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  • Por que você não deveria argumentar com radicais – o efeito “Backfire”

    Sabe aquela vez que você topou, nas redes sociais ou fora delas, com uma pessoa muito convicta defendendo algo que você tinha certeza de que estava errado?

    Pode ter sido um antivacina, um terraplanista, um negacionista da pandemia ou um apoiador ferrenho de algum político, daqueles dispostos a defender qualquer bobagem ou mentira que seu ídolo tenha dito.

    Identificou o diálogo aí nas lembranças, né?

    Então, você têm os fatos e a ciência a seu favor. Você argumentou contra o que essa pessoa convictamente defendia e ela obviamente mudou de opinião diante das evidências que você apontou, não foi? Pois é, comigo também nunca aconteceu. A verdade é que, diante de pessoas inflexíveis sobre algo, muitas vezes não as convencemos nem mesmo de fatos elementares.

    Efeito backfire: quando a tentativa de argumentar sai pela culatra.
    (fonte: https://web.northeastern.edu/nulab/backfire-effects-misinformation)

    Seria essa tentativa de argumentar com os muito convictos, então, puro desperdício de tempo e energia? A realidade dura nos mostra que pode ser ainda pior do que isso. Sua tentativa de convencer o fanático pode ter um efeito totalmente negativo e torná-lo ainda mais convicto de sua crença. Esse é o chamado “efeito backfire” e é bem provável que você já o tenha produzido em alguém ou nele incorrido em discussões por aí.

    Entendendo o conceito

    “Nenhuma opinião deve ser defendida com fervor (…) O fervor apenas se faz necessário quando se trata de manter uma opinião que é duvidosa ou demonstravelmente falsa.” — Bertrand Russell

    O efeito backfire foi verificado pela primeira vez em um estudo publicado em 2010 [1], conduzido pelos cientistas políticos Brendan Nyhan e Jason Reifler das universidades de Michigan e da Georgia, EUA. Nesse estudo, eles criaram artigos fictícios de jornal que reproduziam informações falsas amplamente difundidas nos EUA à época. Por exemplo, como a ideia de que as forças armadas estadunidenses teriam encontrado armas de destruição em massa no Iraque do ditador Sadam Husseim. Os voluntários da pesquisa liam esses artigos e, na sequência, recebiam outro texto com a informação correta. Isto é as supostas armas de destruição em massa jamais foram encontradas.

    Um curioso resultado encontrado pela pesquisa foi o de que os voluntários mais conservadores e favoráveis à guerra contra o Iraque relataram, após a leitura do artigo com a informação verdadeira, que tinham ainda mais certeza de que as tais armas de destruição em massa realmente existiam. Em outras palavras, a tentativa de correção da crença incorreta desses voluntários “saiu pela culatra” (o efeito backfire) e eles ficaram ainda mais convictos sobre algo que nunca aconteceu de fato. Por acaso isso te soa familiar e te faz lembrar de alguma discussão que já teve com alguém?

    Mas, podemos chamar de ignorância?

    Não! Esse efeito não é fruto de ignorância ou burrice, como se poderia imaginar a princípio. Ele ocorre, na verdade, como um desdobramento do raciocínio motivado. Ou seja, é uma forma de pensar na qual selecionamos somente as evidências que nos agradam para embasar uma conclusão à qual já tínhamos chegado de antemão. Assim, ao receber uma informação que se choca com sua crença, a pessoa tende a revisar mentalmente as “evidências” (não importa muito que possam ser falsas) que a induziram a ter essa concepção equivocada e, nesse processo de revisão de suas memórias, pode acabar reforçando sua crença inicial.

    Efeito backfire e política em contexto de pandemia

    Até o uso das máscaras tem sido objeto de disputa na polarização política (fonte: Pixabay)

    No âmbito da política, que tem como motor as ideologias e paixões humanas, não faltam exemplos de racionalização de “evidências” que levam ao efeito backfire de forma coletiva. Em um cenário de intensa polarização política, quase tudo é politizado e não seria diferente com os aspectos que envolvem a pandemia de coronavírus. Nesse contexto, um exemplo do efeito backfire coletivo pôde ser observado nos que passaram a minimizar a pandemia, buscando equivaler a Covid-19 a uma gripe comum.

    As políticas negacionistas

    Nos EUA e no Brasil, foram os presidentes os principais líderes políticos a sistematicamente minimizar a gravidade do coronavírus [2, 3]. Tanto lá como cá, os seguidores de ambos, ao receberem o sinal de seus ídolos, passaram a reproduzir sua concepção. Diante do crescente número de casos comprovados e das complicações, sequelas e mortes causadas pelo vírus, parte expressiva dos defensores da ideia de que se tratava de uma “gripezinha”, ao invés de mudarem de posição perante evidências contrárias, passaram a intensificar seu negacionismo por meio de teorias conspiratórias, ou seja, acionaram o raciocínio motivado resultando no efeito backfire.

    Da afirmação — jamais comprovada — de que governadores estariam inflando os números de óbitos [4], passando pelo questionamento sobre a lotação de hospitais (com sugestão do presidente para que populares os invadissem e filmassem os leitos) [5], até o enfoque no número de casos recuperados [6], foram muitos os esforços dos negacionistas convictos para minimizar o terrível impacto da pandemia no segundo país em número de óbitos causados pela Covid-19 no mundo.

    Minimizando a pandemia

    Quanto àquele esforço de se minimizar a pandemia por meio do enfoque nos milhões de recuperados, é quase cômico observar que, na verdade, isso pesa contra o negacionismo dos fanáticos: a constatação de que há milhões de recuperados pressupõe a existência de um número ainda maior de infectados, o que por si só já expõe a extensão e a gravidade da pandemia.

    Animados pelo mesmo impulso negacionista, surgiram também inúmeros apoiadores do presidente cujos parentes ou conhecidos supostamente tiveram diagnóstico positivo para Covid-19, mas que morreram, juram eles, de câncer ou outra doença grave. Por suposto, trata-se aqui do que chamamos, em ciência, de evidência anedótica; é razoável a probabilidade, porém, de que a leitora tenha visto alguma história do tipo em suas redes sociais durante a pandemia.

    A “vacina chinesa” e o efeito backfire

    Nem mesmo a vacina contra o coronavírus escapou à lógica da polarização política. Bastou o Ministério da Saúde anunciar a intenção de adquirir a CoronaVac [7]– vacina que está sendo produzida em associação entre o Butantã e a Sinovac, uma empresa chinesa — que o presidente, pressionado por apoiadores contrários à vacina [8], cancelou o acordo de compra [9]. Após esse imbróglio, várias fake news sobre a CoronaVac inundaram as redes sociais [10], como a de que a vacina usaria células de bebês abortados [11]. Isso tudo nos faz levantar a questão: existe a possibilidade de ocorrer o efeito backfire ao argumentarmos com um antivacina? Considerando-se a ciência sobre o tema, a resposta infelizmente é “sim”.

    [Fonte: Renato Machado — cartunista]

    Os mesmos pesquisadores citados, Reifler e Nyhan, conduziram, em 2015, um estudo sobre mitos relativos a vacinas [12]. À época, 43% dos estadunidenses acreditavam que a vacina da gripe poderia fazê-los ter gripe. Assim, nesse estudo, eles buscaram verificar a eficácia de se oferecer as informações corretivas dessa crença infundada. Como resultado, o estudo apontou que informações corretas — que a vacina não causava a gripe — foram suficientes para reduzir bastante essa crença específica.

    Efeito colateral

    No entanto, os voluntários da pesquisa que demonstraram níveis mais altos de preocupação com supostos efeitos colaterais de vacinas (como acreditar que elas causam autismo) passaram a manifestar menor disposição a vacinarem seus filhos. Nesse estudo, o efeito backfire ocorreu não na crença específica, alvo da informação corretiva, mas na postura dos voluntários que já tinham uma perspectiva antivacina, os quais ficaram ainda mais convictos sobre isso.

    A esta altura, a leitora pode estar se perguntando se, por causa da possibilidade do efeito backfire, não devemos jamais argumentar com as pessoas muito convictas que estejam defendendo algum absurdo. Todavia, na realidade, há uma situação bastante frequente na qual convém, sim, debater com dogmáticos.

    Argumentar ou não argumentar, eis a questão

    Não é possível convencer um crente de coisa alguma, pois suas crenças não se baseiam em evidências; baseiam-se numa profunda necessidade de acreditar.” — Carl Sagan

    Em uma conversa privada, no tête-à-tête mesmo, com alguém defendendo radicalmente alguma inverdade, talvez seja melhor não insistir. O risco de você contribuir para que a pessoa fique ainda mais convicta é real. Por isso, vale muito mais a pena argumentar com as pessoas que podem ter caído em alguma desinformação, mas que têm maior abertura ao debate. E elas são muitas. Dessa forma, como sustenta o cientista político David Redlawsk, isolam-se os fanáticos de todo tipo, reduzindo sua influência.

    Estudos mais recentes, como o dos cientistas políticos Thomas Wood e Ethan Porter, da George Washington University, não encontraram o efeito backfire em relação a fatos específicos [13]. Os pesquisadores argumentam que é possível, sim, mudar a opinião equivocada das pessoas com a exposição de fatos.

    Mas…

    É preciso lembrar, no entanto, que existe sempre a possibilidade de que elas reforcem sua postura — como ocorreu no estudo mencionado sobre a vacina — apesar de se dobrarem a um fato específico. Como um exemplo, imagine que você vai argumentar com uma pessoa que defende um remédio comprovadamente ineficaz contra a Covid-19 porque o político que ela apoia insiste se tratar de um medicamento salvador. A depender de sua abordagem e do nível de convicção dessa pessoa, talvez até a convença do fato de que o remédio é ineficaz. Não espere, porém, que diminua o apoio dela ao político, pois o mais provável é que o contrário aconteça.

    No entanto, como parte significativa de nossas vidas atualmente acontece em rede, quando o debate for em público, como no Facebook ou em grupos de Whatsapp, convém demonstrar que os radicais estão equivocados. Nas redes, terceiros quase sempre estão observando as conversas alheias. Eis aí a situação na qual vale a pena travar o bom combate contra a desinformação, a mentira e as concepções falsas. Se seu interlocutor direto ficar ainda mais convicto na defesa de alguma desinformação qualquer, paciência. Quase sempre há vários outros que podem se beneficiar do seu esforço de argumentação em prol do restabelecimento da verdade.

    Por fim

    Vivemos em tempos nos quais vicejam posturas anticientíficas e esforços de relativização da verdade, quando não de sua negação completa. Como é bastante conhecido, isso é impulsionado por líderes políticos cujo comportamento é replicado por milhões de seguidores. Por isso, é importante que continuemos disputando, se não os corações, ao menos as mentes das pessoas e ter consciência da possibilidade de que o efeito backfire ocorra é um passo fundamental nessa jornada.

    Referências:

    [1] Nyhan, B, Reifler, J (2010) When Corrections Fail: The Persistence of Political Misperceptions; Political Behavior, Vol 32, No 2, pp 303-330.

    [2] (2020) Timeline: How Trump Has Downplayed The Coronavirus Pandemic. National Public Radio (NPR), 02 de outubro de 2020.

    [3] “Gripezinha” e “histeria”: cinco vezes em que Bolsonaro minimizou o coronavírus (2020)

    [4] Bolsonaro endossa notícia falsa para dizer que Estados inflam mortes por coronavírus, Valor Econômico, 31 de outubro de 2020.

    [5] Bolsonaro recomenda invadir hospitais, Correio Braziliense, 11 de junho de 2020.

    [6] Na data em que Brasil ultrapassa 100 mil mortos, Bolsonaro destaca pacientes recuperados, Agência Brasil (EBC), 20 de outubro de 2020.

    [7] Brasil anuncia que vai comprar 46 milhões de doses da CoronaVac, Agência Brasil, 20 de outubro de 2020.

    [8] Bolsonaro sabia da intenção de compra da CoronaVac, mas recuou, Estado de Minas, Edição de 21 de outubro de 2020.

    [9] Bolsonaro diz que Governo Federal não comprará vacina CoronaVac Agência Brasil (EBC), 21 de outubro de 2020.

    [10] Aos Fatos (agência de fact-checking) – resultados de busca do verbete “coronavac”

    [11] (2020) É falso que CoronaVac usa células de bebês abortados, Aos Fatos, 28 de julho de 2020.

    [12] Nyhan, B, Reifler, J (2015) Does correcting myths about the flu vaccine work? An experimental evaluation of the effects of corrective information. Vaccine 33 (3): 459–464.

    [13] Wood, T., Porter, E. (2018). The elusive backfire effect: Mass attitudes’ steadfast factual adherence. Political Behavior, Vol41, pp135-163.

    OBS:

    Esse texto contou com a revisão primorosa de Caroline Frere Martiniuc e Eduardo Jesus Veríssimo, aos quais agradeço enormemente.

    Este texto originalmente foi escrito e postado no blog Política na Cabeça

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Todavia, não necessariamente representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Eleições 2018: por um Brasil mais educado!

    Texto por Cássio Ricardo Fares Riedo

    Estamos em época de eleições e é muito comum ver a preocupação com a Educação nas declarações do Brasil desejado pela população na “divulgação” feita por um dos canais televisivos abertos, que prefiro nem mencionar. Mesmo que tais declarações sejam chatíssimas, suspeito ainda das intenções sobre como tais informações voluntariamente cedidas pela populaçãoserão usadas. Contudo, não é esse o assunto que pretendo tratar neste post. Usei-o apenas para ressaltar a preocupação da população com a Educação. Enfim, parece que todos pedem uma Educação “melhor”, mas o que seria “realmente” uma Educação “melhor”? Nesse sentido, o que seria possível fazer para “melhorar” a Educação? Seja como for, vamos ver o que os candidatos a presidência dizem em seus programas sobre e Educação?

    Livro e lupa

    Como foi feita a identificação das propostas dos partidos nas Eleições 2018

    A fim de não ser intencionalmente partidário, usarei o resultado indicado pela última pesquisa Ibope para as Eleições 2018, divulgada em 26 de setembro, como referência para a apresentação das propostas na área de Educação. Além disso, após a identificação da ordem dos candidatos, usarei apenas as siglas dos partidos para indicar as propostas. Em síntese, os documentos oficialmente produzidos pelos partidos para as eleições não foram utilizados, pois é comum o uso de uma linguagem intencionalmente partidária. Conforme a intenção inicial, foram utilizadas indicações encontradas em sites que apareceram na primeira página do Google, a partir de um busca com as palavras “propostas sobre educação dos candidatos à presidência nas eleições 2018”. Como resultado, os sites melhores posicionados foram: BBC NEWS, DESTAK, NEXO e R7 Notícias.

    Este não é um levantamento preciso e acadêmico, com consultas a bases de dados totalmente confiáveis, mas apenas o que transpareceu na pesquisa pela internet sobre as Eleições 2018. Assim sendo, o objetivo não é chegar a nenhuma conclusão sobre se uma proposta pode ser melhor do que outra. É refletir sobre o que pode ser tomada como uma boa Educação, principalmente a partir do modo como as propostas foram reconhecidas pelos órgãos de notícias.

    Enfim, apresentarei um resumo das propostas sobre a Educação para as Eleições 2018 nos sites indicados na seguinte sequência: Jair Bolsonaro (PSL), Fernando Haddad (PT), Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB), Marina Silva (REDE), (João Amoedo) NOVO, Álvaro Dias (PODEMOS), Henrique Meirelles (PMDB); Guilherme Boulos (PSOL); Cabo Daciolo (PATRIOTA), Vera Lúcia (PSTU), João Goulart Filho (PPL), José Maria Eymael (DC).

    Eleições 2018
    As propostas dos dois partidos que disputam a primeira colocação na intenção de votos (acima de 20%) segundo a pesquisa do Ibope de 26 de setembro para as Eleições 2018

    • PSL: não admitir ideologia de gênero nas escolas; diminuir o percentual de vagas para cotas raciais; ampliar o número de escolas militares e impor a participação das Forças Armadas na diretoria das instituições educacionais; adoção da educação à distância no Ensino Fundamental, Médio e universitário; mudanças no método de ensino (com “mais matemática, ciências e português”); expurgar a ideologia de Paulo Freire; investir em parcerias privadas e colaboração com instituições da Ásia.

