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  • Pelos olhos delas: relatos e reflexões durante a quarentena – parte 1

    Startup Stock Photos via Pexels. Creative Commons.

    A pandemia da COVID-19 afetou profundamente a forma como a sociedade se organiza e teve reflexos agudos no universo do trabalho. No meio acadêmico, já há dados iniciais que mostram que as mulheres estão sendo desproporcionalmente afetadas: as cientistas e pesquisadoras estão submetendo menos artigos durante a quarentena; em contrapartida, os periódicos observaram um aumento do número de envios de trabalhos realizados por homens.

    Nós, do Ciência Pelos Olhos Delas, temos conversado muito sobre esse contexto de isolamento social e como ele impacta a produtividade de todas as pessoas que atuam na área acadêmica – desde discentes de graduação até professores universitários. Por isso, elaboramos um questionário em português e em inglês para mensurar esse impacto e comparar as respostas de quem faz pesquisa no Brasil e em outras partes do mundo.

    Os resultados parciais de nossa pesquisa podem ser conferidos na reportagem escrita por Nayara Fernandes e publicada no Portal R7 em 25 de agosto de 2020. Além dessa iniciativa, também temos pensado a respeito das repercussões da quarentena em nosso dia a dia, o que nos fez chegar à proposta deste post: relatar nossas vivências ao longo dos últimos meses e também refletir sobre o momento atual e sobre o que vem depois dessa experiência coletiva. Confira abaixo a primeira parte.

    Relatos e reflexões da equipe do Ciência Pelos Olhos Delas durante a quarentena

    Bruna Bertol

    A Bruna é mestre em Ciências com ênfase em Imunologia Básica e Aplicada e está terminando seu doutorado na mesma área pela USP de Ribeirão Preto (SP). Em 2019, fez estágio na Universidade do Colorado, em Denver (EUA), onde conheceu a Marina e a Giovana, integrantes do blog.

    Ela trabalha com câncer de tireoide e sua relação com fatores genéticos e imunológicos, buscando avanços no seu diagnóstico/prognóstico e tratamento, e também tem interesse nas discussões relacionadas às áreas de política, história e ciências sociais.

    Bruna apresentando seu trabalho de doutorado em um congresso científico internacional em Amsterdam (2018). Arquivo pessoal.

    Natural de Joinville (SC), Bruna voltou dos EUA em janeiro de 2020 para iniciar o último ano do doutorado. Tinha planos de fazer viagens internacionais e de passar mais tempo com sua família em Santa Catarina este ano. Com a chegada da pandemia no Brasil, todo o seu planejamento foi afetado. Ela conta mais abaixo:

    “Eu optei por ficar em Ribeirão Preto pois eu sempre lidei bem com a minha própria companhia, mas a verdade é que a combinação de 1) me adaptar ao Brasil novamente, 2) morar sozinha a mais 800 km de distância da minha família, 3) escrever uma tese de doutorado, 4) medo da pandemia e 5) isolamento social absoluto em casa, tem sido um grande desafio emocional para mim.

    No início, queria muito ler e entender sobre o novo coronavírus para me manter informada, e acabei deixando minha tese em segundo plano, mas, com o avanço da pandemia, chegou o ponto em que sinto que o esgotamento mental tem afetado minha produtividade científica. No início, acreditei que até o mês de agosto as coisas estariam melhores, mas a verdade é que não sabemos como serão os próximos meses no país. 

    Ribeirão Preto tomou medidas de isolamento social que foram cumpridas no início, porém, como a maioria das cidades brasileiras, passou a afrouxá-las, principalmente em virtude da pressão econômica, antes de haver uma redução significativa dos casos diários.”

    Para a Bru, a pandemia expõe de forma escancarada no Brasil a desigualdade social, a precarização do trabalho e a violação constante de direitos fundamentais (como o acesso a um serviço de saúde público e de qualidade). 

    Ela destaca ainda que as mulheres são particularmente afetadas durante a quarentena: ficam mais expostas à violência doméstica e mais sobrecarregadas com os cuidados com a casa e com as atividades de reprodução social¹, além de serem a grande maioria dos profissionais na linha de frente nos hospitais e nos serviços de saúde. 

    A verdade é que é difícil prever nossa vida pós-pandemia, mas certamente o momento em que vivemos nos exige repensar nossa vida individual e em sociedade, bem como ressignificar nossas prioridades, nossos direitos e nosso trabalho.”

    Carolina Francelin

    A Carolina é mestre e doutora pela UNICAMP em Genética e Biologia Molecular com ênfase em Imunologia. Logo após sua defesa de doutorado, no final de 2014, engravidou de sua filha Anna, hoje com 5 anos. 

    Em 2018, mudou-se com sua família para Birmingham (EUA), onde trabalha atualmente como pesquisadora na Universidade do Alabama. Além da pesquisa científica, ela tem interesse em acompanhar a produção intelectual sobre maternidade, criação e desenvolvimento infantil, e também adora fazer experimentos culinários acompanhada pela Anna.

    Carolina no laboratório onde trabalha na Universidade do Alabama em Birmingham (EUA). Arquivo pessoal.

    A Carol, que já conhecia a Marina e o blog antes de se juntar à nossa equipe no começo de 2019, nos conta como foi o início das medidas de quarentena na Universidade do Alabama e na cidade onde vive:

    Foi em uma reunião do laboratório, numa segunda-feira de manhã, que recebi o aviso sobre o fechamento da Universidade. Eu passei esse dia ‘fechando’ experimentos, congelando as células e me certificando que tudo ficaria seguro durante a quarentena – período esse que ninguém sabia dizer a duração. 

    Na quarta-feira da mesma semana as escolas fecharam. Meu esposo também foi enviado de quarentena para casa, sem previsão de volta ao trabalho. No fim daquela semana éramos eu em home office e eles (meu esposo e filha) de férias num apartamento fora da nossa terra natal. 

    Passei pelo desespero de produzir nesse período, o de manter o homeschooling, o de estudar, o de organizar a vida e por aí vai. Foi um processo de resiliência e auto-conhecimento diário, tentando manter os lemas ‘um dia de cada vez’ e ‘antes feito que perfeito’. 

    Voltamos para a rotina (quase) normal no meio de maio. Minha filha só tem aula porque frequenta escola particular, os colégios públicos continuaram fechados e reabriram agora em setembro. 

