Tag: universidade pública

  • Novo Ensino Médio: Desafios para o ensino superior

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    Autores

    Texto escrito por Matheus Naville Gutierrez

    Como citar:  

    Naville Gutierrez, Matheus (2023) Novo Ensino Médio: Desafios para o ensino superior. Revista Blogs Unicamp, V.09, N.01, 2023. Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/revista/2023/08/04/novo-ensino-medio-desafios-para-o-ensino-superior/  
    Acesso em dd/mm/aaaa
    Sobre a imagem destacada:

    No primeiro plano tem jovens concentrados estudando. Na imagem de segundo plano tem jovens em manifestações para condições de ensino melhores.

    Atribuição:

    Fotos: Fernando Almeida / g1 Campinas e Região e Prefeitura de São Paulo. Arte por Clorofreela.

  • O Plano Nacional de Pós-Graduação: Pelo fim da negligência

    O Plano Nacional de Pós-Graduação: Pelo fim da negligência

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    Autores

    Texto escrito por Matheus Naville Gutierrez

    O último PNPG teve o fim de sua vigência em 2021. Qual sua importância e quando podemos esperar um novo?

    2023 iniciou com novos ocupantes nas cadeiras legislativas nacionais e no cargo de presidência da república. Na perspectiva de ares mais sérios e comprometidos com a ciência e a educação pública brasileira, podemos esperar a retomada de políticas públicas nessas áreas. A nova ministra da Ciência, Tecnologia e Inovações, Luciana Santos tem apresentado propostas animadoras, como o aumento da bolsa de pós-graduação e a retomada de recursos bloqueados pelo antigo governo para a área.

    Apesar das perspectivas animadoras, ainda há muito trabalho a ser feito. Uma questão fundamental para o governo federal retomar enquanto necessidade de avanço científico e tecnológico é o Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG). Por que esse documento é essencial para o Brasil, e qual a atual situação dele?

    O que é o Plano Nacional de Pós-Graduação

    Após diversas tentativas de organizar a pós-graduação no Brasil no âmbito nacional, considerando sua estrutura, objetivos e obrigações, foi criado um documento que cumprisse todas essas necessidades. Assim, em 1975 foi promulgado o primeiro Plano Nacional de Pós-Graduação, que aglutinava todas as estruturas gerais dessa formação universitária, que foram inicialmente descritas por Wilson Sucupira juntamente com as obrigações e planejamento que o governo federal cumpriria com a pós-graduação no Brasil. 

    Desde então, já tivemos seis versões dessa política pública. Cada novo plano o documento se expandia, trazendo novas perspectivas para o trabalho dos mestrandos e doutorandos do Brasil. Os PNPGs sempre foram responsáveis por questões como o acesso à pós-graduação, fomento para pesquisas estratégicas, internacionalização e a produtividade. Juntamente, dados sobre a distribuição geográfica, o acesso, e o perfil dos pós-graduandos também consta nesse documento. Analisaremos melhor esses dados através do último PNPG que temos promulgado.

    A importância do PNPG: analisando o último documento promulgado

    Para entendermos melhor a importância de um documento como o PNPG, vamos usar de exemplo o que diz o último que temos em mãos, o Plano Nacional de Pós-Graduação 2011-2020. Escrito em 2010, o documento é separado em dois volumes.

    Iniciaremos com o primeiro volume, que é separado em capítulos que englobam estruturações essenciais para a atividade da pós-graduação ao decorrer de sua vigência. Análise da situação que a pós-graduação se encontrava, projeções de crescimento, sistemas de avaliação, relações entre a pós-graduação e empresas privadas e diretrizes para o financiamento de pesquisas são alguns dos principais pontos que estão descritas nessa primeira parte.

    Já no segundo volume, o foco é em discutir perspectivas para o futuro da pós-graduação para a década seguinte. Para isso, apresenta-se áreas de atuação consideradas essenciais, como cultura, ciências agrárias, a floresta Amazônica, abastecimento energético e o setor espacial brasileiro. 

