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  • Vacina para crianças de 3 a 5 anos: o que sabemos sobre isso?

    Texto escrito por Ana Arnt e Maurílio Bonora Junior

    A vacina CoronaVac foi aprovada pela Anvisa, para crianças entre 3 e 5 anos, finalmente! As próximas etapas são de compra e distribuição de vacinas em quantidade suficiente para todo o território nacional.

    Há algumas regiões que possuem estoque desta vacina e já estão liberadas para iniciar a vacinação desta faixa etária. É o caso de Fortaleza (CE), São Luís (MA), Belém (PA), Boa Vista (RR), Manaus (AM), Salvador (BA) e o Distrito Federal.

    Mas, essa vacina é segura mesmo?

    Junto com a notícia sobre a vacinação infantil, vemos crescer, novamente, discursos antivacina e novos receios surgindo sobre a segurança da vacina para as crianças. Nós entendemos, claro, o quanto estas idas e vindas de informações podem gerar confusão e medo nas pessoas que são responsáveis pelas crianças. Assim, antes de seguir o texto, já adiantamos que SIM, a vacina é segura para crianças de 3 a 5 anos!

    Mas é preciso mais do que segurança para uma vacina ser boa, não é mesmo? Assim, achamos importante retomar estudos que falem sobre como é fundamental que este público seja protegido o mais rápido possível, para seguirmos no combate à Covid-19!

    E a resposta imune?

    O mesmo estudo chinês que fala sobre segurança da vacina nesta faixa etária, também apontou estímulo do sistema imune para a defesa contra o SARS-CoV-2. Todavia, há estudos mais recentes, como o chileno, que foi publicado este ano, sobre a vacina CoronaVac, para crianças de 3 a 5 anos, em relação à variante Omicron.

    O estudo foi feito com um pouco mais do que 490 mil crianças, sendo que cerca de 189 mil não se vacinaram durante a pesquisa e 194 mil se vacinaram com 2 doses de CoronaVac, com um intervalo de 28 dias entre primeira e segunda doses.

    Os resultados encontrados foram de 38,2% de proteção contra COVID-19 sintomática, 64,6% de proteção contra hospitalização e 69% de proteção contra internação na UTI. 

    O que isto quer dizer?

    Estes números às vezes nos deixam confusos, né? O que estas porcentagens querem dizer?

    Já falamos disso em um texto antigo nosso, mas retomaremos o exemplo aqui

    texto: “A fórmula para se calcular a eficiência de uma vacina é a seguinte: Eficiência= 1 - VP vp Sendo que: V = Número total de pessoas que foram vacinadas P: Número total de pessoas que receberam o placebo v: Número de pessoas vacinadas que foram infectadas (ou algum outro efeito que esteja pesquisando) p: Número de pessoas que receberam o placebo que foram infectadas Entretanto, quando o número total de vacinados e que receberam o placebo são muito parecidos, podemos desconsiderar essa parte da fórmula, ficando da seguinte forma: Eficiência=1-vp Vamos ver um exemplo, para ficar mais claro: Suponha que 50.000 pessoas serão testadas, 25.000 com a vacina e 25.000 com o placebo. Desses 50.000, 100 se contaminaram com o patógeno em um período de 6 meses. Analisando essas 100 pessoas que se infectaram, descobriu-se que 97 delas estavam no grupo que não se vacinou e somente 3 no grupo vacinado. Como o número de vacinados e que receberam placebo é parecido, podemos usar a fórmula simplificada. Fazendo uma divisão simples: Eficiência=1-397=~97% descobre-se então que a vacina tem uma eficácia de 97%.”

    Agora, utilizando desses conhecimentos, podemos entender um pouco melhor os resultados do artigo chileno. Quando vimos que a CoronaVac, em crianças, gera uma proteção de 38,2% contra a forma sintomática da COVID-19, o que isso quer realmente dizer é que as crianças têm uma PROBABILIDADE de (quase) 40% de não ter sintomas da Covid-19, caso se contamine com o SARS-CoV-2.

    Pode parecer pouco, mas nesse momento o mais importante é impedir que essas crianças desenvolvam a forma mais séria da doença, que tem causado muitas mortes dentro desse grupo.

    E aí que os outros resultados se tornam tão importantes. Dizer que a CoronaVac gera 64,6% de proteção contra hospitalização e 69% de proteção contra internação na UTI, novamente, não quer dizer que de 100 crianças, exatamente 64 não serão hospitalizadas enquanto 36 com certeza precisarão de um hospital. Na verdade, esses valores nos dizem que, na média, a criança vacinada tem 64,6% a mais de probabilidade de não ser internada e, principalmente, 69% de chance de não precisar de uma UTI (que são os casos mais graves).

    Óbvio que pode acontecer pequenos desvios dentro desses valores, por exemplo, podemos ficar sabendo de muitos casos, dentro do nosso círculo de conhecidos, de crianças que mesmo vacinadas tiveram sintomas de Covid-19 e precisam ir ao hospital. Mas é aí que precisamos lembrar que quando falamos de vacinação, não estamos olhando somente para as poucas dúzias de pessoas que conhecemos ou ouvimos falar, e sim de milhões de crianças, jovens, adultos e idosos. Assim, quando olhamos para o conjunto como um todo, podemos ver o poder das vacinas e a real proteção que elas geram em nós.

    Considerações importantes sobre o estudo chileno

    Este estudo se realizou na população, e isto quer dizer que não houve “placebo”. O que isto quer dizer? O conjunto de pessoas que toma placebo na fase experimental é exatamente aquele que chamamos de “grupo controle”. Isto é, o grupo que vai “tomar” algo (pode ser até mesmo água), para que consigamos comparar com o grupo que tomou a vacina.

    Assim, neste caso, o grupo controle foi o “não vacinado”. E isso pode acontecer, mesmo sem passar de novo pelas fases 1 e 2 de pesquisa? Sim! Quando a vacina já está sendo aplicada na população – após todas as fases experimentais – que são as fases 1, 2 e 3 – nós seguimos analisando os dados da vacina na população.

    Isto acontece, especialmente em casos como do SARS-CoV-2, que é um vírus que está com alta transmissão na população, com novas variantes circulando. Assim, também vamos comparando as nossas análises iniciais – das pesquisas realizadas nas fases 1, 2 e 3 – com as respostas posteriores. Esta continuidade de coleta de dados, em termos populacionais, chama-se de farmacovigilância.

    Praticamente todos os medicamentos e vacinas utilizados no mundo possuem pesquisas de farmacovigilância por anos – até décadas – sendo realizadas.

    Portanto, nada disso torna a vacina “experimental”. Ou seja, pesquisas de longa duração são fundamentais para compreendermos como as populações estão de saúde e como as interações com medicamentos e vacinas funcionam em um prazo longo (de décadas, no caso).

    Finalizando

    Apenas para lembrar o que sempre falamos sobre vacinas desde o início de nosso trabalho no Especial Covid-19: vacinas são um pacto coletivo. Dessa forma, essas vacinas são seguras e fundamentais para diminuirmos a infecção em crianças e controlarmos a transmissão do vírus na população!

    Em suma, a pandemia não só não acabou, como segue com alta transmissão e um grande número de casos e óbitos em nosso país. É fundamental que consigamos proteger ainda mais as crianças e tornar nosso cotidiano mais saudável e seguro!

    Para Saber Mais

    BRASIL, Anvisa, Farmacovigilância.

    G1 (2022) 6 capitais e o DF começam a vacinar crianças a partir de 3 anos contra a Covid nesta segunda, G1, 18/07/2022

    Jara, A, Undurraga, EA, Zubizarreta, JR et al (2022) Effectiveness of CoronaVac in children 3–5 years of age during the SARS-CoV-2 Omicron outbreak in Chile Nat Med

    Han, B, Song, Y, Li, C, Yang, W, Ma, Q, Jiang, Z, … & Gao, Q (2021) Safety, tolerability, and immunogenicity of an inactivated SARS-CoV-2 vaccine (CoronaVac) in healthy children and adolescents: a double-blind, randomised, controlled, phase 1/2 clinical trial The Lancet Infectious Diseases, 21(12), 1645-1653.

    Fernandes, EG, López-Lopes, GIS, Silva, VO, Yamashiro, R, Madureira, KCR, Gallo, JF, … & Brigido, LFM (2021) Safety and immunogenicity of an inactivated SARS-CoV-2 vaccine (CoronaVac) in inadvertently vaccinated healthy children, Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, 63.

    OPAS (2005) A importância da Farmacovigilância 

    Outros materiais

    Cobertura Vacinal, retomadas, indivíduos e população

    Reações adversas e vacinas: o que são e onde habitam 

    Vacina de Pólio e a segurança dos protocolos de vacinações atuais 

    Políticas públicas em saúde e vacinação de Covid-19

    As 11 fake news sobre vacinas infantis que circularam antes e durante a consulta do ministério da saúde

    Reações adversas, vacinação e desinformação 

    Estudos preliminares, vacinas, políticas públicas e eventos cardiovasculares

    Vacinação infantil contra Covid-19: desinformação, miocardite e outros alarmismos

    Passaporte nacional de imunização e segurança sanitária  – Faz sentido isso? – Updated

    Vacinação, transmissão e variantes: o que aprendemos nesse um ano

    Fases das vacinas

    E aqueles resultados das vacinas?

    Parcerias:

    Mellanie Fontes-Dutra: A vacina CoronaVac está APROVADA, COVID-19 E CRIANÇAS, Dados do Chile da CoronaVac em crianças de 3-5 anos,

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os textos foram produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Bem como, foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • 2 anos de Pandemia de Covid-19

    Imagem de Clorofreela

    Hoje completamos 2 anos de Pandemia de Covid-19. No início de 2020, ainda em janeiro, víamos as notícias percorrendo o mundo, acompanhávamos atentos aos acontecimentos recentes acerca de uma pneumonia cujo patógeno era considerado novo, para nós.

    No dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde finalmente decreta que o Coronavírus, SARS-CoV-2, tinha se tornado uma pandemia. Isto é, um vírus que atinge todos os países do mundo (ou quase todos).

    Enquanto buscávamos informações seguras para realizar nosso trabalho, aqui no Blogs de Ciência da Unicamp, também víamos proliferar desinformações vindas dos locais em que mais deveríamos confiar e que ocupam postos destinados ao cuidado de nossa população. 

    Em 2 anos, enfrentamos mais de 450 milhões de casos notificados no mundo e 6 milhões de óbitos confirmados registrados. Destes, ainda que com uma subnotificação enorme, quase 11% ocorreu aqui em solo brasileiro (cuja população total é 2,6% da população mundial…). 

