Tag: Economia Brasileira

  • Bolsonaro, a Petrobras e a luta de classes

    Texto por Vítor Lopes de Souza Alves.

    Na última sexta-feira, 19, o presidente Jair Bolsonaro manifestou a sua intenção de realizar uma troca no comando da Petrobras, substituindo o atual presidente da estatal Roberto Castello Branco pelo general Joaquim Silva e Luna. Em decorrência disso, as ações da empresa negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (a Bovespa, atualmente denominada B3) despencaram, fechando os pregões de sexta (19) e segunda (22) com quedas de cerca de 8% e 20%, respectivamente, o que totalizou uma perda de valor de mercado da empresa de pouco mais de 100 bilhões de reais.[1]

    A explicação para o ocorrido reside na disputa social em torno da definição da política de preços dos combustíveis praticada pela empresa. Em 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff e a subida ao poder de Michel Temer, a Petrobras deixou de cobrar pelos combustíveis um preço compatível com os seus custos de produção domésticos e passou a tomar como referência de precificação o preço internacional do barril de petróleo. Como o custo para produzir petróleo no Brasil é bastante inferior ao custo médio do mundo, essa mudança impôs aos consumidores brasileiros um aumento dos preços pagos pela gasolina e pelo diesel. Além disso, passou-se a verificar uma maior volatilidade desses preços, uma vez que os reajustes passaram a ser mais frequentes a fim de acompanhar as variações dos preços internacionais. Por um lado, os preços maiores e mais voláteis representaram um prejuízo à sociedade brasileira como um todo, tanto aos motoristas em geral, que precisam abastecer os seus veículos, como aos caminhoneiros em particular, para quem o diesel representa a maior parte do custo dos fretes. Por outro lado, eles significaram uma vantagem para o mercado financeiro, pois elevaram a lucratividade da empresa, permitindo que ela distribuísse mais dividendos aos seus acionistas – a esse respeito, deve-se ter em conta que a Petrobras também possui ações listadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE, na sigla em inglês) e que uma parcela relevante dos seus acionistas é formada por estrangeiros.

    Dando continuidade ao viés liberal, entreguista e pró-mercado de Temer, o governo Bolsonaro tem mantido, desde o seu início, essa mesma política de preços. No entanto, tal como a greve dos caminhoneiros de 2018, ainda no governo Temer, que culminou com a demissão do então presidente da Petrobras Pedro Parente, novas ameaças de paralisação por parte da categoria pressionam hoje Bolsonaro a intervir na empresa, alterando o seu comando. Ainda que não seja certo que tal intervenção resultará em redução e controle dos preços dos combustíveis, pois o governo analisa outras alternativas para atender às reivindicações dos caminhoneiros[2], o mercado financeiro já avaliou a possibilidade da adoção dessa política e já precificou os seus efeitos. Imaginando que os preços da gasolina e do diesel voltarão a ficar abaixo do nível determinado pelo livre-mercado – isto é, o mercado internacional de petróleo –, os acionistas da Petrobras já previram receber menos dividendos no futuro, venderam as suas participações na empresa e provocaram o colapso do seu valor de mercado. Esse fato constitui um claro sinal de que a mobilização da classe trabalhadora ainda é capaz de produzir resultados efetivos. A simples ameaça de uma greve, que sequer chegou a se concretizar, forçou o atual governo a sinalizar que atuará – o que ainda não é certo – de forma intervencionista, nacionalista e pró-sociedade e provocou um enorme alvoroço na Bovespa. Bolsonaro, temendo que uma nova paralisação nacional possa trazer dificuldades ao seu governo e inviabilizar a sua reeleição, está sendo coagido a atuar à maneira como Dilma atuava, a abandonar um tópico importante da sua agenda liberal e a fazer com que a Petrobras volte a atender aos interesses do povo brasileiro e não mais aos de uma minoria detentora de títulos financeiros.