    Para o retorno ao laboratório, preparamos documentos de conduta de segurança, mantemos distância social, usamos máscaras e somos orientados a fazer de casa tudo o que for possível. As cafeterias estão fechadas, os restaurantes do campus foram abertos somente para a retirada de refeições e as aulas presenciais retornaram cheias de protocolo de segurança.”

    Para a Carol, a pandemia trouxe à tona importantes discussões, como as diferenças de classe, raça e gênero, o quanto grupos específicos são afetados de formas diferentes e o que pode ser feito para melhorar a sociedade como um todo:

    “As pessoas postam nas redes sociais que esperam pelo retorno à vida após a pandemia, e eu realmente espero que não seja um retorno. Eu espero que os processos tenham sido reavaliados e que, de alguma forma, a humanidade tenha mudado a forma de como tem construído o mundo.”

    Gabriela Mendes

    A Gabriela é biomédica e mestre em Biologia Celular pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Atualmente, ela realiza seu doutorado no Programa Interdisciplinar de Genética na Texas A&M University, em College Station, no Texas, onde trabalha desde 2016 com biomateriais.

    O objetivo principal do projeto da Gabi é utilizar esses biomateriais para promover a formação de novos vasos sanguíneos para acelerar a cicatrização local, visando o tratamento de doenças como diabetes e doenças cardiovasculares.

    Interessada em contribuir e aprender mais sobre a divulgação científica e o papel das mulheres nas diferentes áreas da ciência, ela integra o blog desde o início de 2019.

    Gabriela em 2019 no laboratório onde exerce sua pesquisa de doutorado, na Universidade Texas A&M em College Station (EUA). Arquivo pessoal.

    No final de fevereiro deste ano, durante uma reunião de laboratório, a Gabi foi alertada por sua orientadora sobre a possibilidade de passarem a trabalhar remotamente se o número de casos de COVID-19 aumentasse nos EUA e, mais especificamente, no Texas. No mês seguinte, essa possibilidade se concretizou, como ela nos conta a seguir:

    “Dia 13 de março foi o último dia que fui trabalhar no laboratório, antes que a universidade paralisasse todas as atividades de pesquisa que não fossem relacionadas ao novo coronavírus. A partir desse dia comecei a trabalhar em casa pelo computador e só saía para fazer compras de itens básicos. 

    Por mais de 2 meses somente pessoas consideradas essenciais tinham acesso aos laboratórios – aquelas pessoas que estavam trabalhando com o novo coronavírus e/ou que tivessem que cuidar de células e animais de laboratório. A universidade reabriu para as outras pesquisas no dia 1o de junho e foi quando pude retomar meus experimentos no laboratório seguindo as novas regras de segurança: uso obrigatório de máscaras dentro do prédio, somente 2 pessoas por laboratório no mesmo horário, distanciamento social, higiene das mãos com maior frequência, entre outras medidas. 

    Atualmente, o uso de máscaras continua sendo obrigatório em qualquer local público e no campus. As aulas presenciais na universidade recomeçaram em agosto, mas parte da carga horária de aulas continua sendo online. Os casos de COVID-19 continuam aumentando na cidade e no estado, ao mesmo tempo em que as pessoas tentam voltar às suas rotinas de atividades. Já são seis meses trabalhando de casa sempre que possível e convivendo somente com colegas do lab, além do meu marido. Nessa nova rotina, continuamos saindo de casa somente para fazer compras de mercado e algumas vezes vamos caminhar num parque.”

    A Gabi defenderia sua tese de doutorado em agosto, mas, devido à pandemia, a  defesa foi adiada para dezembro. Em meio ao estresse da finalização do doutorado e o fato de estar longe da família durante a quarentena imposta pela pandemia, ela ressalta a importância de continuar seguindo as recomendações de cientistas e de especialistas e continua:

    “Cada vez mais defendo a ciência e confio nela, e espero que com o nosso trabalho no blog a gente consiga conscientizar mais pessoas sobre a importância da pesquisa e do método científico. Além disso, acho que as desigualdades sociais e de gênero foram escancaradas no mundo todo com a pandemia, quando vemos que pessoas em situação de maior vulnerabilidade morrem mais de COVID-19, e que as mulheres têm acumulado afazeres domésticos e produzido menos no trabalho. Ao mesmo tempo, estes são problemas que tem sido bastante discutidos durante a pandemia e espero que essas reflexões tragam melhorias daqui pra frente.” 

    A parte 2, com os relatos das demais integrantes do Ciência Pelos Olhos Delas, será publicada no blog em 25 de setembro.

    Os relatos acima, escritos pelas integrantes do Ciência Pelos Olhos Delas, foram condensados e editados por Gabriela Mendes e Juliana Lobo. Este post passou pela revisão de toda a equipe do blog antes de ser publicado.

    Nota

    ¹ Para saber mais sobre reprodução social, recomendamos a videoaula “Divisão Sexual do Trabalho”, ministrada pela cientista política Flávia Biroli (UnB).

    Este texto publicado no Especial Covid-19 foi escrito originalmente no Blog Ciência Pelos Olhos Dela

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Assim, os autores produzem os textos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional. Além disso, os textos são revisados por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Dessa forma, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • Cenários Pós-Pandemia

    O novo Coronavírus (SARS-CoV-2) relacionado à Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) está causando uma pandemia que já ultrapassou 3 milhões de infectados e 200 mil mortos. Durante essa primeira onda de pandemia, muitos países estão enfrentando problemas relacionados à falha da capacidade dos seus sistemas de saúde. Por causa disso, vários países adotaram medidas de distanciamento social, quarentena e rastreio de infectados, enquanto tentam desenvolver vacinas e medicamentos.

    Alguns países como a China, Coreia do Sul e Dinamarca, tem aliviado aos poucos tais medidas após conseguir níveis adequados do controle da transmissão e o número de mortes ter começado a diminuir. Contudo, para acabar com a possibilidade de ressurgir infecções, períodos prolongados ou esporádicos de distanciamento social ainda são necessários.

    Após a primeira onda de pandemia, o SARS-CoV-2 pode apresentar dois panoramas.

    O primeiro, o vírus ser erradicado assim como sua parente, a SARS-CoV-1 (o vírus do surto de 2003), com medidas de saúde pública intensivas. Ou pode – assim como a vírus Influenza e outros coronavírus (os chamados HCoV – Coronavírus de Humanos) – recircular pela população de forma sazonal, causando surtos durante o outono e inverno nas zonas temperadas. Se conseguirmos saber em qual desses cenários se encaixa esse novo vírus, será possível propor medidas públicas de saúde para combater futuras crises referentes a ele.

