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  • A “culpa” não é do Nordeste

    O resultado das últimas eleições presidenciais mexeu bastante com os ânimos da população brasileira. Dentre os tantos absurdos ditos e suas consequências danosas, há um em particular que envolve colocar, no Nordeste, a “culpa” pelo ex-presidente não ter sido eleito. Ouvi muita gente bufando de raiva contra essa região do país, e gostaria de tratar neste post, que essa “culpa” ao qual se referem, não é do Nordeste.

    Recentemente estava preparando minhas aulas da disciplina Tratamento de Dados, quando decidi trazer os dados do índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal (IFDM) para as 10 cidades do Rio de Janeiro com melhores índices, as 10 cidades com piores índices, e a cidade em que o instituto onde trabalho está situado.

    O índice FIRJAN analisa o desenvolvimento socioeconômico de cada um dos mais de 5 mil municípios brasileiros, em três áreas: Educação e Saúde, Emprego & Renda, elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), com base em dados oficiais disponibilizados pelos Ministérios da Economia, da Educação e da Saúde.

    Assim, associado a este índice, coloquei também a porcentagem de votos no ex-presidente Jair Messias Bolsonaro no 2.º turno de 2018, e no 2.º turno de 2022, como apresento a seguir.

    Na coluna da direita (B2022 – B2018) apresento a diferença na porcentagem de votos que este candidato recebeu no ano de 2022 em comparação a 2018.

    MunicípioIFDM (2016)Bolsonaro 2018Bolsonaro 2022B2022 – B2018
    Itaperuna0.818073.67%65.26%-8.41%
    Nova Friburgo0.808972.83%59.44%-13.39%
    Piraí0.793161.79%51.59%-10.20%
    Volta Redonda0.792164.13%52.88%-11.25%
    Rio de Janeiro0.788666.35%52.66%-13.69%
    Petrópolis0.782674.20%62.25%-11.95%
    Itaguaí0.781574.97%64.34%-10.63%
    Resende0.778774.28%61.86%-12.42%
    Niterói0.778462.46%48.79%-13.67%
    Carmo0.776653.34%45.37%-7.97%
    Duque de Caxias0.663768.79%58.31%-10.48%
    Varre-Sai0.634666.43%63.46%-2.97%
    Arraial do Cabo0.630074.73%64.12%-10.61%
    Cambuci0.626459.85%49.57%-10.28%
    São Gonçalo0.618967.35%55.42%-11.93%
    Santa Maria Madalena0.618663.34%48.51%-14.83%
    Sumidouro0.617071.94%64.30%-7.64%
    São Francisco de Itabapoana0.615871.10%66.95%-4.15%
    Queimados0.604868.47%58.90%-9.57%
    Belford Roxo0.596368.88%60.20%-8.68%
    Japeri0.581666.48%58.30%-8.18%

    Você mesmo pode ver que em nenhuma destas 21 cidades, tivemos uma porcentagem de votos em 2022 maior do que em 2018.

    Ou seja, de 3 a 15% da população de cada uma destas cidades, que em 2018 votou em Bolsonaro, mudou seu voto após 4 anos.

    Tirando a média aritmética das diferenças destas 21 cidades, temos que em cada cidade, em média 10% da população que em 2018 votou em Bolsonaro, mudou seu voto após 4 anos.

    Observe também que em 2018, Bolsonaro venceu todas estas 21 cidades, já em 2022 ele venceu em 17 destas 21 cidades.

    Isto nos mostra que, em 4 anos no papel presidente do Brasil, este candidato perdeu muitos dos seus eleitores, tanto nas cidades com melhores índices FIRJAN, como naquelas com piores.

    Assim, não é o Nordeste o único “culpado” por hoje termos um presidente diferente, mas a “culpa” também se deve aos eleitores das outras regiões do país, incluindo estas 21 cidades do Rio de Janeiro, que em 4 anos puderam refletir sobre a escolha que realizaram.

    Imagem de capa

    Fonte das informações: TSE
    Infográfico: G1

  • Eleições 2018: por um Brasil mais educado!

