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  • As 11 Fake News sobre vacinas infantis que circularam antes e durante a consulta do Ministério da Saúde

    Segundo agências de checagem de fatos, 90% dos textos abordam a questão da segurança das vacinas. Eles distorcem estudos, peças publicitárias e até falas do Diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS). Além disso, parte dos conteúdos trazem vídeos de médicos e especialistas (nem sempre reconhecidos pela comunidade científica) que desaconselham vacinar as crianças, contribuindo para confundir a população.

    Contexto

    Após pouco mais de 22 meses desde que a OMS caracterizou a Covid-19 como pandemia, as vacinas ainda são a única medida eficaz, de que se tem notícia, para combater a doença, porém, no Brasil a imunização tem sido questionada não só por movimentos historicamente contrários às vacinas, mas também, surpreendentemente, por lideranças políticas que, paradoxalmente, deveriam zelar pela saúde da população. 

    O último embate, em que mais uma vez as autoridades nacionais se prestaram ao papel de questionar a necessidade das vacinas, começou no dia 26 de outubro de 2021 quando o comitê de especialistas do Food and Drug Administration (FDA), agência federal reguladora de saúde dos Estados Unidos, recomendou a aplicação da vacina em crianças de 5 a 11 anos. Assim, no dia 27, a imprensa noticiou que a farmacêutica Pfizer anunciou que solicitaria à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorização para vacinar crianças a partir de 05 anos de idade, o que se deu no dia 12 de novembro.

    Já em16 de dezembro, a agência aprovou o uso e divulgou os resultados técnicos de sua análise. Aliás, no mesmo dia, em live para seguidores, o atual Presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), ameaçou divulgar os nomes dos técnicos da Anvisa que participaram da aprovação do imunizante para crianças. Além disso, no dia 18, o quarto ministro da Saúde da gestão Bolsonaro, Marcelo Queiroga, anunciou que o governo federal realizaria uma consulta pública sobre a vacinação de crianças antes de decidir se aprovaria o início da imunização para elas, medida criticada tanto por médicos quanto por técnicos da Anvisa.

    Por que é importante verificar quais fake news circularam em dezembro?

    Em Saúde Pública (mas não apenas), a desinformação é um gravíssimo problema, pois, pode, por um lado provocar sobre demanda nos Sistemas de Saúde com exames desnecessários, motivados por alarmismo, por outro, levar pessoas a comportamentos extremos como deixar de realizar tratamentos necessários e de usar remédios essenciais para sua vida, enfim, no limite, a desinformação pode matar. Dessa forma, dado o momento em que o Ministério da Saúde solicitou uma consulta pública sobre o tema, a desinformação pode ter sido usada para distorcer a percepção das pessoas sobre as vacinas contra a Covid-19 para crianças.

    Metodologia

    Foram colhidas manualmente informações verificadas pelos sites, editorias e agências de checagem brasileiros Boatos.org, Aos Fatos, Projeto Comprova, Fato ou Fake, Uol Confere e Lupa, entre 01 dezembro de 2021 e 03 de janeiro de 2022. Assim, no total, os jornalistas realizaram no período cerca de 226 checagens, das quais 79 estavam relacionadas à Pandemia da Covid-19. Dentre estas, há 11 peças desinformando sobre a vacina infantil contra a Covid-19. Dessa forma, optamos por classificar essas verificações utilizando os rótulos de Misinformation and Disinformation (M&D) em Vacinas, compostos por 5 categorias e 17 subcategorias, elaborados por integrantes do Grupo de Estudo da Desinformação em Redes Sociais (EDReS), da Unicamp :

    1. Segurança: vacinas causam doenças (A); pessoas vacinadas transmitem a doença (B); vacinas causam autismo (C); as vacinas causam efeitos colaterais graves (D); as vacinas contêm ingredientes perigosos (E); é mais seguro contrair a doença do que vacinar (F); as vacinas podem prejudicar o sistema imunológico (G); sobrecarga de vacinas e suas consequências (H); esquemas alternativos de vacinação são mais seguros (I)

    2. Efetividade: as vacinas não funcionam (J); as vacinas não são responsáveis ​​pela diminuição das doenças (K)

    3. Saúde alternativa: promoção de alternativas à vacinação, principalmente serviços naturopáticos e de bem-estar (L)

    4. Moralidade: associação entre vacina contra HPV e promiscuidade, e / ou questões religiosas (M)

    5. Teorias da conspiração: narrativas sobre instituições poderosas ou atores com intenções nefastas e planos secretos (N)

    6. Outro: autodireção – liberdade de escolha, pesquisa independente (O); alegam que quem conhece a “verdade” não vacina (P); apelo emocional (Q) 

    (TOKOJIMA MACHADO, DE SIQUEIRA e GITAHY, 2020: p. 03)

    Análise

    Discussão

    Das 5 categorias possíveis de M&D em Vacinas, figuram na amostra Segurança (81%) e Teorias da Conspiração (19%). Assim, de todas as 17 subcategorias categorias possíveis, figuram quatro: as vacinas causam efeitos colaterais graves (D), as vacinas contêm ingredientes perigosos (E) as vacinas podem prejudicar o sistema imunológico (G), e narrativas sobre instituições poderosas ou atores com intenções nefastas e planos secretos (N). 

    Contudo, há textos que podem ser enquadrados em mais de uma categoria, como por exemplo a desinformação sobre 13 crianças que teriam morrido na África em função da vacina (categoria D) que também é associada ao nome do empresário estadunidense Bill Gates (categoria N). Dessa forma, por essa perspectiva, o número de textos que abordam a segurança dos imunizantes sobe para 90%.

    Observando especificamente para as 09 peças que versam sobre efeitos colaterais graves causados por vacinas, constata-se que 04 delas associam vacinas diretamente a mortes de crianças, em 02 os “especialistas” desaconselham a vacinação de crianças, em outras 02 a vacina é associada a riscos de AVC, miocardite e pericardite em crianças e 01 repisa a teoria da “vacina teste”.

    Hoje, já existe um consenso de que esses conteúdos não são tão espontâneos quanto fazem parecer e que existe uma linha de produção de desinformação com interesses financeiros e/ou políticos, um Ecossistema da Desinformação. Assim, partindo dessa premissa, a absoluta predominância de peças com foco nos efeitos colaterais das vacinas apontam para o interesse em criar na população uma atmosfera de risco, levando-as a hesitar em vacinar seus filhos. Apesar disso, conforme apontam recentes levantamentos de opinião, a imensa maioria dos brasileiros (79% segundo o Datafolha e  72%, Genial / Quaest), pretende vacinar seus filhos.

    Por fim…

    Neste estudo não dispomos de dados para afirmar que esses 18% (em média) de pais que ainda hesitam em vacinar seus filhos estão sendo influenciados pela desinformação que circula desenfreadamente via mídias sociais e, por vezes, na mídia tradicional, uma vez que insiste em dar espaço para negacionistas da vacina. Todavia, outros estudos utilizando a Análise de Redes podem confirmar ou negar essa hipótese, mapeando o alcance dessas publicações, os seus produtores e toda a rede de disseminadores que trabalha diuturnamente contra a saúde pública e contra a ciência.

    Referências: 

    PROJETO COMPROVA (2021) É enganoso que vacina contra covid-19 tenha provocado aumento de morte de crianças

    PROJETO COMPROVA (2022) Médica distorce estudo para atacar vacinas e é desmentida pelo autor.

    TOKOJIMA MACHADO, DF, DE SIQUEIRA, AF, GITAHY, L (2020) Natural stings: selling distrust about vaccines on Brazilian YouTube Frontiers in Communication, Volume 5, p 91.