    Vidas que não sofrem sozinhas ao virem a termo. Foram pessoas, famílias inteiras, sofrendo com desde a infecção, até internações, cuidados paliativos e descaso ou falta de leitos hospitalares – o que aconteceu em grande parte do mundo. (Podemos analisar isto aqui, aqui, aqui, aqui e mais recentemente, aqui).

    Primeiro ano da Pandemia

    Aqui no Brasil, após um primeiro ano nitidamente marcado pela desinformação, o colapso veio junto com o início de uma lenta vacinação e muita apreensão. Nosso março de 2021 foi marcado com perdas e exaustão, que nublavam a esperança pela chegada da vacina. Uma vez que víamos despedidas de pessoas queridas que não conseguiram se afastar da infecção, semanas antes de sua tão esperada data de vacinação chegar. Este foi o maior colapso sanitário e hospitalar já vivenciado em nosso país.

    O Especial COVID-19, aliava-se ao Todos Pelas Vacinas e também ao Consulado Geral da França em São Paulo para informar sobre vacinas, Covid-19, efeitos sociais da pandemia, surgimento de variantes e muito mais temas necessários para entendermos e enfrentarmos esta doença que se agravava no cenário brasileiro.

    Assim, completamos 1 ano de pandemia no auge do colapso, após uma virada de ano literalmente sem ar, em Manaus, em um ato de descaso sem igual na história de nosso país.

    Segundo ano de Pandemia

    Iniciamos 2021 com 200 mil óbitos. Rapidamente chegamos a marcas mais tristes e devastadoras, que só desaceleraram em função da vacinação que ampliou sua cobertura ao longo do primeiro semestre, ainda que com velocidade menor do que a capacidade brasileira de negociação, compra e distribuição destas vacinas.

    Passamos por uma dolorosa CPI, que escancarou esquemas de corrupção e planejamentos que em nada relacionam-se com princípios de uma gestão pública para salvar vidas, frente a uma crise sanitária que vivenciávamos.

    Debatemos inúmeros medicamentos que não tinham efeito algum para Covid-19, enquanto notícias falsas sobre vacinas brotavam em mensagens instantâneas de aplicativos e causavam hesitação vacinal.

    Fechamos o ano de 2021 com mais de 600 mil mortes em nosso país, muitas delas evitáveis. Vimos, ainda neste final de 2021, o apagão de dados públicos do DATASUS. Sem explicações plausíveis, o que prejudicou muito o monitoramento da doença no Brasil.

    Todavia, a esperança da vacina infantil aprovada pela Anvisa trazia alento para nós, também.

    Junto com a vacina infantil, um novo levante de desinformações era visto, mais cruel e ardiloso: a frequente ameaça que, supostamente, as vacinas causavam miocardite e mal súbito em crianças é uma avalanche constante em nossos meios de comunicação de redes sociais.

    Sem qualquer fundamento ou dados concretos, causam hesitação vacinal em um grupo ainda vulnerável. Piorando, ainda, nosso cenário em que caem as últimas barreiras de cuidados básicos individuais. Por exemplo, as máscaras faciais. Além disso, acentua-se a situação em função de estados e municípios retirando a obrigatoriedade de uso em crianças em fase escolar, sem esquema vacinal completo.

    Seguimos atentos, junto a outros grupos de divulgadores científicos e cientistas, olhando atentamente números, pesquisas, casos pelo mundo, tentando compreender o momento em que estamos vivendo da pandemia. Além disso, com esperança de dias melhores e mais amenos (como acreditamos realmente estarmos alcançando), ainda cientes de que a pandemia não acabou. Não estamos em uma endemia e temos reiterado que tornar-se uma endemia não é algo bom, se negligenciarmos mortes por Covid-19.

    Longe de alarmismos, temos tentado observar a pandemia com um otimismo atento e alerta.

    E com radares ligados para novidades que possam ser importantes para seguirmos divulgando ciência, todos os dias.

    A todes que seguem juntes a nós, nessa toada, nosso muito obrigada.

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Vacinação, Transmissão e Variantes: o que aprendemos nesse um ano?

    Vacinação, Transmissão e Variantes: o que aprendemos nesse um ano?

    Por meses e meses, o que mais tínhamos em nossas mentes quando o assunto Pandemia vinha à tona eram perguntas e mais perguntas. Por exemplo, o vírus é mortal? Como sei que estou infectado? Há uma cura? Quanto tempo será de lockdown? Preciso usar máscara e álcool em gel? Quando vai haver uma vacina? Tem algum remédio? Como as vacinas funcionam? Quanto tempo dura a proteção gerada por elas? E as variantes? Posso me infectar e transmitir mesmo vacinado? Como acontece a transmissão?

    Mês a mês, pesquisa após pesquisa, fomos aprendendo e descobrindo um pouco mais sobre o SARS-CoV-2, a COVID-19, as variantes e as vacinas.

    Mas ainda assim, duas perguntas ressoavam no fundo de nossas mentes, nos fazendo repeti-las a cada nova descoberta: por quanto tempo a imunidade das vacinas dura e, mesmo vacinado, ainda posso infectar novas pessoas?

    Bem, logo de cara posso lhes dizer que ainda não temos certeza de quanto tempo a imunidade total das vacinas dura em nosso corpo. Temos algumas noções, vários estudos avaliando o número de anticorpos, com muitas pesquisas mostrando a redução dos anticorpos após vários meses (o que é algo totalmente normal olhando do ponto de vista imunológico), mas ainda um baixo número de artigos avaliando a resposta imune celular, isso é, a porção do nosso sistema imune que nos defende utilizando células. 

    Entretanto, quanto ao impacto das vacinas na transmissão, temos cada vez mais informações que nos auxiliam em montar um panorama geral sobre esse assunto. E é sobre isso que vamos falar aqui hoje.

    O que se sabe até o momento sobre a influência das vacinas na transmissão da COVID-19?

    Pouco tempo após as primeiras campanhas de vacinação ao redor do mundo terem começado, os primeiros estudos avaliando sua capacidade de reduzir os sintomas da COVID-19, hospitalizações e mortes eram publicados. Nessa época, muitos desses estudos chegavam a comentar sobre a possibilidade das vacinas estarem reduzindo a transmissão do SARS-CoV-2 entre as pessoas. Contudo, esses primeiros estudos não focaram em avaliar exatamente a transmissão entre as pessoas. Por causa disso, muitas dessas suposições sobre o impacto na transmissão ficavam no campo das ideias.

    Entretanto, já passou um ano de vacinação mundo afora. Assim, vários estudos foram feitos focando especificamente no impacto da vacinação na transmissão, avaliando e mostrando efeitos bem positivos. Tudo isso reafirma a necessidade do uso de vacinas (mas não exclusivamente o uso delas) para se chegar ao fim da pandemia. 

    Entre muitas coisas, esses são os principais pontos que sabemos no momento:

    • As vacinas reduzem a infecção inicial causada pelo SARS-CoV-2. Isto é, os sintomas sentidos por uma pessoa totalmente vacinada infectada tendem a ser mais leves, do que em uma pessoa não vacinada infectada;
    • O tempo levado pelo vírus para gerar uma cópia de si mesmo dentro das nossas células (chamado de tempo de replicação) é menor em pessoas totalmente vacinadas que se infectaram. Isto quando comparado com pessoas não vacinadas infectadas. Consequentemente, a quantidade de vírus no organismo (a carga viral) de uma pessoa totalmente vacinada infectada é menor;
    • Pessoas totalmente vacinadas infectadas emitem uma quantidade menor de partículas virais através de tosse, espirro ou mesmo a fala. Além disso, as partículas virais emitidas por essas pessoas têm uma infecciosidade menor. 
      • Em outras palavras, uma pessoa totalmente vacinada e que foi infectada joga para fora do seu corpo uma quantidade menor de vírus, e esses vírus têm também uma menor capacidade de infectar outra pessoa;
    • Pessoas totalmente vacinadas que foram infectadas pelo SARS-CoV-2 conseguem limpar o vírus do seu corpo mais rapidamente. Isto é, o sistema imune desses indivíduos é mais eficiente em matar os vírus e as células infectadas por ele, em um intervalo de tempo menor.

    Ok, em um grande resumo, o que isso quer dizer? 

    Todos esses dados nos mostram que vacinas foram e são capazes de reduzir o tempo que o vírus fica dentro de nosso corpo, a partir de várias formas que é REDUZINDO:

    • a multiplicação do vírus;
    • a sua emissão;
    • o tempo que o vírus fica dentro do corpo;

    Assim sendo, de forma indireta, é possível dizer que as vacinas impactam e reduzem sim a transmissão do SARS-CoV-2 em pessoas totalmente vacinadas.

    E se você chegou aqui e ainda tem dúvidas sobre isso, vamos pensar o seguinte: 

    “Se uma pessoa com COVID-19 têm menos vírus dentro do corpo (por esse não estar conseguindo se multiplicar rapidamente), tal pessoa emite menos vírus para o ambiente ao seu redor (por tossir e espirrar menos, por exemplo) e fica menos tempo com o vírus dentro do corpo (por seu sistema imune estar matando o vírus e as células infectadas mais rápido). Assim, essa pessoa tem uma chance menor de transmitir o vírus para outros indivíduos, quando comparada com um indivíduo que se infectou sem estar vacinado.”

    Aqui é o momento em que faço algumas ressalvas. Note bem a palavra que foi usada anteriormente: indivíduos vacinados têm uma chance MENOR de transmitir para outras pessoas. Isso não quer dizer que, se você foi vacinado com duas ou três doses, você não terá chance alguma de pegar e transmitir o SARS-CoV-2. 

    Além disso, uma segunda ressalva que devo fazer aqui é sobre esses mesmos estudos que citei: as pesquisas mais completas avaliaram a transmissão de pessoa para pessoa em contatos domiciliares, e não em grandes ambientes abertos ou com grandes aglomerações. Para essas situações, novamente, ainda é estritamente necessário que nós continuemos a utilizar medidas não farmacológicas, como o uso de máscaras e de distanciamento social, em ambientes fechados ou com grandes quantidade de pessoas. 

    O grande ponto da discussão aqui é: uma pessoa com o esquema vacinal completo tem uma menor PROBABILIDADE de conseguir transmitir o vírus para outra pessoa. As vacinas não param a transmissão, mas sim reduzem esta.