    • PT: investir 10% do PIB na educação pública; revogar a emenda do teto de gastos; promover uma Escola com Ciência e Cultura para valorizar a diversidade (em contraponto à Escola Sem Partido); priorizar a reforma do ensino médio; expandir as matrículas nos ensinos técnico, profissional e superior; valorizar e qualificar os professores (com a Prova Nacional para Ingresso na Carreira Docente na rede pública de educação básica); promover a inclusão digital.

    As propostas com chances relativas (intenções de voto entre 5% e 5%) de concorrer ao planalto nas Eleições 2018

    • PDT: revogar a emenda do teto de gastos; expandir o ensino integral com creches e Escolas Profissionalizantes com Ensino Médio integrado ao Ensino Técnico; elevar a média de anos de estudo da população; ampliar a oferta de vagas nas universidades públicas; fortalecer o CNPq e suas instituições de pesquisa (repassar 2% do PIB o gasto para Ciência e Tecnologia); valorizar os professores (com programas de iniciação docente, estágio e mentoria); combater a evasão escolar; definir critérios para a escolha de diretores; manter o ProUni e o Fies, além de programas de bolsa para pós-graduação e a criação de novos convênios com outras instituições ; eliminar o analfabetismo escolar; garantir a permanência e a conclusão na idade adequada; adotar uma base nacional comum curricular; aprimorar a formação e seleção de professores; promover a Educação de Jovens e Adultos.

    • PSDB: expandir o ensino integral; priorizar a educação básica; investir na formação e qualificação dos professores; melhorar os índices no Pisa (exame internacional de avaliação do Ensino Médio); fortalecer o ensino técnico e tecnológico; estimular parcerias entre universidades, empresas e empreendedores; promover a educação para idosos.

    • REDE: expandir o ensino integral; criar uma Política Nacional Integrada para a Primeira Infância; valorizar os professores; promover uma escola pública e laica; incentivar a política de cotas nas universidades; cumprir as metas do Plano Nacional de Educação (PNE).

    Eleições 2018As propostas com menos chances (intenções de voto entre 2% e 5%) de concorrer ao planalto nas Eleições 2018

    • NOVO: distribuição de valores monetários para os mais pobres pagarem por serviços privados; Prouni para os Ensinos Infantil, Fundamental e Médio; priorizar a educação infantil; ampliar o ensino médio-técnico; introduzir o pagamento de mensalidades em universidades públicas; melhorar a gestão das escolas.

    • PODEMOS: expandir o ensino integral; priorizar a educação infantil e o ensino fundamental; universalizar o acesso, a permanência e o aprendizado de qualidade nos Ensinos Fundamental e Médio; combater as desigualdades entre as regiões do país; capacitar os professores.

    • PMDB: priorizar a educação infantil; promover a Escola sem Partido.

    As propostas praticamente sem chances (menos de 2% das intenções de voto) de concorrer ao planalto nas Eleições 2018

    • PSOL: revogar o teto de gastos; criar um Sistema Nacional de Educação; valorizar os professores; priorizar a educação infantil; investir em universidades públicas e Institutos Federais; retomar o investimento em pesquisa; acabar com as parcerias entre Estado e iniciativa privada; revogar a Reforma do Ensino Médio e a Base Nacional Comum Curricular.

    • PATRIOTA: expandir o ensino integral; investir 10% do PIB na educação pública; acabar com ideologia de gênero nas escolas; erradicar o analfabetismo; combater a evasão; valorizar as atuais universidades federais, ampliando os campi e criar novas universidades públicas.

    • PSTU: investir 10% do PIB na educação pública; encarar o ensino e o acesso ao conhecimento como um direito e não como serviço ou mercadoria; estatizar todas as instituições privadas de ensino; acabar com o vestibular; promover as cotas raciais e sociais; acabar com o ensino religioso ou confessional.

    • PPL: expandir a educação em tempo integral; investir 10% do PIB para a educação; revogar o teto de gastos; federalizar o ensino básico; equiparar o piso salarial do Ensino Básico ao piso dos Institutos Tecnológicos; educação infantil; capacitar os professores; promover a acessibilidade do cidadão LGBT.

    • DC: expandir a educação integral; promover o ensino público universitário e cursos profissionalizantes; introduzir a disciplina Educação Moral e Cívica no Ensino Fundamental.

    PensadorBreve análise das propostas apresentadas pelos partidos para as Eleições 2018

    A intenção da análise não é se aprofundar teoricamente nos conceitos da área da Educação, mas apenas comparar alguns aspectos que surgiram nas propostas dos candidatos à presidência nas Eleições 2018. Muitas outras interpretações poderiam ser propostas e mesmo as que foram sugeridas, poderiam ser mais aprofundadas. Entretanto, preferiu-se apenas abrir alguns pontos para reflexão, para que cada eleitor pense, ou tente pensar, por si mesmo. Então, apenas podemos desejar que as reflexões sejam frutíferas para (re)pensar a postura dos candidatos em relação à Educação.

    Educação em tempo integral e a preocupação com a educação Infantil e Básica

    Um aspecto bastante presente em vários partidos é o conceito de educação integral. Foi o item mais citado. Outro aspecto também bastante presente foi a preocupação com a Educação Infantil e Básica e com o ensino técnico-profissionalizante, ainda que bem menos presente.

    O Ensino Superior e o desenvolvimento de pesquisas

    Posto que, em relação ao nível superior de ensino, nem todas as propostas revelam preocupação com o Ensino Superior ou o desenvolvimento da pesquisa, fica-se sem saber como será a formação dos professores. Com efeito, quando presentes, as propostas podem até ser consideradas antagônicas, variando desde a radical privatização das instituições privadas até o pagamento de mensalidades em universidades públicas ou o incentivo a parcerias público-privada. Em suma, deve-se relembrar que as empresas privadas “usam” os recursos das universidades para desenvolverem produtos de seus interesses. Entretanto, como as universidades brasileiras são em sua grande maioria públicas, o resultado das pesquisas deveria ser socialmente compartilhado e não restrita a interesses “comerciais”, afinal, são publicamente financiadas.

    O financiamento e a administração da Educação

    Surpreendentemente, considerando o financiamento, alguns partidos indicam o investimento de 10% do PIB na educação pública, mas a maioria não chega nem a mencionar possíveis percentuais de investimento. Ainda que tal informação possa ser considerada de extrema relevância para o planejamento e futuro da nação, nenhum valor ou índice é explicitado. Similarmente, e ainda pior do que a falta deste tipo de informação, há uma relativamente baixa preocupação em relação à formação e valorização dos professores. Ao mesmo tempo em que tal consideração não aparece em muitas propostas, indica-se o Ensino Básico como prioridade. Mas, como priorizar o Ensino Básico sem considerar a formação, necessariamente superior, dos professores?

    Ainda que a preocupação com os professores não tenha aparecido em várias propostas, a preocupação com a administração das escolas apareceu até de forma distorcida em algumas poucas propostas. Contudo, deve-se analisar que a Educação deveria ser considerada um bem comum e não um bem privado, pois deveria ser a base para formação do cidadão. Em outras palavras, a república e a democracia só se sustentam com indivíduos bem formados e capazes de avaliar as propostas dos partidos em todas as eleições. Dessa forma, por meio da Educação, torna-se possível escolher em quem votar com autonomia e consciência das implicações de suas escolhas.

    A escola NÃO deve ser vista como uma empresa

    Portanto, dirigir uma escola não pode ser comparada à administração de uma empresa ou de instituições extremamente hierarquizadas. Por exemplo, uma empresa privada pode falir enquanto que a Educação é algo tão sério que não pode ter nenhuma possibilidade de falência no desenvolvimento da população. Nesse ínterim, a escola deve sempre buscar o aprimoramento de toda a coletividade. Não apenas para aumentar um suposto lucro em favor de alguns e detrimento de outros. Nesse sentido, não dá para escolher um público-alvo, é necessário que a formação seja a melhor possível para todos.

    Dessa forma, propostas como a de impor a participação das Forças Armadas na diretoria das instituições educacionais ou simplesmente de “melhorar a gestão das escolas” devem ser consideradas com muita atenção e até algum distanciamento racional, pois, nem no Exército, a transparência na gestão e na concorrência de licitações podem ou devem ser idealizadas.

    A transmissão de conhecimentos e a formação dos estudantes

    Além disso, se é preciso reconhecer que, para melhorar a escola como um todo e, mais especificamente, a formação dos estudantes, não é suficiente apenas a transmissão de determinados conhecimentos. Deve-se ensinar a pensar e não apenas a obedecer e reproduzir o que já é conhecido. Ou seja, percebe-se a falta de sentido em propostas tradicionais e conteudistas como “introduzir a disciplina Educação Moral e Cívica no Ensino Fundamental” ou “mudanças no método de ensino – com mais matemática, ciências e português”.

    Por exemplo, para uma escola plural, na qual se aprenda a refletir sobre os mais variados valores, não deve haver espaço para restrições em relação ao que se pode ou não conhecer. Dessa forma, propostas como “Escola sem partido”, além dos conteúdos tradicionais, limitam a capacidade de reflexão dos estudantes. De fato, limitará também suas atuações futuras na sociedade, inibindo a capacidade de identificar e reconhecer as diferentes formas dos partidos apresentarem suas ideias e propostas. Portanto, terão dificuldade em escolher o que for mais adequado para si mesmos e para seu círculo social.

    A preparação dos futuros eleitores

    Não se trata de preservar os estudantes de conhecimentos inapropriados mas de prepará-los para evitar a adesão à imposições de figuras messiânicas ou palavras de ordem com sentido esvaziado. Por exemplo, permitirá associar, reconhecer e relacionar discursos em formas de promessas que não foram cumpridas quando algum dos postulantes teve a oportunidade de estar em outras instâncias estaduais e municipais de governo, como ao afirmar que se irá “investir na formação e qualificação dos professores”, mas não aceitar discutir as reivindicações de professores e colocar a polícia para reprimir (violentamente) suas manifestações.

    Ou então, pedir para ser chamado pelo profundo conhecimento de Economia, mas sem detalhar as pretensões sobre Educação. Afinal, governar não é apenas se preocupar com a Economia, mas deveria ter preocupações muito maiores com toda a população. Então, pior ainda, quando se assume não entender nada sobre Economia e se fez “sugestões” pouco razoáveis sobre a militarização da escola, a qual visa a impor obediências aos estudantes e não estimular a criatividade e o amor pelo conhecimento.

    Conclusão

    Portanto, se realmente queremos um Brasil mais educado, precisaremos conhecer melhor, no momento das eleições, as propostas dos candidatos para a área da Educação. De pouco adianta gravar um vídeo para aparecer em rede nacional, que nem sabemos para que será usado. Assim, seria preciso, e até mesmo mais coerente, ter clareza sobre o que é uma Educação de qualidade e como ela poderia ser melhorada. Contudo, a democracia, para um funcionamento ideal, infelizmente demanda esforço de compreensão e análise das propostas dos futuros governantes já nas eleições. E não só dos candidatos a órgãos majoritários, mas também de senadores e deputados federais e estaduais…

    Referências

    BBC NEWS. Eleições 2018: as propostas de todos os candidatos a presidente do Brasil. 17/08/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

    DESTAK. Educação: compare as propostas dos candidatos à Presidência da República. 28/08/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

    DUNDER, K. O que os candidatos à Presidência prometem para Educação e Cultura. 04/09/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

    FRAGA, O.; ELER, G. Como os candidatos tratam da educação nos planos de governo. 25/08/2018. Acesso em: 25 set. 2018.

  • As Propostas para Ciência dos Candidatos à Presidência de 2018, Segundo Seus Programas de Governo

    Texto por Lucas Rosa

    Esse ano, toda a nação se reunirá para decidir seu governante pelos próximos 4 anos. É a época onde diversas das questões são trazidas à mente do brasileiro; saúde, educação e segurança são amplamente discutidas na televisão. Historicamente, a ciência tem ficado de lado nesses debates, raramente sendo o ponto focal de qualquer candidato. Esse ano, mais do que nunca, a ciência brasileira precisa estar em pauta. 2018 e os próximos anos serão cruciais para decidir o destino do país pelas próximas décadas; com os cortes recentes da verba de ciência e tecnologia, o desenvolvimento brasileiro se tornará irreversivelmente defasado caso esses cortes não sejam revertidos. Se o próximo presidente não estiver disposto a priorizar a restauração dessa verba, podemos dar adeus às perspectivas de um Brasil desenvolvido no futuro próximo.

    Recentemente, tivemos uma iniciativa excelente para tentar mudar esse cenário, que foi a Sabatina com os Presidenciáveis organizada pelo Disperciência e o Science Vlogs Brasil. Essa sabatina contou com a presença de quase todas as candidaturas, seja na figura do candidato em si ou através de um representante (com três exceções: Manuela D’Ávilla (que não é mais candidata) e Geraldo Alckmin, que alegaram incompatibilidade de horários, e Jair Bolsonaro, que sequer respondeu ao convite da organização). Caso você não tenha visto, sugiro fortemente que veja o debate CLICANDO AQUI.. Ele é longo, sim, mas o seu país precisa que o seu voto seja informado. Vá assistindo ao longo de vários dias se necessário, mas faça-o.

    Essa semana, tivemos a divulgação dos planos de governo de todos os principais candidatos à corrida presidencial. Assim, resolvi dar uma olhada em todos eles e averiguar o que cada candidato tem em mente para resolver a situação da ciência no país.

    Farei o possível para afastar os meus viéses (Afinal, não sou uma máquina – tenho meus candidatos favoritos e, principalmente, os que sou veemente contra). O intuito aqui será avaliar as propostas conforme estão no plano de governo, emitindo a minha opinião. Peço aos leitores que façam o possível para fazer o mesmo – e, acima de tudo, evitem cair no fanatismo. Se eu falei mal do plano de governo do(a) seu(ua) candidato(a), não significa necessariamente que eu estou tendo favoritismos, que eu sou [insira aqui seu rótulo favorito] ou que eu sou incapaz de entender a genialidade do(a) candidato(a). Às vezes a ideia é só uma merda mesmo. E você precisa estar apto à avaliar criticamente o(a) seu(ua) candidato(a) e ser capaz de reconhecer que ele(a) é capaz de errar. Cultos à personalidade, historicamente, são uma cilada tremenda (vide Mussolini, Hitler, Mao Zedong, Stalin, etc)

    Sem mais delongas, vamos aos planos. Clicando no nome do candidato, você terá acesso ao plano de governo completo do mesmo. Os candidatos estão ordenados por ordem de intenção de votos NESSA pesquisa recente, e ordem alfabética em caso de empate.

    Haddad (PT)

    ATENÇÃO: Essa seção foi feita antes da impugnação da candidatura do Lula e anúncio do Haddad como candidato. Assim, a análise abaixo é do programa de governo do Lula (E suponho que o do Haddad seja similar)

    A primeira aparição da palavra “ciência” no programa é em um parágrafo falando sobre políticas visando promover representatividade feminina na sociedade de forma geral, onde menciona “o
    incentivo à produção de ciência e tecnologia pelas mulheres”. Obviamente é positivo expandir a participação feminina no mundo científico. Também propõe o Programa Escola com Ciência e Cultura, que, segundo o programa,  transformará “as unidades educacionais em espaços de paz, reflexão, investigação científica e criação cultural”. Bonito, mas os termos são vagos – significa ensinar metodologia científica no ensino fundamental e médio? Significa ampliar laboratórios de ciências nas escolas? Significa colocar alunos em contato com cientistas e trabalhos científicos? Não sabemos.

    Então, o programa do PT promete ampliar os investimentos em ciência, tecnologia e inovação – mas não diz para quanto, nem que medidas específicas pretende tomar para isso. Isso é repetido posteriormente no Programa. Também propõe ” intensificar o diálogo da cultura com outros campos, como a educação, a ciência e tecnologia, a comunicação, o esporte, a saúde, a economia e o turismo”. Novamente, o que isso significa, especificamente?