    G1, Fato ou Fake

    DOMINGOS, R “É #Fake que”:

    Cartaz de campanha de prevenção ao AVC em crianças na França tenha relação com a vacina contra Covid-19

    Cartaz de campanha de prevenção ao AVC em crianças na França tenha relação com a vacina contra Covid-19

    Imagens de autópsia mostrem lesões causadas por vacina contra Covid e que imunizante cause vasculite

    Vídeo de homem que se diz inventor das vacinas de mRNA e afirma que vacinas são tóxicas para crianças

    Vídeo que diz que Austrália vai colocar 24 mil crianças em ‘campo de quarentena’ para serem vacinadas

    Boatos.org

    BECKER, K (2021) Pfizer admite que vai levar 5 anos para descobrir riscos de vacinas para crianças #boato

    MATSUKI, E

    13 crianças morreram após serem vacinadas contra Covid-19 na África #boato,

    Austrália cria campo de concentração para não-vacinados e vai vacinar crianças à força #boato

    Diretor da OMS diz que vacinas contra Covid-19 matam crianças #boato

    Diretor da OMS diz que vacinas contra Covid-19 matam crianças #boato

    Robert Malone é o inventor da vacina mRNA e está certo sobre vacinação de crianças #boato

    Agência aos fatos

    FAUSTINO, M (2021) Em vídeo, médica mente sobre substâncias e efeitos adversos de vacinas contra a Covid-19. Agência Aos Fatos

    MENEZES, LF (2021) É falso que Anvisa aprovou sem contraindicação vacina da Pfizer para crianças Agência Aos Fatos.

    MENEZES, LF (2021) Em vídeo, virologista falseia ao dizer que vacinas de mRNA são tóxicas para crianças Agência Aos Fatos

    RUDNITZKI, E (2022) Austrália não vai separar 24 mil crianças de seus pais para vaciná-las em ‘campo de quarentena’ Agência Aos Fatos

    PACHECO, P (2021) Vacinas contra Covid-19 não provocam liberação de fibrina na corrente sanguínea Agência Aos Fatos

    Agência Lupa

    NOMURA, B (2021) #Verificamos: É falso que Austrália colocou 24 mil crianças em ‘campos de quarentena’ para vaciná-las, Agência Lupa.

    NOMURA, B (2021) #Verificamos: É falso que vacinas de RNA mensageiro levam à produção de proteínas tóxicas em crianças Agência Lupa

    SKROCH, JB,  MACÁRIO, C (2021) #Verificamos: Médica distorce informações ao relacionar vasculite a vacinação contra a Covid-19, Agência Lupa

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Maurílio é autor no Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Vacina contra COVID-19 para Crianças: entre o dever e o poder, o que prevalece?

    Era uma época sombria. Os mortos se acumulavam. O vírus caminhava pelas ruas sem controle, como uma besta desvairada, batendo de porta em porta e entrando naquelas que se abriam à ele. Infestava tudo e todos que encontrava em seu caminho: desde combatentes da pandemia a desavisados, perdidos e negacionistas.

    E então ela chegou, aquela que realmente poderia afastar as escuras nuvens que tomavam nosso mundo, permitindo que o sol brilhasse novamente nesse pálido ponto azul que chamamos de Terra: a Vacina.

    Começou com os idosos. Pais, avós, tios, conhecidos. Reclusos, com medo e trancados desde o início da pandemia. 

    Com o tempo, aqueles de meia idade, muitas vezes chamados efetivamente de “adultos”, foram sendo vacinados. 50, 40, 30 anos… a cada semana, pessoas mais novas eram chamadas.

    Então, chegou nosso momento, os “jovens”. Após ver avós e pais vacinados, finalmente seria a nossa hora. A tão sonhada proteção estava chegando, e logo poderíamos – quem sabe – rever os amigos, dessa vez sem o intermédio de uma tela.

    E agora?

    Com a situação um pouco mais calma, mas não completamente resolvida (e podendo facilmente voltar ao caos passado), a vacinação da próxima geração, as nossas crianças, se aproxima a passos módicos. Entretanto, assim como um vulto que persiste em ficar na extremidade de nossa visão, as sombras do movimento antivacina se lançam sobre os indivíduos, espalhando o medo e mentiras sobre a vacinação dos menores.

    Pensando nisso, viemos aqui para explicar as novas notícias sobre a vacinação das crianças e responder suas dúvidas, cara leitora e leitor, para que possa entender melhor sobre isso e proteja suas filhas e filhos.

    O que se sabe sobre a COVID-19 em crianças?

    O vírus causador da COVID-19, o SARS-CoV-2, tem muitas similaridades com o vírus causador da SARS em 2003, o SARS-CoV-1. Entretanto, os casos infantis entre as duas doenças têm algumas diferenças. Na SARS, os casos entre crianças eram bem raros e tinham um histórico de exposição muito claro. Isto é, sabia-se como, onde e quando a criança havia pego o vírus. Já com a COVID-19, esse rastreio de casos foi e é bem mais complicado [1]. 

    A princípio, como muitas crianças desenvolviam a forma leve ou assintomática, os casos entre elas eram ignorados. Assim, dizia-se que não haveria qualquer problema em elas pegarem o SARS-CoV-2. Com o passar das semanas e o aumento gigantesco do número de infecções, começou-se a ver que esses casos assintomáticos (tantos infantis quanto adultos) eram fonte de uma parte significativa do espalhamento do vírus. 

    Mas há muito mais informações hoje…

    Atualmente, até onde se sabe, a COVID-19 afeta todas as idades de crianças e adolescentes, desde recém-nascidos até maiores de 18 anos. Os principais sintomas que elas apresentam são febre e tosse. No entanto, outros sintomas inespecíficos podem aparecer, como dor de cabeça e de garganta, cansaço, nariz tampado e escorrendo, vômito e diarréia [2, 3]. Em geral as crianças desenvolvem a forma assintomática, leve ou moderada da COVID-19. Todavia, alguns estudos sugerem que recém-nascidos (e crianças com menos de 1 ano de idade) possuem 3x mais chances de ter sintomas gastrointestinais e desenvolver a forma severa da COVID-19 [3]. Assim, pensando nisso, é de suma importância levar em consideração ainda a proteção dos pequenos, seja mantendo-os em isolamento social ou levando-os para se vacinar, quando as campanhas de vacinação para essas faixas de idade começarem.

    ainda sobre controvérsias

    Infelizmente, nos dias atuais, o mesmo discurso do começo da pandemia (sobre não haver risco para as crianças) ainda é utilizado para advogar a volta às aulas, mesmo já sabendo de tudo isso. Mas, é claro que, por um lado, compreendemos ser muito difícil todo o processo de ensino a distância, as dificuldades e problemáticas criadas com ele, fora a questão que muitas crianças de famílias necessitadas dependiam de serviços escolares para necessidades de saúde mental, física e nutricional. 

    Entretanto, é necessário lembrar que apesar da maior parte das crianças desenvolverem casos leves de COVID-19, elas ainda podem desenvolver casos severos e vir a falecer, principalmente aquelas que possuem alguma comorbidade, são imunocomprometidas ou fazem uso de imunossupressores. Além disso, alguns estudos vêm sugerindo que, assim como em adultos, após uma infecção de COVID-19 em crianças, pode haver a persistência de sintomas como cansaço, dor muscular, insônia, problemas respiratórios e de concentração, durante vários meses pós-infecção [4, 5].

    Mas algum país já está vacinando menores de 12 anos?

    Sim! Alguns países já começaram a vacinar as suas crianças 

    • Cuba: a partir de 2 anos com a Soberana 2 e Soberana Plus [6],
    • Chile: 6 anos ou mais com CoronaVac [7],
    • China: a partir de 3 anos com CoronaVac [8],
    • Estados Unidos: a partir dos 6 anos com a Pfizer [9].

    A grande questão aqui é que os Estados Unidos foi o primeiro país a ter uma vacina (Pfizer) aprovada para uso emergencial em crianças por uma agência reguladora e a publicar os dados das fases de teste em revistas científicas, para avaliação do resto da comunidade científica [10]. Enquanto isso, tanto os dados da Soberana 2 (em Cuba) e da Coronavac (no Chile e na China) permanecem em sigilo. Ou seja, sem comunicação oficial para a OMS e revistas científicas para revisão por pares. 