    Além disso, como tem se falado muito, as vacinas também garantem outras vantagens como:

    • A redução da chance de desenvolver doença grave, hospitalização e morte por COVID-19;
    • A intensidade dos sintomas sentidos após o fim da COVID-19 de longa duração (que também têm sido chamadas de Sequelas Pós-COVID)
    • E também mas não menos importante, a frequência que variantes de preocupação surgem;

    Ué, mas ouvi dizer que as vacinas ajudam no surgimento de novas variantes

    Pois bem, já vou dar a resposta mais simples, curta e direta para esse tipo de boato que foi veiculado recentemente: Não. Vacinas não ajudam no surgimento de novas variantes. Ponto. 

    Agora que já deixamos isso certo, vem entender melhor comigo o motivo.

    Durante uma infecção, seja por um vírus, bactéria, fungo, ou qualquer outro parasita, nosso corpo trava um cabo de guerra: nosso sistema imune contra o parasita em questão (no caso, o SARS-CoV-2). Para fugir das diversas defesas que o sistema imune possui, os vírus possuem utilizam de sua maior arma: sua alta capacidade de mutação. 

    A mutação é nada menos que uma troca em alguma das bases nitrogenadas (as famosas “letrinhas”) no material genético, durante o processo de replicação. Entretanto, esse processo é caro, pois somente poucas mutações serão benéficas, enquanto que a grande maioria das mutações que surgirem irão ser, de alguma forma, ruins para o organismo em questão (no caso, o vírus). 

    O modo de se contornar esse problema é relativamente simples: infectando mais pessoas, ou, em outras palavras, se transmitindo mais. Quanto mais pessoas são infectadas (alta transmissibilidade), mais vírus são mutados, e maior é a chance de aparecer uma mutação que seja boa para ele (e, consequentemente, ruim para nós). Quando uma mutação boa aparece, esse vírus consegue se transmitir mais fácil, infectar mais pessoas, ganhar mais mutações, e isso acaba se tornando um ciclo eterno. 

    Dessa forma, surge a pergunta: como reduzir o número de mutações?

    E a resposta mais simples (que, a propósito, já temos falado há bastante tempo) é: reduzindo a transmissão do vírus entre as pessoas. Para isso, precisamos utilizar tanto medidas farmacológicas quanto não farmacológicas. Por isso a importância do uso combinado de máscaras, álcool em gel, distanciamento social E vacinas. As três primeiras medidas vão atuar logo no começo de uma cascata de eventos (citada logo mais), enquanto a vacina atua a partir do meio dela. A seguir exemplificamos como todas essas medidas auxiliam na redução da transmissão e, consequentemente, reduzem o surgimento de novas variantes. 

    Vacinação em massa e uso de medidas não farmacológicas → Menos pessoas se infectando → pessoas que foram infectadas tendo um tempo de infecção menor → Com o tempo de infecção menor, o vírus fica menos tempo no corpo do indivíduo  → Quanto menor o tempo que o vírus fica no corpo do indivíduo, menor a quantidade de vírus se multiplicando ali → Quanto menor a quantidade de vírus se multiplicando, menor a quantidade de mutações aparecendo → Quanto menor a quantidade de mutações aparecendo, menor a chance de surgir uma variante mais transmissível.

    Finalizando

    O ponto central aqui é mostrar que somente uma medida (como a vacinação de parte da população), não será o suficiente para acabarmos com a pandemia. Se quisermos que ela realmente chegue ao fim, precisamos todos fazer um esforço em conjunto para reduzir a transmissão do vírus, com a vacinação de TODA a população global, aliado ao uso de máscara, distanciamento social e – quando necessário – quarentena. Somente assim seremos capazes de diminuir o surgimento de novas variantes e superar a pandemia de uma vez por todas.

    Para saber mais:

    Outros Materiais:

    • Mellanie Fontes-Dutra

    Vacinas impactam na transmissão;

    Vacinas podem produzir variantes mais resistentes? Não!

    Dados de Harvard (NBA) com tempo menor de transmissão e recuperação mais rápida da infecção entre vacinados x não vacinados

    Vacinação reduz transmissão de delta e individuos vacinados transmitem menos

    Totalmente vacinados contrair e transmitir COVID-19 em casa, mas em taxas MUITO MENORES do que indivíduos não-vacinados e as vacinas reduzem o risco de infecção pela variante #Delta e acelera a depuração viral

    Dados REACT-1 Imperial College London proteção vacinados (delta) e possivel redução da transmissão em vacinados (medidas seguem sendo necessárias enquanto transmissão for elevada).

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Estudos preliminares, vacinas, políticas públicas e eventos cardiovasculares

    Texto escrito por Mellanie Fontes-Dutra, Ana Arnt e Rafael Lopes Paixão

    Semana passada fez barulho uma notícia que nos preocupou bastante pela repercussão que tomou, mesmo que por algumas horas apenas, os assuntos do momento nas redes sociais. O barulho se deu pela suspensão da vacina Janssen em território Francês, por conta de um suposto aumento leve no risco de infarto em adultos abaixo de 75 anos, nas primeiras duas semanas após a vacinação.

    Nosso compromisso, aqui no Blogs Unicamp, em parceria com o Todos Pelas Vacinas, sempre foi com a responsabilidade em relação ao modo como trabalhamos as informações científicas que vemos circulando – e, também, em relação às notícias que aparecem.

    A começar pelo título da reportagem, já ligamos o nosso radar e fomos buscar os artigos que estavam embasando a tomada de decisão francesa e, também, a reportagem no UOL Notícias.

    O texto de hoje é para apontar o que aconteceu e qual a base técnica que gerou esta decisão. Também achamos interessante comentar sobre a importância de ligarmos o sinal de alerta com notícias bombásticas e alarmistas, que podem gerar insegurança, dúvidas e (por de tudo) hesitação vacinal. Reiteramos aqui, portanto, que não consideramos este um bom momento de “ganhar cliques” com manchetes que podem desinformar a população ou causem qualquer tipo de receio em relação à vacinação. Especialmente de forma injustificada! Essa técnica, tida como clickbait, além de não ajudar a entender o problema, ainda pode trazer danos exatamente por não serem todas as pessoas que abrem os links e leem as reportagens inteiras.

    Então já vamos soltar o spoiler do final da reportagem:

    E agora…

    Vamos aos estudos!

    “França limita uso da vacina Janssen, que sugere leve aumento do risco de infarto”

    Aqui no Brasil vimos primeiramente no Uol Notícias, mas também foi noticiado em veículos franceses. A primeira ressalva já é para o “leve aumento do risco”.

    Lembremos que “risco de alguma coisa” é uma medida, com base em estudos populacionais, de algo acontecer. Além disso, nos salta aos olhos o estudo ser “PRELIMINAR”. O que isto quer dizer?

    Estudo preliminar é aquele que necessita mais estudos para confirmar os dados encontrados.  Neste sentido, gostaríamos de ressaltar aqui uma das frases que consideramos importante.

    “Para o risco de infarto do miocárdio após a vacina Ad26.COV2.S [Janssen] a estimativa é mais incerta devido ao baixo número total de casos.”

    Um pouco sobre os dados técnicos: Intervalos de confiança na incidência relativa

    Mas não é só isso, há mais elementos ainda. Vejamos também os intervalos de confiança na incidência relativa. Esta é uma medida que pode oferecer vislumbres do quanto um fator ocorre em uma população durante um  período analisado. Isto é: um evento, em um grupo de pessoas, em um tempo definido pelo estudo.

    Esta parte é chatinha mesmo, pois é parte da compreensão dos dados do artigo em si, e têm alguns detalhes que são fundamentais para sabermos se podemos ou não afirmar enfaticamente (spoiler: nunca podemos) os resultados (e utilizá-los para compor uma política pública, por exemplo)·

    Pois bem, estes intervalos de confiança na incidência relativa foram muito amplos, o que adiciona um grau de incerteza sobre a verdadeira incidência desses eventos, nesse caso.

    O que isso quer dizer?

    O Intervalo de Confiança diz quanto da medida que estamos usando é observada em uma amostra. Por exemplo, o Brasil tem uma amplitude de temperaturas que vai de 0ºC até 40ºC. Mas isso não quer dizer que essas temperaturas são frequentes, ou acontecem todas na “mesma quantidade”. Não quer dizer, também, que a “média de temperatura observada no país é de 20ºC”.

    Pois existe uma faixa de temperatura que é mais frequente – e esta faixa pode estar mais próxima dos 30-40ºC do que do 10-20ºC. Sem mais dados coletados, ou maior precisão das informações, não temos segurança em afirmar muita coisa sobre a temperatura, ou variação de temperatura média, em nosso país. O mesmo é para o Índice de Confiança (IC), se vc tem um IC largo, sem mais informações coletadas, significa que vc tem pouca certeza sobre essa medida que você observou. Ou que sua amostra não é representativa do fenômeno que se quer observar.

    Mas é segura mesmo essa tal vacina de adenovírus?

    Sim! No mundo inteiro foram mais de 38 milhões de doses de Janssen aplicadas. A própria reportagem da UOL reitera que com todas estas aplicações, não houveram efeitos colaterais que justificassem uma interrupção do uso desta vacina!

    Já o relatório – que foi a base desta notícia – cita outros estudos que estariam de acordo com estes resultados benéficos da vacina Janssen. Isto é, todos os estudos citados ressaltam que:

    • Os riscos pela COVID-19 são muito maiores do que qualquer risco oferecido pela vacinação, OU
    • Os benefícios da vacina superam riscos de eventos mais raros

    Sabemos, inclusive, que comparando com a infecção pelo vírus SARS-CoV-2, há um risco maior de problemas cardíacos do que eventos relacionados à vacinação, segundo este estudo aqui. Além disso, também existem indícios de que podem existir fatores de confusão quanto a estes riscos relacionados com a vacinação. Para os autores do estudo, os resultados precisariam ser confirmados com mais estudos e qualquer análise a partir dos resultados obtidos precisaria ser vista com muita cautela. Outro estudo nessa direção fala ainda que existe uma limitação para a generalização dos resultados e, de qualquer forma que olhemos, os benefícios da vacinação é maior.

    Ainda sobre o relatório, vacina Janssen e a França

    O relatório usado como base para a notícia do UOL e para a interrupção da vacinação com a Janssen, no entanto, têm mais uma questão importante a ser observada. Os dados foram analisados a partir do risco “ultraindividual”, como eles citaram. Neste caso, os dados não poderiam ser extrapoláveis para uma população. Com isso, reitera-se a necessidade de mais estudos confirmatórios, reforçada pelos próprios autores. 

    Aliás, é importante também lembrar do contexto da França. Temos um país com uma cobertura vacinal relativamente alta (~80% para a primeira dose e 77,3% para a segunda dose). Além disso, a limitação da vacina da Janssen é temporária e, talvez, não tenha um efeito efeito significativo sobre o andamento da vacinação. 