    Em parágrafo posterior, reconhece a necessidade de investimentos em ciência e tecnologia como pré-requisito para um modelo de desenvolvimento.

    Finalmente, chegamos à uma seção específica para falar de ciência e tecnologia, o que é bastante positivo (e presente em surpreendentemente poucos dos planos de governo). Reafirma nessa seção a importância de investimentos significativos no ramo, e propõe algumas ideias. A primeira é a criação do Sistema Nacional de Ciências, Pesquisas e Inovação (C,P&T) que, pelo que eu entendi, seria um sistema para integrar a produção científica pública e privada, aproximando as duas. Sinceramente não entendi bem a proposta. A segunda proposta é sobre a ampliação do comércio externo e utilização cooperativa de recursos com outros países. Não fica 100% claro a relação deste item com ciência – pesquisas colaborativas? Exportação de tecnologia? Enfim. Também propõe recriar o Ministério de Ciência e Tecnologia (atualmente fundido ao de comunicações), uma decisão acertada ao meu ver (seria bom preenchê-lo por mérito e não por jogo político, mas essa é outra história…); por fim, o programa propõe retomar o direcionamento de recursos do Fundo Setorial do Petróleo ao Fundo Nacional de Ciência e Tecnologia. Essa proposta me agrada não só por ser maior financiamento para ciência, mas por ser uma proposta concreta.

    No geral, não achei o programa ruim, mas também não achei dos melhores. Ele reforça várias vezes o compromisso de aumentar o orçamento, mas não diz para quanto. Gostaria de uma porcentagem razoável do PIB (2 ou 3%) sendo fixada para isso. No mais, achei o plano meio vago. Parece estar com boas intenções, mas não com a atenção devida para o tema, e a estruturação devido.

    Jair Bolsonaro (PSL)

    O candidato possui uma seção dedicada à ciência e tecnologia no plano de governo, o que é um ponto positivo, bem como uma estruturação de um plano de fato, invés de apenas promessas – outro ponto positivo. A seção se debruça principalmente sobre a intenção do candidato de melhorar a relação da ciência com o mercado privado, tomando como exemplo hubs tecnológicos de países mundo afora. O programa realça a importância (na opinião do candidato) dos universitários terem uma formação empreendedora, buscando transformar os conhecimentos adquiridos em produtos e negócios, e a importância de aproximar a academia do mercado. Por fim, também destaca a importância do Brasil aproveitar os seus recursos e oportunidades – como o desenvolvimento de formas sustentáveis de energia (assunto que, de fato, somos um país com plenas condições de nos tornamos líderes) e procurando novas e inovadoras aplicações com nióbio e grafeno, dois produtos naturais abundantes no Brasil.

    Vamos começar pelos pontos positivos. O plano me surpreendeu positivamente. De fato, o Brasil se beneficiaria bastante de uma melhor integração entre a academia e a iniciativa privada e um maior aporte de recursos da iniciativa privada em pesquisas de tecnologia aplicada. Realmente no mundo inteiro há investimentos privados no setor de ciência e tecnologia, e o Brasil é deficiente nessa integração. Também fiquei feliz em observar essa valorização das capacidades energéticas do Brasil. Essa é uma tecla que eu bato bastante: nós estamos com a faca e o queijo na mão para nos tornarmos líderes do setor energético mundial conforme a mudança da matriz energética for se solidificando no século XXI (E isso é inevitável, graças ao aquecimento global. Negacionistas podem chorar e mentir à vontade, quando as temperaturas começarem a trazer malefícios econômicos ao setor agrário, por exemplo, os países serão forçados a procurar alternativas aos combustíveis fósseis). O Brasil precisa correr atrás, e logo, de desenvolver formas alternativas de energia ou aperfeiçoar as já existentes (hidrelétrica, eólica e solar são todas possíveis de serem aplicadas no país e, portanto, de serem estudadas e aperfeiçoadas por nós), estabelecendo-se assim como líder nesse mercado para poder aproveitar essa demanda que vai chegar mais cedo ou mais tarde. E, por mais que muitos zoem o Bolsonaro por ele botar fé demais no nióbio e no grafeno (não, eles não são a fórmula mágica para a solução de todos os problemas), vale a pena sim estudar esses materiais e procurar novas e inovadoras aplicações – porque, novamente, se conseguirmos, nós seríamos os líderes imediatos do mercado, por possuirmos amplas reservas desses recursos.

    O problema do programa do Bolsonaro não é o que ele contém, mas sim o que falta. O foco excessivo na iniciativa privada é preocupante porque, ainda que eu ache sim que o Brasil precisa melhorar nesse aspecto, a iniciativa privada jamais pode substituir os investimentos públicos em ciência, e sim complementá-los. Simplificando um pouco: A ciência se divide em ciência básica e ciência aplicada. A ciência aplicada pode e deve receber investimentos da iniciativa privada; isso é útil para liberar os recursos públicos para serem aplicados majoritariamente na ciência básica, que é a ciência que estuda os fenômenos meramente para entendê-los, não necessariamente para gerar uma tecnologia deles. E essa relação é simbiótica: A ciência básica é o pântano de ideias que a ciência aplicada extrai a sua “matéria prima intelectual”, por assim dizer; a ciência aplicada, por sua vez, fornece ao público leigo a justificativa para os investimentos públicos para manter a ciência básica.

    É importante entender que ciência básica não é ciência inútil. Primeiro porque o propósito da ciência não é (só) gerar tecnologia, mas sim entender o mundo em que vivemos; e segundo porque, como eu expliquei, a ciência aplicada depende da existência da ciência básica. Ilustrando com um exemplo: As tecnologias de comunicação que possuímos hoje (rádio, TV, computador, etc) só se tornaram possível quando James Maxwell conseguiu compreender o fenômeno do eletromagnetismo. Maxwell era um cientista de ciência básica – ele não estudava o eletromagnetismo com o intuito de criar rádios e televisões, e sim para entender esse fenômeno da natureza. Porém, quando o fenômeno foi entendido, essa aplicação se tornou possível por outros cientistas. Ou seja, o governo precisou sustentar as pesquisas “inúteis” de Maxwell para que nós tivéssemos uma base sólida o suficiente para tornar possível o desenvolver aparelhos de comunicação.

    E esse é o tipo de investimento que a iniciativa privada jamais faria, porque os ganhos são incertos e, muitas vezes, à longuíssimo prazo. Por isso é preciso tomar cuidado com essa noção que a solução para a ciência é deixar a iniciativa privada cuidar dos investimentos. Essa deve sim ser uma prática complementar, permitindo assim uma maior liberação de recursos públicos. O programa de Bolsonaro só menciona a primeira metade, sem mencionar seus planos para a pesquisa básica e sem se comprometer a manter os investimentos públicos em ciência. Esse silêncio é preocupante.

    Com essa ressalva, porém, eu diria que o plano de Bolsonaro é aceitável. É certamente melhor que o silêncio ou promessas vagas de alguns candidatos supracitados.

    Geraldo Alckmin (PSDB)

    A única referência à ciência no Programa é uma proposta de estimular parcerias entre universidades e empresas, trazendo o setor privado para próximo do setor científico de forma a aumentar a produtividade e competitividade brasileira. O programa especifica que essa aproximação seria para o setor aplicado, mas não diz nada sobre o que pretende fazer com o setor de ciência básica, ou quais serão as medidas tomadas para combater os catastróficos cortes recentes no orçamento científico. Na minha opinião, o programa está incompleto no que diz respeito às necessidades do setor científico neste momento do país.

    Marina Silva (REDE)

    O programa de Marina reconhece logo no início a importância dos investimentos em ciência e tecnologia para o desenvolvimento do país. Chega até a pincelar um reconhecimento da importância de difundir esse conhecimento na sociedade, mas não fica claro se ela fala especificamente da divulgação científica, ou apenas do acesso da sociedade aos frutos desse conhecimento. De qualquer forma, ambos são importantes.

    O programa possui uma seção específica sobre ciência e tecnologia – o que, como repeti várias vezes nessa matéria, é um ponto positivo, demonstrando que a candidata reconhece a importância do tema. A seção começa com um reconhecimento do problema, chamando-o de a maior crise da história da ciência brasileira (o que, de fato, é). Marina afirma que seu governo reconhece a ciência como investimento, e não gasto (uma visão acertada). A candidata se compromete a trabalhar para tentar garantir 2% do PIB para financiamento de ciência e tecnologia, e propõe recriar o Ministério de Ciência e Tecnologia (separado do de Comunicações). Além disso, Marina afirma que a inovação brasileira é precária, se referindo aqui especificamente à empresas, que tem poucos retornos em investimentos de pesquisa e desenvolvimento. Ela propõe combater isso reduzindo tarifas e remoção de barreiras e entraves burocráticos para a importação de materiais, serviços e equipamentos a serem usados em ciência, tecnologia e inovação. Por fim, Marina pretende facilitar a vinda de cientistas de fora do Brasil pra cá (uma “fuga de cérebros” ao contrário) e fortalecer a relação universidade-empresa.

    Gostei muito do que vi no programa da Marina. Ele é sucinto, mas direto ao ponto, reconhece efetivamente o problema e tem boas propostas para solucioná-lo, algumas bastante específicas. Um dos melhores programas, ao meu ver, para a ciência e tecnologia.

    Ciro Gomes (PDT)

    O programa de Ciro Gomes possui uma seção específica para lidar com ciência e tecnologia, o que é bastante positivo. Nela, o candidato faz um bom resumo dos problemas enfrentados pela ciência brasileira – a fuga de cérebros, a falta de modernização, a burocracia. Então seguem-se uma série de propostas – elaborar um plano nacional de ciência e tecnologia, buscando tornar o esforço científico mais eficiente e mais próximo do setor privado; colocar a ciência e tecnologia nacional para fomentar o setor produtivo; fortalecer o CNPq, estimular a aplicação do conhecimento ao setor tecnológico e aproximar o setor empresarial das universidades. Neste último item, ele propõe ideias mais concretas: auxiliar empresas que atuam no país a construir centros de pesquisa por aqui, e estimular a contratação de pesquisadores por essas empresas, permitindo o pagamento de bolsas à esses pesquisadores, pelo que entendi. Se for isso, seria excelente; você permitiria que as agências de fomento fornecessem bolsas à pesquisadores trabalhando no setor privado, o que significa que a empresa receberia um profissional altamente qualificado para desenvolver pesquisa e desenvolvimento à custo baixo, e o pesquisador teria mais opções de carreira além de simplesmente se tornar professor universitário.

    Também propõe uma divisão de recursos para investimento em ciência; parte iria diretamente para a universidade para ela alocar onde achar melhor (Basicamente como é hoje), mas a outra parte seria direcionada à estimular pesquisas em assuntos estratégicos que “atendam as demandas da sociedade”. Se isso for associado a um aumento nos investimentos de forma geral, pode ser uma boa ideia. Ela respeita a importância da ciência básica, mas também trabalha para aproximar a academia da iniciativa privada, que é uma excelente medida, ao meu ver, como já discorri acima. O programa menciona também criar um conselho superior de política de ciência e tecnologia, o que pode ser uma boa ideia se for composto de cientistas – e uma péssima ideia se for composto de políticos. Reforça como dois setores chaves o setor de fontes de energia renovável (que concordo, como disse acima no item do Bolsonaro) e da “indústria 4.0” – a digitalização e automação dos meios de produção, outro setor absolutamente crítico para este século.

    O programa também discorre um pouco sobre a importância de estabilizar o financiamento científico – absolutamente crucial, como disse na introdução – e propõe novas maneiras de viabilizar financiamento científico, incluindo a criação de fundos de investimento. Também propõe algo extremamente importante: A desburocratização da importação de materiais para ciência, algo que prejudica extremamente o andamento eficaz da ciência brasileira. Por fim, Ciro promete melhoras no sistema de patentes e propriedade intelectual, buscando desburocratizar e aumentar a segurança jurídica do processo, facilitando a integração entre universidades e empresas.

    No geral, achei o programa do Ciro extremamente positivo. Ele reconhece a importância do investimento em ciência básica, mas também procura maneiras de estimular o investimento privado em ciência aplicada. Só tenho uma crítica, mas bem pequena: Faltou formalizar uma porcentagem do PIB para investimento em ciência. O Ciro já declarou intenção de investir 2% do PIB – meta brasileira há anos, nunca alcançada – em outras ocasiões, mas eu queria ver isso no papel. Ainda assim, um dos melhores planos entre os analisados.

    Álvaro Dias (PODEMOS)

    Uma das grandes propostas de Álvaro Dias nos debates tem sido o seu “Plano de Metas”, contendo 19 metas divididas em Sociedade, Economia e Instituições. A Ciência aparece como a Meta 4 dentro das Metas de Sociedade, junto de Cultura e Turismo. Me é um pouco estranho colocar a ciência junto desses outros dois itens, uma vez que eles não tem muita relação com a Ciência. Também passa aquele ar de “segundo plano”. Mas isso talvez seja só uma interpretação errônea minha.

    A próxima vez que a palavra ciência aparece no documento é nas diretrizes do plano de metas; o item “Ciência, Cultura e Turismo” propõe um “Programa Nacional de Inovação”, mas não explica o que seria esse programa, nem como ele vai ajudar a ciência brasileira.

    Não tem muito material para abordar aqui. O programa diz que tem ciência como uma das prioridades (Uma das 19, pelo menos…), mas não traz nenhum plano, nenhuma proposta concreta. Gostaria de ouvir mais do candidato sobre o que é esse Programa Nacional de Inovação.

    Cabo Daciolo (PATRIOTA)

    Em seu programa de governo, o candidato Daciolo reconhece a importância de políticas públicas em diversas áreas, entre elas a ciência. Também afirma que apenas 8% das escolas públicas do país possuem laboratório de ciências, e permite alocar mais recursos públicos para aumentar esse índice (entre outros citados no mesmo parágrafo). Em outro parágrafo, se compromete a valorizar ciência e tecnologia, mas não desenvolve o raciocínio, concluindo com uma promessa de aumentar o número de institutos federais de formação técnica. Por fim, no final do programa, afirma que quer tornar o Brasil um país utilizador de matérias-primas invés de exportador das mesmas, citando que podemos então aplicar essas matérias-primas em áreas de ciência e tecnologia para produzir bens finais de consumo interno. Conclui o parágrafo dizendo que ” IREMOS FIGURAR ENTRE OS PAÍSES MAIS DESENVOLVIDOS DO PLANETA.” (Com caps-lock ligado mesmo).

    Também acho que o Brasil pode ser um dos países mais desenvolvidos do planeta (com caps-lock opicional), e explico melhor como no parágrafo sobre o programa do Bolsonaro. Quanto ao programa do Cabo Daciolo, senti falta de propostas concretas e de um compromisso claro com a restauração dos níveis de investimento público em ciência.

    João Amoedo (NOVO)

    A palavra ciência só aparece uma vez no texto, em uma proposta que diz “Novas formas de financiamento de cultura, do esporte e da ciência com fundos patrimoniais de doações.”. Fundos patrimoniais são basicamente grandes montantes de dinheiro, geralmente doados por alguém, que são investidos e seus rendimentos usados para investir em objetivos diversos. Um exemplo famoso são a Fundação Rockfeller e a Fundação Bill e Melinda Gates. O candidato também menciona a ciência na proposta “Universidades: melhor gestão, menos burocracia, novas fontes de recursos não-estatais e parcerias com o setor privado voltadas à pesquisa.”

    A ideia de fazer isso no Brasil não é ruim. De fato, o Instituto Serrapilheira, fundado ano passado, é basicamente isso, e eu adoraria ver mais iniciativas do tipo se proliferando. Porém, é o mesmo que eu falei acima: Essa é uma prática complementar, não fundamental. Essa não pode ser a espinha dorsal do financiamento científico no país, ou a ciência brasileira quebra. Acho ótimo visar aproximar o setor privado da academia e das pesquisas aplicadas brasileiras, mas a ciência está em crise por falta de financiamento público, e a falta de comentários do candidato sobre isso é preocupante. Não será suficiente aproximar a iniciativa privada da ciência e se dar por satisfeito; é necessário também restaurar – ou, se possível, ampliar – o financiamento público em pesquisa.