    Assim, por esses e outros motivos que vamos apresentar agora as principais informações referentes às vacinas contra COVID-19 que estão sendo testadas e aprovadas para uso em crianças:

    Vacina Pfizer [10-13]:

    • Pode ser aplicada em crianças de 5 a 11. A Pfizer e Biontech anunciaram que até o final de 2021 iriam publicar os dados referente ao uso da vacina em crianças entre 6 meses e 5 anos.
    • A dose utilizada em crianças de 5 a 11 é ⅓ da dose original utilizada em adultos e jovens maiores de 12 anos. 
      • Serão aplicadas duas doses, com um intervalo de 3 semanas entre elas.
    • A quantidade de anticorpos neutralizantes (falamos sobre este conceito nesse e nesse texto) observadas nas crianças após um mês da segunda dose, foi bem parecida com a quantidade vista em jovens e adultos.
      • Isso quer dizer que mesmo com a dose sendo menor, as crianças acabam tendo uma proteção boa.
    • Não foram vistos grandes efeitos colaterais. Os poucos efeitos observados assemelham-se com os efeitos que aparecem em jovens adultos.
    • A eficácia da vacina ficou por volta dos 90%, bem parecido com a eficácia em adultos.
    • A Pfizer já obteve, em nosso país, a aprovação da ANVISA para uso da sua vacina para crianças entre 5 e 11 anos.

    Vacina Moderna [14-17]:

    • Ainda não há aprovação pelo FDA, mas a Moderna já divulgou alguns dados de fase ⅔ da sua vacina infantil, anunciando que logo deve enviar para análise da agência reguladora.
    • Vacina testada em crianças entre 6 e 12 anos (assim como da Pfizer). Demonstrou uma boa capacidade na geração de anticorpos neutralizantes.
    • Diferente da Pfizer, nesse caso serão duas doses com um intervalo de 4 semanas.
    • Os poucos efeitos colaterais relatados foram bem leves, como dor local, dor de cabeça e cansaço.
    • Em algumas análises preliminares, alguns pesquisadores notaram uma diferença na taxa de desenvolvimento de inflamação no coração (miocardite) em adolescentes (12-17) que receberam a vacina. Isso levou a um atraso na análise da vacina para crianças, pois quiserem verificar se também haveria essa diferença para os pequenos.
      • Ainda não se estabeleceram relações entre a miocardite como uma reação adversa e as vacinas. Para mais informações, você pode conferir aqui, aqui e aqui.

    Vacina CoronaVac [18-21]:

    • A China, Chile e Emirados Árabes já estão vacinando suas crianças e jovens entre 3 e 17 com a CoronaVac.
    • Em junho, a China aprovou o uso da CoronaVac em crianças e adolescentes, contudo, a vacinação em si só começou em meados de outubro. 
    • Apesar de já estar sendo aplicada em alguns países, até o momento só temos os dados de fase 1 e 2 (caso não lembre o que são as fases de desenvolvimento das vacinas, confira esse texto aqui) da CoronaVac nessa faixa de idade (3-17 anos). 
    • Em agosto, o Instituto Butantan fez o pedido para a ANVISA para aprovação do uso emergencial da CoronaVac em crianças, contudo, a ANVISA negou tal pedido, requisitando mais informações.
    • Até o momento, o uso emergencial para essas faixas etárias ainda não foi concedido para a CoronaVac.

    Deveríamos vacinar as crianças e só então voltar às aulas presenciais?

    Na última semana do mês de junho, 250 mil crianças tinham sido diagnosticadas – a constar, somente naquela semana – com a COVID-19 na Inglaterra. Inclusive, este foi o pior momento da pandemia no quesito escolar desde a reabertura do país em março de 2021. Em Israel, país modelo da vacinação na população adulta, o número de crianças em período escolar que testaram positivo para COVID-19, triplicou na mesma semana. Devido a somente 4% da população menor de 15 anos estar vacinada. Em suma, na época, ambos os países estavam com a vacinação bem avançada, mas ainda não o suficiente para voltar às aulas [22].

    Assim, isso nos mostra que, se não tomarmos cuidado, aqui no Brasil a mesma coisa pode acontecer. Inclusive, um aviso, já está acontecendo: cada vez mais vamos ver menores de 18 anos e crianças testando positivo para COVID-19. Aliás, vemos quando são feitos os testes, enchendo os hospitais e, inclusive, falecendo.

    Ainda é cedo para bater o martelo, mas…

    Sabemos que este é um terreno difícil de discussão e que as crianças perderam muito com os distanciamentos e pouca socialização nestes dois anos. Portanto, o debate é realmente delicado. A princípio, a nossa indicação e o que consideraríamos ideal era esperarmos um pouco mais, tanto para a volta às aulas quanto para a retomada da sociedade ao “antigo normal”. Assim, a chegada da Pfizer no Brasil é um sinal de que a etapa de vacinação infantil está mais próxima, tornando a vida social um pouco mais segura.

    Todavia, também sabemos que com a variante Ômicron tomando lugar rapidamente do cenário atual, somado ao apagão de dados e falta de testes, fica muito difícil não apenas analisar os melhores caminhos como também indicar um lugar seguro para tomada de decisões tão importantes, como as que precisamos no momento.

    Para saber mais:

    1. Zhou, MY, Xie, XL, Peng, YG, Wu, MJ, Deng, X. Z, Wu, Y, … & Shang, LH (2020) From SARS to COVID-19: What we have learned about children infected with COVID-19, International Journal of Infectious Diseases, 96, 710-714 
    2. She, J, Liu, L, & Liu, W (2020) COVID‐19 epidemic: disease characteristics in children, Journal of medical virology, 92(7), 747-754. 
    3. Cui, X, Zhao, Z, Zhang, T, Guo, W, Guo, W, Zheng, J, … & Cai, C (2021) A systematic review and meta‐analysis of children with coronavirus disease 2019 (COVID‐19), Journal of Medical Virology, 93(2), 1057-1069.
    4. Ludvigsson, JF (2021) Case report and systematic review suggest that children may experience similar long‐term effects to adults after clinical COVID‐19, Acta Paediatrica, 110(3), 914-921.
    5. Buonsenso, D, Munblit, D, De Rose, C, Sinatti, D, Ricchiuto, A, Carfi, A, & Valentini, P (2021) Preliminary evidence on long COVID in children, MedRxiv. 
    6. Oppmann, P (2021) Cuba vaccinates children as young as 2 in strategy to reopen schools, economy, CNN
    7. Mohor W, D (2021) Chile overcame the Delta variant. Now it’s racing to vaccinate kids, CNN,
    8. Wu, H (2021) China to start vaccinating children to age 3 as cases spread ABC News
    9. G1 (2021) CDC passa a recomendar vacina da Pfizer contra a Covid-19 para crianças de 5 a 11 anos nos EUA
    10. FDA (2021) FDA Authorizes Pfizer-BioNTech COVID-19 Vaccine for Emergency Use in Children 5 through 11 Years of Age
    .
    1. Pfizer (2021) Pfizer and Biontech announce positive topline results from pivotal trial of COVID-19 vaccine in children 5 to 11 years.
    2. Walter, EB, Talaat, KR, Sabharwal, C, Gurtman, A, Lockhart, S, Paulsen, GC, … & Gruber, WC (2021) Evaluation of the BNT162b2 covid-19 vaccine in children 5 to 11 years of age, New England Journal of Medicine
    3. Martins, A (2021) Pfizer pede autorização à Anvisa para vacinar crianças de 5 a 11 anos, Exame
    4. Moderna (2021) Moderna Announces Positive Top Line Data from Phase 2/3 Study of COVID-19 Vaccine in Children 6 to 11 Years of Age.
    5. Moderna (2021) Moderna Provides Update on Timing of U.S. Emergency Use Authorization of its COVID-19 Vaccine for Adolescents.
    6. Hernandez, J (2021) The FDA is probing whether the Moderna vaccine can cause a rare side effect in teens, NPR.
    7. Witberg, G, Barda, N, Hoss, S, Richter, I, Wiessman, M, Aviv, Y, … & Kornowski, R (2021) Myocarditis after Covid-19 vaccination in a large health care organization, New England Journal of Medicine
    8. G1 (2021) China aprova uso da CoronaVac para crianças a partir de 3 anos, diz Sinovac.
    9. Han, B, Song, Y, Li, C, Yang, W, Ma, Q, Jiang, Z, … & Gao, Q (2021) Safety, tolerability, and immunogenicity of an inactivated SARS-CoV-2 vaccine (CoronaVac) in healthy children and adolescents: a double-blind, randomised, controlled, phase 1/2 clinical trial, The Lancet Infectious Diseases
    10. Mattos, L. (2021). Butantan entra com novo pedido para aprovar uso da Coronavac a partir dos 3 anos, Folha de São Paulo 
    11. Giving Compass. (2021). The Impact Of The Delta COVID Variant On Unvaccinated Youth.

