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  • Comunicação de ciência – público e comunicadores

    Unir diferentes agentes no processo de comunicação, como pesquisadores, comunicadores de ciência, figuras públicas e público, é uma boa estratégia para a divulgação científica e democratização do conhecimento.

    Planejando a estratégia de divulgação científica

    O público seleciona a informação que vai consumir de acordo com o que lhe parecer mais útil para a sua vida profissional e pessoal de forma a selecionar o que lhe parece mais conveniente para cada situação de sua vida (Torquato, 2015). 

    Pensar o público é um dos primeiros passos para uma boa estratégia de divulgação científica. Preparar uma comunicação baseada apenas no que queremos comunicar em um processo unidirecional pode fadar sua divulgação ao fracasso e mesmo criar ruído. 

    Uma boa estratégia para desenvolver o seu conteúdo de divulgação científica é a criação de uma Persona, uma personagem ideal, alvo da sua comunicação. Para saber mais sobre a criação da Persona acesse o post Comunicação sobre ciência – Pensando o público

    Com a publicação dos primeiros conteúdos é possível acompanhar como o material está sendo recebido/consumido (ou não) pelo público. Isso pode ser feito de maneiras diferentes, como por exemplo, através da quantidade de acessos, compartilhamentos, curtidas e comentários. Alguns programas e empresas de marketing também incluem a pesquisa de opinião ao longo do processo. 

    Por que avaliar o processo de divulgação científica é importante? 

    A comunicação é um processo que só existe dentro de um contexto. Ela faz parte de um tempo, espaço (virtual ou não) e pessoas. Ela é um processo social de produção e compartilhamento de sentido por meio da materialização de formas simbólicas (França, 2001). Isso quer dizer que uma estratégia de comunicação que hoje funcionou bem para um determinado público pode não funcionar um tempo depois.  

    Dessa maneira, é importante para qualquer projeto de divulgação científica, que o(a) comunicador(a) consiga entender os processos e discursos da ciência, da comunicação e do seu público/grupo social que se quer alcançar. 

    Recentemente, duas formas audiovisuais distintas sobre uma mesma instituição, o Instituto Butantan, deixou isso evidente. Ambas falaram sobre a instituição, a primeira, um vídeo institucional e a segunda, uma adaptação da música do MC Fioti que remetia à vacina e ao Instituto Butantan. 

    Vídeo Institucional:

    Vídeo MC Fioti:

    Enquanto o vídeo institucional foi visualizado um pouco mais de 7,4 mil vezes em 5 meses, o clipe do MC Fioti obteve mais de 13,6 milhões de visualizações em 6 meses. Mas vale lembrar, que além de analisar o alcance, é importante lembrar que os públicos foram distintos. 

    Então, começamos a ter alguns elementos para se pensar a divulgação científica: Além da pesquisa desenvolvida, ou conteúdo que se quer divulgar, há o seu público. Além disso, há outro elemento importante, que em muitos casos é esquecido: Qual o objetivo ou intenção da sua comunicação? 

    A intencionalidade da divulgação científica: Comunicação como um Direito Humano

    Ao longo das últimas décadas, a comunicação passou a ser reconhecida como um direito humano fundamental, mas esse conceito ainda está em construção (GOMES, 2007).O debate sobre o direito de comunicar foi inaugurado pela UNESCO em 1970. No Brasil, só foi reconhecido pelo Estado mais tarde por meio do decreto nº 7.037 de 2009, que instituiu a terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) (Vanucchi, 2018). 

    Entender e participar dos processos relacionados à ciência e tecnologia, como as decisões associadas às políticas públicas, assim como os processos comunicativos constituem também elementos importantes para a cidadania. Nesse sentido, a divulgação científica tem relação direta com o direito à comunicação, e por conseguinte, com os direitos humanos. 