    Henrique Meirelles (MDB)

    A palavra “Ciência” sequer aparece em todo o documento. Eu dei uma lida geral e realmente não encontrei nada. Acho bastante triste o candidato do maior partido do país não dedicar uma linha do seu programa de governo à ciência. Gostaria de ver um compromisso formalizado com a ciência por parte do candidato.

    Vera Lúcia (PSTU)

    As palavras “ciência”, “pesquisa”, “tecnolgia” e “inovação” sequer aparecem no texto em momento algum. Booo.

    Eymael (DC)

    O eterno democrata cristão, do jingle que gruda feito chiclete (você está cantando agora, não está?) só menciona uma vez alguma coisa relacionada à ciência, até onde pude ver: Ele propõe a criação do Plano Nacional de Apoio à Pesquisa, “tanto em seu aspecto de investigação pura, como no campo da pesquisa aplicada”. Fico feliz que o candidato reconheça a distinção e a importância de ambas, mas ele não diz o que é esse plano e como isso vai ajudar a ciência, tampouco menciona qualquer coisa sobre a crise orçamentária atual. É melhor do que o nada de alguns candidatos, mas gostaria de ter mais detalhes sobre esse Plano.

    Guilherme Boulos (PSOL)

    O plano de Guilherme Boulos é campeão absoluto em comprimento – 228 páginas, bem mais que o dobro dos outros programas extensos como o de Bolsonaro, Haddad/PT e Ciro. O programa reconhece a crise de investimentos na ciência, culpabilizando os cortes na área pela grave recessão que o país enfrenta. O programa realça que deseja combater a prática da Cura Gay e similares, que classifica (acertadamente) de pseudocientíficas. No item 4 do Programa, o candidato que a produção do conhecimento será um dos eixos do desenvolvimento do país. Reafirma o compromisso em manter a autonomia universitária e o aumento dos investimentos. Propõe a criação de um programa de fomento à inovação, pesquisa e desenvolvimento, buscando articular as áreas econômicas e sociais com a científica – o que, ao meu ver, é meio vago. A seção critica pesadamente os cortes e a dissolução do ministério de ciência e tecnologia através da sua fusão com o ministério de comunicações. Reconheceu o papel da luta política dos cientistas, que se fortaleceu esse ano, contra os cortes. Propõe fortalecer a cooperação internacional, promovendo mobilidade de pesquisadores e facilitando o reconhecimento de títulos entre os países. Por fim, faz três propostas: Refazer o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, ampliando seu orçamento; aplicar o Marco Legal da Ciência, já aprovado no Congresso (Se quiser saber mais sobre o marco, leia AQUI); e elaborar um Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, articulando sociedade, setores produtivos e academia, estabelecendo uma política estratégia de pesquisa com metas a curto, médio e longo prazo, e estruturado de forma a não ficar vulnerável às mudanças de governo posteriores. Afirma que esse programa deve possuir mecanismos de controle para evitar uso irresponsável de dinheiro, mas reconhece a necessidade de autonomia acadêmica – o que é ÓTIMO. Deixe a ciência para os cientistas, e apenas mantenha o olho neles. Dito isso, queria mais detalhes de como esse plano vai ser elaborado – suponho que o candidato não tenha essas metas já em mente (o que é um acerto – novamente, deixe os cientistas decidirem isso), mas não fala quem vai compôr a elaboração desse projeto, etc.

    Em outro ponto do Programa, Boulos propõe o desenvolvimento de uma política de ciência e tecnologia para o setor farmacêutico, com laboratórios e instituições públicas como pilares centrais, que atenda às demandas do SUS. Isso me parece uma ideia arriscada. Laboratórios públicas não devem ser fábricas de remédio – isso quase aconteceu no caso desastroso da fosfoetanolamina, com consequências catastróficas. No caso de alguns candidatos, eu expressei preocupação que eles quisessem integrar a iniciativa privada em coisas onde ela não serve; aqui temo que seja o caso contrário, colocar a iniciativa pública em algo que fica melhor nas mãos do mercado.

    De qualquer forma, achei um plano sólido, bem-fundamentado. Gostaria de mais especificidade em alguns pontos, mas poucos programas delineiam tão bem o problema atual de financiamento da ciência quanto o programa do PSOL.

    João Goulart Filho (PPL)

    Sim, isso mesmo, o filho do ex-presidente João Goulart está concorrendo. Eu descobri isso pesquisando para este texto. Vivendo e aprendendo.

    O plano de governo do candidato possui uma seção extensa dedicada à ciência e tecnologia. Nessa seção, ele prioriza a restauração do ministério de Ciência e Tecnologia, desfazendo a fusão com o Ministério de Comunicações que foi realizada no governo anterior, e que o candidato João Goulart chama de “desastrosa”. Além disso, o candidato se compromete à ampliar o percentual de investimento em ciência e tecnologia para 3% do PIB, tal qual boa parte dos países desenvolvidos. O plano de governo do candidato aponta especificamente quais áreas ele pretende priorizar: microeletrônica, informática, telecomunicações, materiais estratégicos, engenharia genética, biomédica, nuclear, aeroespacial e a indústria da defesa, de forma a assegurar a independência nacional. Outro compromisso é o de fortalecer o Programa Espacial Brasileiro, bem como a indústria nuclear nacional, em cooperação com a comunidade internacional. Também reforça o desejo de aproximar universidade e setor privado, principalmente nos setores nucleares, agricultura, medicina e indústria. Por fim, propõe uma taxa de 1% sobre exportações agrárias, dinheiro esse a ser aplicado especificamente em ciência e tecnologia desse setor.

    Eu estou absolutamente chocado com a altíssima qualidade desse plano de governo. As ideias são estruturadas e muito bem planejadas – fica claro que o candidato (ou, mais provável, sua equipe) pesquisaram ostensivamente o assunto. A especificidade do plano me agrada muito. Não é uma promessa vazia e generalista – é uma promessa específica, dizendo onde e porque quer investir, e até bolando planos para tornar esse desejo possível. Pretende trazer investimentos da iniciativa privada aos setores que se beneficiariam dela, mas sem abrir mão da importância da ciência básica. Eu honestamente não consigo ver um defeito relevante para criticar. O candidato definitivamente está no meu radar agora.

    Considerações finais

    Os programas que me deixaram uma impressão positiva foram (em ordem do “pior” para o “melhor”, mesmo considerando todos positivos): Haddad/PT e Bolsonaro (empate técnico), Boulos, Ciro, Marina e João Goulart. Menção honrosa para o do Amoedo, que tá no caminho certo, mas falta algumas coisas. Lembrando que essa classificação é meramente opinião pessoal minha.

    Estou positivamente chocado com a do João Goulart. É uma pena que o candidato seja tão pouco conhecido e não tenha participação nos debates, porque suas pautas para a ciência são muito bem-embasadas. Marina é uma segunda-colocada muito próxima, ao meu ver. O espaço entre o programa de Ciro é um pouco maior, e entre o do Ciro e do Haddad/PT ou Bolsonaro ainda maior. Obviamente, essa é apenas minha opinião baseada no que eu li, e você pode interpretar as coisas de forma diferente.

    Nenhum dos planos de causou revolta (novamente, analisando o que os programas falam apenas sobre ciência). Os programas que me decepcionaram não o fizeram por falar besteira, mas por não falar nada.

    Naturalmente, essas são minhas impressões analisando apenas o programa. Se o candidato efetivamente acredita no que escreveu (ou no que sua equipe escreveu), são outros quinhentos.

    No mais, é isso e espero que tenham gostado, deu um trabalho razoável de fazer.

    Lucas Rosa é colaborador e administrador do blog Mural Científico.

  • Plebiscito: palavra difícil

    Por Luã Leal

    O período entre 1988 e 1993 foi, de fato, bastante agitado para a política no Brasil. Do ângulo da sociologia da cultura, também parece pertinente pensar como esse contexto, marcado nacional e internacionalmente por uma sensação de fim de ciclos, testemunhou a emergência de novos fenômenos midiáticos. Esquecida como peça da engrenagem da redemocratização, a campanha para

    O período entre 1988 e 1993 foi, de fato, bastante agitado para a política no Brasil. Do ângulo da sociologia da cultura, também parece pertinente pensar como esse contexto,  marcado nacional e internacionalmente por uma sensação de fim de ciclos, testemunhou a emergência de novos fenômenos midiáticos. Esquecida como peça da engrenagem da redemocratização, a campanha para o plebiscito de 1993 propiciou, no entanto, a reativação de uma série de imagens para representação do país.

    A regulamentação da propaganda eleitoral, atualmente, está garantida pela Lei nº 9.504/97. A ciência política e o estudos de comunicação já se debruçaram sobre os recursos midiáticos adotados pelas campanhas, mas, em geral, as atenções se voltam à construção de persona ou de agenda política no Horário de Propaganda Eleitoral Gratuita (HPEG). No plebiscito, os lados das duas disputas (parlamentarismo x presidencialismo) e (monarquia x república) revisavam os problemas recentes do Brasil para tecer diagnósticos de como resolver os impasses da jovem democracia após tanto anos de regime militar.

    O Brasil havia acabado de sair do período ditatorial, 1964-1985, e o primeiro presidente civil a inaugurar a Nova República, eleito por voto indireto, faleceu em 1985. O vice José Sarney, então, assumiu devido ao falecimento de Tancredo Neves, ambos membros do Partido do Movimento Democrático Brasileiro. Os tempos eram agitados, instáveis e a roda da história parecia girar muito rapidamente:

    • de agosto de 1984 a julho de 1993, o Brasil teve quatro moedas diferentes: Cruzeiro (1984-1986), Cruzado (1986-1989), Cruzado Novo (1989-1990) e Cruzeiro (1990 a 1993).
    • desde 1960, a primeira eleição com voto direto para presidente da República ocorreu em 1989, com 22 candidaturas, entre as quais sete tiveram mais de 1 milhão de votos no primeiro turno.
    • em dezembro de 1992, o presidente eleito em 1989, Fernando Collor, renunciou e sofreu impeachment.
    • seguindo a Constituição de 1988, no governo de Itamar Franco, vice e sucessor de Collor na presidência, foi convocado o plebiscito sobre a forma e o sistema de governo de 1993.

    Em suma, a República presidencialista aparecia representada como um modo de organizar a política no Brasil em perpétua crise. Na imprensa, pululavam notícias que indicavam a ausência de perspectiva de melhorias para a população tanto nas áreas urbanas quanto nas rurais. Líder do movimento de direitos nos seringais do Acre, Chico Mendes foi assassinado em 1988. Em 1992, na capital paulista, o governador do Acre Edmundo Pinto sofreu um latrocínio. Também em maio do mesmo ano, o esquema de de PC Farias passou a ser investigado em uma Comissão Parlamentar de Inquérito. O movimento “Cara-Pintada” tomou as ruas das grandes cidades. Em outubro, houve o massacre no complexo penitenciário do Carandiru na cidade de São Paulo.

    Nas eleições municipais de 1992, PDT e PT conseguiram, cada um, quatros capitais, o PSB um total de três. O PSDB e o PMDB, respectivamente, venceram em cinco e quatro capitais. Esses partidos seriam protagonistas nas disputas entre parlamentarismo e presidencialismo.

    Entre 1985 e 1988, vale lembrar, houve intensa reorganização partidária, pois nasceram o PFL, o Partido Democrata Cristão (ambos de 1985) e o PSDB (1988), além da retomada das legendas de esquerda como PCdoB, PSB e PCB.

    Em 2018, o plebiscito completa 25 anos de sua realização. Devido à eleição deste ano, surgiram interessantes iniciativas de aproximar os debates das Ciências Sociais da conjuntura política contemporânea. A partir deste ponto da postagem, destacarei estratégias das campanhas durante o plebiscito.

    Na propaganda gratuita sobre a forma e o sistema de governo, a campanha monarquista era identificada pelo slogan “Vote no Rei”. Responsáveis pela comunicação com o eleitorado usaram expressões populares como “entrar na real”, “o sol é o astro-rei” e “quem foi rei nunca perde a majestade”. Outra estratégia era vincular o voto na monarquia como opção de protesto à situação, pois os monarquistas definiram que votar na república era optar pela situação. O jingle monarquista trazia ainda uma ideia potente: a monarquia seria uma resposta baseada na tradição para resolver problemas da modernidade. Para a campanha monarquista, recusar a república poderia colocar o Brasil no nível de desenvolvimento de outras monarquias parlamentaristas como o Japão e a Suécia.

    Trecho da letra do jingle:

    “Fique atento que chegou o dia/ de coroar a democracia/com modernidade a melhor tradição/ é sua vontade dizer sim ou não/ o plebiscito, palavra difícil/ torna mais fácil encontrar a verdade/ nosso passado é o pai do futuro/quem foi rei nunca perde a majestade”.

    Outra ideia recorrente apresentada pela campanha do “Vote no Rei”: o voto na monarquia era garantia de estabilidade, discurso bastante propício para um período de sucessivas crises na República Nova. Interpretando uma garota do tempo, a atriz Cissa Guimarães, por exemplo, apareceu em um peça publicitária explicitando analogias entre as crises de governo e as mudanças meteorológicas. No texto lido pela atriz, havia uma pretensão de explicar ao eleitorado as diferenças entre crises de governo, passageiras e resolvidas pelo primeiro-ministro, e o papel do chefe do Estado, o rei para os monarquistas, como duradouro representante do povo.

    O resultado desse plebiscito e as diferenças entre as campanhas dos republicanos parlamentaristas e presidencialistas abordarei na postagem da próxima semana. Por enquanto, basta informar que a Justiça Eleitoral registrou comparecimento de 74,24% , mais de 67 milhões de votantes. O estado com menor comparecimento foi o Maranhão, com participação de apenas 41,38% do eleitorado.

    Publicado originalmente em: Vértice Sociológico

  • Ciência e política: como atuar mutuamente?

    Texto por Lucas Miguel

    Sempre em ano de eleições, vem a tona o pensamento de como a Ciência será promovida no governo do próximo presidente. Algumas notícias em 2018, como o anúncio de cortes da CAPES e CNPq, deixam um alerta sobre uma possível escassez de recursos. O orçamento está apertando, porém tal situação não é de hoje. Qual a devida ação a ser tomada pelos políticos frente a Ciência? Apoiá-la? Camuflá-la? Deixá-la de lado? A política sempre andou ao lado da Ciência, desde longa data, porém ela é instável.

    Você já deve ter ouvido sobre Galileu Galilei: um cientista queimado por abraçar a sua descoberta sobre o movimento da Terra. Sócrates foi obrigado a tomar cicuta, um veneno letal, ao forçarem a recusar a verdade que ensina. Até mesmo Giordano Bruno, apoiador das ideias copernicanas, morto pela Inquisição. Naquela época, a Igreja era um “órgão” único e sempre lutava contra a presença da intelectualidade junto aos governos. A História sempre nos deu exemplos aonde, após o surgimento de uma ideia contrária a um preceito, simplesmente não se tinha diálogo, apensa execução. Hoje, no século XXI, a conversa entre Ciência e Política, por meio dos governantes, acontece, mas de forma muito lenta.

    Os cientistas em formação, mestrandos e doutorandos, almejam um dia reverter ao mundo aquilo que sua pesquisa científica busca: MUDANÇA. Os políticos brasileiros sempre dizem que mudar é necessário, mas nenhum deles pensa EM COMO MUDAR. Do modo contrário, os cientistas buscam pela IMPLEMENTAÇÃO DESTA MUDANÇA: facilitar a vida da sociedade, resolver problemas. Cientistas, por essência, buscam mostrar que o mundo não é apenas um livro, e sim uma grande biblioteca, pronta para prover e receber conhecimento. Todavia, será que a sociedade pensa o mesmo sobre a ciência brasileira? Visando alcançar o maior número de pessoas, realizamos uma pesquisa de opinião, via Twitter, a qual se encontra abaixo. Agradeço a minha amiga, Jéssica Sales, bacharela em Direito, pela UEMG, e atualmente mestranda na Unimontes, por se propor a me ajudar nessa pesquisa.