    Texto por Cássio Ricardo Fares Riedo

    Estamos em época de eleições e é muito comum ver a preocupação com a Educação nas declarações do Brasil desejado pela população na “divulgação” feita por um dos canais televisivos abertos, que prefiro nem mencionar. Mesmo que tais declarações sejam chatíssimas, suspeito ainda das intenções sobre como tais informações voluntariamente cedidas pela populaçãoserão usadas. Contudo, não é esse o assunto que pretendo tratar neste post. Usei-o apenas para ressaltar a preocupação da população com a Educação. Enfim, parece que todos pedem uma Educação “melhor”, mas o que seria “realmente” uma Educação “melhor”? Nesse sentido, o que seria possível fazer para “melhorar” a Educação? Seja como for, vamos ver o que os candidatos a presidência dizem em seus programas sobre e Educação?

    Livro e lupa

    Como foi feita a identificação das propostas dos partidos nas Eleições 2018

    A fim de não ser intencionalmente partidário, usarei o resultado indicado pela última pesquisa Ibope para as Eleições 2018, divulgada em 26 de setembro, como referência para a apresentação das propostas na área de Educação. Além disso, após a identificação da ordem dos candidatos, usarei apenas as siglas dos partidos para indicar as propostas. Em síntese, os documentos oficialmente produzidos pelos partidos para as eleições não foram utilizados, pois é comum o uso de uma linguagem intencionalmente partidária. Conforme a intenção inicial, foram utilizadas indicações encontradas em sites que apareceram na primeira página do Google, a partir de um busca com as palavras “propostas sobre educação dos candidatos à presidência nas eleições 2018”. Como resultado, os sites melhores posicionados foram: BBC NEWS, DESTAK, NEXO e R7 Notícias.

    Este não é um levantamento preciso e acadêmico, com consultas a bases de dados totalmente confiáveis, mas apenas o que transpareceu na pesquisa pela internet sobre as Eleições 2018. Assim sendo, o objetivo não é chegar a nenhuma conclusão sobre se uma proposta pode ser melhor do que outra. É refletir sobre o que pode ser tomada como uma boa Educação, principalmente a partir do modo como as propostas foram reconhecidas pelos órgãos de notícias.

    Enfim, apresentarei um resumo das propostas sobre a Educação para as Eleições 2018 nos sites indicados na seguinte sequência: Jair Bolsonaro (PSL), Fernando Haddad (PT), Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB), Marina Silva (REDE), (João Amoedo) NOVO, Álvaro Dias (PODEMOS), Henrique Meirelles (PMDB); Guilherme Boulos (PSOL); Cabo Daciolo (PATRIOTA), Vera Lúcia (PSTU), João Goulart Filho (PPL), José Maria Eymael (DC).

    Eleições 2018
    As propostas dos dois partidos que disputam a primeira colocação na intenção de votos (acima de 20%) segundo a pesquisa do Ibope de 26 de setembro para as Eleições 2018

    • PSL: não admitir ideologia de gênero nas escolas; diminuir o percentual de vagas para cotas raciais; ampliar o número de escolas militares e impor a participação das Forças Armadas na diretoria das instituições educacionais; adoção da educação à distância no Ensino Fundamental, Médio e universitário; mudanças no método de ensino (com “mais matemática, ciências e português”); expurgar a ideologia de Paulo Freire; investir em parcerias privadas e colaboração com instituições da Ásia.

    • PT: investir 10% do PIB na educação pública; revogar a emenda do teto de gastos; promover uma Escola com Ciência e Cultura para valorizar a diversidade (em contraponto à Escola Sem Partido); priorizar a reforma do ensino médio; expandir as matrículas nos ensinos técnico, profissional e superior; valorizar e qualificar os professores (com a Prova Nacional para Ingresso na Carreira Docente na rede pública de educação básica); promover a inclusão digital.

    As propostas com chances relativas (intenções de voto entre 5% e 5%) de concorrer ao planalto nas Eleições 2018

    • PDT: revogar a emenda do teto de gastos; expandir o ensino integral com creches e Escolas Profissionalizantes com Ensino Médio integrado ao Ensino Técnico; elevar a média de anos de estudo da população; ampliar a oferta de vagas nas universidades públicas; fortalecer o CNPq e suas instituições de pesquisa (repassar 2% do PIB o gasto para Ciência e Tecnologia); valorizar os professores (com programas de iniciação docente, estágio e mentoria); combater a evasão escolar; definir critérios para a escolha de diretores; manter o ProUni e o Fies, além de programas de bolsa para pós-graduação e a criação de novos convênios com outras instituições ; eliminar o analfabetismo escolar; garantir a permanência e a conclusão na idade adequada; adotar uma base nacional comum curricular; aprimorar a formação e seleção de professores; promover a Educação de Jovens e Adultos.

