estudos estatísticos. Além disso, devido ao rápido contágio e a limitação dos sistemas de saúde, se sabe que a taxa de mortalidade pelo COVID-19 depende do país, mas está em torno de 0,36-8%, com uma baixa taxa reportada na Alemanha e a maior na Itália5

    É importante ressaltar aqui que ainda não há vacina ou remédio que sejam eficazes contra o COVID-19. Muitos laboratórios ao redor do mundo estão correndo contra o tempo para desenvolver um tratamento, mas as melhores estimativas são de que não teremos uma solução acessível à população pelo menos até o final de 2020.

    O Brasil

    No dia 23 de março, o Brasil contava com 1891 casos diagnosticados da doença e 34 mortes6. O crescimento é alarmante, sabendo que no dia 15 de março se reportavam 162 casos positivos para o COVID-19. Isso significa que em oito días (de 15 a 23 de março), os casos aumentaram mais de 11 vezes. Isso nos dá um bom indicativo de como a doença se espalha rapidamente, o que pode levar ao esgotamento dos leitos disponíveis em hospitais para o tratamento dos doentes. 

    O Brasil conta com uma população de cerca de 210 milhões de habitantes. Se imaginarmos que somente 50% da população terá contato com o vírus, e que 50% dessa pessoas desenvolvem sintomas, o número de pessoas sintomáticas no Brasil pode chegar a 50 milhões de pessoas. Desses 50 milhões, estima-se que 5% precisaria de tratamento hospitalar7. Imagine agora se todas essas pessoas ficarem doentes ao mesmo tempo. Seria humanamente impossível tratar todos os doentes, ademais somando-se os pacientes com outras doenças e acidentes. Repare que todos esses números são baseados nos dados que temos disponíveis de outros países, e que ao final dessa crise, esse cenário poderá ter sido melhor, ou ainda pior. 

    Diante desse cenário, podemos ver a importância de diminuir a disseminação do vírus, para que assim não tenhamos um sistema de saúde sufocado e sem a capacidade de tratar todas as pessoas doentes. 

    Qual o melhor combate ao coronavírus? 

     

    Higiene

    Criar hábitos de limpeza é muito importante nessa jornada. O melhor que podemos fazer para ajudar a sociedade é nos isolar em casa. Mas as vezes precisamos sair para ir ao mercado ou algum lugar que seja urgente. Para isto precisamos ter uma rotina de limpeza para entrar em casa e recomendamos alguns passos:

    1. Coloque as chaves perto da porta e não pegue-as se não for sair; se puder, limpe.

    2. Assim que chegar em casa, tire os sapatos e a roupa e deixe do lado de fora, depois lave a roupa com água e sabão. 

    3. Ao entrar em casa, não toque em nada antes de se higienizar.

    4. De preferência tome banho, se não puder, lave bem todas as áreas expostas com água e sabão. 

    5. Limpe o celular com um lenço e um pouco de álcool 70%, se não tiver álcool pode passar um paninho com água (não precisa ser muita) e um pouco de sabão e depois retirar o excesso com um lenço úmido (quase seco).

    6. Se tiver óculos, lave os óculos com água e sabão. 

    7. Quando estiver em casa, lave as mãos frequentemente com água e sabão durante 20 segundos.

    8. Não precisa ficar de máscara na casa se não estiver doente ou positivo com coronavírus. 

    9. Tente fazer o máximo de compras online. Se pedir alguma coisa pelo delivery, evite falar com a pessoa, pegue a caixa, limpe com álcool e entre em casa; evite contato, use cartão para pagar a conta. 

    10. Evite passar as mãos na boca ou nariz.

    11. Evite o pânico.

     

    Se possível #fiqueemcasa, mas se precisa sair para algum lugar, evite o uso de transporte público, evite aglomerações e evite tocar em superfícies. Lembre-se: sempre que puder, lave as mãos e siga a rotina acima da limpeza no retorno a casa.