    Como é o cenário atual de outros coronavírus?

    O SARS-CoV-2 faz parte da família Coronaviridae e do gênero betacoronavírus, que inclui outros parentes dele como: o SARS-CoV-1, o MERS-CoV (responsável pelo surto no oriente médio em 2012), e dois outros coronavírus de humanos, o HCoV-OC43 e HCoV-HKU1.

    O SARS-CoV-1 e MERS-CoV são vírus mais perigosos, causando doenças severas com uma taxa de mortalidade de 9 e 36% respectivamente. Contudo, sua transmissão é bem mais difícil de acontecer do que a do vírus causando a atual pandemia.

    Quanto aos HCoVs, as infecções causadas por eles são um tanto quanto mais leves, sendo que tais vírus são os segundos mais comuns em causar o resfriado. Os surtos de HCoVs acontecem geralmente no inverno nas zonas temperadas, o que pode sugerir que o clima frio e nosso comportamento de nos aglomerar nessas situações para nos aquecer pode facilitar sua transmissão, assim como acontece com o vírus influenza.

    Apesar da imunidade causada pela infecção dos HCoV durar pouco (aproximadamente 1 ano), a imunidade contra os vírus mais sérios, como o SARS-CoV-1, é de longa duração, o que nos permite combatê-lo mais rápido em um segundo contato. Uma boa notícia é que o contato com um desses vírus gera anticorpos que ajudam a combater os outros, em um processo chamado Imunidade Cruzada

    Resumidamente: entre 10 e 12 dias após entrarmos em contato com um desses vírus, começamos a produzir anticorpos. Isso nos ajuda a combater aquela infecção inicial e gera a tão falada memória imunológica, que em um segundo contato com o vírus, causará uma resposta mais rápida e eficiente no seu combate.

    A Imunidade Cruzada acontece quando um anticorpo produzido contra uma parte X de um desses vírus do gênero betacoronavírus (que são parecidos em sua estrutura), acaba se ligando a essa mesma parte X de outro vírus do mesmo gênero, ajudando a combatê-lo de forma mais rápida e eficiente.

    Quais são os fatores que podem influenciar novas ondas epidêmicas ou pandêmicas do SARS-CoV-2?

    A partir de todas essas informações, um grupo de pesquisadores de Harvard publicou na Revista Science um modelo matemático da transmissão considerando os seguintes fatores que poderiam influenciá-la:

    • O grau de transmissão durante variações sazonais, isto é, como seria a contaminação das pessoas dependendo das variações climáticas;
    • A duração da imunidade, gerada pelo SARS-CoV-2
    • O grau de imunidade cruzada entre o SARS-CoV-2 e outros coronavírus já em circulação na população

    A partir destes fatores, os cientistas chegaram às seguintes possibilidades:

    1. O SARS-CoV-2 pode voltar a proliferar a qualquer momento do ano. Infecções no outono/inverno favorecerem surtos mais agudos com um maior número de infectados, enquanto infecções no inverno/primavera, apesar de ainda ocorrer, vão levar a surtos menores; 
    2. Se a imunidade do SARS-CoV-2 não for permanente ou de longa duração, ele pode  voltar a entrar em circulação assim como acontece com o Influenza e os HCoV. Uma imunidade de curto período levaria a surtos anuais de SARS-CoV-2, enquanto uma imunidade um pouco mais duradoura, 2 anos por exemplo, levaria a surtos bienais;
    3. Em lugares onde há uma alta variação sazonal (como as zonas temperadas, no Sul do Brasil) a transmissão teria uma incidência menor durante o verão, mas também haveria surtos mais recorrentes e maiores durante o inverno. Isso aconteceria porque durante os meses de verão, quando a transmissão seria menor, há um acúmulo de indivíduos suscetíveis (ou que não foram infectados na última onda ou que “perderam” a imunidade com o passar dos meses);
    4. Se a imunidade do SARS-CoV-2 for permanente, o vírus pode desaparecer por 5 anos ou até mesmo antes de causar um surto maior. Além disso, se ele gerar imunidade cruzada contra outros HCoV, estes podem virtualmente desaparecer também;
    5. Já se a imunidade cruzada de outros betacoronavirus contra SARS-CoV-2 for baixa, isso pode ajudar que o  SARS-CoV-2   desapareça por poucos anos, podendo ressurgir depois. Por exemplo, se considerarmos que a imunidade contra SARS-CoV-2 pode durar apenas dois anos, os baixos níveis de imunidade cruzada dos HCoV poderia nos ajudar a  prolongar o tempo de ressurgimento do SARS-CoV-2, voltando a aparecer depois de 3 anos, ao invés de 2.

    Quais são os possíveis futuros cenários? 

    Vamos considerar o pior cenário possível: não há imunidade cruzada entre outros HCoV contra o SARS-CoV-2, não há como aumentar a capacidade dos sistemas de saúde, remédios e vacinas vão requerer meses ou até alguns anos para o desenvolvimento e teste, restando somente intervenções não farmacológicas para conter a transmissão do vírus. Nesse cenário, a pandemia de COVID-19 poderia durar até 2022, com possíveis duas ondas de contaminações que teriam seu pico durante o inverno no hemisfério norte, e com a necessidade de  novos períodos de isolamento social de 25 até 75% do tempo. Durante esses dois anos, possivelmente o vírus contaminaria todo o mundo. Neste caso, as contaminações aconteceriam como aconteceu com o influenza entraria em um ciclo sazonal de infecções (ocorrendo principalmente no inverno).

    Caso a capacidade dos sistemas de saúde seja aumentada (e isto já está ocorrendo, mesmo que mais lentamente do que gostaríamos neste momento), facilitaria à população a ganhar imunidade contra o vírus, levando a redução do tempo da pandemia, dos isolamentos e distanciamentos sociais. Essa imunidade não ocorre por termos mais hospitais, mas por termos mais capacidade de suporte para atender pacientes, assim, estes têm mais chances de sobreviver, ficando imunizados (ao menos, ao que tudo indica) por um tempo. Junto a esse fato, com a descoberta de algum potencial medicamento eficaz, a pandemia e as medidas de isolamento poderiam ser totalmente relaxadas por volta do primeiro semestre de 2021.