    • PSDB: expandir o ensino integral; priorizar a educação básica; investir na formação e qualificação dos professores; melhorar os índices no Pisa (exame internacional de avaliação do Ensino Médio); fortalecer o ensino técnico e tecnológico; estimular parcerias entre universidades, empresas e empreendedores; promover a educação para idosos.

    • REDE: expandir o ensino integral; criar uma Política Nacional Integrada para a Primeira Infância; valorizar os professores; promover uma escola pública e laica; incentivar a política de cotas nas universidades; cumprir as metas do Plano Nacional de Educação (PNE).

    Eleições 2018As propostas com menos chances (intenções de voto entre 2% e 5%) de concorrer ao planalto nas Eleições 2018

    • NOVO: distribuição de valores monetários para os mais pobres pagarem por serviços privados; Prouni para os Ensinos Infantil, Fundamental e Médio; priorizar a educação infantil; ampliar o ensino médio-técnico; introduzir o pagamento de mensalidades em universidades públicas; melhorar a gestão das escolas.

    • PODEMOS: expandir o ensino integral; priorizar a educação infantil e o ensino fundamental; universalizar o acesso, a permanência e o aprendizado de qualidade nos Ensinos Fundamental e Médio; combater as desigualdades entre as regiões do país; capacitar os professores.

    • PMDB: priorizar a educação infantil; promover a Escola sem Partido.

    As propostas praticamente sem chances (menos de 2% das intenções de voto) de concorrer ao planalto nas Eleições 2018

    • PSOL: revogar o teto de gastos; criar um Sistema Nacional de Educação; valorizar os professores; priorizar a educação infantil; investir em universidades públicas e Institutos Federais; retomar o investimento em pesquisa; acabar com as parcerias entre Estado e iniciativa privada; revogar a Reforma do Ensino Médio e a Base Nacional Comum Curricular.

    • PATRIOTA: expandir o ensino integral; investir 10% do PIB na educação pública; acabar com ideologia de gênero nas escolas; erradicar o analfabetismo; combater a evasão; valorizar as atuais universidades federais, ampliando os campi e criar novas universidades públicas.

    • PSTU: investir 10% do PIB na educação pública; encarar o ensino e o acesso ao conhecimento como um direito e não como serviço ou mercadoria; estatizar todas as instituições privadas de ensino; acabar com o vestibular; promover as cotas raciais e sociais; acabar com o ensino religioso ou confessional.

    • PPL: expandir a educação em tempo integral; investir 10% do PIB para a educação; revogar o teto de gastos; federalizar o ensino básico; equiparar o piso salarial do Ensino Básico ao piso dos Institutos Tecnológicos; educação infantil; capacitar os professores; promover a acessibilidade do cidadão LGBT.

    • DC: expandir a educação integral; promover o ensino público universitário e cursos profissionalizantes; introduzir a disciplina Educação Moral e Cívica no Ensino Fundamental.

    PensadorBreve análise das propostas apresentadas pelos partidos para as Eleições 2018

    A intenção da análise não é se aprofundar teoricamente nos conceitos da área da Educação, mas apenas comparar alguns aspectos que surgiram nas propostas dos candidatos à presidência nas Eleições 2018. Muitas outras interpretações poderiam ser propostas e mesmo as que foram sugeridas, poderiam ser mais aprofundadas. Entretanto, preferiu-se apenas abrir alguns pontos para reflexão, para que cada eleitor pense, ou tente pensar, por si mesmo. Então, apenas podemos desejar que as reflexões sejam frutíferas para (re)pensar a postura dos candidatos em relação à Educação.

    Educação em tempo integral e a preocupação com a educação Infantil e Básica

    Um aspecto bastante presente em vários partidos é o conceito de educação integral. Foi o item mais citado. Outro aspecto também bastante presente foi a preocupação com a Educação Infantil e Básica e com o ensino técnico-profissionalizante, ainda que bem menos presente.