    Por si só, todos os parâmetros estabelecidos nesses dois volumes já nos mostram a necessidade de termos um PNPG atualizado, envolvida intimamente com a sociedade e com os meios acadêmicos. Só para exemplificar, pode-se pontuar o surgimento do Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG), que foi estruturado nesse PNPG e iniciou seus trabalhos em 2019. Conforme a descrição no capítulo 8 do volume 1 do PNPG, o SNPG analisa, pontua e garante a continuidade dos trabalhos propostos no documento.  

    Contudo, é notável que esse PNPG tem sua vigência até o ano de 2020, e já estamos em 2023. Qual a situação do próximo documento?

    Onde está o Plano Nacional de Pós-Graduação 2021-2030?

    A situação da continuidade desse documento essencial é delicada. Primeiramente, as últimas diretrizes situam que o PNPG deveria fazer parte do Plano Nacional de Educação (PNE), que está em vigência de 2014 até 2024. Certamente, essa seria uma decisão difícil pelo tamanho e objetivos da pós-graduação no Brasil. Desse modo, o meio acadêmico ficaria sem nenhum amparo nacional até a próxima organização de um novo PNE.

    No entanto, em junho de 2022 o governo federal estabeleceu uma comissão responsável para a escrita do novo PNPG, com a perspectiva para vigência entre 2021 e 2030. 

    A desorganização política geral nos órgãos educacionais e científicos no governo Bolsonaro não é novidade nenhuma. O governo Bolsonaro foi definido por denúncias de corrupção no Ministério da Educação, negacionismo científico, corte de verbas para a ciência e até mesmo tentativa de inibir o acesso à universidade pública. Por isso fica claro que a pós-graduação, sua organização, desenvolvimento e valorização também não estariam nos planos do antigo governo.

    Visto que estamos vivendo com novas perspectivas políticas e com possíveis valorizações do trabalho científico realizado por pós-graduandos no Brasil, surge a necessidade de pensarmos esse novo PNPG. Por isso, penso que o Ministério da Educação, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, o poder legislativo e o meio acadêmico possam juntar forças e reestruturar um novo documento, um novo Plano Nacional de Pós-Graduação.

    O futuro da pós-graduação 

    Essa perspectiva animadora possibilita começarmos a traçar alguns projetos para o futuro da pós-graduação no Brasil. Inevitavelmente, ele passará por uma organização nacional, como o PNPG, que poderá ser feito da maneira que esperamos. Questões como a permanência de estudantes, o aumento das bolsas de estudo, a profissionalização da pós-graduação, a política de cotas, o equilíbrio demográfico regional, todas essas questões podem (e devem) estar nesse próximo documento.

    Ou seja, cabe agora a cobrança, a participação ativa, a organização coletiva e a estruturação de ideias essenciais para conseguirmos avançar com uma pós-graduação que atenda aquilo que esperamos enquanto projeto de nação e de sociedade. Respirar novos ares e novas perspectivas para 2023 e adiante é um alivio e nos enche de esperança. mas o trabalho para o desenvolvimento da ciência e da educação no Brasil vai sempre existir, e continuaremos lutando. 

    Para saber mais:

    Blog PEMCIE; A gratuidade da universidade pública é inquestionável

    PNE – Plano Nacional de Educação

    Plano Nacional de Pós-Graduação – PNPG 2021-2030

    Plano Nacional de Pós-Graduação – PNPG 2011-2020

    Evolução do SNPG no decênio do PNPG 2011-2020

    ANF (Agência Nacional de Notícias das Favelas); Cientista analisa perspectivas na gestão de Luciana Santos

    CNN; Prioridade é aumentar orçamento para bolsas de pós-graduação

    ISTOÉ; O bolsolão do MEC virou o maior escândalo de corrupção do governo Bolsonaro

    TERRA; Matéria do ‘JN’ critica negacionismo científico de Bolsonaro

    ESTADÃO; Governo Bolsonaro manda cortar 87% de verbas para ciência e tecnologia

    O autor:

    Matheus Naville Gutierrez é Mestre e doutorando em ensino de Ciências e Matemática pela UNICAMP e licenciado em Ciências Biológicas pela UNESP. Sempre dialogando sobre educação, tecnologia, ensino superior, cultura e algumas aleatoriedades que podem pintar por ai.