    Mas, como dito, esse seria o pior dos cenários. A maioria dessas alegações feitas pelos pesquisadores foram baseadas em modelos matemáticos, então muitas pesquisas ainda precisam ser feitas para se comprovar algumas dessas modelagens como o grau de imunidade cruzada causada pelos vírus e o tempo da imunidade das pessoas contra o SARS-CoV-2.




    Referências:

    https://time.com/5822470/countries-lifting-coronavirus-restrictions-europe/

    https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/situation-reports/

    https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2020/04/15/interna-brasil,844824/brasil-anuncia-droga-com-94-de-eficacia-contra-coronavirus-em-laborat.shtml

    Kissler, S. M., Tedijanto, C., Goldstein, E., Grad, Y. H., & Lipsitch, M. (2020). Projecting the transmission dynamics of SARS-CoV-2 through the postpandemic period. Science.

    Neher, R. A., Dyrdak, R., Druelle, V., Hodcroft, E. B., & Albert, J. (2020). Potential impact of seasonal forcing on a SARS-CoV-2 pandemic. Swiss Medical Weekly, 150(1112).

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Alguns questionamentos sobre governo, um vírus e a fome

    “Eu tenho quase certeza que não vou morrer por causa desse vírus aí, mas se eu parar de trabalhar eu e toda a minha família vamos morrer de fome”.

    “Eu tenho quase certeza que não vou morrer por causa desse vírus aí, mas se eu parar de trabalhar eu e toda a minha família vamos morrer de fome”.

    Foi no dia 18 de março que ouvi pela primeira vez essa frase, dita por um motorista de Uber, e que logo depois se tornou tão popular na mídia conjuntamente à progressão da pandemia de COVID 19 no país. Naquele dia fui à São Paulo para participar em um programa de rádio sobre Fome e Direitos Humanos. A universidade na qual eu realizo minha pesquisa de doutorado, Unicamp, havia cancelado todas as atividades até o dia 14 de abril e eu já estava em uma quarentena auto imposta pois tinha participado de muitos eventos com pessoas recém chegadas da Europa.  Por esses e outros motivos, a ida para São Paulo me deixava um pouco ansiosa, principalmente ao saber que a cidade se configurava como o epicentro da doença no Brasil. Depois de confirmar com os organizadores do programa que a entrevista ia acontecer de qualquer maneira, me preparei para a viagem tentando seguir ao máximo as medidas de higiene recomendadas.

    No entanto, ao entrar na cidade fui percebendo que a vida por ali estava beirando a normalidade. Pessoas estavam trabalhando em lojas, havia vendedores de água e salgadinhos nos semáforos, os restaurantes estavam cheios e os ônibus municipais estavam tão lotados como usual. Assim, temendo contaminar alguém com a doença que nem sabia se tinha, resolvi chamar um Uber e, no caminho, comecei uma conversa que resultou na frase com a qual iniciei este texto.

    A afirmação do motorista ficou martelando na minha cabeça durante todo o dia. Mais do que isso, foi essencial para me fazer pensar na relação entre a fome, os direitos sociais básicos e a epidemia que estávamos por enfrentar – o que acabou sendo o principal tópico de discussão da entrevista naquela manhã.

    A comida sempre foi boa para pensar, como afirmou Lévi-Strauss (1929). Mas em relação à pandemia do COVID-19, a comida é objeto essencial para entendermos melhor os efeitos desta doença, não apenas compreendendo-a como epifenômeno de relações sociais mais amplas. Principalmente, porque o novo coronavírus tem suposta origem no consumo de animais exóticos e porquê sua epidemia impôs quarentena e distanciamento social para um número massivo da população mundial. E isto acabou impedindo ou alterando o acesso a direitos sociais mais básicos, tais como alimentação, habitação e saúde, que a atenção ao tema da comida e à garantia de acesso a ela é de extrema relevância.

    Estou certa, assim como diversos pesquisadores e cientistas das mais variadas áreas, que a atual pandemia pode ser compreendida como um momento crucial para repensarmos categorias  estruturais de nossa vida em sociedade como a economia, a política, o governo e o Estado. Assim, a discussão sobre o acesso à comida enquanto necessidade básica para a sobrevivência parece ser um bom ponto de partida.

    Em 1948, com a criação das “Nações Unidas”, após o fim de uma das maiores crises globais até então vivida, foi assinado a “Declaração Universal dos Direitos Humanos”, na qual o artigo 24 afirma:

    “Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle” (ONU, 1948).

    Essa declaração, apesar de não constituir uma obrigação jurídica para os Estados, se propunha como uma resolução com o objetivo de evitar uma nova situação catastrófica como aquela experienciada durante a Segunda Guerra Mundial. 

    No momento atual, ao prestarmos atenção nas implicações que a epidemia de COVID-19 pode trazer para a sociedade como um todo, somos incitados a questionar se esses direitos foram em algum momento realmente garantidos, pelo menos para parte da população mundial.

    Retomando a afirmação do motorista de Uber, mas também considerando o que os trabalhadores das mais diversas áreas têm reivindicado nesse momento, podemos nos atentar para a precariedade de muitas vidas. Talvez, grande parte da população nunca teve garantido “o direito à segurança em caso de perda dos meios de subsistência fora de seu controle” (ONU, 1948).

    Penso, então, que o que essa pandemia está nos ensinando reside precisamente nos efeitos do vírus para além do tempo da ‘declarada pandemia’, modificando ou questionando ideias acerca do próprio conceito de ‘vida’ e subsistência.

    A comida que é usualmente um objeto renegado ao setor privado de nossas vidas, o domínio do oikos, vista como parte de uma esfera afastada da política, define agora, talvez mais do que nunca, aqueles que podem viver ou os que são deixados para morrer. E nesse processo, acaba por definir também o que é entendido por economia (oikos) e qual a sua importância na ‘feitura do Estado’ (Lima, 2012).

    De acordo com o Ministro da Saúde, Luis Henrique Mandetta, “a vida não se resume a uma doença, a um vírus”. Essa afirmação pode sim ser um consenso, no entanto, podemos questionar, a que se resume a vida então? Quais são os mínimos vitais que precisam ser estabilizados para que algo possa ser definido como vida? Que vida é essa que seguiremos tendo após a resolução dessa pandemia (e aqui não penso uma resolução no sentido de fim ou cura do problema)?