    Outros materiais:

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Maurílio é autor no Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Vacina de Pólio e a segurança dos protocolos de vacinação atuais

    Texto escrito por Flávia Ferrari

    O primeiro texto sobre vacinas, da equipe do Todos Pelas Vacinas, falou sobre Reações Adversas, com a Mellanie Fontes-Dutra! Hoje nós vamos falar sobre uma vacina especial, que é o coração do Programa Nacional de Imunização e a grande vedete dos fãs de vacina: a vacina de pólio (poliomielite ou a gotinha!).

    O que é pólio?

    Temos relatos de poliomielite (popularmente conhecida como paralisia infantil) desde a antiguidade. Não é, portanto, uma doença recente em nossa história, como humanidade. Porém, o vírus só foi descoberto no começo do século XX. A trajetória foi, portanto, longa até entendermos o que causa esta doença!

    A principal forma de transmissão é por contato com as fezes. Isto é, fecal-oral. Mas também pode ser transmitida de forma oral-oral. A paralisia infantil é assintomática em 95% dos casos. Todavia, em 1% dos casos podem se desenvolver sintomas graves, menos de 0,05% morrem.

    Se olharmos estes números, de alguma forma (curiosa até) eles colocam em xeque as discussões que temos hoje sobre a COVID. Isto porque muitos afirmam sobre os supostos “baixo riscos” que crianças têm ao contraírem a doença a COVID-19. Entretanto, nós sabemos que devemos tentar preservar o máximo de vidas possível, especialmente quando se trata de doenças e mortes evitáveis! Aliás, isso ainda intensifica-se ao refletirmos nas sequelas para toda uma vida e no impacto disso para a saúde pública. 

    Jonas Salk e a poliomielite

    Mas o assunto hoje é a pólio e a vacina! Então, quero contar um pouco sobre a história da pesquisa de Jonas Salk. Salk trabalhava desde 1941 com o vírus Influenza (gripe) e em 1947 começou seus estudos sobre a poliomielite. Em 1949, outros pesquisadores desenvolveram um método in vitro de propagação do poliovírus. Salk usou a técnica para produzir grandes quantidades de vírus e iniciar testes de inativação do vírus. Salk acreditava que a vacina poderia ser feita de vírus morto, produzindo assim anticorpos através da presença no sangue. 

    Os primeiros testes de segurança foram feitos em cerca de 5000 indivíduos. Salk chegou até mesmo a inocular a vacina experimental nele mesmo, na esposa e nos seus três filhos. 

    Após esses testes de segurança em pequena escala, realizou-se o maior estudo clínico já feito, recrutando 1,8 milhões de crianças só nos Estados Unidos, para realizar os testes de fase 3. 

    No caso da COVID, por se tratar de um vírus com transmissão muito mais comum, precisamos de grupos menores para tanto. Os testes de fase 3 não passaram de dezenas de milhares. 

    A aplicação da vacina de pólio

    Voltando ao teste de Salk, já em 1955, a vacina começou a ser aplicada em massa. Com um controle muito menos rígido que os atuais houve uma grande falha em um laboratório que não utilizou o procedimento correto para inativar o vírus. Com isso, de 380 mil doses lançadas pelo laboratório, 164 crianças ficaram paralisadas (0,043%) e 10 morreram (0,003%), uma porcentagem muito baixa, em relação ao total de vacinas aplicadas. No entanto, mesmo com uma porcentagem baixa assim, este foi considerado o maior desastre biológico da história dos Estados Unidos da América. 

    Aliás, tão desastroso que culminou na mudança de todo o padrão de checagem de segurança das vacinas, até os dias atuais no mundo inteiro. A cepa utilizada era a mais virulenta também, algo inimaginável nos dias atuais.

    Cabe ressaltar que após esse incidente, nenhum evento desse tipo ocorreu mais.  Devido às novas técnicas de segurança e ao controle de qualidade para as vacinas, que inclusive ajudaram a melhorar os procedimentos atuais.

    Hoje no Brasil, usamos a CoronaVac como vacina contra COVID-19 tendo a tecnologia de vírus inativado que possui mais de um método de inativação. Isto é, o utilizado pela vacina Salk e também métodos de radiação de alta frequência. Além disso, usamos atualmente métodos de controle muito mais efetivos.

    Como assim? Quer dizer que usam o mesmo método catastrófico do Salk? Não. Quer dizer que aprimoramos a tecnologia de inativação do vírus, construímos conhecimento sobre nossos erros

    Hoje, o método de vacinas de vírus inativado é considerado muito seguro.

    Em 1961, com a continuidade da vacinação e revisão dos protocolos, os casos reduziram 90% só nos Estados Unidos. No Brasil, a vacina começou a ser utilizada a partir de 1960.  Porém não temos dados seguros da redução, pois não havia notificação compulsória até 1968. 

    Na década de 80 surgiram os Dias Nacionais de Vacinação (e o Zé Gotinha – A gente tem um vídeo fofo disso). Em 1991 houve o último caso de pólio nas Américas! Um marco histórico de vitória de uma política pública de saúde tão importante!

    Em 1994 fomos certificados como área livre de circulação de pólio selvagem. Segundo projeções, se a queda continuar no mundo todo (hoje apenas Nigéria, Afeganistão e Paquistão e outros casos relatados em outros países), em 2024 poderemos ter erradicado o vírus no mundo, 70 anos após o desenvolvimento da vacina.

    Segundo a Organização Mundial da Saúde, erradicar a poliomielite significaria uma economia mundial de cerca de 40 bilhões de dólares, pelo menos. Este número torna-se ainda mais significativo quando levamos em conta que são países de baixa renda os afetados por esta doença. Mas mais importante do que isto, a OMS aponta que:

    Quando a pólio for erradicada, o mundo poderá celebrar a entrega de um grande bem público global que beneficiará todas as pessoas da mesma forma, não importando onde elas vivam (…) o sucesso significará que nenhuma criança voltará a sofrer os terríveis efeitos da paralisia provocados pela poliomielite ao longo da vida

    E o que isto tem a ver com a vacinação de COVID-19, o Todos Pelas Vacinas e nossa campanha de vacinação infantil?

    É importante termos noção de que a ciência não funciona em saltos com soluções inéditas. Sabemos que vivemos atualmente um momento difícil, que parece se arrastar por nossas vidas e esperamos diariamente notícias de que a pandemia acabou. Mas compreender estes processos científicos também torna-se parte da possibilidade de confiar mais ainda nos processos científicos. Isto é, compreender que a ciência funciona a partir de análises anteriores, técnicas já desenvolvidas, aprimoradas, para problemas contemporâneos e novos. A vacina para Covid, como não poderia deixar de ser, utilizou-se de plataformas, técnicas e conhecimentos prévios para ser desenvolvida com segurança para nós e para as crianças.

    Assim, reforçamos alguns pontos: Vacinas salvam vidas, mas não extinguem o vírus em um passe de mágica. A pesquisa em vacinas pode ser rápida, ainda mais se houver interesse público, financiamento e uso de plataformas já desenvolvidas. As vacinas não foram desenvolvidas rapidamente como passe de mágica, nós utilizamos saberes prévios, como são as outras usadas atualmente. Por exemplo, a vacina de RNA que já vinha sido desenvolvida para outros vírus.