    O Ensino Superior e o desenvolvimento de pesquisas

    Posto que, em relação ao nível superior de ensino, nem todas as propostas revelam preocupação com o Ensino Superior ou o desenvolvimento da pesquisa, fica-se sem saber como será a formação dos professores. Com efeito, quando presentes, as propostas podem até ser consideradas antagônicas, variando desde a radical privatização das instituições privadas até o pagamento de mensalidades em universidades públicas ou o incentivo a parcerias público-privada. Em suma, deve-se relembrar que as empresas privadas “usam” os recursos das universidades para desenvolverem produtos de seus interesses. Entretanto, como as universidades brasileiras são em sua grande maioria públicas, o resultado das pesquisas deveria ser socialmente compartilhado e não restrita a interesses “comerciais”, afinal, são publicamente financiadas.

    O financiamento e a administração da Educação

    Surpreendentemente, considerando o financiamento, alguns partidos indicam o investimento de 10% do PIB na educação pública, mas a maioria não chega nem a mencionar possíveis percentuais de investimento. Ainda que tal informação possa ser considerada de extrema relevância para o planejamento e futuro da nação, nenhum valor ou índice é explicitado. Similarmente, e ainda pior do que a falta deste tipo de informação, há uma relativamente baixa preocupação em relação à formação e valorização dos professores. Ao mesmo tempo em que tal consideração não aparece em muitas propostas, indica-se o Ensino Básico como prioridade. Mas, como priorizar o Ensino Básico sem considerar a formação, necessariamente superior, dos professores?

    Ainda que a preocupação com os professores não tenha aparecido em várias propostas, a preocupação com a administração das escolas apareceu até de forma distorcida em algumas poucas propostas. Contudo, deve-se analisar que a Educação deveria ser considerada um bem comum e não um bem privado, pois deveria ser a base para formação do cidadão. Em outras palavras, a república e a democracia só se sustentam com indivíduos bem formados e capazes de avaliar as propostas dos partidos em todas as eleições. Dessa forma, por meio da Educação, torna-se possível escolher em quem votar com autonomia e consciência das implicações de suas escolhas.

    A escola NÃO deve ser vista como uma empresa

    Portanto, dirigir uma escola não pode ser comparada à administração de uma empresa ou de instituições extremamente hierarquizadas. Por exemplo, uma empresa privada pode falir enquanto que a Educação é algo tão sério que não pode ter nenhuma possibilidade de falência no desenvolvimento da população. Nesse ínterim, a escola deve sempre buscar o aprimoramento de toda a coletividade. Não apenas para aumentar um suposto lucro em favor de alguns e detrimento de outros. Nesse sentido, não dá para escolher um público-alvo, é necessário que a formação seja a melhor possível para todos.

    Dessa forma, propostas como a de impor a participação das Forças Armadas na diretoria das instituições educacionais ou simplesmente de “melhorar a gestão das escolas” devem ser consideradas com muita atenção e até algum distanciamento racional, pois, nem no Exército, a transparência na gestão e na concorrência de licitações podem ou devem ser idealizadas.

    A transmissão de conhecimentos e a formação dos estudantes

    Além disso, se é preciso reconhecer que, para melhorar a escola como um todo e, mais especificamente, a formação dos estudantes, não é suficiente apenas a transmissão de determinados conhecimentos. Deve-se ensinar a pensar e não apenas a obedecer e reproduzir o que já é conhecido. Ou seja, percebe-se a falta de sentido em propostas tradicionais e conteudistas como “introduzir a disciplina Educação Moral e Cívica no Ensino Fundamental” ou “mudanças no método de ensino – com mais matemática, ciências e português”.

    Por exemplo, para uma escola plural, na qual se aprenda a refletir sobre os mais variados valores, não deve haver espaço para restrições em relação ao que se pode ou não conhecer. Dessa forma, propostas como “Escola sem partido”, além dos conteúdos tradicionais, limitam a capacidade de reflexão dos estudantes. De fato, limitará também suas atuações futuras na sociedade, inibindo a capacidade de identificar e reconhecer as diferentes formas dos partidos apresentarem suas ideias e propostas. Portanto, terão dificuldade em escolher o que for mais adequado para si mesmos e para seu círculo social.