    A pergunta foi: “O Brasil investe apenas 0,7% do PIB em pesquisa, cerca de 4x menos que países desenvolvidos. Apesar disso, a Bradicinina, utilizada no tratamento de pressão alta, é 100% brasileira, e responsável por salvar muitas vidas. Sabe disso: você acredita na ciência brasileira?”


    Resultado:
    Número de impressões: 15.989 (total de pessoas que viram o Tweet)
    Número de engajamentos: 1305 (total de pessoas que interagiram com o Tweet)
    Votos: 1021
    SIM: 72%
    NÃO: 28%

    Podemos notar que mais de 15 mil pessoas visualizaram o tweet, no entanto, apenas 8% se engajaram e 6% responderam a pergunta. Esse resultado mostra que uma grande porcentagem dessa fração da população brasileira não acredita ou não se interessa pelo assunto. Quantos brasileiros sabem o papel do Ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação (MCTIC)? Quantos já se interessaram em procurar sobre o papel da ciência na sociedade? Inclusive, muitos projetos do MCTIC são atuantes na sociedade, como o Gesac, o Cidade Digital e o Centro de Recondicionamento de Computadores.

    Ao meu ver, faltam políticas públicas que favoreçam o engajamento da sociedade com a ciência brasileira. As universidades federais e estaduais são pagas com dinheiro público e, além de promoverem serviços de saúde públicos, deveriam propor iniciativas sociais, mas, para isso, o Estado e o Governo, devem incentivar e promover diretrizes direcionadas a atuação dos cientistas na sociedade. Aqui na UNICAMP, durante o UPA (Unicamp de Portas Abertas), os alunos e a sociedade podem visitar o campus e interagir com os pesquisadores e decidir sobre uma futura carreira. Fizemos um post sobre este evento que pode ser acessado aqui. Outro modo de interação, de forma mais aberta, é o Pint of Science, que objetiva levar uma discussão sobre temas científicos aos bares e restaurantes. Uma forma mais ativa de implementação de projetos científicos em sociedade, por exemplo, é o sistema de Sistema de Alerta a Inundações de São Paulo (SAISP), que foi desenvolvido em convênio com Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). No SAISP são providos mapas de chuvas, leituras de represas e avisos de inundações.

    Diversas iniciativas poderiam existir para promover o maior contato da comunidade com os cientistas, como cursos, palestras, propagandas incentivadoras. É imprescindível a necessidade de um fórum entre políticos e cientistas, para discutir o rumo científico do Brasil, políticas públicas, ajudas necessárias, entre outros assuntos. Por que não haver uma cooperação mais frequente, com políticas de retorno a sociedade?

    Para realizarmos TUDO isso, não podem haver os diversos cortes prometidos: de bolsas, de incentivo a ciência, na manutenção frequente de lugares estatais,nas  medidas de prevenção de saúde pública, como o SUS, nos programas de desenvolvimento e aprimoramento de pesquisas em Zika …

    Em suma, gostaria de enfatizar que, em debate, nenhum candidato especulou ou foi questionado sobre seu posicionamento em relação a ciência e seus andares a passos curtos. IMPORTANTÍSSIMO discutirmos sobre o assunto, já que, dependendo do modo como ela é tratada, podemos ter a ciência noticiada não pelos seus méritos, mas sim como um próximo Museu Nacional.

    Uso da imagem de capa: Copyright

    Union of concerned scientists

    Texto publicado originalmente em Terabytes of Life

  • Eleições 2018: Propostas dos presidenciáveis em relação ao cenário energético

    Texto por Rafael Henrique

    Este é um texto especial considerando as eleições que já estão acontecendo e que estamos cada vez mais próximos de decidir o futuro presidente do Brasil de 2019 a 2022. Basicamente, é um levantamento das principais propostas dos candidatos em relação ao cenário energético, idem o seu comprometimento quanto a esse assunto. Aqui, eu levanto também o que eu acho das propostas em relação a energia. Logo, a analise opinativa está limitada quanto a este contexto. Não é uma analise do que os candidatos propõem como um todo. Sem contar que o estudo é feito limitando-se aos documentos das suas propostas de governo, e não as suas declarações antigas ou recentes.

    A analise também consiste em contabilizar a palavra energia, de forma a avaliar também o seu comprometimento com o assunto.

    Por Rodolfo Clix no Pexels

    Álvaro Dias (PODE)

    Energia: 1

    Não há muitas referências quanto a questões energéticas. No final do plano ele menciona a preservação e aproveitamento de biomas nacionais, idem o programa Renovabio. Como poucos conhecem o programa, achei que ele deveria ter explicado sobre o mesmo, e não simplesmente ter colocado ele como proposta. No plano de governo, eu senti falta de mais detalhes para cumprir o desenvolvimento sustentável. Inclusive na questão dos biomas nacionais, que é um assunto que exige esta explicação.

    Senadores da 56ª Legislatura | Senador Alvaro Dias (Pode-PR)… | Flickr

    Cabo Daciolo (PATRI)

    Energia: 0

    Nenhuma alusão a questão energética. Muito menos em relação ao meio ambiente.

    Ciro Gomes (PDT)

    Energia: 8

    Em relação a questões ligadas a infraestrutura, Ciro Gomes propõe uma seria de investimentos para incentivar as energias renováveis, como a solar e a eólica. Na parte de seu plano relacionado a meio ambiente, ele propõe estimular tais fontes com políticas públicas. Tal objetivo é a redução dos gases estufa, considerando a meta do Acordo de Paris. Demonstrou conhecer este contrato. Propõe também reduzir o desmatamento, desenvolver sistemas com informações sobre a emissão de carbono, e desenvolver setores que agregam a sustentabilidade. O programa de ciência do presidenciável visa contemplar a energia como um dos pontos mais importantes, demonstrando preocupação com o setor energético.

    Finalmente, ele menciona a questão nuclear, promovendo seu desenvolvimento. Ciro pensa em trazer a decisão da energia nuclear para fins militares venha da população, e não de deficiências tecnológicas e científicas.

    Fernando Haddad (PT) – Propostas considerando o plano de governo de Luís Inácio Lula da Silva

    Energia: 13

    Seu programa consta a produção de energia a partir de energias mais limpas, considerando que o país tem elevado potencial. Idem uma maior prioridade para fontes renováveis. Apresenta mais detalhes, como as tecnologias verdes de informação e comunicação, agricultura de baixo carbono, dentre outras. Da mesma forma que investir em competências mais verdes, como agroecologia, biocombustíveis, dentre outros.

    Assim como Ciro, pretende investir em ciência e tecnologia, com um foco para a área energética. O presidenciável também cita uma parceria entre empresas e universidades para o auxilio na sua proposta de políticas de financiamento. Finalmente, ele propõe uma reforma fiscal verde, com o intuito de aumentar o custo da poluição e premiar investimentos com emissão de baixo carbono. Estas propostas visam fortalecer tecnologias mais sustentáveis.

    Na sua proposta de soberania energética, propõe a redução das emissões de GEE, maior implementação de kits fotovoltaicos, e a modernização do sistema elétrico existente. Esta última propõe substituir os combustíveis líquidos por gás natural e biocombustível. Logo, ele propõe a inserção de pelo menos um combustível fóssil na matriz energética, embora esta também emita gases poluentes. A mesma proposta também propõe aumentar a eficiência energética.

    O governo também propõe uma gestão sustentável dos recursos hídricos. Ele também menciona e visa cumprir o Acordo de Paris mais a agenda 2030.

    Geraldo Alckmin (PSDB)

    Energia: 1

    Apenas cita priorizar as energias renováveis. Inclusive também cita meio ambiente uma vez, falando em desenvolvimento sustentável, como a questão da preservação da Amazônia e a redução de gases, inclusive referenciando a agenda 2030 definida pela Organização das Nações Unidas (ONU). Praticamente o programa dele é fraco em conteúdo, tanto a questão da energia, quanto em relação ao meio ambiente.

    Guilherme Boulos (PSOL)

    Energia: 18 (2 vezes a palavra aparece em um contexto fora de propostas energéticas)

    O programa de Boulos provou ser mais voltado ao meio ambiente do que para o desenvolvimento sustentável em si, embora ele não ignore a sua importância. Em seu plano de governo, é priorizado as fontes renováveis. Inclusive, ele também cita o incentivo aos carros elétricos. Basicamente, ele foca em alternativas para reduzir a emissão de gases estufa. O programa de Boulos também menciona o Acordo de Paris, considerando sua proposta para redução.

    Inclusive em seu programa, ele não propõe a construção de novas usinas hidrelétricas e nucleares. Porém, propõe a manutenção das mesmas.

    Outro ponto interessante é o desmatamento zero. Ou seja, não desmatar nenhuma floresta e utilizar apenas as áreas já desmatadas. Uma proposta ousada, porem dependendo de um bom estudo de consumo, poderá ser possível. Isso é, se não haver desperdício do que é produzido por estas áreas.

    Henrique Meirelles (MDB)

    Energia: 1

    Menciona o Acordo de Paris, porém apenas cita em uma única frase que irá cumpri-lo. Idem o incentivo para fontes renováveis. O presidenciável também cita a preservação do meio ambiente e da floresta Amazônica. Ao meu ver, faltou muitos detalhes em seu plano de governo.

    Jair Bolsonaro (PSL)

    Energia: 10

    Ele menciona que o Nordeste deve ser motivado a gerar energia eólica e solar, cujo potencial é maior. Inclusive, é um dos poucos candidatos que apresenta em seu plano de governo a questão do setor elétrico, embora fale muito pouco desta. Ainda mais que possui um tópico sobre energia, embora tenha pouco conteúdo. Isto realmente está sendo debatido nas universidades, considerando o seu mercado. Em questão as hidrelétricas, o candidato propõe um licenciamento ambiental de no máximo 3 vezes, o que reduziria o prazo para avaliar se é viável ou não. A medida tem como objetivo a redução da burocracia ambiental. Finalmente, ele propõe o uso em conjunto do gás natural com as energias renováveis. Apesar de ter pouco conteúdo nestas partes, apresenta maior preocupação do que vários dos candidatos.

    João Amoedo (NOVO)

    Energia: 2

    Ele cita o fim dos subsídios em energias não renováveis, idem o incentivo as fontes renováveis. Tem uma parte específica sobre o assunto falando sobre a sustentabilidade, e que aborda estes pontos. Porém, ainda assim achei que faltou detalhamento destas propostas.

    João Goulart Filho (PPL)

    Energia: 4 (3 vezes a palavra aparece em um contexto fora de propostas energéticas)

    Menciona a energia em questão da infraestrutura. Em sua proposta de número 11, ele propõe um uso racional dos recursos naturais, o que indiretamente envolve a produção de energia. Embora a sua proposta seja mais focada no meio ambiente. João Goulart também menciona a eólica e a energia hídrica, porém como renda de terra que deve ser priorizada para o crescimento econômico. Não da muitos detalhes, além de citar a manutenção da estatização e re-estatização de empresas privadas.

    José Maria Eymael (DC)

    Energia: 1

    Também menciona pouco a energia na questão da infraestrutura. Também menciona pouco o meio-ambiente, resumindo em usufruir deste sem agredi-lo. Praticamente apresentou pouco sobre os temas, porém aprofundou menor do que os presidenciáveis que fizeram pouco caso.

    Ficheiro:José Maria Eymael no senado.jpg – Wikipédia, a ...

    Marina Silva (Rede)

    Energia: 21

    Como já era esperado (para aqueles que já conhecem Marina pela sua longa trajetória idem suas candidaturas passadas para presidência), Marina propõe uma política mais sustentável. Como por exemplo, na questão do saneamento, ela propõe a redução de emissões dos gases estufa e do consumo de energia. Na questão do urbanismo, ela sugere a substituição de veículos elétricos no lugar dos convencionais (movidos a combustíveis fósseis), idem geração de energia renovável nas cidades, inclusive mencionando o uso da eficiência energética.

    Tem um tópico específico para desenvolvimento sustentável. Neste tópico ela, assim como Bolsonaro, reconhece o problema na distribuição de energia elétrica. Tem como proposta uma matriz sustentável e que produza um custo de investimento e operação o mais baixo possível.

    Possui também um tópico para uma economia de carbono neutro. Neste, promove o uso de energias renováveis, e cita o Acordo de Paris com o intuito de cumpri-lo. Ainda cita a Petrobras para atuar em investimentos nas energias mais limpas. Neste paragrafo ainda reforça a questão da eficiência energética para melhoria de distribuição de energia. Também tem uma proposta ousada que é expandir a energia solar para comunidades vulneráveis, embora se utilize de parcerias de instituições de pesquisas para este fim.

    Finalmente, neste tópico, Marina aborda questões relacionadas ao controle do desmatamento no meio ambiente.

    Em relação a qualidade de vida no campo, Marina Silva também levanta utilizar a agricultura para atender a demanda por biocombustíveis.

    Basicamente, no seu plano de governo, a pesquisa e a ciência é mais focado para a preservação do meio ambiente e seu uso de forma sustentável.

    Vera Lúcia (PSTU)

    Energia: 0

    Não fala nada sobre energia. Fala ainda bem pouco do meio ambiente, em relação ao agronegócio.

    Conclusão:

    Quanto a contabilidade da palavra energia, temos o seguinte ranking. O ranking, no caso, mostra quais estão mais comprometidos em relação ao tema da energia. Não aborda de fato a qualidade de seu conteúdo.

    1 – Marina Silva (21 vezes aplicado no contexto energético)

    2 – Guilherme Boulos (16 vezes aplicado no contexto energético)

    3 – Fernando Haddad (13 vezes aplicado no contexto energético)

    4 – Jair Bolsonaro (10 vezes aplicado no contexto energético)

    5 – Ciro Gomes (8 vezes aplicado no contexto energético)

    6 – João Amoedo (2 vezes aplicado no contexto energético)

    7 – Álvaro Dias, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, João Goulart Filho e José Maria Eymael (1 vez aplicado no contexto energético)

    8 – Cabo Daciolo e Vera Lúcia (A palavra energia não aparece, mesmo num contexto fora do cenário energético)

    Em relação ao conteúdo, ao meu ver o plano de Haddad (consultando o plano do ex-presidenciável Lula) foi o melhor, tanto por apresentar uma proposta conciliatória para o uso de energias renováveis quanto para não renováveis (como o incentivo ao gás natural), quanto para incentivar o uso da ciência para fins energéticos. Em seguida, teria a Marina por ter um viés mais ambiental porém incentivado para as energias renováveis, idem uma preocupação com o sistema elétrico, sendo este um ponto tocado apenas por ela e Jair Bolsonaro. Sem falar que também há um incentivo para a ciência, porém com um foco mais ambientalista. Em seguida estaria Ciro Gomes, por incentivar a ciência para investimento na energia, e fazer um destaque quanto ao uso da energia nuclear. Guilherme Boulos está em quarto lugar, não só por ter muitos detalhes em relação ao seu plano energético com um viés ambiental, mas também por ter uma preocupação em relação as usinas nucleares e hidrelétricas já existentes. Tanto que pensa em preserva-las, embora não busque expandi-las. Em quinto, Jair Bolsonaro. Apesar de demonstrar preocupação com o cenário energético, e destacar a política de preços, não deu muitos detalhes, no qual eu senti falta. Na penúltima colocação, ficariam Alckmin, Amoedo, Dias, Eymael, Meirelles e João Goulart. Posição compartilhada principalmente pela falta de detalhes em suas proposta. E em último, Daciolo e Vera Lucia, por justamente não mencionarem este assunto. Vejamos o ranking:

    1 – Fernando Haddad

    2 – Marina Silva

    3 – Ciro Gomes

    4 – Guilherme Boulos

    5 – Jair Bolsonaro

    6 – Álvaro Dias, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, João Amoedo, João Goulart Filho e José Maria Eymael

    7 – Cabo Daciolo e Vera Lucia

    E você. Qual a sua opinião? Quem na sua opinião tem uma melhor proposta no cenário energético. Lembre-se que a analise foi considerada apenas os documentos com seu plano de governo, e não suas mídias sociais, entrevistas, participações em debate, dentre outros. Fiquem a vontade para enriquecer este debate, idem acessar o plano de governo dos demais candidatos.