    Sobre as publicações, extrapolações de dados e políticas públicas

    Como falamos no início deste texto, nos preocupa muito a análise alarmista e descuidada dos dados de artigos e pesquisas, especialmente com dados que indicados como “preliminares”.

    Desde o início da pandemia temos falado sobre dados preliminares (que precisam de mais pesquisa para confirmarem-se), estudos em preprint (não avaliados por pares) e pesquisas feitas com uma amostra pequena da população. E veja, de modo algum estamos dizendo que estes estudos não são importantes. O que queremos dizer é: eles são estudos que precisam de mais análise e, portanto, cautela nas interpretações.

    E a atenção deve-se redobrar para tomadas de decisões em políticas públicas e notícias em grandes veículos! Isto porque estudos assim precisam confirmar dados com mais análises, replicação de experimentos, coleta de dados em populações maiores. Tomar decisões apressadas – ou jogar manchetes sensacionalistas pode ter um efeito negativo no que temos chamado de hesitação vacinal.

    Isto é, causar um efeito de receio frente à vacinação, sem que tenhamos dados realmente relevantes sobre o que estamos falando.

    E, novamente, não estamos de modo algum dizendo que os estudos não foram bem conduzidos ou os resultados não são reais ou bem analisados. Estamos ressaltando o que os próprios autores falam: “é preciso mais dados que confirmem”; “precisamos de cautela para não termos conclusões precipitadas”; “seria importante replicar experimentos”, dentre outras falas são indícios bem importantes de dados preliminares e amostras pequenas

    Por fim

    Sobre este estudo reportado, especificamente, precisamos entender até onde esse “leve aumento de risco” seria maior do que o risco que a própria doença oferece, durante sua fase aguda E APÓS essa fase. Este dado é fundamental para tomadas de decisão no escopo de uma política pública, por exemplo. Portanto, o intuito desse texto é trazer um pouco da discussão sobre os achados em si, na perspectiva de política de saúde pública, e alertar para a forma como esses dados são compartilhados, para não fomentar uma hesitação vacinal que não faz sentido no contexto atual, e que pode prejudicar a adesão à vacinação em outros locais.

    Para saber mais

    Botton, J, Jabagi, MJ, Bertrand, M, Baricault, B, Drouin, J, Le Vu, S, Weill, A, Farrington, P, Zureik, M, Dray-Spira, R (2022) Evaluation du risque d’infarctus du myocarde, d’accident vasculaire cérébral et d’embolie pulmonaire suite aux différents vaccins anti-COVID-19 chez les adultes de moins de 75 ans en France, Epi-Share Rapport complet

    HAS (2022) Covid-19 : la HAS rend trois nouveaux avis pour actualiser la stratégie de lutte contre le virus

    Sidik, SM (2022) Heart-disease risk soars after COVID — even with a mild case, Nature 602, 560

    Tanne, JH (2022) Covid-19: Even mild infections can cause long term heart problems, large study finds, BMJ

    UOL (2022) França limita uso da vacina Janssen; estudo sugere leve aumento do risco de infarto

    Xie, Y, Xu, E, Bowe, B et al (2022) Long-term cardiovascular outcomes of COVID-19, Nat Med (2022).

    Outros textos do Especial

    Reações Adversas, vacinação e desinformação

    Políticas Públicas em Saúde e Vacinas

    Todos Pelas Vacinas

    Os Autores

    Ana Arnt é licenciada em biologia, doutora em educação, professora do Instituto de Biologia da Unicamp, coordena os projetos Blogs de Ciência da Unicamp e o Especial COVID-19.

    Mellanie Fontes-Dutra é biomédica, doutora em neurociência e pesquisadora na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Divulgadora Científica na Rede Análise COVID-19. Autora convidada no Especial COVID-19 e parte do projeto Todos Pelas Vacinas.

    Rafael Lopes Paixão da Silva é doutorando em física. Ele estuda dados de saúde pública e sua dinâmica e relações com o clima é Físico. Pesquisador no Observatório Covid-19 Brasil e convidado pelo editorial para escrever no Especial COVID-19.

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Reações adversas, vacinação e desinformação

    Texto Escrito por Julio C Ponce e Ana Arnt

    Há muita informação e desinformação sobre vacinação e reações após as pessoas se vacinarem. Elas causam mais do que apenas ruído para selecionarmos conhecimentos que nos ajudem a compreender a situação das relações entre a vacinação e a saúde humana. Temos visto que este conjunto de informações massificado têm se ampliado nas redes e ajudam a compor o que temos chamado de “hesitação vacinal”.

    Longe de julgar quem têm receio, é preciso entender que as notícias de reações adversas não são leves. Elas têm se intensificado não só em quantidade de mensagens, mas na gravidade dos efeitos após a vacinação. Mas será que as vacinas causam mesmo esta quantidade de reações adversas? Como podemos entender melhor isto?

    Vamos olhar mais de perto alguns exemplos sobre vacinação e reações adversas?

    Um dos exemplos que vamos analisar é sobre as mortes após vacinação em Singapura, supostamente 33 óbitos nos primeiros seis meses do ano passado.

    O estudo recém publicado na Forensic Science International avaliou se houve correlação entre a vacinação recente e mortes. O artigo tem como autores pesquisadores da Divisão de Medicina da Autoridade de Ciências de Saúde do país.

    Aliás, antes de falar do estudo, lembremos que Singapura está vacinando a população com Pfizer (desde 12/20) e Moderna (desde 03/21). Além disso, também importante ressaltar que até o fim do levantamento de dados do artigo (em Julho de 2021), mais de 5.5 milhões de doses haviam sido aplicadas: 3.4 como primeira, 2.1 como segunda. Atualmente, 84% da população está com duas doses e 55% com a dose de reforço.

    Neste artigo, incluiu-se todas as pessoas que morreram, tiveram problemas cardíacos ou neurológicos que ensejassem manobras de ressuscitação, em até 72 hs depois da aplicação. Isto entre as datas de 01/02/2021 e 30/06/2021, sendo que nenhum caso foi reportado antes disso.

    Ao todo reportaram-se 33 casos com dados completos. No mesmo período, Singapura, com sua política bastante restritiva, chegou a 36 mortes por COVID-19. Mas voltemos às mortes pós-vacina: foram 26 homens e 7 mulheres, com idade média de 69 anos (o mais novo tinha 23, o mais velho 96). Por fim, em 5 dos 33 casos, não houve autópsia.

    “O quê? Mas… como determinaram a causa mortis?”

    Assim, nestes casos, a causa da morte era visivelmente por outras ocorrências, por histórico de saúde prévia e pelas circunstâncias da morte. Já dos casos em que houve autópsia, solicitou-se uma série de exames (histopatologia, IgE, níveis de triptase, e de proteína C-reativa), para identificar possíveis reações à vacina.

    Ao avaliarem os dados, o estudo apontou que das 33 mortes, um total de ZERO (0), nenhuma, nadica de nada, tinha relação causal com a vacina. Ou seja, não havia aumento dos marcadores imunológicos/inflamatórios ou, quando presentes, eram devidos a outras condições, como sepse.

    Isto é, quando vamos analisar uma reação adversa após a vacina (leia-se até 72h após a vacinação acontecer), devemos analisar inúmeros indicadores, através de exames minuciosos destes pacientes com suspeita de reação adversa.

    Após esta análise, teremos condição de estabelecer (ou não) uma relação causal. Assim, o que queremos dizer: nem todo acontecimento após uma vacina tem como causa esta vacina. E nós sabemos que notícias podem assustar. Mas assusta mais ainda notícias sensacionalistas sendo usadas para causar medo em pessoas se vacinarem – ou vacinarem crianças!

    Seguindo o estudo…

    É interessante contextualizar que, sendo Singapura uma cidade-estado, todos os casos de óbitos passam por esse setor central. Ou seja, todas as mortes com potencial relação à vacina foram ao menos avaliadas. Novamente, nenhuma apresentou qualquer relação causal com as vacinas.

    Dessa forma, no período do estudo, o sistema de alerta de efeitos adversos do país (similar ao VAERS) registrou 6.606 casos suspeitos de efeitos adversos pelas vacinas, dos quais 252 foram classificados como sérios.

    E aqui, novamente reforçamos que esses sistemas de registros tratam-se de suspeitas de reação, sem a análise final tendo sido realizada. Após as análises dos 252 casos sérios, 42 casos de reação anafilática, todos reversíveis, com tratamento ambulatorial. A reação anafilática, quando aparece, é em questão de minutos, ou até 4 horas depois da vacinação em sua forma precoce (tipo I), e 72 horas na forma mais tarde (tipo IV).

    Foram ainda relatados 12 casos de miocardite e periocardite. 12 casos em 5.5 milhões de doses aplicadas.

    Ah, mas 12 casos, gente!

    Aqui cabe o alerta acerca do quanto estas notícias enfatizam a exceção e não a regra. Foram mais de 5.5 milhões de doses aplicadas, com 12 casos de miocardite e periocardite. Isto é um total de 0,00022% de chances de acontecer. Difícil mensurar ainda assim?

    Por exemplo, há mais risco de morrer de acidente aéreo nos EUA do que de ter esse efeito com vacina. Sim! Anualmente contabiliza-se cerca de 740 mortes anuais por 291 milhões de habitantes (dados retirados deste link).

    Na verdade, fazendo uma regrinha bem básica de 3, dá para dizer que é mais risco morrer de Covid-19 (0,075%, ou 5.8 milhões de óbitos em 7.8 bilhões de pessoas). Ou seja, vacinas são seguras e à revelia do que sensacionalistas têm propagado nas redes, salvam vidas todos os dias!

    As mortes que ocorreram após a vacina, como demonstrado neste trabalho, são, na grande maioria, pessoas que pelo próprio desenrolar da vida potencialmente morreriam com ou sem a proteção (e de causas não relacionadas a ela)!

    Mas e a reação do caso de Lençóis Paulistas após a vacinação?

    Pois é, mais um caso em que matérias jornalísticas correram para alardear e negacionistas de plantão tem usado arduamente para causar pânico e hesitação vacinal. Vamos lá! Para não caírem em matérias com potencial viés sensacionalista, é sempre bom pensar no que temos de dados.

    Para quem não lembra, este caso aconteceu logo no início da vacinação infantil, e pode ser acompanhado melhor nesta matéria da CNN. A criança em questão teve alterações nos batimentos cardíacos e desmaiou, horas após vacinar-se.