    Este texto foi publicado originalmente no Blog PEmCie

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos são produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores e foram revisados por pares. Por fim, reitera-se o compromisso Editorial com a qualidade das informações publicadas neste projeto, podendo acontecer revisão do aceite de submissão sempre que observarmos irregularidades e desinformações sendo veiculadas. Os textos publicados são de responsabilidade dos autores e não necessariamente representam a visão do Blogs de Ciência da Unicamp e da Universidade Estadual de Campinas.

    Como citar:  

     

    Sobre a imagem destacada:

    Fotos de xxxx. Arte por xxxx.

  • A gratuidade da universidade pública é inquestionável

    Texto por Matheus Naville Gutierrez

    A PEC 206 pode destruir a universidade pública brasileira. Precisamos defendê-la de argumentos falsos.

    O deputado Kim Kataguiri (Democratas-SP) colocou em pauta hoje um projeto que visa alterar a constituição, o qual ele é relator. A PEC 206/2019, redigida em 2019 pelo deputado General Peternelli (PSL-SP), propõe a cobrança de mensalidade nas universidades públicas para todos os seus frequentadores, e aqueles que não puderem pagar, podem usufruir da universidade pública gratuitamente. O progresso científico e tecnológico brasileiro é diretamente afetado e atacado com esse projeto, que antes de mais nada, é deturpado e usa de pressupostos errôneos. Primeiramente, a PEC usa pressupostos completamente equivocados. Vamos debatê-los a seguir.

    O texto enganador da PEC

    Logo após a leitura do texto da PEC, uma problemática bem clara sobre o pressuposto do projeto de lei se mostra. A defesa nefasta que está acontecendo nas redes sociais não leva em consideração os parâmetros da lei em si.

    Trecho PEC
    Trecho retirado da PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO N.º206 , DE 2019

    Conforme o texto acima, a lei propõe justamente que exista uma comissão que avalie a situação socioeconômica dos estudantes e faça uma deliberação sobre o pagamento ou não da mensalidade. Ou seja, a base é que TODOS os estudantes paguem mensalidade, estando apenas alguns eximidos da conta. Decerto, essa lógica levanta muitas questões problemáticas. Vamos a algumas delas:

    Como essa comissão será formada? Como ela atenderá todos os estudantes? Quais critérios serão utilizados para essa escolha? Essa comissão não poderia ser utilizada de forma a excluir ainda mais os estudantes? Eles não precisariam passar por mais uma etapa burocrática para conseguir se manter na universidade pública?

    Uma vez que esse debate entrou na esfera pública novamente, podemos nos debruçar em alguns pressupostos que esse projeto de lei. A seguir, coloco algumas dessas questões para conversa.

    Quem frequenta a universidade pública?

    Inicialmente, a defesa dessa PEC sugere que as universidades públicas brasileiras são frequentadas majoritariamente por pessoas oriundas das classes mais altas. Sendo assim, elas teriam o poder aquisitivo necessário para pagar os custos de seus estudos na universidade. Ainda que esse discurso pareça verdadeiro, ele atualmente é falso. Segundo dados da pesquisa do perfil socioeconômico dos estudantes de graduação das universidades federais, o perfil brasileiro é: 53,5% dos estudantes vivem com renda de até 1 salário mínimo por pessoa nas famílias. Esta pesquisa coletou dados de 63 universidades federais brasileiras. Confira abaixo os dados na tabela:

    É necessário debater sobre as formas que universidade pública elitiza o conhecimento e cria modos de facilitar a permanência de pessoas com renda maior, nós sabemos disso. Contudo, o projeto de lei não serve como resposta para esse problema.