    Um dia após essa constatação do Ministro da Saúde, o presidente Jair Bolsonaro aprovou uma medida provisória (MP) que buscava soluções para a crise econômica decorrente do COVID-19. Um dos pontos mais polêmicos da medida permitia a suspensão de contratos de trabalho por até quatro meses durante o período de calamidade pública no país, desde que fossem disponibilizados cursos de formação online para os trabalhadores. Esse ponto foi rapidamente removido da MP após grande mobilização virtual da população, mas o poder executivo federal segue tentando barrar toda possibilidade de criação de medidas que garantam um padrão de vida adequado para todos os cidadãos, com a justificativa de que essas ações poderiam quebrar a economia do país. 

    No entanto, se nos atentarmos aos dados sobre trabalho no país percebemos que a taxa de informalidade é de 41%, o que equivale à 38,8 milhões de trabalhadores sem carteira registrada. Esses números sugerem então um baixo impulso na economia, pois normalmente o trabalho informal está associado à baixos salários, além de não permitir a garantia de estabilidade e segurança no provimento familiar. Em um contexto de crise são esses trabalhadores e suas famílias que são colocados, de uma hora para outra, em condição de total precariedade.

    Face a esse problema, no dia 24 de março, o presidente Jair Bolsonaro, fez um pronunciamento oficial televisionado em todo o país, mostrando sua preocupação com a atual situação econômica. Em sua fala, tentando minimizar os efeitos da crise, afirmou que o COVID-19 não passa de uma “gripezinha” e que por isso somente os idosos e os casos suspeitos deveriam ser mantidos em quarentena e o resto da população deveria continuar vivendo normalmente, isto é, produzindo e consumindo.

    A oposição entre economia e vida parece ser elemento central na forma de gestão do atual governo, o que nos incentiva a questionar então, como garantir um padrão de subsistência adequado para toda a população se o Estado não está disposto a manter grande parte dos cidadãos protegidos do vírus?

    Apesar de parecer um questionamento um tanto inocente, penso que o novo coronavírus pode trazer a possibilidade de repensarmos algumas oposições dadas como ‘naturais’ que operam em nossa vida em sociedade, sendo a principal delas a oposição entre a esfera da economia e a da política. Acredito que o direito à comida ou próprio fenômeno da fome podem nos ajudar a trazer luz aos aspectos mais materiais que informam esse dualismo.

    Se pensamos a economia enquanto diretamente associada à manutenção da vida, isto é, como instrumento de produção e reprodução das condições materiais necessárias à existência humana digna, essa oposição entre economia e vida, ou entre economia e política se desmancha. Mas se seguirmos entendendo essas esferas como separadas continuaremos presos a uma ideia de vida totalmente desnuda de humanidade. O vírus terá então nos ensinado muito pouco sobre nós mesmos.

    Leia também:

    Solidariedade: saúde para todos

    Para saber mais:

    Lévi-Strauss, Claude.[1929] (1965) Le triangle culinaire. L’Arc.

    Lima, Antonio Carlos de Souza, (2012). O estudo antropológico das ações governamentais como parte dos processos de formação estatal. In: Dossiê. Fazendo Estado. Revista de Antropologia. Vol. 55, N. 02 de 2012, São Paulo, USP.

    ONU. (1948) Declaração Mundial dos Direitos Humanos. Paris: III Assembléia das Nações Unidas, 10/12/1948. Res. No 217 A. Disponível em: http://www.onu -brasil.org.br/documentos_direitos humanos.php.

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Ficar em casa para quê?

    Versão Ana Arnt do fim de Fevereiro…

    Enquanto eu estava viajando para um canto aqui na América do Sul, nas minhas férias, eu acompanhava a situação do Corona, à distância. Tentava entender a gravidade da situação pelos jornais, entre alarmismos e uma calma latente. (mas a letalidade não é baixa? Pensava eu…). Entre um café e outro, uma trilha aqui, uma parada em um lugar com internet ali, eu buscava acompanhar as notícias sem um empenho dantesco…

    Por outro lado, eu conversava com a Rafaela quase todos os dias! Mensagens bobas sabe? De saudades, felicidade pela projeção da amiga na pesquisa, pelas fotos bonitas em redes sociais… Estas coisas que parecem, para muitos, fúteis e mundanas (e são mesmo, em muitos níveis!). Entre relatos de pesquisa e novidades de laboratórios, conversas comuns de amigas que mesmo distante, seguem em contato. Desde que pensamos em montar esta série de textos, olhando para trás, fizemos uma retrospectiva, que apresentamos hoje, a partir da narrativa e perspectiva dela, na Itália…

    Diário de uma pesquisadora na Itália, em  etapas…

    1 – Quando o vírus começou a aparecer na China, estávamos de olho. O grupo de pesquisa que eu participo estudou a primeira epidemia de SARs, em 2003 , é normal acompanhar casos semelhantes e estar sempre atentos.

    2 – O vírus chega na Itália! Um casal chinês que estava em Wuhan vem para cá, nós monitoramos a situação… Mas até este momento, nem imaginávamos o que estava por vir.

    3 – Passam-se algumas semanas. Chega a notícia do paciente 1, que não teve contato com ninguém da China, nem ninguém infectado. Como assim? De que maneira isso pode ter escapado ao nosso radar?

    4 – Não há como não elaborar, no susto, teorias da conspiração diversas. Porém, hoje, sabemos que em razoável silêncio, o vírus já estava em circulação comunitária.

    5 – Segundo a OMS, os pacientes que se encaixavam como suspeitos do Corona teriam que ter contato com pessoas que vieram de países com a doença, além dos sintomas. O paciente 1 não esteve em contato com ninguém que estivera nos países de risco… A Itália, assim, descartou o paciente 1. 

    6 – Enquanto isso, no nosso laboratório, muita conversa, um pouco de piada, análises de textos e informações. Uma leveza extrema, as conversas fluíam entre análises.

    7 – De repente, opa! Em um piscar de olhos: o número de casos aumentam! De um dia pro outro, dobram! Como assim?

    8 – Carnaval chegou. Sim a doença estava aparecendo, mas estava tudo bem, estávamos monitorando e aprendendo sobre tudo o que ocorria. Eu, particularmente, fui à Veneza com a minha máscara (lindíssima, inclusive!). Está tudo tranquilo, posto fotos em redes sociais, converso com amigos do Brasil, que também estão no carnaval… E…

    9 – 11 cidades fecham! Carnaval cancelado! Isso: CANCELADO. Lockdown! Acabou o carnaval no meio da praça. Simples assim: em um segundo eu estou de máscara, plena, rindo. No outro é anunciada a medida de conter o coronavírus pelo microfone no meio da festa na rua.