    Com a investigação em andamento, acabou sendo diagnosticada com uma doença congênita rara, a síndrome de Wolff-Parkinson-White. Quando falamos que é uma doença congênita, significa que ela nasceu com isto e apenas não tinha manifestado sintomas ainda. E para doenças congênitas isso pode acontecer sim!

    A incidência dessa síndrome, em crianças, aparece em torno de 0,07%, nos Estados Unidos (algo como 1 caso a cada 1.428 crianças).

    A vacinação está lenta, porém…

    Mesmo assim, até fecharmos este texto foram 590 mil doses na capital paulista. Meio milhão de crianças. Dessa quantidade de crianças, poderíamos estimar que cerca de 413 tenham esta síndrome, por exemplo.

    Dessa forma, por que então não vemos 413 notícias de crianças colapsando?

    A resposta é simples:

    Porque não há associação entre a vacina e eventos de taquicardia em pacientes com Síndrome de Wolff-Parkinson-White, aparentemente.

    Ou seja, a vacina não tem relação com eventos cardíacos nesses pacientes.

    A vacinação infantil

    O que mais nos preocupa, neste momento, é a lentidão que a vacinação infantil avança no país. Temos um cenário de retorno às escolas, muitas crianças nem na idade vacinal estão e a retomada tem sido prevista para todas as crianças. Veja, não estamos questionando a necessidade das escolas para este público, neste momento.

    É demarcar que temos uma situação grave e precisamos de um empenho maior, da sociedade, da classe política, das sociedades científicas, para a vacinação infantil acontecer. É preciso pressão social para termos maior cobertura vacinal e segurança para esta população específica!

    Dose de reforço e esquema vacinal completo

    Por outro lado, temos também outro dado importante e muito difícil neste momento, que é o fato de muitas pessoas não estarem aderindo à dose de reforço. Aliás, temos inúmeras pessoas que não tomaram a segunda dose da vacina.
    A partir da variante Ômicron, temos considerado a dose de reforço fundamental para termos uma resposta imunológica do nosso corpo, contra uma possível infecção. Assim, torna-se necessário, e urgente, prestarmos atenção nestes dados, ampliar a vacinação da população com o esquema vacinal completo, incluindo a chamada dose de reforço!

    Até o último levantamento feito, ao escrevermos este texto, tínhamos 70,99% da população com 2 doses (ou dose única)

    Precisamos intensificar a terceira dose não como reforço, mas como dose adicional, tal como o próprio Ministério da Saúde preconizou em nota técnica recentemente, inclusive para adolescentes.

    Por fim

    Sempre que se deparar com notícias sobre reações adversas de vacina e notícias sensacionalistas, antes de compartilhar, nossa recomendação segue: procure fontes oficiais e cientistas ou divulgadores científicos que têm atuado na área, para entender melhor o caso.

    Sempre confira as informações, veja as fontes, rastreie os dados. Na dúvida, pergunte aos grupos que têm atuado nesta frente de combate à desinformação! Seja parte desta luta!

    E lembre-se, sempre: vacinas salvam vidas! Vacine-se e espalhe essa ideia!

    Para Saber Mais

    Florida Museum (2022) Risk of Death, 18 Things More Likely to Kill You Than Sharks

    Jung HJ, Ju HY, Hyun MC, Lee SB, Kim YH (2011) Wolff-Parkinson-White syndrome in young people, from childhood to young adulthood: relationships between age and clinical and electrophysiological findings, Korean J Pediatr 2011, 54(12):507-511. 

    G1 (2022) Mapa da Vacinação no Brasil

    Ministério da Saúde (2022) Ministério da Saúde recomenda dose de reforço contra a Covid-19 para adolescentes imunocomprometidos

    Resende, I (2022) Menos de 50% do público infantil recebeu a primeira dose da vacina contra a Covid, CNN Brasil

    VAERS, Vaccine Adverse Event Report System

    YEO, A, KUEK, B, LAU, M, TAN, SR, CHAN, S (2022) Post COVID-19 vaccine deaths – Singapore’s early experience, Forensic Science International.

    Textos do Blogs e outras fontes:

    Julio Ponce escreveu dois fios no Twitter sobre o tema, aqui e aqui, que inspiraram a organização deste texto.

    Mais sobre Reações Adversas, Vacinação Infantil; Desinformação sobre vacinação infantil, e outros textos sobre vacina no Especial COVID-19 do Blogs Unicamp.

    Mais informações também podem ser vistas no site do Todos Pelas Vacinas

    Os Autores

    Julio C Ponce é Bacharel em Ciências Moleculares e Farmácia-Bioquímica, Mestre em Fisiopatologia Experimental e Doutor em Epidemiologia. Julio é autor convidado do Blogs Unicamp, para o Especial Covid-19.

    Ana Arnt é licenciada em Ciências Biológicas, Mestre e Doutora em Educação, Livre Docente pelo Instituto de Biologia da Unicamp e Coordena o Blogs de Ciência da Unicamp e o Especial COVID-19.

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • As 11 Fake News sobre vacinas infantis que circularam antes e durante a consulta do Ministério da Saúde

    Segundo agências de checagem de fatos, 90% dos textos abordam a questão da segurança das vacinas. Eles distorcem estudos, peças publicitárias e até falas do Diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS). Além disso, parte dos conteúdos trazem vídeos de médicos e especialistas (nem sempre reconhecidos pela comunidade científica) que desaconselham vacinar as crianças, contribuindo para confundir a população.

    Contexto

    Após pouco mais de 22 meses desde que a OMS caracterizou a Covid-19 como pandemia, as vacinas ainda são a única medida eficaz, de que se tem notícia, para combater a doença, porém, no Brasil a imunização tem sido questionada não só por movimentos historicamente contrários às vacinas, mas também, surpreendentemente, por lideranças políticas que, paradoxalmente, deveriam zelar pela saúde da população. 

    O último embate, em que mais uma vez as autoridades nacionais se prestaram ao papel de questionar a necessidade das vacinas, começou no dia 26 de outubro de 2021 quando o comitê de especialistas do Food and Drug Administration (FDA), agência federal reguladora de saúde dos Estados Unidos, recomendou a aplicação da vacina em crianças de 5 a 11 anos. Assim, no dia 27, a imprensa noticiou que a farmacêutica Pfizer anunciou que solicitaria à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorização para vacinar crianças a partir de 05 anos de idade, o que se deu no dia 12 de novembro.

    Já em16 de dezembro, a agência aprovou o uso e divulgou os resultados técnicos de sua análise. Aliás, no mesmo dia, em live para seguidores, o atual Presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), ameaçou divulgar os nomes dos técnicos da Anvisa que participaram da aprovação do imunizante para crianças. Além disso, no dia 18, o quarto ministro da Saúde da gestão Bolsonaro, Marcelo Queiroga, anunciou que o governo federal realizaria uma consulta pública sobre a vacinação de crianças antes de decidir se aprovaria o início da imunização para elas, medida criticada tanto por médicos quanto por técnicos da Anvisa.

    Por que é importante verificar quais fake news circularam em dezembro?

    Em Saúde Pública (mas não apenas), a desinformação é um gravíssimo problema, pois, pode, por um lado provocar sobre demanda nos Sistemas de Saúde com exames desnecessários, motivados por alarmismo, por outro, levar pessoas a comportamentos extremos como deixar de realizar tratamentos necessários e de usar remédios essenciais para sua vida, enfim, no limite, a desinformação pode matar. Dessa forma, dado o momento em que o Ministério da Saúde solicitou uma consulta pública sobre o tema, a desinformação pode ter sido usada para distorcer a percepção das pessoas sobre as vacinas contra a Covid-19 para crianças.

    Metodologia

    Foram colhidas manualmente informações verificadas pelos sites, editorias e agências de checagem brasileiros Boatos.org, Aos Fatos, Projeto Comprova, Fato ou Fake, Uol Confere e Lupa, entre 01 dezembro de 2021 e 03 de janeiro de 2022. Assim, no total, os jornalistas realizaram no período cerca de 226 checagens, das quais 79 estavam relacionadas à Pandemia da Covid-19. Dentre estas, há 11 peças desinformando sobre a vacina infantil contra a Covid-19. Dessa forma, optamos por classificar essas verificações utilizando os rótulos de Misinformation and Disinformation (M&D) em Vacinas, compostos por 5 categorias e 17 subcategorias, elaborados por integrantes do Grupo de Estudo da Desinformação em Redes Sociais (EDReS), da Unicamp :

    1. Segurança: vacinas causam doenças (A); pessoas vacinadas transmitem a doença (B); vacinas causam autismo (C); as vacinas causam efeitos colaterais graves (D); as vacinas contêm ingredientes perigosos (E); é mais seguro contrair a doença do que vacinar (F); as vacinas podem prejudicar o sistema imunológico (G); sobrecarga de vacinas e suas consequências (H); esquemas alternativos de vacinação são mais seguros (I)

    2. Efetividade: as vacinas não funcionam (J); as vacinas não são responsáveis ​​pela diminuição das doenças (K)

    3. Saúde alternativa: promoção de alternativas à vacinação, principalmente serviços naturopáticos e de bem-estar (L)

    4. Moralidade: associação entre vacina contra HPV e promiscuidade, e / ou questões religiosas (M)

    5. Teorias da conspiração: narrativas sobre instituições poderosas ou atores com intenções nefastas e planos secretos (N)

    6. Outro: autodireção – liberdade de escolha, pesquisa independente (O); alegam que quem conhece a “verdade” não vacina (P); apelo emocional (Q) 

    (TOKOJIMA MACHADO, DE SIQUEIRA e GITAHY, 2020: p. 03)

    Análise

    Discussão

    Das 5 categorias possíveis de M&D em Vacinas, figuram na amostra Segurança (81%) e Teorias da Conspiração (19%). Assim, de todas as 17 subcategorias categorias possíveis, figuram quatro: as vacinas causam efeitos colaterais graves (D), as vacinas contêm ingredientes perigosos (E) as vacinas podem prejudicar o sistema imunológico (G), e narrativas sobre instituições poderosas ou atores com intenções nefastas e planos secretos (N). 

    Contudo, há textos que podem ser enquadrados em mais de uma categoria, como por exemplo a desinformação sobre 13 crianças que teriam morrido na África em função da vacina (categoria D) que também é associada ao nome do empresário estadunidense Bill Gates (categoria N). Dessa forma, por essa perspectiva, o número de textos que abordam a segurança dos imunizantes sobe para 90%.

    Observando especificamente para as 09 peças que versam sobre efeitos colaterais graves causados por vacinas, constata-se que 04 delas associam vacinas diretamente a mortes de crianças, em 02 os “especialistas” desaconselham a vacinação de crianças, em outras 02 a vacina é associada a riscos de AVC, miocardite e pericardite em crianças e 01 repisa a teoria da “vacina teste”.