    Ou seja, a PEC coloca como responsável por essa problemática os estudantes. Como assim? Atualmente, a universidade não possibilita o acesso e a permanência de pessoas sem os recursos financeiros, o que falarei mais adiante. Mas o mais relevante é: cria uma disputa por vagas e cotas entre os próprios estudantes já em situação de vulnerabilidade social e financeira. Esta PEC cria, portanto, uma narrativa de embate entre os estudantes para tirar o foco da problemática real das universidades: as políticas públicas e como são feitos os investimentos.

    Atacando o problema de verdade

    Para que essa elitização velada da universidade comece a ser combatida de verdade, precisamos focar em duas frentes. Primeiramente, o debate sobre o vestibular. Ele sim, um gargalo colocado de forma proposital para excluir uma parcela dos estudantes. Ele afunila a entrada na universidade, principalmente quem não consegue dedicar o tempo necessário de estudos para enfrentar a maratona dos vestibulares (e não consegue pagar por cursos pré-vestibulares).

    Em seguida, as políticas públicas de permanência. A universidade pública brasileira é um espaço de formação que exige a dedicação quase exclusiva de seus alunos, sem tempo para trabalhos externos. Para criar condições aos estudantes usufruam de suas possibilidades formativas, a universidade precisa garantir moradia, alimentação e renda para os estudantes.

    Nossa defesa, como política pública, é oposta ao projeto de lei. Isto é, o financiamento para permanência de estudantes na universidade pública deve ser proveniente de políticas públicas inclusivas, que abarquem a diversidade, origem e identidades diversas. Quem deve financiar esses estudantes, portanto, não devem ser eles mesmos, mas políticas públicas destinadas a sua formação.

    O que se desenvolve na universidade pública no Brasil?

    Ao mesmo tempo, o discurso de se pagar é nefasto por não compreender a complexidade da produção e da vivência nas universidades brasileiras. A ideia de que é um local de apenas estudo, em que o estudante apenas assiste aulas e realiza provas é falacioso. A universidade pública, desde os estudantes de graduação, desenvolve ciência, forma profissionais, produz conhecimento que retornará para a sociedade.

    O desenvolvimento da ciência brasileira, realizada por graduandos e pós-graduandos, foi o que nos garantiu o desenvolvimento de diagnósticos, com agilidade e eficiência, durante toda a pandemia da Covid-19, aqui na Unicamp e em várias universidades brasileiras. Além disso, a grande quantidade de pesquisas e atuações acadêmicas neste período, em todas as áreas de conhecimento, tiveram participação ativa de estudantes ainda em formação, de modo voluntário ou com bolsas, que minimizaram os efeitos da doença em toda a sociedade brasileira.

    Uma nação que busca o progresso sustentável e tecnológico precisa do desenvolvimento científico, que acontece unicamente nas universidades públicas. Isto é, a proposta de se pagar para estudar em uma universidade pública, além de afastar futuros cientistas que poderiam surgir de diversas origens sociais e econômicas, deturpa a própria ideia de desenvolvimento científico em nosso país.

    A pós-graduação: ela também pode ser afetada em médio e longo prazo

    O pós-graduando, hoje, vivencia uma carreira de uma avassaladora precarização, sem recursos, com bolsas sem ajustes e com a visão social de que é “apenas um estudante”. Não, não é. O estudante de graduação e pós-graduação são profissionais que desenvolvem trabalhos em sua área de formação, desde o início do curso. Você, por exemplo, aceita trabalhar de graça por vários anos, sem nenhuma renda? Pois é, além de atuar de graça, ainda precisaria pagar, neste caso.

    Na perspectiva desta lei, que prevê cobrança de mensalidade na graduação, também não afetaria essa etapa que acontece na universidade pública? Se cobrarmos os estudantes de graduação, depois de quanto tempo a pós-graduação que será cobrada? Essa proposta de lei é um afronte gigantesco à autonomia e ao ideal de universidade pública.