     

    Isolamento

    Neste momento é melhor ficar em casa e evitar circular pelas ruas. O isolamento serve para combater ou impedir o espalhamento do vírus. Serve para que a doença não seja transmitida para as demais pessoas e com o isolamento, evitamos a propagação massiva da COVID-19 a superlotação de hospitais por pessoas infectadas e que o sistema de saúde entre em colapso. É importante manter o distanciamento social. Muitos países decretaram quarentena (isolamento físico e temporário de pessoas) para evitar o contágio, e é recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). 

     

    Para saber mais:

    https://www.blogs.unicamp.br/covid-19/os-isolamentos-sao-importante-sim-senhor-e-nao-e-de-hoje-essa-pratica/

     Depende de todos para que este vírus não se espalhe pelo país e o isolamento é uma maneira de cuidarmos e cuidar dos nossos familiares. 

     

    #ficaemcasa #coronavírus

     

    Referências

     

    [1] Mateu MG. The Structural Basis of Virus Function. Structure and Physics of Viruses. Acesso:https://link.springer.com/chapter/10.1007/978-94-007-6552-8_1

    [2]https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019

    [3]https://www.statista.com/chart/21173/hospitalization-icu-admission-and-fatality-rates-for-reported-coronavirus-cases/

    [4]https://www.cdc.gov/mmwr/volumes/69/wr/mm6912e2.htm

    [5]https://brasil.elpais.com/brasil/2020/03/20/ciencia/1584729408_422864.html

    [6]https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:folha-informativa-novo-coronavirus-2019-ncov&Itemid=875

    [7]https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/03/18/protocolo-elaborado-pelo-incor-vai-orientar-o-tratamento-dos-casos-graves-de-coronavirus-em-sp.ghtml

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Como divulgar informações de prevenção do Covid-19 se a língua de seu país não é a sua?

    Partindo do ideal de que a divulgação científica, principalmente neste momento da pandemia do Covid-19, deve chegar a TODOS, responda com sinceridade, divulgador científico:

    Seu material foi pensado para TODOS os brasileiros?

    Pensando nessa questão, a Profa. Dra. Taciana de Carvalho Coutinho da UFAM – Universidade Federal do Amazonas, em Benjamin Constant no Norte do país, se propôs a desenvolver junto de seus alunos, materiais de divulgação científica sobre a Covid-19 para as comunidades indígenas da região.

    “Todos os meus alunos de iniciação científica são indígenas… A universidade possui mais de 50% de alunos indígenas de 8 etnias presentes” comenta Taciana.

    De acordo com o censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no território nacional existem 274 línguas indígenas, e dos 130 mil indígenas apenas 6 mil falam o português, além da língua mãe, desses 46 mil indivíduos falam a língua Ticuna, do Amazonas. 

    A região de fronteira do Alto Solimões encontra-se em posição estratégica no país, na tríplice fronteira Brasil – Colômbia – Peru, e é a porta de entrada circulação de pessoas e produtos provindos do pacífico, de países da América do Sul, Central e do Norte. São três as principais cidades da fronteira no Amazonas, banhadas pelos rios Solimões e Javari: Atalaia do Norte, Benjamin Constant e Tabatinga, sendo esta última cidade gêmea de Letícia na Colômbia, em uma fronteira física quase inexistente. Quase, pois hoje encontra-se fechada por conta do Covid-19. Tabatinga também faz fronteira com Santa Rosa, no Peru e Benjamin Constant com Islândia, também Peru. A população das três cidades juntas ultrapassa os 100 mil habitantes e, contando com as cidades em conexão, esse número pode chegar à 300 mil habitantes.

    Hoje, Taciana cedeu um pouco do seu tempo de quarentena para nos contar mais sobre esse trabalho, confira abaixo a entrevista:

    A Profa. Dra. Taciana de Carvalho Coutinho é doutora em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande e leciona há 11 anos no Instituto de Natureza e Cultura da UFAM de Benjamin Constant

    Érica Mariosa: Profa. como surgiu a ideia de preparar esse material de divulgação científica na língua mãe dos seus alunos?

    Taciana de Carvalho Coutinho: A ideia surgiu a partir da carta que fizemos como agradecimento pelos produtos de agricultura, caça e pesca que nos disponibilizam e da conscientização da importância deles ficarem nas comunidades nesse momento. 