    10 – Medo. Sim, não há outro modo de dizer. Eu estou em pânico de ficar presa em Veneza! Corro. Suspendo o resto da reserva do hotel, pego o trem e volto pra casa. Enquanto isso, uma amiga brasileira que está comigo, acha melhor ir pro Sul, porque lá a situação tá mais tranquila. 

    11 – Volto para Milão, a vida parece normal no norte, menos pânico que em Veneza (Ufa!!! que bom!!). Lá tinha um caso confirmado (Deus me dibre de ficar lá presa, sozinha). Em Milão, ainda não há casos confirmados. 

    12- Dias depois, o medo vai dominando a mídia. Mil indicações de álcool em gel a todo instante. Eu acalmo meus amigos do Brasil que perguntam, falo que devem se preocupar com a Dengue e outras doenças tropicais. “Calma, tá tudo certo, tem um certo exagero no ar”, eu dizia. Mas enquanto isso…

    13 – Eu começo a mastigar artigos e relatórios da OMS, tanto para debater no grupo de pesquisa, quanto para discutir com as minhas amigas na Itália como poderíamos viver aquele momento. Quase numa tentativa de não assumir que a gente tinha que ficar em casa mesmo! Eu ainda comento com algumas amigas brasileiras que tenho dúvidas se devo voltar ou não. É tudo muito incerto, sabe?

    14 – Minha amiga, que tinha ido para o sul? Fui visitar ela e logo após ela consegue pegar o último vôo da latam Itália-Brasil.

    15 – Ah pronto! Bloquearam o norte! Eu fiquei…

    16 – Mas também… Ainda dava para ir trabalhar, ir em restaurante… Eu usava álcool em gel e mantinha um metro de distância, como recomendado. Uma pena não conseguir mais ir visitar o lago Como! Sigo lendo os artigos, seguimos tentando entender tudo e debatendo a situação no laboratório.

    17 – Dois dias depois, é anunciado o fechamento completo da Itália. Um dia depois é anunciado o fechamento de todo o comércio só ficando aberto farmácias e mercados. 

    18 – O número de mortos aumentam, os médicos são infectados, faltam médicos para tratar as pessoas. O caos chegou enfim. A gente parou! De novo: A GENTE PAROU!

    19 – Estamos em casa, todos!!!!! Vamos às ruas quando precisa, mas não sem medo.

    Enquanto isso, na ponte Brasil-Itália das redes sociais…

    A Rafa estava sã e salva em casa, mas sem ver pessoas, isolada no seu apartamento, lendo artigos sem parar e nos atualizando da situação, da gravidade dos números, das escalas de trabalho no laboratório e de como, aqui no Brasil, devíamos proceder. E nessa altura, Rafa era sim, bem enfática nas recomendações de que não era um exagero e tudo aqui ia fechar também!

    Já a Ana Arnt estava voltando às aulas depois das férias, questionando internamente se a amiga não tava exagerando, tentando ler relatórios internacionais e acompanhar os desdobramentos dos casos brasileiros, que já começavam a pipocar nos noticiários, redes sociais, canais de divulgação científica.

    Pois bem, mal começou as aulas na Unicamp e: paramos! Segunda semana letiva, 15 minutos antes da reunião do Grupo de Pesquisa do PEmCie acontecer, veio a mensagem oficial. Logo após tinha aula na Pós Graduação. Enquanto isso a Rafaela já dizia no grupo que era isso mesmo, sem exagero, a gente tinha que parar!

    Por que isso está nesta série de postagens sobre o Corona?

    Uma das grandes dificuldades de tudo o que está acontecendo é que estamos aprendendo enquanto a doença se desenvolve. E por ser uma doença que avança muito rápido na sociedade, em números, o quão severo era o problema e as razões de considerarmos severo, foram mudando (o que é bem normal no trabalho científico). A grande questão era: nós mudávamos nossa postura frente a tudo o que ocorria, literalmente, da noite para o dia!

    Grande parte do aprendizado, além disso, vinha (e ainda vem) de artigos recém publicados e de relatórios da OMS, sem tempo para debater com nossos colegas. Estamos aprendendo, estudando e divulgando o que sabemos, com um tempo muito curto – e isso não é exatamente o mais comum do dia a dia na Divulgação Científica e na produção científica… Mas vamos ao cerne da questão: Parar ou não parar?

    #fiqueemcasa

    Parece lógico dizer a todos para ficar em casa. Temos que provocar, sim, o isolamento máximo de contatos sociais. Não basta só limpar-se com álcool gel, nem lavar as mãos constantemente. É preciso distância entre pessoas! É fundamental respeitarmos um espaço entre todos na rua, repensarmos nossos hábitos higiênicos e tudo o mais que já foi dito. Mas ficar em casa é sim uma estratégia funcional e fundamental. É a recomendação da OMS, do Ministério da Saúde, de pesquisadores da área. O cenário ideal é esse: todos em casa.

    Mas não é essa a possibilidade o tempo inteiro, não é mesmo? Vivemos em condição de pobreza e miséria em nosso país. Temos um enorme número de pessoas trabalhando na informalidade e/ou como autônomos, o que significa que parar de trabalhar (e, portanto, circular) é parar de receber. Temos pessoas que trabalham na área da saúde, transportes e logística de distribuição de alimentos e medicamentos. E é por estas pessoas, todas elas, que, também, temos que parar.

    Hoje, mais do que informações específicas, recomendações.
    Parar tudo seria um dos caminhos, dentre utopias reais e implementáveis!

    Vídeo em que Italianos falam para “o eles mesmos do passado” – 10 dias atrás.