    Links com os programas de governo:

    Álvaro Dias (PODE)

    Cabo Daciolo (PATRI)

    Ciro Gomes (PDT)

    Fernando Haddad (PT)

    Geraldo Alckmin (PSDB)

    Guilherme Boulos (PSOL)

    Henrique Meirelles (MDB)

    Jair Bolsonaro (PSL)

    João Amoedo (NOVO)

    João Goulart Filho (PPL)

    José Maria Eymael (DC)

    Marina Silva (Rede)

    Vera Lúcia (PSTU)


    Publicado originalmente em Conexão Na7ural

  • O compromisso político de fazer ciência no Brasil hoje

    Texto por Cláudia Alves

    Hoje o dia amanheceu chuvoso em muitas cidades, e aqui em Roma também. Andando pelas ruas, reparei em quantas pessoas carregavam seus guarda-chuvas. Não pude evitar o pensamento: nenhuma delas estava com medo de levar um tiro e morrer por causa do que carregavam. Esse post é em memória de Rodrigo Serrano, brutalmente assassinado no dia 17 de setembro de 2018 pela polícia militar do Rio de Janeiro.

    O compromisso político de fazer ciência no Brasil hoje

    Quem escolhe ser pesquisador em nosso país (e no mundo todo) acaba se acostumando com o questionamento recorrente sobre a utilidade prática do que faz, do seu trabalho. Nas ciências humanas, esse questionamento é talvez ainda mais frequente porque nossas pesquisas não produzem, na maioria das vezes, resultados imediatos, pragmáticos, mensuráveis pelos parâmetros da sociedade de consumo. Estudar as diversas perspectivas da representação literária ao longo dos anos na literatura brasileira não parece ter o mesmo prestígio que compreender a reprodução de uma bactéria a fim de criar um novo remédio, por exemplo. E por que será que isso acontece? Arrisco um palpite: porque, nessa sociedade, pesquisas que não geram patentes, sobretudo porque não geram lucros, não despertam muito interesse.

    Sempre que posso, faço questão de começar meus textos por aí, porque acredito que precisamos lembrar – e relembrar quantas vezes pudermos – que estamos vivendo em uma época em que a formação e a reflexão de tipo humanística correm o risco de cair em desuso. Atualmente, a ideia de trabalho e produção de conhecimento está ligada a valores capitalizados, tecnocráticos, pouco ideológicos ou apolíticos, e, nesse espaço, a maturação de reflexões humanas não tem tempo suficiente para acontecer. Tudo precisa ser rápido e funcional. Já deu para perceber que a conversa é tensa, né? Mas todo esse preâmbulo é para pensarmos juntos como a ideia de produção científica se encaixa nesse contexto – e como fazer ciência, em todas as áreas, principalmente dentro de uma universidade pública, só pode ser entendido como um gesto político.

    Nos estudos literários (e talvez posso afirmar que no âmbito das pesquisas sobre linguagem em geral), existe um esforço em se pensar os poderes que estão em disputa. Nosso trabalho muitas vezes se volta à desnaturalização de ideias consolidadas e de pensamentos enraizados em nossa cultura. Nesse sentido, fica difícil imaginar como uma pesquisa desse tipo pode ser considerada apolítica: estamos constantemente exercitando nossa reflexão crítica ao olhar para o mundo e estudar suas diversas manifestações ao longo do tempo.

    É por esse caminho que muitos estudiosos pensam na capacidade transformadora que a própria literatura exerce. Escrever seria um gesto de colocar no papel aquilo que precisa ser revisto em nosso mundo e, a partir daí, gerar no leitor um pensamento com potencial para se tornar atitude. Estamos então em um terreno em que a literatura pode ser vista como um espaço público de politização e também de disputa de histórias. Por meio dos livros, seria possível contar uma história que sistematicamente determinadas esferas de poder quiseram (e querem) calar, assim como poderia despertar nos leitores uma reflexão. Ou seja: quanto mais a gente lê, mais a gente se depara com versões diferentes para uma mesma história e dificilmente sairemos dessas leituras da mesma forma que entramos.

    Jean Paul Sartre, importante filósofo e escritor francês do século XX, publicou em 1948 o livro Que é a literatura? (Editora Ática, 2004, tradução Carlos Felipe Moisés), no qual discute, após o final da Segunda Guerra Mundial, o que, por que e para quem escrever literatura. Depois das atrocidades cometidas pelos governos fascistas e nazistas nos anos anteriores, Sartre e tantos outros intelectuais voltaram seus pensamentos em direção às ainda possíveis perspectivas de existência humana – e como o ato de pensar e escrever sobre essa existência ainda poderia ter alguma função.

    Foto por Daniel Frank.

    Sartre defende a ideia de que “através da literatura (…) a coletividade passa à reflexão e à mediação, adquire uma consciência infeliz, uma imagem não equilibrada de si mesma, que ela busca incessantemente modificar e aperfeiçoar” (2004, p. 217). Sua posição parece estar entre dois caminhos já bastante trilhados quando se pensa no fazer literário: a ideia de que a literatura vai salvar a humanidade, despertando-lhe a consciência necessária para isso, mas também a ideia de que essa consciência é infeliz, desequilibrada, mediada, o que significa que não necessariamente ela atingirá seu potencial de conscientização nos indivíduos.

    Muito complicado? É mais ou menos pensar que ler não é sinônimo de caráter – há muitos exemplos por aí de gente que já leu muito, mas continua tendo comportamentos questionáveis. E também que nem toda literatura é questionadora e progressista, afinal é também no âmbito literário que versões opressoras da história se consolidam. O ponto principal é que, repito, parece que estamos diante do potencial de reflexão e de crítica que pode emanar da literatura. A ideia de que, com esse esforço de leitura, a coletividade pode tomar conhecimento de si mesma, reconhecer onde estão suas falhas e, a partir daí, buscar modificá-las e aperfeiçoá-las. Em outras palavras, escrever e pensar a literatura como pequenos movimentos de transformação.

    O lugar que ocupamos como pesquisadoras e pesquisadores, me parece, passa também por essas mesmas questões. A ideia de produzir ciência, ou seja, de produzir conhecimento, em um país com tantas desigualdades (sociais, econômicas, culturais) como o nosso não deve estar isenta de sua potencialidade de reflexão e de transformação social. Porque são ausências políticas em momentos conturbados como os que estamos vivendo ultimamente que podem criar monstruosidades históricas com as quais certamente não queremos conviver.

    E assim chegamos ao Brasil do ano de 2018, onde ainda é preciso debater machismo, racismo, homofobia e tantos outros preconceitos enraizados na nossa história. Esse debate, que perpassa todas as esferas públicas de produção de conhecimento (e por isso também todas as universidades, programas de pós-graduação e institutos de pesquisa), não pode ser diminuído ou silenciado, pois estamos disputando a história que se fará daqui por diante. A reflexão humanística, que deveria ser uma guia aos estudos literários e também às demais ciências, reafirma sua importância nesse processo como aquela que não nos deixa esquecer os momentos em que a humanidade se viu ameaçada por seu próprio desenvolvimento e capacidades destrutivas. Posicionar-se politicamente em todas as esferas que nos cabem é então reconhecer a função pública que cada indivíduo carrega em si e estimular a reflexão crítica em todas as frentes imagináveis. Resistir em todos os espaços que ocupamos: esse é o compromisso científico e político do qual não podemos nos isentar.

    Publicado originalmente em Marca Páginas.

  • Motivação entre a ciência e a política

    Texto por Gustavo

    O papel da ciência na sociedade atual vai além de gerar novas tecnologias. Apesar de bem vinda, a busca por inovação – palavra tão exaltada e incensada – nas áreas produtivas não pode ser o único motivo pelo qual a ciência existe. Fabricar celulares e computadores mais rápidos, carros mais econômicos e materiais mais resistentes é algo que certamente tem seu valor, assim como produzir medicamentos mais eficazes, métodos eficientes e não poluentes de controle de pragas agrícolas ou de geração de energia é, sem dúvida, indispensável. No entanto, a produção de novas maneiras de aplicar a ciência no cotidiano prático não esgota a função da própria ciência, ou, pelo menos, não deveria.

    Além da função filosófica, que coloca a ciência enquanto explicação possível para o mundo (o que daria assunto para um texto exclusivo) e de outras que lhe podem ser atribuídas, a Ciência tem a fundamental função de guia – ou ao menos conselheira – para a tomada de decisões no âmbito político. Como gerir melhor a sociedade, aplicar políticas públicas e descontinuar ações ineficazes ou danosas é algo que demanda conhecimento sobre as dinâmicas do mundo natural, área de atuação da Ciência – seja no campo das humanas, exatas ou biológicas.

    Se a ciência tem se dado bem na primeira função – a produção de tecnologia -, o que se pode dizer desta última? Frente ao que temos observado em muitos países e contextos, parece que, infelizmente, a conselheira está sendo solenemente ignorada.

    Como isso se dá?

    No panorama global, o caso que parece mais claro é a recusa do governo do país mais importante economicamente em aceitar os incontáveis alertas científicos quanto ao aquecimento do planeta e o provável caos global que se aproxima de nós. A saída dos EUA do acordo do Clima de Paris é uma demonstração flagrante de desdém para com o conhecimento científico, que apresenta o problema e propõe as soluções nunca aplicadas. A insistência na caça de baleias por países como Japão e Dinamarca, a despeito dos avisos de impacto ecológico e até mesmo econômico, merece também ser citada.

    No Brasil, arrisco dizer, a situação é ainda mais complicada. Não é só a destruição do Museu Nacional e os contínuos cortes no orçamento de C,T&I que mostram o descaso com a Ciência e o conhecimento em nosso país. Em termos práticos, o conhecimento científico tem sido sistematicamente ignorado por nossos representantes político.

    Um exemplo patente foi a discussão sobre o Novo Código Florestal Brasileiro, no começo desta década. Apesar das inúmeras críticas contrárias feitas por pesquisadores reconhecidos nacional e internacionalmente na área e da manifestação oficial de algumas das maiores entidades científicas do país contra a aprovação do projeto, o novo código foi sancionado em Os resultados, como previsto, têm sido desanimadores.

    Para não ficar só neste, podemos citar o exemplo de Belo Monte, onde um cenário semelhante de discussão se configurou, ou o da nova lei sobre liberação de químicos agrícolas – talvez o mais novo capítulo.

    Como motivar-se?

    Fazer pesquisa no Brasil, frente a todos os desafios, não é tarefa fácil. É preciso acreditar no que se faz para se dedicar ao tema que se quer abordar, a despeito de bolsas minguantes e estrutura muitas vezes insuficiente. Depende, portanto, de muita motivação. E é esse o questionamento neste texto. Tanta dedicação está sendo aproveitada por quem deveria? Sua pesquisa sobre a redução dos peixes da Amazônia em decorrência da instalação de barragens, ou sobre a perda dos solos em áreas de agricultura predatória, ou, ainda, a respeito do aumento de doenças causadas pela poluição do ar, por excelentes e incríveis que sejam, irão impactar e influenciar alguém mais que os cientistas da área? Alguma decisão relevante (à nível nacional, estadual, municipal) será tomada levando-a em conta? É difícil motivar quem faz ciência (seja pesquisador, docente ou pós-graduando) frente a este cenário, mas é preciso.

    Tudo começa com a valorização da ciência em toda a sua complexidade, e não apenas o potencial da tecnologia: a relevância desigual dada à ciência aplicada em detrimento da básica é um sintoma bem claro deste panorama. Além disso, a maneira como, frequentemente, as parcerias com a iniciativa privada são colocadas como a única salvação da pesquisa nas universidades é preocupante, pois, ainda que essa interação seja uma opção bem-vinda em muitos casos, a exclusividade deste tipo de financiamento traria impactos negativos inegáveis à produção de conhecimento básico e a temas que, a curto prazo, são “não-lucrativos”, como é o caso de boa parte das pesquisas em áreas como paleontologia ou história medieval, para ficar nestes dois exemplos.

    Mudanças dependem, em um regime democrático, de mobilização política e, obviamente, do voto consciente. Em tempos de eleições, o mínimo que devemos fazer é levar em consideração as propostas de governo dos candidatos em temas que dizem respeito à Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente, Agricultura, etc (veja aqui e aqui). Junto a isso, trazer a população para mais perto da Ciência é a única maneira de esperar que o dedicado trabalho dos cientistas seja levado em conta pelos representantes públicos.

    Publicado originalmente em Ciência em Si.

  • Política e Ciência: Newton morde a maçã

    Texto por Jefferson Picanço

    Não se pode pensar Ciência sem Política. Ciência pressupõe pesquisa, busca, invenção. Politica significa antes de mais nada fazer escolhas. No mundo em que vivemos, uma convive com a outra, se interconecta com a outra. No Brasil também sempre foi assim, com as suas peculiaridades. Existem muitos problemas a serem resolvidos e enfrentados usando ciência e usando política. Isso é fazer política. E isso também é fazer ciência.

    CIÊNCIA, NEWTON E A MAÇÃ

    Uma maçã caindo no chão é somente uma maçã. Para que essa maçã vire ciência, é preciso Newton observando a maçã cair. Para que Newton observe a maçã cair e isso vire ciência, Newton precisa subir no ombro de gigantes: isso pressupõe escolas, professores, despesas com educação. E isso é política: escolhas que devemos ter sobre quais escolas, quais professores e qual financiamento devermos controlar para que possamos ter Newton vendo a maçã cair e isso vire ciência.

    Newton e a maçã: uma alegoria (e uma lenda) da Ciência…

    Você não precisa de ciência para viver. Isso é uma escolha. Política. Podemos viver naturalmente, tendo o que a natureza nos dá. Alguém se habilita? Nós também não precisamos fazer Ciência. Se tivermos recursos, comprar ciência, comprar tecnologia. Como fizemos no passado, podemos vender borracha e comprar pneus. Vender ferro e comprar navios. É uma escolha política sem muitos riscos. Claro que continuaremos pobres. Alguns, que possuem o seringal e a mina de ferro, viverão confortavelmente. Aos demais, restará o trabalho duro e uma subsistência difícil. Mas, como sempre, é uma escolha política da ciência que queremos ter em nossas vidas.

    QUE CIÊNCIA QUEREMOS?

    Mas, e se nós quisermos ter Ciência? Ciência de verdade? Que tal não viver com a lenda de Newton e a maçã, a qual, como já mostraram seus biógrafos, não passa de uma lenda? O que precisamos para ter nosso próprio desenvolvimento cientifico? O que precisamos para vencer nossos problemas de educação, saúde, produção industrial, produção intelectual?

    Não existe milagre na ciência. Ciência requer trabalho. Leitura, estudo, experiencia. Como recentemente disse uma colega, horas-bunda na cadeira. E isso requer que tenhamos pessoas que façam isso como profissão. Pessoas que possam cada vez mais viver disso. E que tenham condições de fazer suas pesquisas, discutir livremente os seus resultados e suas ideias com outros cientistas, com os políticos, com a sociedade.

    QUE CAMINHOS TRILHAR?

    Todos os países que tem um nível razoável de vida para seu povo fizeram e fazem isso. A Inglaterra, desde o século XVIII tem uma cultura de manutenção e financiamento de pesquisas. A Alemanha, desde que era Prússia, reformulou a sua universidade a partir de 1811 e num século deixou de ser um país atrasado que era para se tornar uma potencia mundial.

    No século XX tivemos a Coreia, um país pobre e arrasado por guerras. Em 1960, os índices de vida e renda da Coreia eram inferiores aos do Brasil. No entanto, o país investiu firmemente em educação e hoje é uma das principais potencias industriais do planeta.

    Tudo isso são escolhas. Tudo isso é política. A forma como escolhemos nossa Ciência, por outro lado, impacta nossa maneira de ser e estar no mundo.