    Nós temos em sala de aula muitos alunos indígenas, de 8 etnias diferentes, e era importante pensar em como fazer um trabalho de alerta  para que esses alunos e outros indígenas não saiam de suas comunidades, uma vez que eles vem até a cidade para vender a sua produção de alimentos. 

    Optamos por disponibilizar materiais na língua Ticuna, traduzido pelos próprios alunos e distribuído pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e a Fundação Nacional do Índio – FUNAI, além de uma campanha muito forte para que os – não indígenas – não entrem nas comunidades, devido a vulnerabilidade de saúde e dificuldade de acesso atendimento hospitalar.

    Para se ter uma ideia, ao lado de Tabatinga (cidade próxima a Benjamin Constant) existem mais de 7 mil indígenas, imagina se o vírus chega até eles! Seria catastrófico, a região não tem condições hospitalares, não existe, inclusive uma articulação política para esses atendimentos.

    Muitos deles vivem da caça, da pesca e da agricultura que são vendidos na cidade, assim ficam vulneráveis. A ideia era conscientizá-los que fiquem em suas comunidades. 

    EM: Quais os desafios e a realidade de estar em uma sala de aula com alunos que não possuem o português como língua mãe?

    TCC: Trabalhar com essa diversidade sociocultural é bem complexo, somos preparados na vida acadêmica a lidar com ciência pura e aplicada, uma vez que sou bióloga, com mestrado em genética e doutorado em recursos naturais, e a princípio, ao chegar em sala de aula, há insistência em algo mecânico. É preciso abrir a cabeça e perceber que nessa região às coisas são diferentes.

    Não é possível cobrar do meu aluno um português exemplar, uma vez que ele foi alfabetizado na língua de origem. Tenho alunos Ticunas que falam sua língua de origem muito bem mas pouco escrevem, tenho alunos que leem e escrevem muito bem o português mas não escrevem em ticuna ou já até perderam a fala de origem, além das outras etnias indígenas presentes na região. 

    Vem daí a dificuldade de produzir esse mesmo material em outras línguas.

    Tendo todos os alunos indígenas me fez pensar em como, eu como profissional, poderia ajudar a buscarem e perceberem que eles são protagonistas da sua realidade. 

    Normalmente, eles são muito pesquisados, mas eles também são pesquisadores, vão a suas comunidades e estudam sobre sua cultura, sua diversidade, seu artesanato, suas lideranças, sua identidade. É importante mostrar que eles podem dentro da universidade pesquisarem sobre sua própria comunidade. E isso foi importante para essa aproximação das necessidades dessa região.

    EM: Como foi preparado o material?

    TCC: Se você observar, as frases foram pensadas para serem simples mas possuem sua simbologia. As crianças e os idosos representam a nova geração e a geração que detém o conhecimento tradicional. Isso é muito importante.

    Na imagem está o Sr. Pedro Inácio que foi um grande líder do povo Ticuna, foi o homem que lutou pela organização social da comunidade, então ele possui uma forte representatividade para o povo.

    Não só as frases, mas as imagens também não foram escolhidas ao acaso, essas imagens fazem parte do cotidiano deles, a ideia é também trabalhar com essa sensibilização.

     

    A imagem do casal de idosos abraçados foi escolhido por ser o casal mais velho a se casar na região, apesar de já viverem como casal a muitos anos, eles optaram por oficializar a união em um casamento coletivo, se destacando por serem o casal mais velho a se casar. Então, seu simbolismo está no respeito aos nossos idosos.

    Fiquem nas comunidades.

     O material foi produzido pelos alunos:

    • Sandrinha Inácio Clemente – Comunidade Indígena Novo Porto Lima
    • Monique Inácio Clemente – Comunidade Indígena Novo Porto Lima
    • Nilson Fernandes Agostinho – Comunidade Filadélfia üütchigüne.
    • Isanildo Moçambite de Souza – Comunidade Bom Caminho
    • Edney Firmino Santos – Comunidade Vila Independente de SPO

    Com a orientação da Profa Dra Taciana de Carvalho Coutinho e ajuda na tradução Edivania Luciano Fidélis – Comunidade de Filadélfia BC/AM

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Como nos infectamos e transmitimos os coronavírus?