    A educação deve sempre ser pública, gratuita, de qualidade e de fácil acesso

    Em suma, esse é um projeto de lei que ataca diretamente a constituição nacional que garante o acesso à educação pública, gratuita e de qualidade para para todas as pessoas da nação. Em primeiro lugar, a garantia que ela é pública é a base para o desenvolvimento da ciência, da extensão e do ensino sem a necessidade de cumprir uma agenda empresarial e de resultados. Juntamente, a educação precisa ser gratuita, para garantir que todas as pessoas tenham acesso ao desenvolvimento cidadão, profissional, científico e humanístico. Assim como ela também precisa ser de fácil acesso, garantindo que todas as pessoas que busquem uma instituição de ensino consiga acessá-la.

    O problema da elitização velada das universidades é importante e de necessária discussão. Mas que ela seja feita de forma séria, verdadeira e com propostas reais de sua superação, e não seja retirado do Estado brasileiro a sua responsabilidade.

    Atualização (24 de maio, 19h21; Editorial)

    A PEC não está mais em tramitação, enquanto finalizávamos o texto, em função do pedido de Audiência Pública, com participação de representantes da sociedade civil organizada, conforme consta neste documento.

    Para saber mais

    Beraldo, Gabriela (2022) Bolsa Capes, do MEC, completa 9 anos sem reajuste. entenda o que isso significa, 23 de março de 2022.

    BRASIL. PEC 206/2019, Dá nova redação ao art. 206, inciso IV, e acrescenta § 3º ao art. 207, ambos da Constituição Federal, para dispor sobre a cobrança de mensalidade pelas universidades públicas.

    UFES. Pesquisa nacional apresenta o perfil dos estudantes de graduação das universidades federais, 17 de maio de 2019.


    Publicado originalmente no blog PEMCIE.


    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadoresAlém disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp.

  • Contradições acima de tudo, cortes acima de todos.

    Texto por Ana Arnt, Erica Mariosa Carneiro, Eduardo Akio Sato e Graciele Oliveira

    Ontem, 8 de Maio de 2019, recebemos a notícia de que “A gestão do presidente Jair Bolsonaro (PSL) bloqueou nas últimas horas bolsas de mestrado e doutorado oferecidas pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior)”, conforme consta na publicação do Jornal Folha de São Paulo.

    Enquanto isso, nas redes sociais do Ministério da Educação, encontramos divulgada a abertura da inscrição no Exame Nacional do Ensino Médio, relacionando isso a um passo para seguir a carreira científica (como vocês podem acompanhar clicando aqui, aqui, e aqui).

    Nos comentários destas postagens do Ministério da Educação, inúmeras pessoas interrogam sobre “qual carreira científica?”, tendo em vista os cortes orçamentários anunciados ao longo de toda a gestão deste governo.

    Quais cortes?

    Ao longo da semana passada três Universidades Federais alvo de bloqueios orçamentários – UnB, UFBA e UFF. A justificativa para tal ação era o enquadramento no critério “fazer balbúrdia”,

    Exemplo de Evento de Extensão Ridículo de Instituição Científica

    segundo o Ministro da Educação Abraham Weintraub. O Ministro ainda afirmou que “A universidade deve estar com sobra de dinheiro para fazer bagunça e evento ridículo“. Complementando com dizeres de que dentro das universidades há pessoas do Movimento Sem Terra, bem como gente pelada. Estes foram os exemplos de “bagunça” usados pelo Ministro da Educação, em sua entrevista com o jornal Estado de São Paulo, que justificariam os bloqueios.