    Pesquisadores e Comunicadores de Ciências

    As tensões entre os comunicadores de ciência e pesquisadores não são recentes. Por exemplo, a relação entre cientistas e jornalistas é marcada, em algumas ocasiões, pela falta de acesso do jornalista ao cientista para as entrevistas em tempo hábil para veiculação da notícia, como fonte de reportagem. Em outras ocasiões, a relação é marcada pela desconfiança de cientistas sobre jornalistas na divulgação das suas pesquisas. Alguns cientistas temem que suas pesquisas sejam veiculadas sem exatidão ou mesmo deturpadas.

    Outro campo de tensão entre pesquisadores e comunicadores de ciência é o da divulgação científica.  As críticas e discussões sobre “quem pode falar” de ciência não são recentes. De um lado, alguns pesquisadores afirmam que esse papel deve ser destinado aos próprios cientistas, especialistas em um determinado assunto. Do outro lado, comunicadores de ciência que vem conseguindo conquistar cada vez mais espaço entre os diferentes públicos, “furando as bolhas”.. 

    Em busca de um processo conjunto

    O processo de divulgação científica precisa do conhecimento não apenas da área específica sobre a qual está comunicando, mas também do conhecimento da área de comunicação. Há a necessidade de se começar a pensar o processo de divulgação científica a partir do trabalho conjunto que envolve pesquisadores, comunicadores de ciência e o(s) público(s) alvo. 

    Aqui voltamos para a pergunta feita anteriormente “Qual o objetivo ou intenção da sua comunicação?”, mas agora de uma outra forma  “Qual a intenção do seu fazer divulgação científica?”

    Há uma relação intrínseca entre ciência e poder  (Caldas).  O conhecimento científico é essencial para a resolução de problemas e tomada de decisões e tem relação direta com processos democráticos e cidadania. O agente no processo de divulgação científica, seja ele pesquisador ou não, precisa passar de relação vertical, como a do educador-salvador, que leva o conhecimento aos menos esclarecidos, para o de comunicadores envolvidos com processos mais democráticos e participativos, aberto ao diálogo  – estabelecendo processos de interação e comunicação. 

    Formiguinhas, uni-vos!

    Diante da desinformação e da infodemia que se tornou mais evidente frente à pandemia, uma outra preocupação ganha destaque entre os divulgadores de ciência e jornalistas: Como furar a bolha, cada vez mais delimitada pelos algoritmos, e alcançar o seu público? Nesse sentido, há um aumento das discussões sobre como fazer divulgação científica e atuar em conjunto para alcançar um número maior de pessoas em diferentes grupos sociais. 

    No período de pandemia, aconteceram vários cursos online voltados tanto para o jornalismo científico, quanto para a divulgação científica, incluindo alguns realizados pelo Blogs Unicamp. 

    Tensões, embates, preocupação conjunta com soluções para o processo de divulgação científica, promoção de cursos e profissionalização do divulgador científico e comunicador de ciência, todos esses fenômenos podem indicar o fortalecimento de um campo de pesquisa/atuação ainda em desenvolvimento.

    É comum o uso do termo “trabalho de formiguinha” para exprimir o trabalho do divulgador científico em conquistar o seu público. No entanto, a divulgação científica vem agregando mais pessoas e transformando em um trabalho de um coletivo de formigas, um  trabalho de correição. 

    Pensando juntos desde o início

    Algumas iniciativas de divulgação científica vem pensando em conjunto para desenvolver processos de divulgação científica:

    O blogs de Ciência da Unicamp é uma iniciativa de divulgação científica que inclui pesquisadores de diversas áreas e comunicadores de ciência. No processo, os pesquisadores participam de um treinamento voltado para a divulgação científica por meio de blogs, a Integração. Além disso, o Blogs Unicamp fomenta o diálogo com o seu público. A Erica Mariosa fala um pouco sobre o processo de divulgação científica no Blogs Unicamp em seu post Como fazemos a divulgação da divulgação científica no Blogs de Ciência da Unicamp?

    Outro exemplo de atuação conjunta entre pesquisadores, comunicadores de ciência, artistas e personalidades públicas foi a iniciativa do Todos Pelas Vacinas.  