    Primeiro é preciso colocar que as informações que serão colocadas aqui estão baseadas nos sites da Organização Mundial da Saúde e Ministério da Saúde.

    A COVID -19, doença causada pelo novo coronavírus, é uma doença nova. Dia-a-dia estamos aprendendo mais sobre ela em função das observações feitas por profissionais das áreas da Saúde e pelos pesquisadores de diferentes áreas, em todo o mundo. Assim, novas informações podem surgir a cada dia.  

    Simples assim? Sim.

    Nos infectamos com os coronavírus quando levamos as mãos ao rosto e tocamos as mucosas da boca, do nariz e dos olhos. Ou quando permitimos que nossos rostos toquem em rostos de pessoas infectadas. Ou quando levamos celulares contaminados ao rosto.  Se estamos em isolamento social e não beijamos ninguém, apenas as mãos e os celulares são responsáveis pelo transporte dos coronavírus para nos infectar. 

    E quando nossas mãos fazem esse transporte, inclusive para os celulares?

    Quando tocamos em superfícies onde estão pequenas gotículas de água contendo vírus.  Essas gotículas são liberadas quando pessoas infectadas falam, tossem, espirram e pelas suas secreções nasais. Quando liberadas as gotículas tendem a cair, por incrível que pareça, em função dos seus tamanhos. E vão se depositar nas superfícies dos mais diferentes tipos de tecidos que estão na sua frente.

    Então, dependendo do tipo de material, vão ficar ali por horas ou dias e a viabilidade dos coronavírus pode ser mantida. Por isso, tocou em qualquer superfície não leve sua mão ao rosto!! Use o álcool em gel se estiver em ambiente aberto.  Se estiver em casa ou no seu trabalho vá até a pia e lave suas mãos com água e sabão por 20-40 segundos. Esses dois processos, se realizados de forma correta, eliminam os coronavírus das suas mãos. E ainda, se você usa óculos, lave-os todas as vezes que lavar as mãos. Desinfete seu celular com álcool 70 o GL, sempre que o colocar sobre superfícies que também não estavam desinfectadas.

    Uma pessoa infectada pode também tossir na própria mão, manter contato com as mãos com as secreções da boca e nariz. Logo, sua mão também poderá transmitir os coronavírus. Portanto, não aceite cumprimentos de ninguém por meio de mãos.  

    Quando as pessoas podem transmitir os coronavírus?

    Obviamente, a primeira condição para que uma pessoa transmita coronavírus é estar infectada por eles. Nas primeiras 24 horas após a infecção já podemos transmitir esses vírus. Ao entrar nas nossas células das mucosas da boca, nariz e olhos, os vírus encontram células nas quais conseguem se aderir e serão ali introduzidos. No interior dessas células serão multiplicados, ou seja, formarão milhares de novos vírus que serão eliminados delas para infectarem outras células, até atingirem as células do pulmão. A extensão da infecção definirá a gravidade da doença. 

    O intervalo entre a infecção e o aparecimento dos sinais e sintomas pode variar de 1 a 14 dias, sendo mais comum ao redor de 5 dias após a contaminação. Os principais sintomas são: nariz escorrendo, dor de garganta, tosse, febre e dificuldade de respirar, terminando com uma pneumonia. Esses sintomas aparecem de forma gradual. O principal alerta é a febre. Ela é o alerta para uma atenção redobrada, que seria o isolamento da pessoa de outros contatos em casa, além do uso de máscaras ao ter contato com essa pessoa. No caso de febre persistente e o aparecimento de tosse e dificuldade respiratória é a hora de procurar o sistema de saúde de sua cidade. 

    Importante colocar que entre 60 a 80% das pessoas que se infectam com os coronavírus podem não apresentar nenhum dos sintomas acima indicados. Mas elas transmitem os coronavírus!!! Outros infectados, apresentam sintomas leves e não necessitarão recorrer ao sistema de saúde. 