    Além disso, a aplicação de vacinas em massa ocorrem após testes em grupos para verificar a segurança. Erros que aconteceram no passado balizaram métodos que asseguram formas muito mais confiáveis de produção. Ou seja: Aprendemos e evoluímos muito em segurança e qualidade para que erros do passado não aconteçam mais

    Em suma, as vacinas…

    As vacinas usadas para a COVID-19, tanto em adultos, quanto as vacinas pediátricas são seguras, seguiram protocolos rígidos, aprimorados em dezenas de anos. Assim, não precisamos ter receio em relação à vacinação atual e teremos um mundo mais sadio e com menos adoecimentos, quanto mais pessoas estiverem vacinadas!

    Para Saber Mais:

    Neto Tavares Fernando. O início do fim da poliomielite: 60 anos do desenvolvimento da vacina. Rev Pan-Amaz Saude [Internet]. 2015.

    Organização Panamericana de Saúde. Poliomielite

    Paul JR. A history of poliomyelitis. New Haven: Yale University Press; 1971.

    Polio Global Erradication Iniciative

    Fiocruz. Salk versus Sabin: dois personagens e suas estratégias contra a pólio

    BBC News. ‘Incidente Cutter’: a tragédia nos EUA dos anos 1950 que resultou em vacinas mais seguras

    A autora

    Flávia Ferrari continua a série maravilhosamente bem iniciada pela Mellanie Fontes-Dutra, que falou sobre reações adversas das vacinas, contando um pouco de histórias de pesquisas em vacina, em especial de uma que todos tomaram: A pólio (ou a gotinha). Flávia é bióloga e atua como professora de ciências e autora de materiais didáticos, integra os grupos Observatório da COVID-19 Brasil e Todos Pelas Vacinas.

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Flávia é autora convidada do Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Reações Adversas e Vacinas: o que são e onde habitam?

    Texto escrito por Mellanie Fontes-Dutra

    Há muita informação e desinformação rolando por aí acerca do que é uma Reação Adversa ou eventos adversos e vacinas. Hoje resolvemos abrir a Caixa de Pandora com as informações confusas e falar sobre isto!

    O nome que usamos, técnico, é Evento Adverso Pós-Vacinação (EAPV) e significa qualquer ocorrência médica indesejada após a vacinação. Todavia, não necessariamente a EAPV possui uma relação causal com o uso de uma vacina ou outro imunobiológico (imunoglobulinas e soros heterólogos). Isto quer dizer que eventos que acontecem em nosso corpo não necessariamente são consequência da vacina.

    Vamos entender melhor?

    Existem reações mais frequentes, como a dor no local da injeção, febre e dores no corpo. Esses eventos frequentes são chamados assim porque são experienciados por muitas pessoas, com certa frequência. Mas temos os eventos raros e muito raros, que vamos defini-los abaixo:

    • Eventos adversos raros podem ser registrados de uma vez a cada 1.000-10.000 doses aplicadas.
    • Eventos muito raros podem ser registrados menos de uma vez a cada 10.000 doses aplicadas. Portanto, a ocorrência deles é muito, muito rara, e muitas vezes de difícil relação com a vacina.

    Existem razões para EAPVs acontecerem, por isso analisa-se tudo!

    A principal delas é em decorrência da falha na aplicação da vacina. Por ser a principal causa, em investigações, este deve tornar-se primeiramente descartado – portanto o primeiro analisado. É considerado um evento evitável, por isso a instrução é importante.

    Outro motivo de termos EAPVs são falhas no controle de qualidade/produção e até mesmo práticas inadequadas para a imunização. Por isso a Anvisa (aqui no Brasil) faz um controle imenso e super detalhado desses processos ao avaliar um imunizante. Quem quiser entender melhor sobre isso, pode assistir a Live que fizemos pelo Todos Pelas Vacinas e a Rede Análise, com Gustavo Mendes, que é gerente geral de medicamentos e produtos vivos da Anvisa.

    Aliás, também é por isso que todo o processo, desde as fases de segurança até a de efetividade, é examinado pela comunidade científica internacional. Além disso, todo evento torna-se alvo de analises minuciosas por órgãos fiscalizadores de cada país. Sempre que necessário – seja por que motivo for! – interrompe-se a produção e analisa-se a causa.

    Como reportar um EAPV?

    Há duas formas principais aqui no Brasil:

    Uma vez notificado, investiga-se o evento para saber se a vacina teve relação com o evento. Após a notificação, há uma sequência na avaliação. Inclusive, há uma troca internacional diária entre as farmacovigilâncias dos países. Isto tudo para alertar sobre o eventual aparecimento de um evento adverso mais grave ou inesperado.

    Todos os eventos esperados são computados e não precisam de investigação (pois são esperados). Os eventos esperados, como o próprio nome já diz, são esperados. Isto quer dizer que são comuns e não apresentam gravidade. Febre é um exemplo deles.

    Mas aqueles eventos inesperados são separados para uma maior e detalhada investigação. Assim, é super importante ressaltar a seriedade com que são estudados e analisados eventos adversos pós-vacinação. Não é uma análise banal ou trivial. Tampouco é algo que passa batido por instituições internacionais. Todo e qualquer evento reportado inicia uma análise e toma-se muito a sério cada uma das análises!

    O que é feito para os dados e análises?

    As equipes responsáveis por analisar EAPVs vão atrás de prontuários médicos, histórico de saúde das pessoas, dos familiares, novos exames e outras informações. O objetivo é entender se houve relação entre a aplicação da vacina e o aparecimento desse evento adverso de saúde.

    Por isso é de suma importância que só se estabeleça a relação se for comprovada. E aqui ressaltamos isso várias vezes exatamente para deixar clara a necessidade de tomarmos muito cuidado com desinformações propositais que nos causam receio (ou como temos chamado hesitação vacinal) ou qualquer veiculação de eventos, sem que tenham sido cumpridos os protocolos internacionais de análise. Infelizmente, vemos muitas situações até mesmo trágicas acontecerem. Mas podemos não ter evidências de que as vacinas foram as desencadeadoras. Além disso, podemos causar receio e hesitação acerca da vacinação, sem que faça sentido a relação entre eventos adversos e a vacina em si. 

    Com isso, sempre alertamos: antes de espalhar algum material que tu recebas, veja se existe algum dado científico atrelado a isto!

    Existe um fenômeno chamado associação temporal, que é quando dois eventos acontecem em tempos muito próximos. Mas podem não ter relação de causa e consequência estabelecida entre eles

    Querendo saber mais sobre isso, já escrevi um fio no Twitter sobre o tema! Olha aqui

    Caso identifiquem-se reações inesperadas graves, que se mostrem um risco à população em geral, a Anvisa pode interromper a autorização da vacina. Para isso, também se leva em conta se o eventual risco de um EAPV pode superar o benefício da vacina.

    E aqui já deixamos bem claro:

    NÃO HOUVE ISSO EM NENHUM MOMENTO NO BRASIL

    Até o dia 06 de Dezembro de 2021, nós tivemos 131.685 EAPVs. Neste mesmo período, tivemos 194 milhões de aplicações da vacina. Isto é, 0,07% das aplicações tiveram alguma notificação. Vamos lembrar que eventos raros acontecem uma vez entre 1.000 e 10.000 aplicações. Já Eventos muito raros acontecem uma vez entre 10.000 aplicações. Isto considerando um evento específico (e não qualquer evento aleatório).

    Estes dados indicam que tivemos 0,7 eventos a cada 1.000 aplicações.

    Além disso, e mais importante, não significa que a vacina é a causa. Significa que observamos os eventos observados depois da aplicação. Além disso, este dado é público e pode ser visto no Boletim Epidemiológico publicado pelo Ministério da Saúde.

    Contudo, parece-nos fundamental apontar ainda que a grande maioria (92%) dos eventos adversos são reações sem gravidade. Por exemplo: dores de cabeça, dores no local de aplicação, febre e tosse.