    Série PEmCie: Coronavírus

    Entrevista de Rafaela Rosa-Ribeiro no jornal Estado de São Paulo

    Links para conferir, sempre, em caso de dúvidas:

    CANAIS OFICIAIS BRASIL e MUNDO

    Organização Mundial da Saúde
    Associação Brasileira de Saúde Coletiva
    Ministério da Saúde
    Central of Disease Control and Prevention

    Jornais

    Folha de São Paulo
    G1
    Estado de São Paulo

    Divulgação Científica:

    Rafaela Rosa-Ribeiro

    Blogs de Ciência da Unicamp:
    www.blogs.unicamp.br
    www.blogs.unicamp.br/pemcie
    www.instagram.com/blogsunicamp

    Átila Iamarino:
    www.twitter.com/oatila
    www.instagram.com/oatila

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Coronavírus e o controle do contágio

    No post anterior, falamos um pouco sobre a história das quarentenas e isolamentos para controlar os contágios. No entanto, o Coronavírus nos impõe um novo ritmo de cuidados e precauções. Como assim? Seja pela rapidez com que a informação se dissemina, seja pelo contágio rápido e silencioso pela população, seja por vivermos em constante deslocamento: estamos vivendo um novo momento de alastramento de doenças. Os tempos são outros… Não vivemos mais em épocas em que conseguíamos estancar embarcações por dias, atracados em alto mar, tampouco conseguimos manter presos entre muros fora das cidades as pessoas, sem que elas interajam com outras pessoas no caminho.  As fronteiras entre os países não só são linhas inexistentes, mas nosso modo de vida é de um grande fluxo de pessoas entre lugares distantes no globo. Assim, quando acontece o surgimento de uma doença que infecta tão rapidamente as pessoas, a partir do contato mais cotidiano e rotineiro, todas as estratégias e modelos criados para estancar o alastramento da doença e inibir o contágio são postos à prova.

    Coronavírus e sua rápida disseminação

    No caso do Coronavírus, após a percepção de que estávamos, sim, enfrentando uma nova doença e da rapidez com que mais e mais pessoas adoeciam, ainda em Wuhan, mesmo sem a compreensão de todos os mecanismos de contágio, houve os primeiros anúncios de quarentena. Após o contato inicial com alguém infectado com o Coronavírus, os primeiros sintomas podem aparecer entre 2 a 14 dias, sendo mais comum em 05 dias. Dessa forma, as pessoas que, inicialmente, chegavam de países ou regiões com incidência do vírus, recebiam orientação de permanecerem o período de 14 dias sob observação e isoladas socialmente, para livrar de qualquer dúvida estarem infectados com o coronavírus. 

    E agora?

    Hoje vivemos um outro momento da doença. Não mais a tentativa de barrar ou atrasar ao máximo sua entrada em nosso país, mas de impedir que o vírus atinja a todos ao mesmo tempo. Percebam: que muitas pessoas serão atingidas, é imaginável! O vírus se espalha por contato, cada pessoa com sintomas chega a infectar de 2-3 pessoas em média. E é muito difícil mudar este número. Porém precisamos que essas infecções vão atingindo as pessoas aos poucos. isto é, diluindo a expansão da doença ao longo do tempo, para que quando atinja o grupo de risco não sobrecarregue o sistema hospitalar público e privado com o uso de leitos e UTIs e a maioria consiga receber atendimento com tempo e adequadamente. Lembrando sempre que o grupo de risco são: idosos e pessoas com doenças cardiorespiratórias, hipertensas, diabéticas, imunossupremidas e que tenham ou já tiveram câncer. Em suma: o momento agora é de diminuir todo e qualquer contato possível. Esta é, por enquanto, a única forma real e tangível de diminuirmos a quantidade de infectados: diminuindo o contato humano! Pareceu cruel? E é mesmo. No próximo post vamos falar um pouco mais sobre a crueldade do isolamento e a noção de saúde e solideriedade…

    Para saber mais

    CYNAMON, Szachna Eliasz (1990) Saúde Pública, qualidade de vida. Cadernos de Saúde Pública, 6(3), 243-246 https://doi.org/10.1590/S0102-311X1990000300001. FOUCAULT, Michel (2002) Em defesa da Sociedade São Paulo: Martins Fontes. ___ (2008) Segurança, Território e População São Paulo: Martins Fontes. GENSINI, Gian Franco; YACOUB, Magdi H; CONTI, Andrea A (2004) The concept of quarantine in history: from plague to SARS Journal of Infection, 49(4), 257-261. https://doi.org/10.1016/j.jinf.2004.03.002 SOUZA, Luis Eugenio Portela Fernandes (2014) Saúde Pública ou Saúde Coletiva? Revista Espaço para a Saúde, 15(4), 07-21.

    Documentos e instâncias oficiais

    BRASIL Ministério da Saúde (2020a) O que é Corona Vírus BRASIL Ministério da Saúde (2020b) Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo novo Coronavírus (COVID-19)

    Aqui neste blog

    Série: Coronavírus

    Para que precisamos de estudos sobre controle de doenças?

    Os isolamentos são importante, sim senhor! E não é de hoje essa prática…

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Os isolamentos são importantes, sim senhor! E não é de hoje essa prática…

    No segundo post da série sobre pandemia, coronavírus e doenças, vamos falar um pouco sobre a história dos isolamentos e da quarentena. Bora lá?

    Isolamentos e quarentenas como estratégias de controle de doenças

    Uma das práticas que têm sido usadas historicamente para combater ou impedir o alastramento de doenças, é o isolamento. Temos debatido isso e buscado colocar em prática a partir do surgimento do Coronavírus (COVID-19). Esta, no entanto, é uma prática de saúde anterior à compreensão de saúde pública contemporânea, mas que foi incorporada como prática em tempos de alastramento de doenças. O isolamento de doentes não é, portanto, atual. Por exemplo, desde textos bíblicos, são comuns os relatos dos leprosários, em que as pessoas eram afastadas por tempos indefinidos das cidades e/ou da região em que moravam. Já a quarentena, como compreendemos até os dias de hoje, remonta a uma prática do Século XIV, inicialmente no porto de Ragusa (hoje Croácia) determinou oficialmente que haveria um tempo de trentina – 30 dias entre o tempo em que as embarcações chegavam ao porto, e poderiam desembarcar. Posteriormente, este tempo depois passou para 40 dias, sendo nomeado de quaranta para viajantes terrestres, que estivessem vindo de regiões em que a peste era endêmica. Dessa forma, em 1377 temos como marco a primeira quarentena oficial, visando proteger juridicamente tanto o comércio, quanto a  saúde da região. Veneza, no ano de 1423, estabelece uma estação de quarentena em uma ilha próxima à sua costa, tornando-se um modelo. Portanto, a quarentena é compreendida como um isolamento físico temporário de pessoas (ou outros seres vivos) que possam estar infectadas com alguma doença contagiosa. Temporário exatamente por conhecermos o tempo em que a doença pode se manifestar.