    A preparação dos futuros eleitores

    Não se trata de preservar os estudantes de conhecimentos inapropriados mas de prepará-los para evitar a adesão à imposições de figuras messiânicas ou palavras de ordem com sentido esvaziado. Por exemplo, permitirá associar, reconhecer e relacionar discursos em formas de promessas que não foram cumpridas quando algum dos postulantes teve a oportunidade de estar em outras instâncias estaduais e municipais de governo, como ao afirmar que se irá “investir na formação e qualificação dos professores”, mas não aceitar discutir as reivindicações de professores e colocar a polícia para reprimir (violentamente) suas manifestações.

    Ou então, pedir para ser chamado pelo profundo conhecimento de Economia, mas sem detalhar as pretensões sobre Educação. Afinal, governar não é apenas se preocupar com a Economia, mas deveria ter preocupações muito maiores com toda a população. Então, pior ainda, quando se assume não entender nada sobre Economia e se fez “sugestões” pouco razoáveis sobre a militarização da escola, a qual visa a impor obediências aos estudantes e não estimular a criatividade e o amor pelo conhecimento.

    Conclusão

    Portanto, se realmente queremos um Brasil mais educado, precisaremos conhecer melhor, no momento das eleições, as propostas dos candidatos para a área da Educação. De pouco adianta gravar um vídeo para aparecer em rede nacional, que nem sabemos para que será usado. Assim, seria preciso, e até mesmo mais coerente, ter clareza sobre o que é uma Educação de qualidade e como ela poderia ser melhorada. Contudo, a democracia, para um funcionamento ideal, infelizmente demanda esforço de compreensão e análise das propostas dos futuros governantes já nas eleições. E não só dos candidatos a órgãos majoritários, mas também de senadores e deputados federais e estaduais…

    Referências

    BBC NEWS. Eleições 2018: as propostas de todos os candidatos a presidente do Brasil. 17/08/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

    DESTAK. Educação: compare as propostas dos candidatos à Presidência da República. 28/08/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

    DUNDER, K. O que os candidatos à Presidência prometem para Educação e Cultura. 04/09/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

    FRAGA, O.; ELER, G. Como os candidatos tratam da educação nos planos de governo. 25/08/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

  • Editorial 2018 – Open Philosophy

    “No século IV a.C., a República de Platão oferecia a primeira utopia sócio-política – uma especulação sobre o melhor modo de organizar a vida (particular e) pública que haveria de se tornar objeto de interpretação e crítica constante no resto da história ocidental.

    Entre as teses mais controversas, há uma de especial interesse: grande conhecedor da psicologia humana, Platão sugere no Livro V de República uma estratégia para evitar os desvios produzidos pela ambição, à qual se inclina naturalmente todo sujeito (e em especial os detentores do poder), pode ser encontrado na abolição da propriedade privada, em especial para a classe governante, tornando comuns não apenas os bens materiais mas também os filhos e todos os laços sanguíneos, de modo que todos concebam o mesmo como “próprio” e o interesse particular não danificasse o comunitário, o bem comum à maioria.

    Anos depois o discípulo de Platão, Aristóteles, reagia à especulação do mestre e à ideia da comunidade de bens e família. Na Política, Aristóteles defende que a pretensão platônica é não apenas impossível mas, ainda que realizável, absolutamente indesejável. A propriedade privada – anota Aristóteles, outro grande conhecedor da vida subjetiva – constitui uma das maiores fontes de motivação e prazer humano, e a sua abolição resultaria justamente no efeito contrário do pretendido: ser de todos não equivale, diz Aristóteles, a ser de cada um mas, paradoxalmente, a ser de ninguém. Com o qual o que é comum seria igualmente negligenciado por todos.

    Há aqui uma clara polarização das perspectivas e um exemplo clássico de bom debate político. Tanto a polarização quanto o debate tiveram início há mais de dois milênios, e são ainda arena de agitada disputa na época contemporânea”

    Há aqui uma clara polarização das perspectivas e um exemplo clássico de bom debate político. Tanto a polarização quanto o debate tiveram início há mais de dois milênios, e são ainda arena de agitada disputa na época contemporânea.