    Calma, ainda tem mais sobre EAPVs

    No Brasil tivemos 9.896 reações consideradas graves. Isto significa cerca de 5 eventos a cada 100 mil doses aplicadas. Dessa forma, é algo menor que 0,005%. E tudo isto, destrinchando apenas os eventos em si, sem analisar especificamente se a reação grave teve como causa a vacina! Em suma, ao fim das análises, na verdade, a maioria das reações nada tem a ver com a vacina (ver o link do Boletim Epidemiológico).

    Ainda não está convencido? 

    Existem mais dados a respeito da vacina, os EAPVs e o coronavírus. Todos eles têm apontado que os riscos da infecção viral mostram-se MUITO mais elevados do que os riscos causados pela vacina. Por exemplo, o risco de alguém que tenha sido internado por COVID-19 desenvolver trombose é 41.000x maior que o da vacina.

    Se estiver difícil de entender estes números, podemos explicar com fatores do dia-a-dia. Assim, é muitíssimo mais fácil ter trombose por tomar anticoncepcional (0,05%) ou fumar (0,18%) do que por tomar a vacina contra a COVID-19 (0,0001% – Janssen a 0,0004% – AstraZeneca). Colocando assim, fica claro que quaisquer riscos de EAPVs mais sérios não são nem próximos de serem superiores aos riscos que corremos no nosso cotidiano, e principalmente pensando na infecção pelo coronavírus (COVID-19).

    Segundo o boletim do Ministério da Saúde, o risco de pegar a COVID-19 e morrer é 56,6 vezes maior que o de ter algum efeito adverso após tomar a vacina (seja leve ou grave). Se olharmos estes números, parece bem estranho ter qualquer hesitação vacinal. Mais ainda causar algum debate enfatizando o cuidado tão exacerbado sobre tomar vacina – incentivando que não se tome a vacina como têm sido feito em nosso país!

    Mas e as crianças? E a Miocardite???

    Ah, sim. O tema do momento: e a miocardite em crianças? O risco de uma criança de 5-11 anos ter miocardite ao pegar COVID-19 é 40 vezes maior do que o risco de essa criança ter miocardite ao ser vacinada. Em suma: os riscos são muito maiores para quem não toma a vacina. 

    Portanto, tome sua vacina! Aliás, se estiver sentindo algum efeito, notifique nos links citados. Mas, ressaltando ainda, se tiver dúvidas, não deixe de enviar para nós! Tanto eu, Mellanie Fontes-Dutra, quanto os parceiros Todos Pelas Vacinas, Rede Análise, Observatório COVID-19 e nós, do Blogs Unicamp); estamos sempre disponíveis para ajudar. Vacine-se e se (nos) proteja! 

    Saiba Mais

    Documentos Oficiais:

    Manual de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinação

    Boletim Epidemiológico Nº 90 – Boletim COE Coronavírus

    Reportagens

    Mali, Thiago (2021) Poder Explica: reações adversas às vacinas contra a covid

    A autora

    Mellanie Fontes-Dutra é biomédica, doutora em neurociência e pesquisadora na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Divulgadora Científica na Rede Análise COVID-19. Autora convidada no Especial COVID-19 e parte do projeto Todos Pelas Vacinas.

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Mellanie é autora convidada do Especial COVID-19. 

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os produziram-se textos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, os textos passaram por revisão revisado por pares da mesma área técnica-científica na Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • #VacinaNoGrau: Pfizer, tá passada?

    Texto escrito por Mellanie Fontes-Dutra e Ana Arnt

    A Pfizer é a vacina que está sendo utilizada para eles: os jovens, aqui no Brasil, na campanha de vacinação neste momento. Tá passada?

    O anúncio dos resultados sobre a eficácia da Pfizer em adolescentes aconteceu no dia 31 de Março de 2021. E hoje, já que estamos lançando a campanha #VacinaNoGrau, resolvemos retomar este estudo! Aliás, já de cara, a notícia foi animadora. A eficácia foi muito alta e não foram observados casos de COVID-19 na amostra analisada de participantes adolescentes nesse estudo!

    Vamos entender como foi a pesquisa?

    O ensaio envolveu 2.260 adolescentes de 12 a 15 anos de idade nos Estados Unidos. Foram observados 18 casos de COVID-19 no grupo de placebo (que teve um N amostral de 1.129 adolescentes). Já no grupo vacinado (que teve um N amostral de 1.131 adolescentes), não houve nenhum caso.

    Em função de nenhum caso ter sido observado no grupo vacinado, a eficácia estimada chega a 100%. Todavia, é sempre bom lembrar que, esse dado é para uma amostra de 18 eventos. Isto é, quando extrapolamos este dado para milhares de vacinados – como ocorre na população geral – a possibilidade sempre é de que a gente observe um ou outro caso de COVID-19 em vacinados sim!

    E o que isto quer dizer? Que as medidas não farmacológicas de uso de máscaras, distanciamento físico e cuidados redobrados em espaços fechados e não ventilados seguem valendo E MUITO.

    Voltando aos dados do estudo, a vacina demonstrou ter uma proteção considerável contra agravamentos também! A regra do anterior segue valendo: a vacina é segura e têm proteção considerável, mas medidas não farmacológicas seguem sendo fundamentais. A gente não cansa de repetir isso, só para ter em mente isso. Isto é, para daqui a pouco ninguém vir dizer, se em milhares de vacinados aparecer algum caso: “AAAAH MAS NÃO ERA 100% EFICAZ?”. 

    Siacalme rapaz, isso não invalida TODA a proteção da vacina não

    Vamos falar de Imunogenicidade agora…

    A vacina desencadeou uma boa quantidade de anticorpos neutralizantes de SARS-CoV-2. Assim, esta vacina demonstra forte resposta imunológica um mês após a 2ª dose. Aliás, na análise anterior com participantes de 16 e 25 anos, essas quantidades também foram bem significativas. 

    E a tal da segurança?

    A vacina foi bem tolerada, com efeitos colaterais geralmente consistentes com aqueles observados em participantes de 16 a 25 anos de idade. Isto é: te joga guri, que vai dar bom.

    Mas não para por aí não… O estudo está sendo atualizado

    Como assim? Claro, ainda há mais grupos e faixas etárias para sabermos sobre a vacina, né? Dessa forma, está em andamento a atualização do estudo com crianças de 11 anos. Neste estudo, de fase 1/2/3 está sendo conduzido com crianças de 6 meses a 11 anos. Assim, avaliando segurança, tolerabilidade e imunogenicidade da vacina em um esquema de duas doses (aproximadamente 21 dias de intervalo)

    Os grupos:

    – Crianças de 5 a 11 anos

    – 2 a 5 anos

    – 6 meses a 2 anos.

    A coorte de 5 a 11 anos começou a receber as doses ainda em março. E nos planos estava iniciar a coorte de 2 a 5 anos em abril de 2021.

    Aprovadíssima

    No Brasil, a Nota Técnica Nº 36/2021-SECOVID/GAB/SECOVID/MS inclui crianças e adolescentes de 12 à 17 anos na campanha de Vacinação.

    Nesta nota técnica (NT), o Ministério da Saúde (MS) considera primordial que 85% da população brasileira seja vacinada contra COVID-19. Isto, a fim de reduzir drasticamente a transmissão da doença em nosso país. Dessa maneira, considerando o registro na Anvisa, em 10/06/2021, a Pfizer foi autorizada para a vacinação de jovens nesta faixa etária. Aliás, é a única, até o presente momento.

    A NT ressalta que a vacinação de adultos acima de 18 não foi concluída. Também aponta que esta faixa etária corre, significativamente, mais riscos de contrair e ter agravamentos no caso de COVID. Todavia, a vacinação dos jovens – que retornaram à escola, bom lembrar – é uma das ferramentas para isto para diminuir a transmissão de forma geral.