    O BRASIL CONSTRÓI SUA CIÊNCIA

    Nos últimos 100 anos, o Brasil também investiu em ciência. Neste tempo, erradicamos diversas doenças de nossas cidades. Ainda falta muito, mas a medicina brasileira progrediu. Hoje, conquistamos, com ajuda da ciência, solos que até então não eram férteis, e os fizemos produzir. Se hoje há agronegócio no Brasil, é porque houve pesquisa agropecuária, é porque houve a Embrapa.

    No início do século XX, éramos um país que não conseguia se desenvolver porque não tínhamos fontes de energia suficientes e boas. Hoje, graças ao esforço de varias gerações de geólogos, temos uma reserva de petróleo das maiores do Mundo, a qual só é possível explorar com altíssima tecnologia.

    Tá OK. Mas e a parte vazia deste copo?

    Ainda precisamos avançar. Como ter uma indústria competitiva e inovadora? Como ter uma Ciência de alto impacto? Como resolver os grandes problemas de nossa sociedade, como saúde, segurança, trabalho? Como resolver isso?

    POLÍTICA E CIÊNCIA. CIÊNCIA E POLITICA

    Precisamos de uma politica que invista mais, e não menos, em ciência. Se queremos realmente um futuro, devemos plantar as sementes hoje. Investimos pouco, e mal. Nossa despesa com ciência em 2015 (um ano ainda “rico”) foi de U$199 dólares por habitante. Empatamos com a Turquia. Perdemos feio para os países do Leste Asiático, Europa, América do Norte.

    E isso apesar de termos uma das maiores comunidades cientifica da América Latina. Uma comunidade briosa, que vem aumentando sua participação no quinhão da ciência nos últimos 15 anos. Mas que, como uma flor sensível, ainda corre sérios riscos.

    A participação publica vem diminuindo sua participação no financiamento da ciência desde 2015. E a política, que poderia trazer soluções, só nos tem trazido pesadelos. Claramente, ciência e a tecnologia não são prioridade de governo. As ameaças vêm de todos os lados.

    PARA ONDE VAMOS?

    Há os que sonhem com uma ciência sem estado. Houve o assessor de um candidato que chegou a dizer que “as pessoas subestimam o poder da filantropia”. Com isso, o douto senhor está nos dizendo que a contribuição privada para a ciência era uma fonte que nós não exploramos direito. Por outro lado, o financiamento privado é hoje irrelevante no financiamento da ciência.

    Entre os candidatos a presidente, qual deles menciona em seu programa a palavra ciência? E dos que o fazem, quais deles confundem ciência com ensino? Embora sejam parceiras, ciência e educação são coisas distintas, com pautas necessidades distintas. Não se faz ciência tirando dinheiro do ensino.

    A política vai ditar a ciência que queremos. Será que vamos escolher seguir um caminho de mais financiamento e uma busca maior de eficácia na resolução de nossos problemas? Ou será que vamos achar que não precisamos fazer ciência?

    São Heisenberg, rogai por nós!


    Publicado originalmente em PaleoBlog.

  • Propostas dos candidatos à Presidência do Brasil para o Meio Ambiente (2018)

    Texto por  Paulo Andreetto de Muzio

    O que seu candidato ou candidata a presidente do Brasil propõe para o meio ambiente? Se pra você esta é uma questão importante na hora de votar, então vale a pena ler o material que preparamos.

    A exemplo do trabalho feito pelo pessoal do Mural Científico ao analisar as propostas dos presidenciáveis sobre Ciência e Tecnologia, meu parceiro aqui do blog Felipe Zanusso sugeriu que fizéssemos uma análise das propostas ambientais dos candidatos.

    A temática ambiental é muito ampla. Não envolve apenas árvores, floresta e natureza selvagem. Sim, isto faz parte. Mas meio ambiente também trata de saneamento básico, abastecimento de água para a população, habitação digna, entre outros subtemas que, de alguma forma refletem em saúde e qualidade de vida para as pessoas. Deste modo, analisar 13 Programas de Governo bastante distintos entre si foi um grande e trabalhoso desafio.

    Para realizar este trabalho, tentamos compreender o que o cada candidato (e sua equipe) entendia por meio ambiente. Se tinha uma visão mais abrangente, se trazia conhecimentos técnicos, ou se ficava só no clichê. Alguns dos Programas citam nada ou quase nada em relação ao tema. Outros têm capítulos específicos para tratar de questões ambientais. Há também aqueles que trabalharam o tema de forma transversal entre os diferentes tópicos do Plano de Governo. Ainda sim, entendemos que quanto mais detalhadas as propostas, melhores elas são. Além de trazerem mais argumentos técnicos, denotam um maior comprometimento do presidenciável com o que está escrito e descrito ali. Propostas vagas e clichês retóricos qualquer um pode fazer e encaixá-los posteriormente nas ações mais diversas e não necessariamente relacionadas ao meio ambiente.

    Fizemos buscas de palavras para ver se encontrávamos termos como “ambiental”, “meio ambiente”, “sustentável”, “sustentabilidade”, “preservação”, “proteção”, “conservação”, “unidades de conservação” e “áreas protegidas”.

    Os Planos mais bem elaborados foram os mais difíceis de analisar, e provavelmente a investigação tenha sido mais superficial por conta da riqueza de detalhes. Deste modo, fiquem à vontade para contribuírem com dados que acharem pertinentes e que possam ter sido omitidos neste trabalho.

    O Natureza Crítica analisou as informações que constam nos Planos de Governo que foram entregues ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mas sabemos que os candidatos dão declarações que fornecem mais detalhes sobre suas propostas ou mesmo as contradizem. Também pode acontecer de o que está proposto no Programa, contradiga o histórico de atuação do candidato. Portanto, mais uma vez, pedimos que contribuam com dados e links para esta discussão nos comentários.

    Álvaro Dias (Pode)

    O Plano de Governo do Candidato Álvaro Dias tem 15 páginas (contando com a capa).

    A palavra “ambiente” aparece 4 vezes, sendo que em 3 compõe meio ambiente, conforme nos trechos reproduzidos abaixo:

    “O crescimento sustentado será alcançado através do estímulo ao empreendedorismo e do aumento e melhoria na qualidade da infraestrutura instalada, sem negligenciar um olhar atento à interiorização e ao meioambiente.” (pág. 5 )

    “O meio-ambiente não pode ser negligenciado e desenvolvimentos tecnológicos devem ser utilizados para a sua preservação.” (pág. 8)

    “Tecnologia como aliada para preservar o meio-ambiente” (pág. 10)

    O último trecho é uma das diretrizes do Plano. Em um primeiro momento é proposto que o desenvolvimento não negligencie o meio ambiente. Em um segundo momento, o Plano propõe o uso da tecnologia para a proteção ambiental.

    O radical “sustent” aparece 9 vezes, sendo 4 para sustentavel, 4 para sustentado e 1 para sustentabilidade. Em todas as vezes os termos estavam relacionados ao desenvolvimento e crescimento econômico.

    O Plano é dividido em três grandes áreas: Sociedade, Economia e Instituições. Entretanto, a única das 19 metas do Plano do candidato (que no arquivo do Plano de Governo não é captada pela busca de palavras) que tem o viés ambiental, “VERDE-ÁGUA E SANEAMENTO 100%”, está inserida em Sociedade, não e Economia. Seguem abaixo os ítens desta meta:

    • Preservação e aproveitamento integral dos biomas nacionais
    • Proteção dos mananciais (replantio de matas em 3500 municípios)
    • Gestão produtiva dos cursos d’água e aquíferos
    • Cumprimento do Plano RenovaBio (créditos para descarbonização)
    • Prioridade Saneamento: 20 bilhões ano/em esgoto tratado

    O mais interessante no Plano de Governo, no que diz respeito à área de meio ambiente, são justamente esses itens, nos quais a proteção ambiental é relacionada ao fornecimento de água. Ainda sim, preocupa o viés de produtividade econômica, que pode ser interpretado no 1º e no 3º ítem. O termo “preservação” remete à maior restritividade em termos de proteção ambiental. Portanto, preocupa sua direta associação com “aproveitamento integral dos biomas”, visto que o justo aproveitamento que temos que dar a biomas que estão seriamente ameaçados é sua preservação e recuperação.

    Em relação aos dois últimos ítens do planos de metas, pode-se notar uma preocupação em relação à mitigação da emissão de gases causadores do efeito estufa, além de uma importante concepção de que saneamento básico também é questão ambiental (apesar de não haver referência ao termo neste trecho).

    Cabo Daciolo (Patri)

    O Plano de governo do candidato Cabo Daciolo tem 17 páginas (contando com a capa) e aborda cinco grandes áreas: Educação, Saúde, Economia, Infraestrutura de Transportes e Segurança Pública.

    Não é feita nenhuma menção direta a Meio Ambiente. O mais próximo o Plano de Governo chega em mencionar conceitos ambientais acontece em dois trechos, às páginas 03 e 17, entretanto sempre atrelados a economia e sem maior detalhamento.

    Seguem os trechos:

    “O Brasil é um país estratégico no cenário político internacional. Possui inúmeras riquezas naturais; um elevado potencial tecnológico e científico; e não por acaso, é atualmente a maior economia da América Latina.”

    “Uma sociedade bem constituída socialmente, psicologicamente e espiritualmente encontra os caminhos do progresso; da justiça social; da distribuição justa da renda; da efetiva ação de segurança pública; do desenvolvimento econômico e sustentável e também valoriza os pilares da educação.”

    Ciro Gomes (PDT)

    O Plano de Governo de Ciro Gomes apresenta 59 páginas (excluindo capa e outras firulas), das quais 4 são inteiramente dedicadas ao tema “Desenvolvimento e Meio Ambiente”.

    A apresentação deste tema é trabalhada com o objetivo de desconstruir a oposição artificial entre a ecologia e a economia (conceitos utilizados no Plano). O primeiro parágrafo se encerra mostrando que as ações devem melhorar a qualidade de vida das pessoas, entretanto. Entretanto, antes disso, o texto dá uma leve escorregada no viés desenvolvimentista e afirma que “as políticas conservacionistas priorizaram a instituição de unidades protegidas como salvaguarda de nossa biodiversidade e pouco avançaram em políticas de harmonização da preservação com a produção.” Vale  lembrar que as áreas protegidas se enquadram em diferentes categorias, algumas permitindo atividades de produção, outras não. O conceito de preservação, que é utilizado no texto, refere-se a formas mais retristritivas de proteção ambiental.

    O Plano de Governo de Ciro Gomes apresenta 15 linhas de ação para a área de Meio Ambiente, o que já mostra uma boa preocupação com a pasta.

    O primeiro ponto positivo é que no Plano, a questão ambiental está relacionada ao abastecimento da população e à questão do saneamento básico, mostrando a uma visão abrangente em relação ao tema.

    O planejamento e o aspecto socioambiental estão bastante presentes as metas. O candidato defende a compatibilização da agenda governamental com a legislação específica da área ambiental. No que tange às unidades de conservação da natureza, a meta é implementar as já criadas, ou seja, tirá-las do papel. Se por um lado pretende abrir concessões à iniciativa privada para explorar economicamente essas áreas, por outro busca a formação de arranjos produtivos locais. Da mesma forma, o Plano indica que grandes obras devam ser acompanhadas de planejamento desses arranjos produtivos em seu entorno. O zoneamento ambiental também está previsto. Além disso, a regularização fundiária para territórios indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais também constam nas metas. Também está prevista a extensão rural.

    O candidato assume ainda compromisso com diversas ações necessárias para a redução da emissão de gases do efeito estufa.

    O último item das metas ambientais é a criação de uma política de proteção aos animais.

    Consta ainda no Plano uma atenção específica que será dada aos impactos da tragédia ambiental causada pela Samarco/Vale, em Mariana/MG.

    O radical “ambient” aparece 26 vezes no texto, sendo que em 20 está relacionado de alguma forma a meio ambiente.

    Geraldo Alckmin (PSDB)

    O Plano de Governo do ex-governador de São Paulo possui 16 páginas (incluindo muitas firulas gráficas, fotografias de página inteira e por aí vai)

    A temática ambiental aparece em apenas dois parágrafos sequenciais.

    Primeiro, é abordada como estratégia de relações exteriores, na qual o candidato toma como referência a agenda Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), definida pela Organização das Nações Unidas (ONU), e se compromete com a redução de emissão de gases, conforme Acordo de Paris. Promete ainda atenção especial à gestão da Amazônia.

    O segundo parágrafo se inicia associando o conceito de sustentabilidade ao de crescimento econômico. Em seguida, o candidato afirma “seremos firmes e técnicos na questão ambiental, evitando a politização e a visão de curto prazo que pautaram os debates ambientais”. Acredito que este seja o ponto mais polêmico das poucas propostas do candidato em relação à área ambiental. Como o parágrafo está inserido em seção  do Plano chamada “O Brasil da Esperança”, esperamos que haja firmeza e respeito ao conhecimento técnico quando se trata do meio ambiente, bem como visões de longo prazo. Entretanto, não podemos esquecer que a questão ambiental já é política por si só. Também não podemos deixar de citar o histórico de aparelhamento político na pasta de meio ambiente do estado de São Paulo durante a gestão do candidato, bem como a interferência em pareceres técnicos.

    O Plano indica ainda que o Brasil concilia desenvolvimento com preservação. Vale lembrar que o conceito de preservação remete à categoria mais restritiva de proteção.

    Na busca por palavras-chave, o radical “ambient” apareceu 3 vezes, “sustent” aparece 4 vezes (sendo 3 relacionado a meio ambiente) e “preserv” aparece uma vez.

    Guilherme Boulos (PSOL)

    O Candidato Guilherme Boulos apresenta 228 páginas de texto em seu Plano de Governo.

    Na busca de palavras, o radical “ambient” aparece 52 vezes, sendo que em 42 refere-se à temática ambiental. O radical “preserv” aparece 7 vezes e em 2 refere-se ao meio ambiente. A palavra “sustentável” aparece 11 vezes, vinculado geralmente ao desenvolvimento econômico. Em 3 está explicitamente relacionado ao meio ambiente. O termo “áreas protegidas” aparece uma vez no texto, “bem como “Unidades de Conservação”.

    O Plano de Governo apresenta uma introdução e 19 capítulos. Um deles é dedicado ao tema “TERRA, TERRITÓRIO E MEIO AMBIENTE: UM NOVO E URGENTE MODELO DE DESENVOLVIMENTO”, com 14 páginas.

    As propostas ambientais estão divididas em 6 grandes temas:

    • Reconhecimento, homologação, demarcação e regularização imediata de todas as terras indígenas, quilombolas e das populações tradicionais;
    • Reforma Agrária Popular e Agroecológica;
    • Acabar com o desmatamento e manejo e restauração das florestas com espécies nativas;
    • Proteção das águas e sistemas hídricos;
    • Defesa dos bens comuns e dos direitos da natureza;
    • Transição energética e produtiva, visando superar o uso dos combustíveis fósseis.

    As propostas estão bem detalhadas e mostram uma visão abrangente sobre o Meio Ambiente, valorizando tanto as pessoas quanto o valor intrínseco dos recursos naturais. O Programa de Governo propõe uma “economia verde” e dá grande destaque aos indígenas, quilombolas e populações tradicionais.

    O candidato também propõe a criação de áreas protegidas.

    A questão da água e do abastecimento urbano, o saneamento básico, assim como o compromisso com a redução da emissão de gases do efeito estufa para combater as mudanças climáticas estão presentes. O Plano ainda critica a atuação do agronegócio e se posiciona contra os transgênicos, pesticidas e afins, entendendo que a agricultura familiar é a solução.

    Na parte ambiental, o Programa está bem embasado. São citados diferentes biomas, conceitos técnicos, legislação, órgãos governamentais e Conferências sobre o tema. São mencionados ainda desastres como o causado pela mineradora Samarco/Vale em Mariana (MG).

    Além de conter um capítulo próprio, a preocupação com a temática ambiental aparece de forma transversal nos capítulos do Programa dedicados aos temas educação, cidades, cultura e relações internacionais.