    A grande mídia brasileira, que mantém uma relação íntima com a burguesia financeira do país, fez críticas severas à atitude do presidente. Os exemplos a seguir ajudam a ilustrar o tom da reação midiática. Uma matéria da BBC News Brasil argumentou que a intervenção de Bolsonaro na Petrobras gerará aumento da inflação.[3] Isso é falso. O petróleo constitui um insumo para quase todas as mercadorias, que precisam ser transportadas para chegarem aos seus consumidores finais. Assim, uma queda dos preços do diesel e da gasolina deve contribuir para reduzir, e não para elevar, os preços de todos os bens e serviços. A revista Isto É deu destaque à declaração do senador Otto Alencar, do PSD da Bahia, de que a desvalorização da Petrobras equivale a duas vezes o valor do auxílio emergencial a ser pago pelo governo no ano de 2021, dando a entender que ela prejudicaria as camadas mais pobres da população.[4] Trata-se, novamente, de um raciocínio equivocado e enganoso. Assim como nenhum cidadão espera o preço da sua geladeira subir para vendê-la e com isso pagar o seu almoço, o Tesouro Nacional não financia os seus gastos a partir da valorização patrimonial do governo. Por fim, na Globonews, Marcelo Mesquita, integrante do Conselho de Administração da Petrobras (um dos 3 conselheiros, num total de 11, que são indicados por e representam os acionistas), defendeu a privatização completa da empresa e disse que Bolsonaro é tão comunista quanto o PT.[5] Na mesma linha da fala de Mesquita, Demétrio Magnoli, um dos comentaristas do canal, chamou Bolsonaro de ditador e o comparou a Hugo Chávez, lembrando que este, quando governou a Venezuela, também interveio na estatal petroleira de seu país. Deve-se reconhecer que Mesquita e Magnoli têm razão quanto ao caráter da intervenção de Bolsonaro, que tem, tal como no caso venezuelano, um viés popular. Muito estranha, no entanto, que o presidente brasileiro seja assim tachado por essa atitude, ao passo que, quando participa de manifestações por um novo AI-5 e pelo fechamento do Congresso e do STF, é tratado de forma muito menos hostil pelos veículos de imprensa.

    O que os episódios recentes evidenciam é uma vitória da classe trabalhadora brasileira, a qual só foi possível porque as relações de poder ainda se dão, no Brasil, sob um regime democrático. Numa ditadura, haveria um espaço muito menor para a luta de classes entre trabalhadores e burgueses, e qualquer ameaça de greve de caminhoneiros poderia ser facilmente reprimida com porretes, gás lacrimogênio, prisões ilegais e tortura. Como Bolsonaro, embora o deseje, não dispõe desses meios autoritários para o exercício do poder, só lhe restou, nesse caso específico, a alternativa de recuar ante as pressões dos trabalhadores e de contrariar os interesses da burguesia. Sob esse ponto de vista, sua intervenção na Petrobras é muito bem-vinda e deve ser comemorada. Em virtude dela, a estatal não perdeu capacidade técnica de produzir 1 mililitro de combustível, os ricos ficaram 100 bilhões de reais mais pobres, e os pobres – espera-se – poderão comprar combustíveis e mercadorias em geral por preços menores. Em outras palavras, o anúncio da alteração na chefia da Petrobras, ao provocar uma expectativa de redistribuição dos rendimentos gerados pela empresa, resultou numa enorme queima do seu capital fictício, sem destruição alguma do seu capital real. Em suma, a contradição trabalho x capital explicitou-se sob a forma do conflito entre caminhoneiros e acionistas pela política de preços da Petrobras, implicando um forte abalo para o governo.

    [1] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/02/petrobras-perde-r-1025-bi-em-valor-de-mercado-apos-intervencao-de-bolsonaro.shtml.

    [2] https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/02/governo-estuda-bolsa-caminhoneiro-contra-alta-do-diesel-sem-interferir-na-petrobras.shtml.

    [3] https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56161636.

    [4] https://istoe.com.br/intervencao-na-petrobras-em-dois-dias-o-governo-perdeu-duas-vezes-o-valor-do-auxilio-emergencial-diz-senador/.

    [5] https://g1.globo.com/globonews/globonews-em-pauta/video/marcelo-mesquita-conselheiro-da-petrobras-fala-sobre-a-troca-de-comando-na-estatal-9291870.ghtml.

     

     

     

     

    Este texto foi publicado originalmente no blog Sobre Economia.

     

     

  • Impactos da Pandemia de Covid-19 sobre a Economia Brasileira

    Texto escrito por Paulo Ricardo S. Oliveira*

    A chamada “segunda onda” da pandemia de Sars-Cov-2, isto é, a crise econômica do pós-pandemia, tem sido objeto de discussão entre os especialistas. As necessidades de isolamento social impostas pela pandemia certamente tem impactos sobre a economia, e é sabido que os efeitos deletérios na economia podem perdurar para além da dissolução da crise sanitária. Mas em qual proporção a pandemia deve afetar a economia brasileira? Nesta nota, busca-se lançar luz sobre essa questão com bases na avaliação dos dados da atividade econômica no primeiro trimestre e nas projeções para a retração do PIB brasileiro no ano de 2020.