    Sobre os riscos em jovens

    Além disso, jovens com algum fator de risco relacionado a comorbidades, como traz a nota técnica, também aumentam a chance de agravamento. Dessa forma, este é outro fator que justifica a vacinação desta faixa etária, mesmo não tendo sido finalizada a vacinação de adultos.

    Figura retirada da Nota Técnica

    Tendo em vista estas análises, o MS através incluiu jovens de 12 a 17 anos no Plano Nacional de Operacionalização de Vacinação contra a COVID-19.

    Dia 15 de setembro, segundo a NT, teremos concluída a remessa de doses suficientes para vacinar 100% da população ADULTA com pelo menos uma dose! Aliás, hoje também inicia oficialmente o calendário de oferta de vacinas se dá a partir de 15 de setembro. Embora em alguns estados e municípios tenham começado antes. Todas as vacinações nesta faixa etária acontecerão, exclusivamente, com a vacina da Pfizer. 

    A ordem de prioridade para vacinação desta faixa etária é população de 12 a 17 anos:

    1. Com deficiências permanentes.;
    2. Com presença de comorbidades;
    3. Gestantes e puérperas;
    4. Privados de liberdade;
    5. Sem comorbidades.

    O que mais acontece dia 15 de setembro?

    Isto mesmo, a nossa campanha #VacinaNoGrau, destinada a todos aqueles jovens que estão iniciando esta etapa fundamental no combate à COVID-19!

    Acompanhe as datas no seu município para ver quando chegar o teu dia!!

    Por fim, lembre-se: vacinou? Se exibe por aí MESMO! Afinal, a vacinação é um direito de todos nós e uma alegria por fazer parte de mais uma etapa para vencermos a COVID-19!

    Aliás, inclusive marca o Todos Pelas Vacinas, marca os grupos parceiros, marca nossas tags #TodosPelasVacinas e #VacinaNoGrau, comemora mesmo! Mas, claro, comemora de máscara, com distanciamento, respeitando as regrinhas básicas não farmacológicas ahahahaha.

    Para Saber Mais

    MINISTÉRIO DA SAÚDE, SECRETARIA EXTRAORDINÁRIA DE ENFRENTAMENTO À COVID-19, NOTA TÉCNICA Nº 36/2021-SECOVID/GAB/SECOVID/MS

    BRASIL Lei nº 14.190, de 29 de julho de 2021

    BRASIL Lei nº 14.124, de 10 de março de 2021

    PFIZER-BIONTECH (2021) Pfizer-BioNTech Announce Positive Topline Results of Pivotal COVID-19 Vaccine Study in Adolescents 

    As autoras

    Ana Arnt é Bióloga, Doutora em Educação, Coordenadora do Blogs de Ciência da Unicamp e do Especial COVID-19

    Mellanie Fontes-Dutra é biomédica, doutora em neurociência e pesquisadora na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Divulgadora Científica na Rede Análise COVID-19

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os produziram-se textos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, os textos passaram por revisão revisado por pares da mesma área técnica-científica na Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

  • [PRESS RELEASE] Todos pelas Vacinas reúne organizações de divulgação científica e entidades científicas em ações pró vacinação contra a Covid-19 para adolescentes

    Com o avanço do Programa Nacional de Imunização  contra a Covid-19, uma campanha liderada pelo Observatório COVID-19 BR reúne organizações ligadas à divulgação científica, entidades científicas, artistas e personalidades públicas para lançar a campanha de vacinação dos jovens maiores de 12 anos – marcado para 15 de setembro (quarta-feira). A campanha contará com diversas ações nas redes sociais com as hashtags #VacinanoGrau e #TodosPelasVacinas terá por objetivo estimular a vacinação em jovens na faixa-etária entre 12 e 17 anos e conscientização da necessidade de manter os protocolos de segurança. 

    A campanha #VacinanoGrau e #TodosPelasVacinas é organizada por ABRASCO, Blogs Unicamp, COSEMS/SP, Equipe Halo,  Instituto Questão de Ciência, Observatório COVID-19 BR, Rede Análise COVID-19, Sociedade Brasileira de Imunologia, União Pró-Vacina, Projeto Divulgar e Grupo InfoVid tem como objetivo criar um espaço para diálogo com a população por meio de conteúdo preparado por especialistas, assim como um ambiente virtual para envio de dúvidas sobre a imunização contra a COVID-19. Um portal (www.todospelasvacinas.info) agrega um conteúdo em vários formatos, textos, áudio, imagens e vídeos para serem compartilhados em todas as redes sociais.

    Rafael Lopes, físico, membro do Observatório Covid-19 BR, lembra que “A história das vacinas no Brasil é centenária, fomos um dos primeiros países a adotar a vacinação como uma política extensiva de saúde pública. Nos conscientizar que vacinar é essencial para salvar vidas é nos reencontrarmos com nossa linda história na saúde pública, efetivar a segunda dose é a oportunidade de fazer parte desta história” 

    No Portal estão disponíveis podcasts criados pelas organizações parceiras, além de outros materiais, como o e-book “Guia Prático sobre as Vacinas” e uma coletânea de artes no espaço VacinArte. A campanha visa convidar a participação do público por envio de dúvidas e engajamento nas redes sociais, como uso de filtros criados para Facebook e Instagram disponibilizados no site. O internauta consegue baixar, também, logo e artes da campanha para espalhar a mensagem e participar da grande mobilização do dia 15 com as hashtags #VacinanoGrau e #TodosPelasVacinas nas redes sociais.

    Flávia Ferrari do Observatório Covid-19 BR ressalta a importância da iniciativa com a união entre cientistas e sociedade civil em prol da vacinação contra a COVID-19, “uma atitude capaz de salvar vidas”. 

    A lista com todas as atividades da campanha podem ser encontradas no site do evento www.todospelasvacinas.info

    Contato:

    Flávia Ferrari – Observatório Covid-19 BR (11) 991116455 obscovid19br@gmail.com

    Beatriz Ramos – Projeto Divulgar (21) 998879227 proj.divulgar@gmail.com

    Ana de Medeiros Arnt – Blogs de Ciência da Unicamp (19) 98364-0054 blogs@unicamp.br

    Texto produzido pelo coletivo Todos Pelas Vacinas

  • Tudo vale a pena por vacinas e divulgação científica? Funk e K-pop

    Semana passada fizemos parte de um grande evento de divulgação científica – bem militantes de internet, sabe? Sentados na frente da tela, e ficamos lá, por horas e horas 24/7 como dizem por aí, e no dia 21/01 aconteceu: viramos militantes de twitter.

    Como se não bastasse isso, os maiores grupos de divulgação científica do país (no fim do post a lista completa dos grupos) saíram convidando artistas e personalidades públicas para militar todos juntos.

    Descansa, militante: o mundo da ciência e suas campanhas

    Dia desses, fui interrogada sobre qual o motivo que eu achava que esta campanha feita por cientistas e divulgadores de ciência faria diferença e outras que tantas vezes fazemos – como marchas para ciência ou ações na internet – não fizeram.

    Claro que não tínhamos certeza, no momento em que a pergunta foi feita, que a campanha seria um sucesso (e ela foi). No entanto, já existiam alguns indícios de que teríamos algum destaque nas redes sociais. Assim, a confirmação de algumas personalidades influentes era um destes indícios.

    No entanto, a ideia não era apenas ter “personalidades” sorrindo e acenando para a campanha. Isto é, era – e segue sendo – defender conjuntamente ao nome “Todos pelas vacinas” que a vacina seja para todos.

    O diálogo com pessoas: nossa, isso existe!

    Um dos pontos que para mim foi interessante na campanha foi conversar com diversas personalidades famosas ou que tem lá seu público seguidor. Dessa forma, ao falar com estas pessoas, além de explicações sobre a campanha em si, eu conversava também sobre dúvidas das vacinas, a ciência e tudo mais. Às vezes a conversa engrenava para outras coisas, desde sugestão de pautas, até piadas e memes (Brasil né, mores).

    Quando eu soube que os K-pops iriam entrar no dia levantando a tag, e quando eu vi que Kondzilla divulgou nosso conteúdo eu percebi que a campanha estava acontecendo mesmo.