    Para saber mais

    CYNAMON, Szachna Eliasz (1990) Saúde Pública, qualidade de vida. Cadernos de Saúde Pública, 6(3), 243-246 https://doi.org/10.1590/S0102-311X1990000300001. FOUCAULT, Michel (2002) Em defesa da Sociedade São Paulo: Martins Fontes. ___ (2008) Segurança, Território e População São Paulo: Martins Fontes. GENSINI, Gian Franco; YACOUB, Magdi H; CONTI, Andrea A (2004) The concept of quarantine in history: from plague to SARS Journal of Infection, 49(4), 257-261. https://doi.org/10.1016/j.jinf.2004.03.002 SOUZA, Luis Eugenio Portela Fernandes (2014) Saúde Pública ou Saúde Coletiva? Revista Espaço para a Saúde, 15(4), 07-21.

    Documentos e instâncias oficiais

    BRASIL Ministério da Saúde (2020a) O que é Corona Vírus  BRASIL Ministério da Saúde (2020b) Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo novo Coronavírus (COVID-19)

    Aqui neste blog

    Série: Coronavírus Primeiro texto da série: Para que precisamos de estudos sobre controle de doenças?

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Para que precisamos de estudos sobre controle de doenças?

    A partir de hoje, vamos publicar um conjunto de textos abordando as ocorrências atuais sobre a quarentena e a pandemia. Serão textos explicando da doença em si. Também abordaremos contextos gerais para entendermos as estratégias para combater o avanço do Coronavírus. Além disso, claro, buscar obter informações, agregá-las aqui no blogs e melhorar (no que for possível) as condições cotidianas nas próximas semanas.

    Sobre doenças e populações e estratégias de governo…

    Se formos olhar para a história moderna, as preocupações com a saúde pública começam a se configurar com a consolidação dos Estados Nação, ou Estados Nacionais Modernos e do Mercantilismo. Como assim? É a partir da ideia de que existe um estado centralizado, cuja população precisa não somente ser governada, mas ser vista como produtora de riquezas que precisa ser mantida viva, é que os Estados vão buscar gerenciar as pessoas de seu país – ou a população – de modo a compreender como vivem e morrem as pessoas. Dessa forma, em vários países, instrumentos e ferramentas vão sendo criados para o estudo dessa população. Isto é, uma busca para intervir cada vez mais no sentido de diminuir a incidência de doenças e males que afetam essa população. Assim, como exemplos podemos citar a estruturação da Estatística e da Polícia Médica, na Alemanha nos séculos XVII e XVIII. Também podemos citar a institucionalização da Higiene, no século XIX, na França, com suas práticas de manutenção da saúde a partir de normas e prescrições para a população. Atualmente, chamamos a área que compreende este conjunto de estudos, estratégias e modelos de ação em cada país, para controlar doenças e compreender suas dinâmicas, de Saúde Pública. Dessa forma, isso inclui diferentes estratégias de governamental de qualquer país do mundo*. Por quê? Para analisar uma série de dados em um determinado tempo. Por exemplo: quantas pessoas nascem e morrem; de que forma nascem e do quê morrem; quais principais doenças atingem essas pessoas; que regiões adoecem mais e do quê; etc. Este tipo de estudo é essencial para organizar um país. Uma vez que de posse deste conjunto de dados, conseguimos organizar de modo eficiente – tanto em cada local (bairro ou município, por exemplo), quanto em regiões ou país – não somente como controlar as doenças, mas melhorar efetivamente a vida da população.

    Em suma…

    Por fim, em termos de população mundial temos, também, o levantamento de dados constante para rastreamento de novas doenças e/ou problemas de saúde. Isto ocorre a fim de combater doenças que possam se alastrar pelo mundo. A Organização Mundial de Saúde é uma das principais instâncias que, em casos como o do Novo Coronavírus, atua intensamente para coletar e agrupar dados, para que as políticas públicas de cada país possam agir de forma rápida e eficiente. * Poderíamos nos estender mais, aqui, e abordar o termo de biopolítica, de Michel Foucault. Em breve, faremos isso… Neste momento, apenas apresentaremos brevemente ideias para chegar no cerne da questão atual. 😉

    Para saber mais

    CYNAMON, Szachna Eliasz (1990) Saúde Pública, qualidade de vida. Cadernos de Saúde Pública, 6(3), 243-246 https://doi.org/10.1590/S0102-311X1990000300001. FOUCAULT, Michel (2002) Em defesa da Sociedade São Paulo: Martins Fontes. ___ (2008) Segurança, Território e População São Paulo: Martins Fontes. GENSINI, Gian Franco; YACOUB, Magdi H; CONTI, Andrea A (2004) The concept of quarantine in history: from plague to SARS Journal of Infection, 49(4), 257-261. https://doi.org/10.1016/j.jinf.2004.03.002 SOUZA, Luis Eugenio Portela Fernandes (2014) Saúde Pública ou Saúde Coletiva? Revista Espaço para a Saúde, 15(4), 07-21.

    Documentos e instâncias oficiais

    BRASIL Ministério da Saúde (2020a) O que é Corona Vírus  BRASIL Ministério da Saúde (2020b) Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo novo Coronavírus (COVID-19)

    Aqui neste blog

    Série: Coronavírus

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • libertar-se (já é tempo, amor)

    Q.U.A.R.E.N.T.E.N.A.M.O.S.
    Ao final do dia, sorrisos, suaves e subordinados, de quem sabe despertar em um mundo com fronteiras.
    Ao final do dia, sobressaltos invisíveis e (des)controles escorrem nossas vidas, como se nada fossem.
    Ao final do dia, contamos o tempo, mais um suspiro, no olhar, (in)serenidades de quem sabe ser mais (do mesmo).
    Ao final do dia esperamos, apenas, a hora de dormir, para esperar a hora de acordar para esperar mais um final de dia.
    .
    R.E.S.I.T.I.R.E.M.O.S.
    Se o cotidiano te atropela, cinza e sedento por rotina e(m) desespero, chegue ao final de cada dia com o escárnio das impossibilidades.
    Escárnio ao cultivar, mesmo encarcerado, alegrias miúdas em segundos vívidos e suor.
    O tempo, meu bem, não te aguarda, por vezes entedia e tudo (como sempre soubemos) vai piorar… 
    Todavia, na vida, não há escárnio maior que o gozo, nem rebeldia melhor que o sorriso sem submissão. 
    .
    Vai e escarra teu deleite.
    Vai e escancara teu prazer.
    Pois o resto, todo, já nos foi aviltado.
    .
    Já é hora, amor, de libertar-se (imerso dentro de casa)

    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

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