    Hoje, já existe um consenso de que esses conteúdos não são tão espontâneos quanto fazem parecer e que existe uma linha de produção de desinformação com interesses financeiros e/ou políticos, um Ecossistema da Desinformação. Assim, partindo dessa premissa, a absoluta predominância de peças com foco nos efeitos colaterais das vacinas apontam para o interesse em criar na população uma atmosfera de risco, levando-as a hesitar em vacinar seus filhos. Apesar disso, conforme apontam recentes levantamentos de opinião, a imensa maioria dos brasileiros (79% segundo o Datafolha e  72%, Genial / Quaest), pretende vacinar seus filhos.

    Por fim…

    Neste estudo não dispomos de dados para afirmar que esses 18% (em média) de pais que ainda hesitam em vacinar seus filhos estão sendo influenciados pela desinformação que circula desenfreadamente via mídias sociais e, por vezes, na mídia tradicional, uma vez que insiste em dar espaço para negacionistas da vacina. Todavia, outros estudos utilizando a Análise de Redes podem confirmar ou negar essa hipótese, mapeando o alcance dessas publicações, os seus produtores e toda a rede de disseminadores que trabalha diuturnamente contra a saúde pública e contra a ciência.

    Referências: 

    PROJETO COMPROVA (2021) É enganoso que vacina contra covid-19 tenha provocado aumento de morte de crianças

    PROJETO COMPROVA (2022) Médica distorce estudo para atacar vacinas e é desmentida pelo autor.

    TOKOJIMA MACHADO, DF, DE SIQUEIRA, AF, GITAHY, L (2020) Natural stings: selling distrust about vaccines on Brazilian YouTube Frontiers in Communication, Volume 5, p 91.

    G1, Fato ou Fake

    DOMINGOS, R “É #Fake que”:

    Cartaz de campanha de prevenção ao AVC em crianças na França tenha relação com a vacina contra Covid-19

    Cartaz de campanha de prevenção ao AVC em crianças na França tenha relação com a vacina contra Covid-19

    Imagens de autópsia mostrem lesões causadas por vacina contra Covid e que imunizante cause vasculite

    Vídeo de homem que se diz inventor das vacinas de mRNA e afirma que vacinas são tóxicas para crianças

    Vídeo que diz que Austrália vai colocar 24 mil crianças em ‘campo de quarentena’ para serem vacinadas

    Boatos.org

    BECKER, K (2021) Pfizer admite que vai levar 5 anos para descobrir riscos de vacinas para crianças #boato

    MATSUKI, E

    13 crianças morreram após serem vacinadas contra Covid-19 na África #boato,

    Austrália cria campo de concentração para não-vacinados e vai vacinar crianças à força #boato

    Diretor da OMS diz que vacinas contra Covid-19 matam crianças #boato

    Diretor da OMS diz que vacinas contra Covid-19 matam crianças #boato

    Robert Malone é o inventor da vacina mRNA e está certo sobre vacinação de crianças #boato

    Agência aos fatos

    FAUSTINO, M (2021) Em vídeo, médica mente sobre substâncias e efeitos adversos de vacinas contra a Covid-19. Agência Aos Fatos

    MENEZES, LF (2021) É falso que Anvisa aprovou sem contraindicação vacina da Pfizer para crianças Agência Aos Fatos.

    MENEZES, LF (2021) Em vídeo, virologista falseia ao dizer que vacinas de mRNA são tóxicas para crianças Agência Aos Fatos

    RUDNITZKI, E (2022) Austrália não vai separar 24 mil crianças de seus pais para vaciná-las em ‘campo de quarentena’ Agência Aos Fatos

    PACHECO, P (2021) Vacinas contra Covid-19 não provocam liberação de fibrina na corrente sanguínea Agência Aos Fatos

    Agência Lupa

    NOMURA, B (2021) #Verificamos: É falso que Austrália colocou 24 mil crianças em ‘campos de quarentena’ para vaciná-las, Agência Lupa.

    NOMURA, B (2021) #Verificamos: É falso que vacinas de RNA mensageiro levam à produção de proteínas tóxicas em crianças Agência Lupa

    SKROCH, JB,  MACÁRIO, C (2021) #Verificamos: Médica distorce informações ao relacionar vasculite a vacinação contra a Covid-19, Agência Lupa

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Maurílio é autor no Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Vacina contra COVID-19 para Crianças: entre o dever e o poder, o que prevalece?

    Era uma época sombria. Os mortos se acumulavam. O vírus caminhava pelas ruas sem controle, como uma besta desvairada, batendo de porta em porta e entrando naquelas que se abriam à ele. Infestava tudo e todos que encontrava em seu caminho: desde combatentes da pandemia a desavisados, perdidos e negacionistas.

    E então ela chegou, aquela que realmente poderia afastar as escuras nuvens que tomavam nosso mundo, permitindo que o sol brilhasse novamente nesse pálido ponto azul que chamamos de Terra: a Vacina.

    Começou com os idosos. Pais, avós, tios, conhecidos. Reclusos, com medo e trancados desde o início da pandemia. 

    Com o tempo, aqueles de meia idade, muitas vezes chamados efetivamente de “adultos”, foram sendo vacinados. 50, 40, 30 anos… a cada semana, pessoas mais novas eram chamadas.

    Então, chegou nosso momento, os “jovens”. Após ver avós e pais vacinados, finalmente seria a nossa hora. A tão sonhada proteção estava chegando, e logo poderíamos – quem sabe – rever os amigos, dessa vez sem o intermédio de uma tela.

    E agora?

    Com a situação um pouco mais calma, mas não completamente resolvida (e podendo facilmente voltar ao caos passado), a vacinação da próxima geração, as nossas crianças, se aproxima a passos módicos. Entretanto, assim como um vulto que persiste em ficar na extremidade de nossa visão, as sombras do movimento antivacina se lançam sobre os indivíduos, espalhando o medo e mentiras sobre a vacinação dos menores.

    Pensando nisso, viemos aqui para explicar as novas notícias sobre a vacinação das crianças e responder suas dúvidas, cara leitora e leitor, para que possa entender melhor sobre isso e proteja suas filhas e filhos.

    O que se sabe sobre a COVID-19 em crianças?

    O vírus causador da COVID-19, o SARS-CoV-2, tem muitas similaridades com o vírus causador da SARS em 2003, o SARS-CoV-1. Entretanto, os casos infantis entre as duas doenças têm algumas diferenças. Na SARS, os casos entre crianças eram bem raros e tinham um histórico de exposição muito claro. Isto é, sabia-se como, onde e quando a criança havia pego o vírus. Já com a COVID-19, esse rastreio de casos foi e é bem mais complicado [1]. 

    A princípio, como muitas crianças desenvolviam a forma leve ou assintomática, os casos entre elas eram ignorados. Assim, dizia-se que não haveria qualquer problema em elas pegarem o SARS-CoV-2. Com o passar das semanas e o aumento gigantesco do número de infecções, começou-se a ver que esses casos assintomáticos (tantos infantis quanto adultos) eram fonte de uma parte significativa do espalhamento do vírus. 

    Mas há muito mais informações hoje…

    Atualmente, até onde se sabe, a COVID-19 afeta todas as idades de crianças e adolescentes, desde recém-nascidos até maiores de 18 anos. Os principais sintomas que elas apresentam são febre e tosse. No entanto, outros sintomas inespecíficos podem aparecer, como dor de cabeça e de garganta, cansaço, nariz tampado e escorrendo, vômito e diarréia [2, 3]. Em geral as crianças desenvolvem a forma assintomática, leve ou moderada da COVID-19. Todavia, alguns estudos sugerem que recém-nascidos (e crianças com menos de 1 ano de idade) possuem 3x mais chances de ter sintomas gastrointestinais e desenvolver a forma severa da COVID-19 [3]. Assim, pensando nisso, é de suma importância levar em consideração ainda a proteção dos pequenos, seja mantendo-os em isolamento social ou levando-os para se vacinar, quando as campanhas de vacinação para essas faixas de idade começarem.

    ainda sobre controvérsias

    Infelizmente, nos dias atuais, o mesmo discurso do começo da pandemia (sobre não haver risco para as crianças) ainda é utilizado para advogar a volta às aulas, mesmo já sabendo de tudo isso. Mas, é claro que, por um lado, compreendemos ser muito difícil todo o processo de ensino a distância, as dificuldades e problemáticas criadas com ele, fora a questão que muitas crianças de famílias necessitadas dependiam de serviços escolares para necessidades de saúde mental, física e nutricional. 

    Entretanto, é necessário lembrar que apesar da maior parte das crianças desenvolverem casos leves de COVID-19, elas ainda podem desenvolver casos severos e vir a falecer, principalmente aquelas que possuem alguma comorbidade, são imunocomprometidas ou fazem uso de imunossupressores. Além disso, alguns estudos vêm sugerindo que, assim como em adultos, após uma infecção de COVID-19 em crianças, pode haver a persistência de sintomas como cansaço, dor muscular, insônia, problemas respiratórios e de concentração, durante vários meses pós-infecção [4, 5].

    Mas algum país já está vacinando menores de 12 anos?

    Sim! Alguns países já começaram a vacinar as suas crianças 

    • Cuba: a partir de 2 anos com a Soberana 2 e Soberana Plus [6],
    • Chile: 6 anos ou mais com CoronaVac [7],
    • China: a partir de 3 anos com CoronaVac [8],
    • Estados Unidos: a partir dos 6 anos com a Pfizer [9].

    A grande questão aqui é que os Estados Unidos foi o primeiro país a ter uma vacina (Pfizer) aprovada para uso emergencial em crianças por uma agência reguladora e a publicar os dados das fases de teste em revistas científicas, para avaliação do resto da comunidade científica [10]. Enquanto isso, tanto os dados da Soberana 2 (em Cuba) e da Coronavac (no Chile e na China) permanecem em sigilo. Ou seja, sem comunicação oficial para a OMS e revistas científicas para revisão por pares. 