    Exemplo de Evento Universitário Ridículo

    Após repercussão negativa, em função de critérios subjetivos e completamente sem embasamento técnico, foram anunciados cortes orçamentários em universidades públicas federais de todas as regiões do país. Além do corte das verbas de custeio das universidades federais, ressaltamos que houve cortes também em todas as etapas de ensino – do infantil ao ensino médio – contrariando a ênfase do governo federal de que o orçamento priorizaria a educação básica e creches. Segundo o jornal Folha de São Paulo, os cortes na educação infantil até o ensino médio são da ordem de R$ 680 milhões. Na rúbrica relacionada à construção e manutenção da educação infantil, foram contingenciados 17% dos R$ 125 milhões do orçamento autorizado (como o exposto nesta reportagem).

    Ressoa, ainda em nossos pensamentos, a pergunta “que carreira científica é essa proposta pelo ENEM?”. A ciência, neste governo, vem sofrendo retaliações e cortes de forma sistemática. Simultaneamente a isso, as propagandas governamentais contradizem o que indica o orçamento. Como, por exemplo, seguir carreiras científicas quando vemos cortadas as verbas das instituições de ensino superior que, em nosso país, são responsáveis por 95% da pesquisa no país?

    Abaixo, o gráfico, cujo artigo pode ser lido na íntegra aqui apresenta dados que indicam o desempenho das principais universidades brasileiras em pesquisas. Figuram no topo da lista apenas instituições públicas, ao contrário do já pronunciado oficialmente por nosso presidente – fala não fundamentada em dados técnicos.

    Não compreendemos as razões que fundamentam a ideia de incentivar carreiras científicas, concomitantemente à promoção de cortes que inviabilizam a formação destes profissionais – tanto no Ensino Superior, quanto na Pós-Graduação (formação necessária a cientistas ao redor do mundo…). Sem bolsas, sem financiamentos de pesquisa, sem universidades com energia elétrica e contas de água em dia, com museus sem verbas para custeio, manutenção para suas estruturas, acervo técnico-científico, pesquisadores e curadores que carreira científica existiria para seguir?

    Vale lembrar que o investimento científico se faz via manutenção de universidades federais e museus – via Ministério da Educação – mas também há editais de pesquisa, programas e ações de outra instância do governo que são essenciais e complementares. O Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação – MCTIC também vem sendo sucateado (42,27% do orçamento, conforme consta nesta nota de entidades e sociedades científicas brasileiras). Ao contrário do que tem sido veiculado pelo governo, as balbúrdias universitárias se relacionam mais a um aumento significativo da produção científica a partir do aumento dos investimentos públicos em ciência e tecnologia, do que bagunças e atuação inócua.

    Revista Nature 8 de Abril de 2019

    Internacionalmente esta situação tem recebido destaque em revistas de alto impacto científico, como a Nature e Science, e cientistas do mundo inteiro assinaram uma petição em defesa da ciência brasileira. Tais ações mostram consternação com nossa situação e indicam o quanto perderemos como país – e mundo – se seguirmos este caminho.

    Revista Science 12 de Abril de 2019

    Apenas um parênteses sobre a produção científica e a soberania nacional (algo tão enfatizado nesta gestão atual). A máxima “conhecer para governar” parece-nos cada vez mais um provérbio esquecido de tempos passados. A atual gestão pública se faz sem que a produção de conhecimentos seja fomentada e sirva como base para a tomada de decisões para o futuro da população, do território, a fim de manter nossa soberania nacional. Um país que não investe em ciência, tecnologia e produção de conhecimentos sociais e culturais é um país que perde condições de planejamento futuro, de compreensão das dinâmicas sociais, ambientais, políticas e econômicas de si mesmo. Nos tornamos, cada vez mais, um país que decreta que dados técnicos e conhecimento não são importantes para a soberania nacional, para a sociedade em que vivemos atualmente, para a vida das pessoas que constituem nossa nação.

    Simultaneamente a isso, vinculamos ao ensino escolar conteúdos e conhecimentos científicos completamente produzidos por nações estrangeiras – mais uma vez colocando em risco a noção de soberania por submetermo-nos à importação de todos os saberes técnicos-científicos a serem pensados em nossa pátria.