    Assim, observe essas informações e cuidado se você pode transmitir os coronavírus: fique em isolamento, tenha separado para seu uso exclusivo itens do dia-a-dia como talheres, roupas de uso pessoal, toalhas de banho e rosto etc.  Descarte em sacos plásticos tudo com que você tenha mantido contato para poder ser lavado ou desinfetado. Essa é uma forma de mostrar seu amor pelos seus e pela humanidade.

    Para saber mais:

    Organização Mundial da Saúde

    Ministério da Saúde

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Química do coronavírus – Parte III

    Pesquisa e desenvolvimento de agentes químicos para o coronavírus

    Indo direto ao ponto, não existem fármacos para o tratamento de pacientes com COVID-19. O fato é que nesse momento não tem no mercado nenhum fármaco ou vacina direcionado para conter a ação do coronavírus (SARS-CoV-2)Uma variedade de medicamentos aprovados para outras indicações, bem como vários medicamentos em investigação, estão sendo estudados em várias centenas de ensaios clínicos em andamento em todo o mundo.

    Reposicionamento de fármacos

    Dado o longo processo de desenvolvimento de novos medicamentos, a estratégia de reaproveitamento de medicamentos tornou-se uma das soluções escolhidas para o tratamento imediato de indivíduos infectados com SARS-CoV-2.

    O reposicionamento ou reaproveitamento de medicamentos é uma abordagem para acelerar o processo de descoberta de medicamentos através da identificação de um novo uso clínico de um medicamento existente aprovado para uma indicação diferente. Nesse contexto, dentre algumas fármacos já conhecido que são candidatos a tratar o COVID-2019  tem-se o arbidol, cloroquinona, lopinavir, remdesivir, etc .[1]  

    Pesquisadores na França publicaram um estudo em que trataram 20 pacientes com COVID-19 com hidroxicloroquina. [2] Eles concluíram que o medicamento mostrava ação antiviral positiva, no entanto, não foi um estudo controlado randomizado e não relatou resultados clínicos, como óbitos. Em orientação publicada na sexta-feira, a Sociedade Americana de Medicina Intensiva disse que “não há evidências suficientes para emitir uma recomendação sobre o uso de cloroquina ou hidroxicloroquina em adultos gravemente enfermos com COVID-19”. [3] Diante das evidências controversas, ainda há muito caminho pela frente quanto ao uso satisfatório de cloroquina no tratamento de pacientes com COVID-2019. Mais informações sobre os ensaios podem ser encontradas em: https://clinicaltrials.gov/  

    A ribavirina é um medicamento antiviral aprovado pelo FDA, que é  usado em combinação com outros medicamentos para o tratamento da infecção crônica pelo vírus da hepatite C e febres hemorrágicas virais. Produzindo uma atividade de amplo espectro contra vários vírus de RNA e DNA, a ribavirina é um nucleosídeo sintético de guanosina que interfere na síntese de mRNA viral. Atualmente, estudos recentes sugerem que a ribavirina em combinação com interferon ou lopinavi/ritonavir  poderia ser eficaz para tratar a infecção por COVID-19. [1]

    Atualmente, pelo menos nove ensaios clínicos sobre lopinavir/ritonavir estão em andamento na China. O resultado inicial sugeriu que o lopinavir e o ritonavir mostram atividade estimulante antiCOVID-19 in vivo, mas com efeitos colaterais intestinais.[4] No entanto, estudo em pacientes adultos hospitalizados com Covid-19 em seu estágio grave não demonstrou nenhum benefício significativo. [5] Adicionalmente, Uma dose fixa da combinação anti-HIV, lopinavir-ritonavir, está atualmente em ensaios clínicos com Arbidol ou ribavirina. [1]

    O medicamento antiviral de amplo espectro Arbidol, que funciona como um inibidor da fusão de células hospedeiras de vírus, entrou em um ensaio clínico para tratamento de SARS-CoV-2. O arbidol é capaz de impedir a entrada viral nas células hospedeiras contra o vírus influenza. [1] Será que o arbidol vai funcionar para o tratamento da COVID-2019?