    Assim, por esses e outros motivos que vamos apresentar agora as principais informações referentes às vacinas contra COVID-19 que estão sendo testadas e aprovadas para uso em crianças:

    Vacina Pfizer [10-13]:

    • Pode ser aplicada em crianças de 5 a 11. A Pfizer e Biontech anunciaram que até o final de 2021 iriam publicar os dados referente ao uso da vacina em crianças entre 6 meses e 5 anos.
    • A dose utilizada em crianças de 5 a 11 é ⅓ da dose original utilizada em adultos e jovens maiores de 12 anos. 
      • Serão aplicadas duas doses, com um intervalo de 3 semanas entre elas.
    • A quantidade de anticorpos neutralizantes (falamos sobre este conceito nesse e nesse texto) observadas nas crianças após um mês da segunda dose, foi bem parecida com a quantidade vista em jovens e adultos.
      • Isso quer dizer que mesmo com a dose sendo menor, as crianças acabam tendo uma proteção boa.
    • Não foram vistos grandes efeitos colaterais. Os poucos efeitos observados assemelham-se com os efeitos que aparecem em jovens adultos.
    • A eficácia da vacina ficou por volta dos 90%, bem parecido com a eficácia em adultos.
    • A Pfizer já obteve, em nosso país, a aprovação da ANVISA para uso da sua vacina para crianças entre 5 e 11 anos.

    Vacina Moderna [14-17]:

    • Ainda não há aprovação pelo FDA, mas a Moderna já divulgou alguns dados de fase ⅔ da sua vacina infantil, anunciando que logo deve enviar para análise da agência reguladora.
    • Vacina testada em crianças entre 6 e 12 anos (assim como da Pfizer). Demonstrou uma boa capacidade na geração de anticorpos neutralizantes.
    • Diferente da Pfizer, nesse caso serão duas doses com um intervalo de 4 semanas.
    • Os poucos efeitos colaterais relatados foram bem leves, como dor local, dor de cabeça e cansaço.
    • Em algumas análises preliminares, alguns pesquisadores notaram uma diferença na taxa de desenvolvimento de inflamação no coração (miocardite) em adolescentes (12-17) que receberam a vacina. Isso levou a um atraso na análise da vacina para crianças, pois quiserem verificar se também haveria essa diferença para os pequenos.
      • Ainda não se estabeleceram relações entre a miocardite como uma reação adversa e as vacinas. Para mais informações, você pode conferir aqui, aqui e aqui.

    Vacina CoronaVac [18-21]:

    • A China, Chile e Emirados Árabes já estão vacinando suas crianças e jovens entre 3 e 17 com a CoronaVac.
    • Em junho, a China aprovou o uso da CoronaVac em crianças e adolescentes, contudo, a vacinação em si só começou em meados de outubro. 
    • Apesar de já estar sendo aplicada em alguns países, até o momento só temos os dados de fase 1 e 2 (caso não lembre o que são as fases de desenvolvimento das vacinas, confira esse texto aqui) da CoronaVac nessa faixa de idade (3-17 anos). 
    • Em agosto, o Instituto Butantan fez o pedido para a ANVISA para aprovação do uso emergencial da CoronaVac em crianças, contudo, a ANVISA negou tal pedido, requisitando mais informações.
    • Até o momento, o uso emergencial para essas faixas etárias ainda não foi concedido para a CoronaVac.

    Deveríamos vacinar as crianças e só então voltar às aulas presenciais?

    Na última semana do mês de junho, 250 mil crianças tinham sido diagnosticadas – a constar, somente naquela semana – com a COVID-19 na Inglaterra. Inclusive, este foi o pior momento da pandemia no quesito escolar desde a reabertura do país em março de 2021. Em Israel, país modelo da vacinação na população adulta, o número de crianças em período escolar que testaram positivo para COVID-19, triplicou na mesma semana. Devido a somente 4% da população menor de 15 anos estar vacinada. Em suma, na época, ambos os países estavam com a vacinação bem avançada, mas ainda não o suficiente para voltar às aulas [22].

    Assim, isso nos mostra que, se não tomarmos cuidado, aqui no Brasil a mesma coisa pode acontecer. Inclusive, um aviso, já está acontecendo: cada vez mais vamos ver menores de 18 anos e crianças testando positivo para COVID-19. Aliás, vemos quando são feitos os testes, enchendo os hospitais e, inclusive, falecendo.

    Ainda é cedo para bater o martelo, mas…

    Sabemos que este é um terreno difícil de discussão e que as crianças perderam muito com os distanciamentos e pouca socialização nestes dois anos. Portanto, o debate é realmente delicado. A princípio, a nossa indicação e o que consideraríamos ideal era esperarmos um pouco mais, tanto para a volta às aulas quanto para a retomada da sociedade ao “antigo normal”. Assim, a chegada da Pfizer no Brasil é um sinal de que a etapa de vacinação infantil está mais próxima, tornando a vida social um pouco mais segura.

    Todavia, também sabemos que com a variante Ômicron tomando lugar rapidamente do cenário atual, somado ao apagão de dados e falta de testes, fica muito difícil não apenas analisar os melhores caminhos como também indicar um lugar seguro para tomada de decisões tão importantes, como as que precisamos no momento.

    Para saber mais:

    1. Zhou, MY, Xie, XL, Peng, YG, Wu, MJ, Deng, X. Z, Wu, Y, … & Shang, LH (2020) From SARS to COVID-19: What we have learned about children infected with COVID-19, International Journal of Infectious Diseases, 96, 710-714 
    2. She, J, Liu, L, & Liu, W (2020) COVID‐19 epidemic: disease characteristics in children, Journal of medical virology, 92(7), 747-754. 
    3. Cui, X, Zhao, Z, Zhang, T, Guo, W, Guo, W, Zheng, J, … & Cai, C (2021) A systematic review and meta‐analysis of children with coronavirus disease 2019 (COVID‐19), Journal of Medical Virology, 93(2), 1057-1069.
    4. Ludvigsson, JF (2021) Case report and systematic review suggest that children may experience similar long‐term effects to adults after clinical COVID‐19, Acta Paediatrica, 110(3), 914-921.
    5. Buonsenso, D, Munblit, D, De Rose, C, Sinatti, D, Ricchiuto, A, Carfi, A, & Valentini, P (2021) Preliminary evidence on long COVID in children, MedRxiv. 
    6. Oppmann, P (2021) Cuba vaccinates children as young as 2 in strategy to reopen schools, economy, CNN
    7. Mohor W, D (2021) Chile overcame the Delta variant. Now it’s racing to vaccinate kids, CNN,
    8. Wu, H (2021) China to start vaccinating children to age 3 as cases spread ABC News
    9. G1 (2021) CDC passa a recomendar vacina da Pfizer contra a Covid-19 para crianças de 5 a 11 anos nos EUA
    10. FDA (2021) FDA Authorizes Pfizer-BioNTech COVID-19 Vaccine for Emergency Use in Children 5 through 11 Years of Age
    .
    1. Pfizer (2021) Pfizer and Biontech announce positive topline results from pivotal trial of COVID-19 vaccine in children 5 to 11 years.
    2. Walter, EB, Talaat, KR, Sabharwal, C, Gurtman, A, Lockhart, S, Paulsen, GC, … & Gruber, WC (2021) Evaluation of the BNT162b2 covid-19 vaccine in children 5 to 11 years of age, New England Journal of Medicine
    3. Martins, A (2021) Pfizer pede autorização à Anvisa para vacinar crianças de 5 a 11 anos, Exame
    4. Moderna (2021) Moderna Announces Positive Top Line Data from Phase 2/3 Study of COVID-19 Vaccine in Children 6 to 11 Years of Age.
    5. Moderna (2021) Moderna Provides Update on Timing of U.S. Emergency Use Authorization of its COVID-19 Vaccine for Adolescents.
    6. Hernandez, J (2021) The FDA is probing whether the Moderna vaccine can cause a rare side effect in teens, NPR.
    7. Witberg, G, Barda, N, Hoss, S, Richter, I, Wiessman, M, Aviv, Y, … & Kornowski, R (2021) Myocarditis after Covid-19 vaccination in a large health care organization, New England Journal of Medicine
    8. G1 (2021) China aprova uso da CoronaVac para crianças a partir de 3 anos, diz Sinovac.
    9. Han, B, Song, Y, Li, C, Yang, W, Ma, Q, Jiang, Z, … & Gao, Q (2021) Safety, tolerability, and immunogenicity of an inactivated SARS-CoV-2 vaccine (CoronaVac) in healthy children and adolescents: a double-blind, randomised, controlled, phase 1/2 clinical trial, The Lancet Infectious Diseases
    10. Mattos, L. (2021). Butantan entra com novo pedido para aprovar uso da Coronavac a partir dos 3 anos, Folha de São Paulo 
    11. Giving Compass. (2021). The Impact Of The Delta COVID Variant On Unvaccinated Youth.

    Outros materiais:

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Maurílio é autor no Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Vacina de Pólio e a segurança dos protocolos de vacinação atuais

    Texto escrito por Flávia Ferrari

    O primeiro texto sobre vacinas, da equipe do Todos Pelas Vacinas, falou sobre Reações Adversas, com a Mellanie Fontes-Dutra! Hoje nós vamos falar sobre uma vacina especial, que é o coração do Programa Nacional de Imunização e a grande vedete dos fãs de vacina: a vacina de pólio (poliomielite ou a gotinha!).

    O que é pólio?

    Temos relatos de poliomielite (popularmente conhecida como paralisia infantil) desde a antiguidade. Não é, portanto, uma doença recente em nossa história, como humanidade. Porém, o vírus só foi descoberto no começo do século XX. A trajetória foi, portanto, longa até entendermos o que causa esta doença!

    A principal forma de transmissão é por contato com as fezes. Isto é, fecal-oral. Mas também pode ser transmitida de forma oral-oral. A paralisia infantil é assintomática em 95% dos casos. Todavia, em 1% dos casos podem se desenvolver sintomas graves, menos de 0,05% morrem.

    Se olharmos estes números, de alguma forma (curiosa até) eles colocam em xeque as discussões que temos hoje sobre a COVID. Isto porque muitos afirmam sobre os supostos “baixo riscos” que crianças têm ao contraírem a doença a COVID-19. Entretanto, nós sabemos que devemos tentar preservar o máximo de vidas possível, especialmente quando se trata de doenças e mortes evitáveis! Aliás, isso ainda intensifica-se ao refletirmos nas sequelas para toda uma vida e no impacto disso para a saúde pública. 

    Jonas Salk e a poliomielite

    Mas o assunto hoje é a pólio e a vacina! Então, quero contar um pouco sobre a história da pesquisa de Jonas Salk. Salk trabalhava desde 1941 com o vírus Influenza (gripe) e em 1947 começou seus estudos sobre a poliomielite. Em 1949, outros pesquisadores desenvolveram um método in vitro de propagação do poliovírus. Salk usou a técnica para produzir grandes quantidades de vírus e iniciar testes de inativação do vírus. Salk acreditava que a vacina poderia ser feita de vírus morto, produzindo assim anticorpos através da presença no sangue. 