    Para conhecer a iniciativa e os conteúdos preparados para os diversos públicos acesse o site do Todos Pelas Vacinas

    Saiba mais

    Caldas, Graças, DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA, RELAÇÕES DE PODER E CIDADANIA, Labjor- Unicamp

    França, Vera Veiga (2015) O objeto da comunicação/A comunicação como objeto, In Hohfeldt, Antonio, Martino, Luiz C, França, Vera Veiga (Org) Teorias da Comunicação: Conceitos, escolas e tendências, Petrópolis, RJ: Vozes.

    Gomes, Raimunda Aline Lucena (2007) A COMUNICAÇÃO COMO DIREITO HUMANO:

    Um Conceito em Construção Universidade Federal de Pernambuco, Dissertação

    Vannuchi, Camilo (2018) O direito à comunicação e os desafios da regulação dos meios no Brasil, Galáxia

    Torquato, Gaudêncio (s/d) Comunicação nas organizações. 

    Este texto foi escrito e publicado originalmente no blog CdF

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os produziram-se textos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, os textos passaram por revisão revisado por pares da mesma área técnica-científica na Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Sobre o período de incubação da doença e suas relações com a quarentena…

    A doença da Covid-19 vem nos impondo uma série de desafios cotidianos. Para nós, no sentido individual, já temos percebido que a doença no Brasil não são apenas números que se somam dia a dia. Já são nomes de conhecidos, amigos e familiares que viram estatística, ou não – dependendo da gravidade dos sintomas e se é necessário hospitalização. Nos casos mais severos, acompanhamos apreensivos internações e, muitas vezes e infelizmente, a despedida de longe dessas pessoas – por medidas sanitárias. 

    Por outro lado, cientificamente, temos tentado compreender a doença em uma velocidade recorde, sem o tempo comum para revisar estudos e debatê-los com colegas da nossa área.

    Período de incubação, o que é isso?

    Um dos artigos que nos chegou às mãos recentemente (publicado no dia 10 de março), aponta que “Nosso entendimento atual do período de incubação do COVID-19 é limitado”. Este estudo analisou o contágio e aparecimento de sintomas de 181 pessoas com infecção confirmada para SARS-CoV-2, ou também conhecido como Novo Coronavírus, antes de 24 de fevereiro deste ano, fora da província de Wuhan (China).

    O período de incubação é o tempo entre o momento em que alguém se infecta pela doença, até o patógeno iniciar sua replicação (e a pessoa tornar-se infecciosa também). No caso da COVID-19, o período de incubação em média é de 5,1 dias.

    Mas este período varia! Segundo a Organização Mundial da Saúde, o período de incubação da Covid-19 ocorre entre 1 e 14 dias. Este estudo, publicado por Lauer e colegas, mostrou que 2,5% das pessoas analisadas apresentaram sintomas em 2,2 dias após a infecção pelo vírus e 97,5% das pessoas apresentam sintomas em 11,5 dias. 

    Qual a relevância deste debate para o combate à transmissão da doença?

    Em geral, ao apresentar os sintomas da doença, o que temos chamado de estar sintomático, é associado à transmissão do patógeno (neste caso o vírus SARS-CoV-2). Entretanto, as evidências mais recentes de transmissão do novo Coronavírus por pessoas levemente sintomáticas e, até mesmo, assintomáticas, foi possível observar que o período de incubação pode ser menor que o período de incubação estimado nos estudos. E isto tem implicações importantes tanto para a dinâmica de transmissão da doença, quanto para a implementação de estratégias de contenção de seu espalhamento na sociedade.

    Se formos compreender que a partir do dia 1 de infecção (isto é: algumas horas após termos sido expostos ao vírus) nós já estamos, potencialmente, transmitindo esta doença até 15 dias após esta exposição, a projeção de isolamento preventivo seria 15 dias, no mínimo. 

    Como assim, 15 dias no mínimo?

    Sim. Considerando, por exemplo, que eu me infectei hoje, dia 10 de abril, e em 15 dias eu não apresentei qualquer sintoma, tudo indicaria que eu passei do período de incubação e, não serei mais um agente transmissor do vírus a partir do dia 25 de abril (aproximadamente e de acordo com o que temos de dados neste momento).