    Antes de analisar os dados, é importante reconhecer que a crise da pandemia não cessa a retomada do crescimento da economia brasileira. A crise da pandemia chega ao Brasil num período de estagnação econômica, que pode ser visto como um desdobramento da crise financeira global e da crise política brasileira, com efeitos mais dramáticos a partir de 2014. Em 2015, por exemplo, o PIB brasileiro encolheu -3,15%. Em 2016, houve nova retração de -2,90%. Desde então, temos observado taxas de crescimento inferiores a 1,5%, nível considerado baixo para as economias emergentes. Por fim, no ano passado, a economia brasileira cresceu apenas 1,08%, e é neste contexto de estagnação que a crise da pandemia nos atinge.[1]

    Impactos da pandemia no 1º Trimestre/ 2020

    De acordo com os dados oficiais, o PIB brasileiro recuou -1,5% no primeiro trimestre de 2020, em relação ao último trimestre de 2019. Sob a ótica da oferta, o PIB industrial recuou -1,4%, serviços -1,6%, enquanto a produção agropecuária apresentou crescimento de 0,6%.  Do lado da demanda, a pandemia afetou significativamente o consumo das famílias, que caiu -2,0% no 1° Trimestre/2020 – maior queda desde 2001. Na contramão, a formação bruta de capital, isto é, a compra das empresas de bens de capital como máquinas e equipamentos, cresceu 3,1%, sobretudo pela baixa base de comparação do 4º Trimestre/2019. Por fim, os gastos do governo cresceram apenas 0,2%, mesmo diante da gravidade da pandemia[2].  

    Os índices de atividade, divulgados para os meses entre janeiro e junho/2020, revelam que, apesar de indicadores positivos na comparação mês a mês desde maio/2020, indústria, comércio e serviços acumulam quedas significativas na comparação entre o 1° Trimestre/2020 e o 1° Trimestre/2019, como mostra a Tabela 1.

    Tabela 1. Índices de atividade econômica na indústria, serviços e comércio – Junho/2020

     IndústriaComércioServiços
    Taxa de variação mensal (ref. Maio/20)8,9%12,6%5,0%
    Taxa de variação mensal (ref. Junho/19)-9,0%-0,9%-12,1%
    Taxa de variação semestral (ref. 1S/19)-10,9%-7,4%-8,3%
    Notas: Comércio – índice de volume de vendas no comércio varejista ampliado | Serviços – índice de volume de serviços | Indústria – índice de produção física industrial.
    Fonte: Elaboração própria com bases nas Pesquisa Mensal de Comércio, Pesquisa Mensal de Serviço e Pesquisa Industrial Mensal do IBGE.

    De forma contra intuitiva, nota-se que a indústria foi o setor mais afetado na comparação trimestral, acumulando queda de -10,9% no 1° Trimestre/2020. Da mesma forma, a despeito das taxas positivas para comparação mês a mês, o comércio encolheu -7,4% e os serviços -8,3% no 1° Trimestre/2020. A Tabela 2 mostra a queda por categoria econômica industrial.

    Tabela 2. Variação da Produção Física Industrial por Categoria Econômica

    Var. 1T/2020 1T/2019Var. Mensal Jun/2020 Jun/2019Var. Mensal Jun/2020 Maio/2020
    Bens de capital-21,2-22,213,1
    Bens intermediários-6,6-5,94,9
    Bens de consumo-16,2-11,615,9
          Bens de consumo duráveis-36,8-35,182,2
          Bens de consumo semiduráveis e não duráveis-10,3-5,66,4
    Fonte: Produção Industrial Mensal – Produção Física/ IBGE.

               

    Nota-se, que o fechamento do semestre, reforça a persistência dos indicadores negativos e revertem os indicadores positivos verificados nas contas nacionais no 1° Trimestre/2020.