    Voltando às contradições de cortes orçamentários e incentivos educacionais, após o corte orçamentário no MCTIC, foi anunciado uma chamada pública que é uma parceria entre MEC-MCTIC, nomeado Programa Ciência na Escola. Ao lançar este edital, o Ministro Abraham Weintraub afirmou que “a ciência é a melhor vacina contra o obscurantismo”, na sequência, pronunciou ainda que “todos nós brasileiros, como nação, temos que fazer escolhas, e esse tipo de escolha, de alocar nossos recursos escassos numa iniciativa dessa, de valorizar a ciência, é justamente o que a gente quer fazer: manter investimento em educação, em pesquisa, em conhecimento”.

    Longe de criticar a iniciativa, o que interrogamos aqui é a contradição de indicar a ciência como saída do obscurantismo e o investimento em educação e conhecimento em um lado da moeda, enquanto evidentes cortes orçamentários se fazem presentes, cerceando as atividades universidades federais e as bolsas e projetos de pesquisas científicas. Além disso, ainda nos interrogamos sobre a contínua depreciação das instâncias produtoras de saber científico de nosso país, de docentes e pesquisadores universitários e sua contribuição histórica – mesmo com parcas verbas – para a construção de um espaço democrático de ciência e produção científica.

    Para saber mais:

    ABC, ANDIFES, CONFAP, CONSECTI, SBPC. (2019). Corte Orçamentário Atinge Desenvolvimento e Soberania Nacionais.

    Agostini, Renata. (2019) MEC cortará verba de universidade por ‘balbúrdia’ e já enquadra UnB, UFF e UFBA. Estado de São Paulo.

    Amparo, Thiago. (2019). Alvos de corte, universidades federais deram salto de produção em 10 anos. Folha de São Paulo.

    ANDES-SN. (2019). Só instituições públicas fazem pesquisa no Brasil, afirma organização

    Assessoria de Comunicação Social do MEC. (2019). No Senado, ministro Weintraub defende recursos para a educação básica. Ministério da Educação.

    Assessoria de Comunicação Social do MEC. (2019). MEC e MCTIC lançam Programa Ciência na Escola com o objetivo de modernizar o ensino de Ciências. Ministério da Educação.

    Moura, Mariluce. (2019). Universidades públicas realizam mais de 95% da ciência no Brasil. Unifesp.

    Oliveira, Regiane. Os primeiros efeitos da asfixia financeira de Bolsonaro sobre as ciências do Brasil. El Pais. 6 de maio de 2019.

    Pinho, Ângela; Saldanha, Paulo; Gentile, Rogério. (2019) Gestão Bolsonaro faz corte generalizado em bolsas de pesquisa no paísFolha de São Paulo. 8 de Maio de 2019.

    Pinho, Ângela; Saldanha, Paulo; Gentile, Rogério. (2019). Bloqueio de verba de universidade por motivo ideológico fere Constituição. Folha de São Paulo.

    Saldanha, Paulo. (2019). Bloqueios no MEC vão do ensino infantil à pós-graduaçãoFolha de São Paulo. 5 de Maio de 2019.

    Saldaña, Paulo (2019). Alfabetização será avaliada por gestão Bolsonaro só em amostra de escolas. Folha de São Paulo. 2 de maio de 2019.

    Saldaña, Paulo. (2019). Ministro da Educação ironiza reitores ao falar de tolerância e pluralidade. Folha de São Paulo.

    Saldaña, Paulo. (2019). MEC estende corte de 30% de verbas a todas universidades federais. Folha de São Paulo.

    UNESP. (2019). Universidades públicas realizam mais de 95% da ciência no Brasil

    Watanabe, Phillipe. Agências de apoio à pesquisa internacionais defendem ciências humanasFolha de São Paulo.

    *Este texto foi elaborado em conjunto com Ana Arnt, Erica Mariosa Carneiro, Eduardo Akio Sato e Graciele Oliveira*

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