    Todavia, a partir do primeiro sintoma – mesmo que muito leve – este tempo de isolamento precisa se prolongar a contar do primeiro dia de aparecimento do sintoma. Alguns estudos apontam evidências, por exemplo, de carga viral alta e um longo período de eliminação do vírus, em pacientes que apresentam sintomas críticos da Covid-19 por muitos dias após início do tratamento da doença (estes são os pacientes que precisam de internação hospitalar com tratamento em UTIs).

    De modo geral, a fase infecciosa se prolonga, para aquelas pessoas que demonstram sintomas, até (no mínimo) 7 dias após o aparecimento do primeiro sintoma e (conjuntamente) 3 dias após cessarem a febre e mais algum sintoma que esteja ocorrendo (coriza, tosse, espirros, falta de ar, dor de cabeça…). O mais prudente, portanto, seria o isolamento total durante esta fase.

    Sobre isolamento social e espacial: qual a relevância disto?

    Já falamos em algumas postagens anteriores e seguiremos apontando esta medida como a principal ferramenta de estancar a transmissão da doença COVID-19! Os estudos sobre a transmissão e o período de incubação apresentados neste post nos mostram que a transmissibilidade do vírus pode iniciar muito brevemente após a infecção e varia entre as pessoas infectadas.

    Estes estudos também apontam que a pessoa infectada segue contagiando outras pessoas por vários dias após os sintomas desaparecerem. Considerando que cerca de 85% das pessoas infectadas apresentam nenhum sintoma, ou sintomas muito leves (muitas vezes não sendo contabilizadas em países que não estão realizando testes em massa), não sabemos quando ou se fomos infectados. Mas neste caso podemos estar espalhando o vírus mesmo assim!

    Dessa forma, o isolamento social e espacial é a medida mais segura, uma vez que prevê que tenhamos pouco contato entre pessoas, diminuindo a possibilidade de nos contagiarmos e contagiarmos outras pessoas. Nosso contato com objetos contaminados e não desinfectados, ou com outras pessoas que estejam infectadas – mesmo sem apresentar sintomas e ou adoecimento aparentes – é a maneira mais rápida do espalhamento do vírus. 

    Infelizmente, o tempo de isolamento é longo e, sim, têm impactos na nossa vida psicológica, financeira e afetiva. Mas não existe outro modo seguro de minimizar os efeitos da disseminação do Coronavírus na sociedade enquanto não entendermos melhor os outros aspectos desse vírus.

    Mais uma vez: fique em casa

    Não cansaremos de falar isto: fique em casa se você puder, diminua a sua exposição em espaços públicos, não visite, cumprimente, beije ou abrace pessoas – especialmente aquelas que não estão cumprindo o isolamento social.

    Se for possível, em sua casa, tente não compartilhar objetos como pratos e talheres. Se você mora com mais pessoas e precisa sair, tome todas as precauções já indicadas em nossas redes sociais para manter as pessoas de sua casa sem contaminação também. 

    Para saber mais:

    LAUER, S. A.; GRANTZ, K. H.; BI, Q.; JONES, F. K. et al. The Incubation Period of Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) From Publicly Reported Confirmed Cases: Estimation and Application. Ann Intern Med, Mar 10 2020.

    Liu, Yang; Yan, Li-Meng; Wan, Lagen; Xiang, Tian-Xin; Le, Aiping; Liu, Jia-Ming; Peiris, Malik; Poon, Leo; Zhang, Wei. Viral dynamics in mild and severe cases of COVID-19. Publicado em 19 de Março de 2020. DOI:https://doi.org/10.1016/S1473-3099(20)30232-2

    Li, Ruiyn; Pei, Sen; Chen, Bin; Song, Yimeng; Zhang, Tao; Yang, Wan; Shaman, Jeffrey.  Substantial undocumented infection facilitates the rapid dissemination of novel coronavirus (SARS-CoV2). Science, 16 Mar 2020, DOI:10.1126/science.abb3221

     

    Figura de capa: Por David S. Goodsell, RCSB Protein Data Bank; 

    doi: 10.2210/rcsb_pdb/goodsell-gallery-019

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

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