    Em relação ao emprego, os dados mais recentes apontam que a taxa de desocupação vem crescendo desde maio/2020, quando estava em 10,5%, e atingiu o ponto máximo do período no final de julho/2020, quando chegou a 13,7%. Também na última semana de julho, o país tinha 5,8 milhões de pessoas afastadas do trabalho devido ao distanciamento social, 8,3 milhões de pessoas em trabalho remoto, 18,7 milhões de pessoas trabalhando menos que o habitual e 29,5 milhões de pessoas com rendimentos menor do que o habitual. Mais preocupante, estima-se que, neste momento, 18,5 milhões de pessoas não procuram emprego por conta da pandemia ou por falta de trabalho na sua localidade e 43,0% dos domicílios nacionais recebem auxílio emergencial.

    Para se ter uma ideia da dimensão da amplitude do auxílio emergencial, o bolsa família, um dos maiores programas de transferência de renda da história recente brasileira, beneficiou 13,5% dos domicílios brasileiros, em 2019 [3].

    Por fim, é possível verificar que os impactos no setor externo da economia brasileira têm sido consideráveis. As exportações caíram -7,7% e as importações -5,21% no 1º Semestre/2020. Apesar das quedas relativamente baixas, o impacto qualitativo da crise sobre a pauta de exportação merece destaque. Como esperado, dada a elasticidade renda das exportações e importações[4], isto é, como a demanda internacional de cada bem responde a movimentos na renda internacional, a queda foi maior para produtos mais complexos e menor para produtos menos complexos. Produtos mais complexos são produzidos em países mais avançados tecnologicamente, demandam mais conhecimentos para serem manufaturados e possuem maior valor agregado. A Tabela 3 mostra a variação das exportações e importações por categoria de complexidade para economia brasileira.

    Tabela 3. Variação das Exportações por Categoria de Complexidade – 1° Trimestre/2020

    Grau de ComplexidadeExportações (bilhões USD)% do total exportadoVar. % 2019/2020
    Baixa28,3427,9%-6,5%
    Média-baixa                  45,645,0%7,9%
    Média-alta22,622,3%-25,5%
    Alta46,34,5%-30,6%
     Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Ministério da Economia e do Observatório de Complexidade Econômica.

    Nota-se que as quedas mais acentuadas nas exportações se deram nas categorias de produtos mais complexos, isto é, a pandemia alterou a qualidade da pauta exportadora nacional. A reversão deste impacto qualitativo vai depender da recuperação das economias parceiras e do grau de protecionismo que pode ampliar-se no pós-pandemia. A queda nas importações, no entanto, foi mais equilibrada dentre as principais categorias de complexidade, como mostra a Tabela 4.

    Tabela 4. Variação nas Importações por Categoria de Complexidade – 1º Trimestre/2020

    Grau de ComplexidadeImportações (bilhões USD)% do Total ImportadoVar. % 19/20
    Baixa3,84,8%-24,0%
    Média-baixa                  21,527,1%-5,6%
    Média-alta36,345,7%-2,4%
    Alta17,622,2%-5,0%
     Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Ministério da Economia e do Observatório de Complexidade   Econômica.

    Projeções de Impactos da pandemia em /2020

    Infelizmente, as principais projeções para economia brasileira no 2º semestre de 2020 reforçam a continuidade das quedas verificadas até o momento. A projeção mais recente do Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que a economia brasileira deve encolher -9,1%, em 2020[5]. A mesma instituição também prevê que a economia global sofrerá retração de -4,9% neste ano.  As projeções do Banco Central do Brasil (BCB), no entanto, são mais otimistas, prevendo uma retração anual de -6,4%, ao mesmo tempo que reconhece que o nível de incerteza continua elevado para os próximos trimestres[6].

    Uma das projeções mais robustas sobre os impactos econômicos da pandemia, que utiliza dados da matriz-insumo produto brasileira, foi feito pelo Grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da UFRJ[7]. O estudo prevê três cenários para o comportamento do PIB e os componentes da demanda final, em 2020, como mostra a Tabela 5.

    Tabela 5. Projeções de retração do PIB brasileiro – 2020

    CenáriosVar. PIBConsumo das FamíliasFormação Bruta de CapitalGasto do GovernoExportações
    Otimista-3,1%-1,5%-10,0%2,5%-6,6%
    Referência-6,4%-3,8%-20,0%2,5%-15,7%
    Pessimista-11,0%-8,3%-30,0%2,5%-20,4%
    Fonte: GIC UFRJ

    Em síntese, as diferentes fontes convergem em relação às previsões para economia brasileira em 2020. Mesmo as estimativas do governo já se aproximam do cenário de referência, e a estimativa do Fundo Monetário Internacional do cenário mais pessimista estimado pelos pesquisadores do IE/UFRJ. Neste cenário, até o final de 2020, espera-se que as exportações brasileiras caiam -20,4%, a formação bruta de capital fixo -30% e o consumo das familiais -8,3%.  O aumento de 2,5% nos gastos do governo, foram estimados a partir da previsão dos gastos adicionais com a saúde pública.