    Desenvolvimento de vacina

    É crucial o desenvolvimento de vacinas seguras e eficazes para controlar a pandemia de COVID-19, eliminar sua propagação e, finalmente, impedir sua recorrência futura. Como o vírus SARS-CoV-2 compartilha homologia de sequência significativa com outros dois coronavírus letais, SARS e MERS (Para entender um pouco mais sobre SARS e MERS, visite nosso primeiro post dessa série: Química do coronavírus – parte I), as vacinas identificadas nessas patentes relacionadas aos vírus SARS e MERS poderiam facilitar o projeto de vacinas anti-SARS-CoV-2. [1]

    A primeira dose da vacina contra o coronavírus denominada mRNA-1273, [1] desenvolvida pelos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA (NIH) e pela equipe de pesquisa de doenças infecciosas da Moderna, foi administrada ao primeiro participante do estudo de Fase 1 em 16 de março. A vacina de mRNA se baseia em moléculas sintéticas de RNA mensageiro (mRNA) – que contêm as instruções para produção de alguma proteína reconhecível pelo sistema imunológico. A ideia é que a defesa do organismo reconheça essas proteínas artificiais como um corpo estranho, levando o corpo a combatê-lo. Se der certo,  na presença do coronavírus, a célula terá desenvolvido a habilidade de identificar e combater o vírus real.

    Á luz do exposto, nota-se um esforço conjunto para desenvolver medicamentos e vacinas eficazes contra infecções de coronavírus existentes e potenciais e outros surtos de vírus altamente patogênicos é necessário para reduzir os impactos na vida humana e nos sistemas de saúde em todo o mundo. Dado o processo oneroso e árduo envolvido no desenvolvimento clínico de medicamentos, o surto de COVID-19 destaca o valor do desenvolvimento de medicamentos antivirais de amplo espectro e a importância de aplicar abordagens inovadoras, como inteligência artificial, para facilitar a descoberta de medicamentos.  

    Nesse momento, somos todos responsáveis pelo avanço da infecção do coronavírus.

    Fiquem em casa e evitem a transmissão do vírus!

    Mapa de coronavírus

    A pandemia de coronavírus afetou mais de 329.000 pessoas, segundo dados oficiais. Na manhã de segunda-feira, pelo menos 14.522 pessoas morreram e o vírus foi detectado em pelo menos 161 países, como mostram esses mapas. Para rastreamento do surto global em tempo real, click AQUI.

    Referência bibliográfica

    1. Liu, Cynthia, Qiongqiong Zhou, Yingzhu Li, Linda V. Garner, Steve P. Watkins, Linda J. Carter, Jeffrey Smoot, et al. “Research and Development on Therapeutic Agents and Vaccines for COVID-19 and Related Human Coronavirus Diseases.” ACS Central Science, March 12, 2020, acscentsci.0c00272. https://doi.org/10.1021/acscentsci.0c00272.

    2. Gautret P, Lagier J, Parola P, Hoang V, Meddeb L, Mailhe M, et al. Hydroxychloroquine and azithromycin as a treatment of COVID-19: results of an open-label non-randomized clinical trial. International Journal of Antimicrobial Agents. In Press. http://www.mediterranee-infection.com/wp-content/uploads/2020/03/Hydroxychloroquine_final_DOI_IJAA.pdf

    3. Kupferschmidt, Kai. “WHO Launches Global Megatrial of the Four Most Promising Coronavirus Treatments.” Science, March 22, 2020. https://doi.org/10.1126/science.abb8497

    4. Liu, Wei, Hai-Liang Zhu, and Yongtao Duan. “Effective Chemicals against Novel Coronavirus (COVID-19) in China.” Current Topics in Medicinal Chemistry, March 5, 2020. https://doi.org/10.2174/1568026620999200305145032.

    5. Cao, Bin, Yeming Wang, Danning Wen, Wen Liu, Jingli Wang, Guohui Fan, Lianguo Ruan, et al. “A Trial of Lopinavir–Ritonavir in Adults Hospitalized with Severe Covid-19.” New England Journal of Medicine, March 18, 2020, NEJMoa2001282. https://doi.org/10.1056/NEJMoa2001282.

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

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