    E com o passar dos dias, eu soube responder meu colega melhor: essa campanha vai funcionar pois estamos conversando (ou tentando conversar) com pessoas.

    Como assim?

    Ora, existe muita dificuldade em fazer divulgação científica no nosso país ainda. Além disso, há falta de definições objetivas acerca do que é divulgação científica e diferenças de jornalismo científico ou de comunicação científica, uso de diferentes mídias e mídias sociais, dentre outros problemas que não cabem em um post…

    Todavia, há mais problemas em conseguirmos dialogar com quem é nosso “público não especialista” ou “público alvo”. O também conhecido e famoso termo “furar bolhas” ou “parar de falar para convertidos” (sinceramente, odeio este último). Mas sim, é difícil furarmos bolhas e conversarmos com quem está fora do círculo.

    Vamos lá…

    Uma das dificuldades é abordarmos a ciência de forma sisuda, fechada, ensimesmada, falando de seu rigor e robustez para si mesma, tão centrada em suas terminologias que não podem ter metáforas que ninguém além de nós mesmos, consegue entender.

    Outra dificuldade é acharmos que o que nós falamos é essencial para as outras pessoas e que elas deviam nos escutar. Afinal, estamos falando de verdades científicas relevantes de um modo supostamente acessível. Assim, nós estamos avisando… Mas não nos escutam.

    não que seja um problema comunicadores que não conseguem ser escutados, longe de mim dizer isto

    Tá, Ana… Desembucha

    Bom… talvez a gente não seja escutado por não estarmos escutando muito também. E quando eu digo escutar quero dizer parar um tempo e prestar a atenção no que outra pessoa, “gente como a gente”, está falando.

    Assim, ao invés de ridicularizar diminuir situações em que se articulam setores diferentes da nossa sociedade, talvez seja hora de cientistas e divulgadores aprenderem um pouco mais sobre como a sociedade funciona.

    O funk e o kpop não vão salvar a divulgação científica. Mas talvez nos salve de nós mesmos. Esta semana vimos um funk falando de vacinas e kpops e Army tuitando (insanamente) nossa campanha. Foram horas nos trending toppics. Teve Zé gotinha dançando até o chão, teve samba, teve chorinho, teve poesia declamada.

    Nada disso foi, em si, divulgação científica.

    Mas foi pela divulgação científica, por uma campanha promovida pela divulgação científica, tentando evidenciar conteúdos científicos dos grupos de divulgadores científicos. E foi por uma causa específica – as vacinas – para todos

    Não foi “nós (divulgadores e cientistas) por nós (divulgadores e cientistas)”. Propusemos uma campanha, para debater uma demanda social efetivamente para todos

    Para todos é K-pop. Mas, também é funk, rap, samba, frevo, milonga, moda de viola, sertanejo, axé, rock, ópera, clássico, ___ (insira aqui o ritmo que tu adoras e eu esqueci de mencionar).

    Para todos é aprendermos a olhar para a sociedade e percebermos sua não-homogeneidade. Quando falamos todos é por estarmos dispostos a ver, respeitar, pensar, ouvir a diversidade e entender (e principalmente aprender) por qual motivo as campanhas científicas nunca funcionam. Bem como, perceber que, em geral, quando falamos em todos, normalmente falamos em “grupos seletos que há décadas têm oportunidades similares às nossas”.

    O que eu aprendi como divulgadora científica?

    Nas redes, aprendi que K-pops sequestram pautas, têm posicionamento político, se baseiam em metas, se organizam e podem potencializar uma visibilidade na rede social, como podem pulverizar um movimento (e muito rapidamente).

    Com isso aprendi mais sobre algoritmos funcionando numa massa, do que em anos falando com pessoas que estudam academicamente isso e eventualmente me explicavam. Isto, óbvio, não é desmerecer colegas que arduamente tentaram me explicar. Só me fez pensar que as vezes a gente precisa quebrar a cabeça mesmo e aprender ficando embasbacado com o número girando ali na nossa frente.

    Na música, poesia e desenho, aprendi que o conceito científico não dá conta de nos emocionar e mobilizar. Mas a arte pega um detalhe da ciência e a transforma em combustível. Que faz chorar, sorrir e nos abraça e conforta de modos que métrica e estatística alguma vai dar conta de descrever, mensurar e especificar.

    Quer ver um pouco de nossa arte?
    VacinArtes

    Mas tudo aquilo se constituiu como divulgação científica?

    A divulgação científica pode ser entendida como um ato de comunicadores (cientistas e jornalistas, por exemplo) que apresentam a ciência de modo acessível a um público externo à academia ou àquela área específica que está sendo abordada (para saber mais sobre Divulgação aqui no blogs, recomendo o MindFlow).

    Tudo o que aconteceu no dia 21 de Janeiro foi dar visibilidade a uma causa, que tem como pano de fundo a ciência aplicada a uma causa social urgentíssima. #Todospelasvacinas se constituiu como uma campanha em prol da vacinação. Para que as pessoas compreendam o que é uma vacina e quais razões para confiar nas vacinas. Mas também para exigir e criar o debate de que as vacinas são um direito de todos e um dever do poder público – em todas as instâncias e níveis.

    Se o ato em si não foi divulgação (sei lá o preciosismo da questão aqui), ele foi um ato que levou às pessoas a procurar informações de divulgação científica. Sim, levou milhares de pessoas a procurar conteúdos sobre vacinas nos grupos que trabalharam no evento de lançamento.

    Sobre termos funk e kpop na campanha

    É um modo não apenas de dar visibilidade, mas também de aprender, mostrar e pensar que o que chamamos de cultura científica precisa lidar com o fato de ser cultura. E que kpop é cultura e funk é cultura.

    Talvez aqui precisemos olhar novamente para autores das áreas das humanidades e entender, novamente, o que é cultura, antes de falar que a cultura científica bibibi-bobobo não deveriam precisar disto ou daquilo se distancia de tudo isso e precisa se distanciar.

    Mas isto é tema de outro longo post.

    Este é o primeiro “Tudo vale a pena por vacinas e divulgação científica?”. Eu vou retomar o conceito de cultura, cultura científica e falar mais sobre o que aconteceu dia 21 de Janeiro e por qual motivo foi uma data histórica na divulgação científica brasileira. Também vamos falar sobre a importância de uma campanha como essa e sua continuidade, próximos passos e sobre os grupos que se envolveram de cabeça nesta empreitada. Por fim, um pouco dos bastidores da equipe e sua semana sem dormir, mas dormindo, para compor este coletivo que foi incrível.

    Todos pelas Vacinas
    Grupos que participaram:
    Observatório Covid-19
    Blogs de Ciência da Unicamp
    Rede Análise Covid-19
    UPVacina
    Equipe Halo
    Projeto Divulga
    Eu e as Plantas

    Para saber mais:

    Andrade, Karolin (2021) Organizações científicas lançam campanha “Todos pelas Vacinas”, para conscientizar sobre a importância das vacinas, Kondzilla.

    Gouvêa, Guacira (2015) A divulgação da ciência, da técnica e cidadania e a sala de aula. In: Giordan, M, Cunha, MB (org) Divulgação científica na sala de aula: perspectivas e possibilidades. 

    Kondzilla (2020) O que é Coronavírus, Covid-19?

    Kondzilla e Equipe Halo (2020) Qual é a das vacinas do Corona?

    Kusuma, A, Purbantina, AP, Nahdiyah, V, Khasanah, UU (2020) A Virtual Ethnogpraphy study: Fandom and Social Impact in Digital Era, ETNOSIA: Jurnal Etnografi Indonesia, 5(2):238–251.

    MC Fiote (2021) MC Fioti – Vai Com o Bum Bum Tam Tam (KondZilla)

    PORTO, CM, org (2009) Difusão e cultura científica: alguns recortes. Salvador: EDUFBA, A internet e a cultura científica no Brasil: difusão da ciência, p.149-165.

    Este texto foi escrito originalmente no blog PEmCie

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

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