    “Hoje, aliás, o debate político é especialmente imprescindível.

    Que significa hoje ser de esquerda? que de direita?

    É ainda pertinente esta nomenclatura? Se sim: qual a sua utilidade?

    Qual a ideia de “progresso” defendida por cada uma das vertentes?

    Qual é o discurso hegemônico de cada uma no que toca à justiça, e à justiça social principalmente?

    Existe uma dogmática própria da esquerda e da direita no que toca à educação e à ciência?

    Quais as propostas dos presidenciáveis no contexto eleitoral do Brasil atual?

     

    Open Philosophy – https://www.blogs.unicamp.br/openphilosophy/

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  • Ciência também é política e economia

    Texto por Victor Augusto Ferraz Young

    Nestes dias que antecedem às eleições presidenciais de 2018, nos deparamos com os recentes cortes orçamentários por parte do governo federal no que se refere à promoção e ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia no Brasil.

    A redução neste e em outros gastos tem como base o fato de que o Estado deve garantir que parte daquilo que arrecada seja direcionado para o pagamento de suas dívidas depois de abatidas as despesas – grosso modo. Que o Estado deva cumprir com seus compromissos, isso não é objeto de discussão, ele deve pagá-los. Os termos da dívida contratada e sua rolagem, a qualidade do gasto realizado e a forma como se obtém a receita são, porém, objeto de acalorado debate, principalmente entre economistas. Ou seja, há espaço para várias formas de se abordar essa questão. Mencionamos o pleito presidencial, pois a forma de se gerir o gasto, a arrecadação e o endividamento é, em grande medida, uma opção política. Não fosse assim, este tema não estaria em todos os programas de governo de cada candidato e não seria um assunto tão debatido como o é nesse momento de escolha do futuro governante.

    Não pretendemos agora abordar toda a discussão sobre a gestão de recursos do Estado, faremos isso ao longo dos próximos meses, assim que o futuro blog de economia estiver pronto. Pretendemos, todavia, salientar nosso ponto de vista quanto à questão do suporte governamental para o desenvolvimento e para a produção de ciência e de tecnologia.

    Os recentes cortes orçamentários nestes itens do governo obedecem, em grande medida, a uma agenda que estabelece que um governo deve gastar não muito mais do que arrecada, realizando e rolando dívidas em meio a reiterados cortes sobre aquilo que não faria parte de suas funções. O mantra desta ideologia é o de que o Estado não deve auxiliar o desenvolvimento da economia local. Ou seja, a melhor ajuda é deixá-la sem auxílio para enfrentar corporações gigantescas em um mercado aberto e globalizado. Caberia ao empresário brasileiro arcar com o custo, o risco e o prazo para a maturação de um investimento em inovação. Isso sem considerarmos aqui um conjunto prévio de produtos avançados e conhecimentos técnicos necessários para a produção de algo novo e rentável. Dada esta ordem de coisas, não é difícil escutar entre candidatos que, neste cenário, do nada, o investidor estrangeiro viria ao Brasil trazer e desenvolver tecnologias de ponta. Ele virá, se houver um mercado aberto e com moeda estável para a retirada de seus lucros, mas a questão da transferência de tecnologias de fronteira me parece remota, quando não improvável.

    Por último, é muito importante enfatizar que historicamente não houve país que se tornasse altamente desenvolvido sem a interferência do Estado. Este apoiou o capital nacional, o progresso da ciência e, como resultado, promoveu a criação de empregos de alto nível para seus habitantes. Também não há nação nessa estatura que tenha seguido, nos momentos cruciais de seu desenvolvimento científico, tecnológico e industrial, uma agenda como esta que descrevemos acima e que está sendo proposta nestas eleições. A chamada proposta “liberal”, eufemismo que substitui o termo neoliberal, não tem como conduzir o país para o mundo dos países desenvolvidos, pois sem o apoio do Estado, não há como desenvolver um dos elementos imprescindíveis e fundamentais para se chegar lá: a criação de tecnologias e inovações com base no conhecimento científico.

    Texto por Victor Augusto Ferraz Young – Doutorando em Desenvolvimento Econômico pela UNICAMP e Colaborador do Blogs de Ciência da Unicamp.

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