     Considerações Finais

    Em suma, os números e projeções do ano corrente indicam que os impactos da crise sobre a economia brasileira serão consideráveis, piores do que os verificados em virtude dos desdobramentos da crise financeira e política de 2014. Certamente, os impactos não afetarão apenas a economia nacional, mas também as demais economias globais. As economias que não lograram o rápido controle da epidemia e continuam alimentando altos níveis de incerteza sobre a capacidade de controle da crise sanitária tendem a sofrer mais intensamente os impactos da “segunda-onda”.

    É preciso ter em mente que essa crise, além do maior impacto sobre PIB brasileiro, tem caráter bastante distinto da crise financeira global de 2008[8]. Por afetar diretamente a capacidade produtiva, a crise da pandemia faz com que as políticas monetárias sejam relativamente ineficazes na retomada da atividade.

    É por isso que policymakers do mundo inteiro têm cada vez mais destacado a importância da política fiscal expansionista (gasto do governo) para a retomada econômica no pós-pandemia. As autoridades econômicas nacionais, no entanto, tendem a perceber a pandemia e seus impactos como um fenômeno temporário, e descartar a possibilidade da ampliação dos investimentos públicos. Essa percepção incorreta da gravidade da crise pode comprometer a recuperação econômica e prolongar o cenário de estagnação da economia brasileira. 

    Do ponto de vista do choque externo e da política comercial e industrial no pós-crise, é provável que os efeitos da queda na renda global e políticas mais protecionistas de comércio afetem as exportações brasileiras de forma significativa. É válido lembrar que, apesar da predominância do consumo interno sobre o produto nacional, a indústria brasileira é altamente dependente da importação de insumos industriais e pode ser afetada pela quebra de algumas cadeias de fornecimento que serão afetadas por possíveis guinadas protecionistas.

    Por outro lado, esse recuo na liberalização comercial pode gerar algum espaço para implementação de políticas industriais e comerciais mais alinhadas com os objetivos de desenvolvimento da indústria nacional. De todo modo, qualquer movimento neste sentido parece improvável diante da atual visão liberalizante das autoridades econômicas nacionais.


    Para saber mais

    [1] Dados do IBGE, Sistema de Contas Nacionais Anuais. Produto Interno Bruto (PIB) a preços básicos, variação real anual.

    [2] Dados do IBGE, Sistema de Contas Nacionais Trimestrais. Dados dessazonalizados, disponíveis em https://sidra.ibge.gov.br/tabela/5932#/n1/all/v/6564/p/201901,201902,201903,201904,202001/c11255/all/d/v6564%201/l/v,p,t+c11255/resultado

    [3] PNAD-Covid/IBGE (2020) Dados da PNAD-COVID/IBGE, disponíveis em  https://covid19.ibge.gov.br/pnad-covid/ .

    [4] Informalmente, elasticidade renda das importações e exportações refere-se a mudança percentual no volume destes dois fluxos após uma variação na renda.

    [5] Dados do World Economic Outlook, Junho/2020 do FMI, disponíveis em https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2020/06/24/WEOUpdateJune2020

    [6] Dado do Relatório de Inflação do Banco Central, Junho/2020 disponível em https://www.bcb.gov.br/content/ri/relatorioinflacao/202006/ri202006p.pdf

    [7] Dados disponíveis em  https://www.ie.ufrj.br/images/IE/grupos/GIC/GIC_IE_NT_ImpactosMacroSetoriaisdaC19noBrasilvfinal22-05-2020.pdf

    [8] Ver análise da Nota do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica, disponível em http://www3.eco.unicamp.br/images/arquivos/nota_cecon_coronacrise_natureza_impactos_e_medidas_de_enfrentamento.pdf

    O autor

    Paulo Ricardo S. Oliveira é Doutor em Desenvolvimento Econômico (IE-UNICAMP), Professor da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) e Economista do Observatório PUC-Campinas.

    Este texto foi publicado originalmente no Blog Sobre Economia

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

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