    Henrique Meireles (MDB)

    Na busca de palavras, o radical “ambient” aparece 3 vezes, o verbete “proteção” aparece 2 vezes, o verbete “conservação” aparece 2 vezes. O radical “sustent” aparece 5 vezes, mas em apenas uma está relacionado a questões ambientais.

    O Plano de Governo do Candidato tem 20 páginas de texto corrido. É dividido em 5 grandes temas. Ao final do capítulo “O Brasil mais integrado”, que trata de investimentos em infraestrutura, são dedicados três parágrafos para tratar de temas ambientais.

    No texto o candidato defende a valorização da biodiversidade e proteção ao patrimônio natural. Em relação às Mudanças Climáticas, o candidato se compromete com a redução da emissão de gases do efeito estufa (conforme acordo de Paris), por meio de uma maior participação da bioenergia na matriz energética e incentivando o reflorestamento e o investimento em energias renováveis.

    O Candidato cita a importância de duas Unidades de Conservação criadas em 2018, mas não dá mais detalhes sobre metas em relação a criação de novas áreas protegidas. Defende ainda  que “Programas de redução do desmatamento na Amazônia, de recuperação de nascentes e de revitalização do Rio São Francisco precisam ser acelerados, assim como a conversão de multas ambientais em novos recursos para serem usados em programas de conservação e revitalização do meio ambiente.”

    Jair Bolsonaro (PSL)

    O Plano de Governo do candidato apresenta 81 páginas em slides de Power Point transformados em PDF.

    Na busca por palavras, o radical “ambient” aparece 4 vezes, sendo que em apenas 2 está relacionado à meio ambiente. Ainda assim, em uma delas “meio ambiente rural” está vinculado à uma nova infraestrutura agropecuária pretendida no Programa. Na outra, o candidato se refere ao licenciamento ambiental como criador de barreiras intransponíveis às pequenas centrais hidrelétricas.

    O verbete sustentável aparece apenas uma vez no ítem “Desenvolvimento Rural Sustentável (Atuação por Programas)”, também relacionado à infraestrutura agropecuária.

    A agropecuária pode ser tanto antagônica quanto aliada ao Meio Ambiente, dependendo de como é feita. Da forma como é colocada neste Programa de Governo, entendo que o presidenciável não traz nenhuma proposta ambiental. Vale lembrar que o candidato propõe a fusão dos ministérios da agricultura e meio ambiente.

    Só para dar uma colher de chá ao candidato, em algum momento ele menciona que “o Nordeste pode se tornar a base de uma nova matriz energética limpa, renovável e democrática”. Mas de resto, sua preocupação com energia é mais relacionada à questão econômica.

    João Amoedo (NOVO)

    Plano de Governo com 23, incluindo capa com foto do candidato.

    Na busca de palavras, o radical “sustent” aparece 12 vezes, ma podemos relacioná-lo de alguma forma à questão ambiental apenas em 6.  Já o radical “ambient” aparece 7 vezes, sendo que em 5 está relacionado a meio ambiente. “Conserv” aparece duas vezes. “Preserv” aparece 2 vezes, mas apenas em uma remete a preservação ambiental. O verbete “protegida” aparece uma vez.

    Entre os 10 ítens propostos no Plano, um deles é dedicado à área de meio ambiente: “Responsabilidade Com As Futuras Gerações Com Foco Na Sustentabilidade E Um Agronegócio Moderno Indutor Do Desenvolvimento”.

    O candidato começa com o mesmo discurso de exaltação da natureza que outros candidatos também fazem uso. Da mesma forma, dá aquela escorregada e diz que vai conciliar preservação e crescimento econômico e dá uma ênfase na exploração dos recursos naturais. Mais uma vez lembrando que preservação e exploração não podem caber na mesma frase. O que mostra o viés econômico do candidato aos pensar na questão ambiental. Mais adiante no plano propõe conciliação definitiva entre conservação e desenvolvimento agrícola. Assusta um pouco o uso da palavra definitiva. A conciliação é sempre bem vinda, mas esperamos que não seja o desenvolvimento agrícola em detrimento da conservação, como normalmente é a linha de trabalho de quem alia a questão ambiental ao viés econômico.

    Um ponto positivo é que o candidato entende, ainda que não com a acurácia necessária conforme indica a redação do texto, que saneamento básico é questão ambiental e que o objetivo é justamente melhorar a qualidade de vida das pessoas. É um ponto importante entender que o tema afeta a vida das pessoas hoje, o que contrapõe com o clichê das futuras gerações, também utilizado no texto.

    Amoedo traz ainda uma visão razoavelmente abrangente de meio ambiente: inclui água, florestas, biodiversidade, clima, pessoas. Propõe recuperação de rios, baías e praias, redução do desmatamento da Amazônia, parcerias com consórcios municipais e com o setor privado, uso de tecnologias, aplicação do Código Florestal, fim dos lixões, foco nas energias renováveis.

    João Goulart Filho (PPL)

    O Plano de Governo do Filho de Jango tem 14 páginas de texto corrido. Dos 20 itens do Programa, um é dedicado ao Meio Ambiente, ocupando cerca de uma página.

    O radical “ambient” aparece 4 vezes na busca por palavras, sendo que em 4 está relacionado à questão ambiental. O verbete “preservação” aparece uma vez. “Proteção” aparece apenas uma vez vinculado a meio ambiente.

    João Goulart Filho faz um diagnóstico sobre a questão ambiental no país e se compromete com a promoção do desenvolvimento com o uso racional dos recursos naturais, em contraponto à exploração predatória vigente. Critica a falta de contrapartida dos países desenvolvidos, aos quais são enviados nossos recursos e aponta o quanto isso impacta na vida das pessoas, dando exemplos como a desertificação, assoreamento e contaminação de corpos d’água, do solo, morte de fauna e flora, acumulação de lixo e poluição atmosférica. Cita ainda o desastre promovido pela Samarco/Vale em Mariana (MG).

    Referente às mudanças climáticas, o candidato escorrega ao afirmar que “apesar de a responsabilidade principal ser dos países ricos, temos que dar nossa contribuição.” Sim, temos que dar a nossa contribuição, mas dizer que a responsa é dos ricos, é não entender a nossa grandeza e a nossa riqueza. É quase entregar a Amazônia pros gringos.

    O candidato propõe barrar o uso predatório dos recursos naturais e planejamento a longo prazo (ponto positivo). Especifica que “o aumento da produção agropecuária deve resultar, principalmente, do aumento da produtividade nas áreas já ocupadas, e não da incorporação de novas áreas, garantindo, assim, as metas de redução de desmatamentos.” Também propõe rever o Novo Código Florestal (de 2012), apontando que o desmatamento só aumentou após sua implementação.

    Goulart Filho propõe ainda aumentar as multas e penas para crimes ambientais, principalmente em casos de desastres ecológicos. Ou seja, responsabilizar mais os grandes e não os pequenos, que é o como acontece na prática.

    O candidato também propõe acabar com os lixões, e fazer convênios com estados e municípios dar a destinação adequada aos resíduos sólidos. Se compromete ainda a garantir a cobertura de 100% da coleta e tratamento de esgoto nos centros urbanos, além de trabalhar a “transição para combustíveis menos poluentes e estimular políticas de transporte coletivo.“

    José Maria Eymael (DC)

    O presidenciável José Maria Eymael apresenta um Programa de Governo de apenas 9 páginas. Dos 27 itens do Plano, um é dedicado ao Meio Ambiente. Confira abaixo na íntegra.

    “MEIO AMBIENTE SUSTENTÁVEL

    1. Proteger o meio ambiente e assegurar a todos o direito de usufruir a natureza sem agredi-la. Orientar as ações de governo, com fundamento no conceito de que a TERRA É A PÁTRIA DOS HOMENS.”

    Gostaríamos de ler mais. Um mínimo detalhamento que tire as expressões acima do campo do discurso vazio.

    Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

    O Plano de Governo de Lula tem 58 páginas, contando com capa, sumários e firulas afins. Dos 5 capítulos, um é inteiramente dedicado ao meio ambiente. O capítulo TRANSIÇÃO ECOLÓGICA PARA A NOVA SOCIEDADE DO SÉCULO XXI tem 14 páginas de texto.

    Na busca por palavras, o radical “ambient” aparece 66 vezes, sendo que em 62 está relacionado a meio ambiente. A palavra “sustentável” aparece 19 vezes. “Conservação” aparece 6 vezes e “Unidades de conservação” 3 vezes. “Preservação” aparece duas vezes, remetendo à biodiversidade.

    O Presidente propõe a construção de uma economia justa e de baixo carbono e defende que o Brasil precisa pensar no longo prazo. Propõe o investimento em agroecologia e mudança nas estruturas produtivas para garantir ar limpo para respirarmos, água potável, mares e rios salubres, e usufruto dos recursos naturais.

    Critica o governo Temer, no qual “o meio ambiente e os povos do campo, das florestas e das águas são tratados como moeda de barganha política, ao flexibilizar licenciamento ambiental, suspender demarcação de terras indígenas, reduzir as unidades de conservação, facilitar a grilagem, dentre outros tantos retrocessos.”

    O candidato defende uma economia de baixo impacto ambiental, com eficiência energética e reciclagem, investimento em energia eólica, biocombustíveis e química verde. Propõe uma reforma fiscal verde, que premiará investimentos e inovação em baixo carbono. Se compromete com a redução de gases de efeito estufa. Lula também propõe um novo marco regulatório para a mineração, citando a tragédia causada pela Samarco / Vale em Mariana (MG).

    De acordo com o Plano de Governo, o candidato entende que saneamento básico e abastecimento de água são questões ambientais e traz propostas para “para garantir a oferta de água para todos e todas com qualidade e regularidade, em sintonia com as metas do Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS) de Água e Saneamento da ONU”.

    O candidato também parece entender o desenvolvimento urbano como questão de meio ambiente, conforme mostrado no Plano, no qual são tratadas questões como moradia e resíduos sólidos.

    Em relação ao campo, o candidato incentiva a produção agroecológica para a produção de alimentos mais saudáveis e propõe um programa de regulação do agronegócio para a redução do desmatamento.

    O Plano contém ainda propostas de políticas fundiárias, de demarcação de terras, de direitos humanos e sociais no campo, de enfrentamento à seca e de inclusão social de pescadores artesanais. Também se compromete a construir políticas públicas de defesa dos animais.

    Em relação a redução do desmatamento o candidato se compromete a fiscalizar o cumprimento do Código Florestal, incluindo o Cadastramento Ambiental Rural fortalecer a proteção das unidades de conservação e dos demais bens da natureza. Entretanto, parece dar o foco nesta questão apenas para o bioma Amazônia.

    Propõe ainda uma política pública de educação ambiental.

    Marina Silva (Rede)

    O Plano de Marina Silva possui 46 páginas, incluindo capa e muitas firulas gráficas.

    O radical “ambient” aparece 31 vezes na busca por palavras, em apenas 20 remetendo a meio ambiente. “Sustentável” aparece 18 vezes e “sustentabilidade” apenas 4, lembrando que compõe inclusive o nome do partido político. A palavra “preservação” aparece 5 vezes, sempre ligada de alguma forma ao meio ambiente, Os termos “Unidades de Conservação” e “Áreas Protegidas” aparecem uma vez cada.

    A candidata propõe investimentos em saneamento básico e segurança hídrica, por meio de criação de capacidades institucionais nos municípios, parcerias público-privadas, investimento em pesquisa e tecnologia e preservação e recuperação de mananciais, nascentes, e demais corpos d’água. Também priorizará “políticas para a redução, reutilização, reciclagem dos resíduos sólidos, tendo como horizonte uma política de lixo zero”.

    Em relação a povos e comunidades tradicionais, Marina promete criar políticas de fomento às suas atividades econômicas, com atenção às suas especificidades culturais. Cita indígenas, quilombolas, ciganos, faxinalenses, pomeranos, caiçaras, pescadoras e pescadores artesanais, seringueiros, extrativistas, quebradeiras de coco babaçu e ribeirinhos. A candidata também se compromete com a demarcação de terras indígena e o reconhecimento e titulação de terras quilombolas. Marina propõe ainda a retomada dos processos de criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável – especialmente Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável e a implantação de um sistema de compensação financeira para as comunidades tradicionais que promoverem a preservação dos recursos naturais e da biodiversidade. Se compromete a envolvê-los em procedimentos de licenciamento ambiental que os impacte direta e indiretamente. Garante ainda programas educacionais diferenciados e adaptados às realidades e especificidades locais e o direcionamento de recursos de ciência e tecnologia para iniciativas dos povos tradicionais. A candidata promete ainda ações para a investigação de crimes ambientais e violação de direitos contra essas comunidades.

    A candidata da Rede se compromete ainda com a implementação de políticas que promovam o bem-estar dos animais, coibindo práticas que causam sofrimentos em atividades produtivas ou em pesquisa.

    Em relação ao meio urbano, Marina propões ações diversas relacionadas à habitação, revitalização de espaços públicos, gestão dos resíduos sólidos e redução da emissão de gases poluentes.

    Duas páginas são dedicadas à proposta de transição para uma economia de baixo carbono. Além da uma mudança no modelo energético, a candidata propõe a valorização de uma economia florestal como estratégia para combater as mudanças climáticas.

    Marina propõe ainda planejamento de uso da terra e se compromete a dar “tratamento específico, com o desenvolvimento de políticas públicas dirigidas para uma grande faixa situada no semiárido nordestino, onde estão concentrados os minifúndios no Brasil, com vistas a superar a situação de precariedade em que vivem centenas de milhares de famílias.” Garantirá financiamento para a agricultura familiar,  fundamental para produzir alimentos para o consumo interno, garantir o trabalho e a geração de renda no campo.

    Vera Lúcia (PSTU)

    O Plano de Governo de Vera Lúcia apresenta apenas 5 páginas de texto.

    Na busca por palavras, o radical “ambient” aparece duas vezes. “Proteção” aparece uma vez

    O termo meio ambiente aparece vinculado ao plano de obras públicas e a questão da reforma agrária. Dos 16 itens do Programa, não há um capítulo específico para Meio Ambiente. Entretanto, há item que propõe a regularização fundiária de áreas indígenas e quilombolas.

    Gostaríamos de saber mais detalhes sobre as propostas.

    Considerações Finais

    Os Planos de Governo de Guilherme Boulos (PSOL), Lula (PT) e Marina Silva (Rede) são os melhores estruturados e detalhados na área de meio ambiente, deixando as propostas de ações mais claras.

    Em seguida vem o de Ciro (PDT), seguido por Amoedo (NOVO). Logos atrás vêm João Goulart (PPL) e Álvaro Dias (Pode) empatados.

    Decepciona que os Planos de Geraldo Alckmin (PSDB) e Henrique Meirelles (MDB), representantes de dois partidos políticos enormes, tenham descrito tão pouco sobre suas propostas para a pasta.

    Jair Bolsonaro (PSL) não apresenta propostas ambientais, tal qual o time dos café-com-leite Cabo Daciolo (Patri), Eymael (DC) e Vera Lúcia (PSTU).

    Elaboramos um ranking abaixo para representar graficamente as propostas dos candidatos para a pasta de meio ambiente.

    Ranking das Propostas:

    1. Boulos, Lula e Marina
    2. x
    3. x
    4. Ciro
    5. Amoedo
    6. João Goulart e Álvaro Dias
    7. x
    8. Meirelles
    9. Alckmin
    10. x
    11. x
    12. x
    13. Bolsonaro, Daciolo, Eymael, Vera Lúcia

    Esta análise deu trabalho e pedimos desculpas se ocorreu algum erro de digitação ou de interpretação, ou mesmo a uma possível falta de padrão nas análises de cada Programa. Esta análise foi realizada nas horas vagas de quem trabalha em horário comercial, portanto pedimos a compreensão. A discussão não se fecha aqui e ainda temos um mês até o dia da votação para o 1º Turno das Eleições de 2018. Portanto, ainda há muita informação para trocarmos. Mais contribuições para este debate são bem vindas.

    Confira abaixo os Programas de Governo de cada candidato:


    Publicado originalmente no blog Natureza Crítica.

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