    Os primeiros testes de segurança foram feitos em cerca de 5000 indivíduos. Salk chegou até mesmo a inocular a vacina experimental nele mesmo, na esposa e nos seus três filhos. 

    Após esses testes de segurança em pequena escala, realizou-se o maior estudo clínico já feito, recrutando 1,8 milhões de crianças só nos Estados Unidos, para realizar os testes de fase 3. 

    No caso da COVID, por se tratar de um vírus com transmissão muito mais comum, precisamos de grupos menores para tanto. Os testes de fase 3 não passaram de dezenas de milhares. 

    A aplicação da vacina de pólio

    Voltando ao teste de Salk, já em 1955, a vacina começou a ser aplicada em massa. Com um controle muito menos rígido que os atuais houve uma grande falha em um laboratório que não utilizou o procedimento correto para inativar o vírus. Com isso, de 380 mil doses lançadas pelo laboratório, 164 crianças ficaram paralisadas (0,043%) e 10 morreram (0,003%), uma porcentagem muito baixa, em relação ao total de vacinas aplicadas. No entanto, mesmo com uma porcentagem baixa assim, este foi considerado o maior desastre biológico da história dos Estados Unidos da América. 

    Aliás, tão desastroso que culminou na mudança de todo o padrão de checagem de segurança das vacinas, até os dias atuais no mundo inteiro. A cepa utilizada era a mais virulenta também, algo inimaginável nos dias atuais.

    Cabe ressaltar que após esse incidente, nenhum evento desse tipo ocorreu mais.  Devido às novas técnicas de segurança e ao controle de qualidade para as vacinas, que inclusive ajudaram a melhorar os procedimentos atuais.

    Hoje no Brasil, usamos a CoronaVac como vacina contra COVID-19 tendo a tecnologia de vírus inativado que possui mais de um método de inativação. Isto é, o utilizado pela vacina Salk e também métodos de radiação de alta frequência. Além disso, usamos atualmente métodos de controle muito mais efetivos.

    Como assim? Quer dizer que usam o mesmo método catastrófico do Salk? Não. Quer dizer que aprimoramos a tecnologia de inativação do vírus, construímos conhecimento sobre nossos erros

    Hoje, o método de vacinas de vírus inativado é considerado muito seguro.

    Em 1961, com a continuidade da vacinação e revisão dos protocolos, os casos reduziram 90% só nos Estados Unidos. No Brasil, a vacina começou a ser utilizada a partir de 1960.  Porém não temos dados seguros da redução, pois não havia notificação compulsória até 1968. 

    Na década de 80 surgiram os Dias Nacionais de Vacinação (e o Zé Gotinha – A gente tem um vídeo fofo disso). Em 1991 houve o último caso de pólio nas Américas! Um marco histórico de vitória de uma política pública de saúde tão importante!

    Em 1994 fomos certificados como área livre de circulação de pólio selvagem. Segundo projeções, se a queda continuar no mundo todo (hoje apenas Nigéria, Afeganistão e Paquistão e outros casos relatados em outros países), em 2024 poderemos ter erradicado o vírus no mundo, 70 anos após o desenvolvimento da vacina.

    Segundo a Organização Mundial da Saúde, erradicar a poliomielite significaria uma economia mundial de cerca de 40 bilhões de dólares, pelo menos. Este número torna-se ainda mais significativo quando levamos em conta que são países de baixa renda os afetados por esta doença. Mas mais importante do que isto, a OMS aponta que:

    Quando a pólio for erradicada, o mundo poderá celebrar a entrega de um grande bem público global que beneficiará todas as pessoas da mesma forma, não importando onde elas vivam (…) o sucesso significará que nenhuma criança voltará a sofrer os terríveis efeitos da paralisia provocados pela poliomielite ao longo da vida

    E o que isto tem a ver com a vacinação de COVID-19, o Todos Pelas Vacinas e nossa campanha de vacinação infantil?

    É importante termos noção de que a ciência não funciona em saltos com soluções inéditas. Sabemos que vivemos atualmente um momento difícil, que parece se arrastar por nossas vidas e esperamos diariamente notícias de que a pandemia acabou. Mas compreender estes processos científicos também torna-se parte da possibilidade de confiar mais ainda nos processos científicos. Isto é, compreender que a ciência funciona a partir de análises anteriores, técnicas já desenvolvidas, aprimoradas, para problemas contemporâneos e novos. A vacina para Covid, como não poderia deixar de ser, utilizou-se de plataformas, técnicas e conhecimentos prévios para ser desenvolvida com segurança para nós e para as crianças.

    Assim, reforçamos alguns pontos: Vacinas salvam vidas, mas não extinguem o vírus em um passe de mágica. A pesquisa em vacinas pode ser rápida, ainda mais se houver interesse público, financiamento e uso de plataformas já desenvolvidas. As vacinas não foram desenvolvidas rapidamente como passe de mágica, nós utilizamos saberes prévios, como são as outras usadas atualmente. Por exemplo, a vacina de RNA que já vinha sido desenvolvida para outros vírus.

    Além disso, a aplicação de vacinas em massa ocorrem após testes em grupos para verificar a segurança. Erros que aconteceram no passado balizaram métodos que asseguram formas muito mais confiáveis de produção. Ou seja: Aprendemos e evoluímos muito em segurança e qualidade para que erros do passado não aconteçam mais

    Em suma, as vacinas…

    As vacinas usadas para a COVID-19, tanto em adultos, quanto as vacinas pediátricas são seguras, seguiram protocolos rígidos, aprimorados em dezenas de anos. Assim, não precisamos ter receio em relação à vacinação atual e teremos um mundo mais sadio e com menos adoecimentos, quanto mais pessoas estiverem vacinadas!

    Para Saber Mais:

    Neto Tavares Fernando. O início do fim da poliomielite: 60 anos do desenvolvimento da vacina. Rev Pan-Amaz Saude [Internet]. 2015.

    Organização Panamericana de Saúde. Poliomielite

    Paul JR. A history of poliomyelitis. New Haven: Yale University Press; 1971.

    Polio Global Erradication Iniciative

    Fiocruz. Salk versus Sabin: dois personagens e suas estratégias contra a pólio

    BBC News. ‘Incidente Cutter’: a tragédia nos EUA dos anos 1950 que resultou em vacinas mais seguras

    A autora

    Flávia Ferrari continua a série maravilhosamente bem iniciada pela Mellanie Fontes-Dutra, que falou sobre reações adversas das vacinas, contando um pouco de histórias de pesquisas em vacina, em especial de uma que todos tomaram: A pólio (ou a gotinha). Flávia é bióloga e atua como professora de ciências e autora de materiais didáticos, integra os grupos Observatório da COVID-19 Brasil e Todos Pelas Vacinas.

    Este texto compõe uma série para a campanha Vou Vacinar, do Todos Pelas Vacinas, Flávia é autora convidada do Especial COVID-19. 

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • Passaporte Nacional de Imunização e Segurança Sanitária – Faz sentido isso? – Updated

    Texto escrito por Marina Fontolan e Ana de Medeiros Arnt

    Há alguns meses, fizemos um texto comentando o Projeto de Lei 1674/2021 que trata do Passaporte Nacional de Imunização e Segurança Sanitária (PSS). No entanto, com o avanço da vacinação no Brasil e no mundo, precisamos revisitar essa questão. Aqui, argumentamos ser indispensável a exigência do passaporte vacinal, não apenas nas fronteiras do país, mas mesmo internamente.

    Antes de argumentarmos sobre isso, vamos retomar alguns dos principais pontos que discutimos no texto passado:

    A vacinação não é compulsória;

     Sim! É verdade. A vacinação não é compulsória e defendemos isto! A vacinação, mesmo sendo obrigatória, não é compreendida como sendo uma ação que o Estado brasileiro pode efetuar de forma coercitiva. Existe diferença substancial entre estas duas noções. A vacinação, por ser obrigatória, pode se vincular a atos restritivos a serviços públicos quando não tomarmos. Por exemplo, pode-se restringir nosso acesso a concursos ou serviços públicos específicos, por meio de lei, impossibilidade de matrícula em escolas e universidades, entre outros serviços.

    Podemos seguir sem tomar as vacinas que decidimos não tomar. Todavia, aquelas que são consideradas obrigatórias, podem ter medidas de restrição para acesso de serviços fornecidos pelo nosso país. Essa lógica vale para qualquer outro tipo de decisão que tomamos. Por exemplo: não podemos dirigir sem nossa CNH, mas há pessoas que o fazem e que podem ser punidas por isso se forem pegas. Por exemplo: o voto é obrigatório. Se não votarmos e não justificamos, temos uma pendência com o governo, alguns serviços também ficam suspensos até que paguemos a multa. Não somos PRESOS por isso, mas temos uma restrição legal para acessar espaços e serviços.

    Não deveria ter discriminação de espaços por ações individuais e opções relacionadas ao nosso corpo;

    Este é um ponto interessante e repleto de vieses. Não existe discriminação no sentido de preconceitos contra a pessoa que não quer se vacinar. Mas existe, no pressuposto da lei, a intenção de que pessoas vacinadas ou imunizadas estão seguras e, portanto, podem circular sem prejudicar outras ao seu redor.

    Nestes casos, a idealização da lei poderia ser entendida pelo bem coletivo, mais do que pela criminalização do que se faz com o corpo individual e as decisões acerca disso… O que nos leva para o próximo item. 

    O estado não deveria controlar nossos corpos;

    A princípio não. Mas esta fala é perniciosa em tantos sentidos, não é mesmo? A liberdade sobre os nossos próprios corpos é um debate absolutamente profundo e necessário. Que não se restringe à vacinação. Ela diz respeito a termos o direito de assumirmos quem nós somos – diz respeito à nossa identidade como cidadão de uma sociedade, de uma nação. Assim, o direito ao nosso próprio corpo é parte da minha condição humana e de minha vivência neste país.

    Eventualmente esta liberdade é cerceada quando eu coloco em risco a vida e a segurança dos outros. De qualquer modo, a noção de risco à sociedade é mais vago e difícil de delimitar do que pode parecer.

    Existem várias pessoas que vêm lutando pelo direito de ser quem são, juridicamente, em nosso país há décadas. Direito de ir e vir, casar com quem quiserem, beijar, transar, ter filhos com quem quiserem, quando (e se) quiserem.

    O Estado, ao tornar a vacina obrigatória, não controla o teu corpo – ele te dá a opção de usar diversos serviços públicos ou te restringir acesso a eles.

    Ninguém tem qualquer direito de agir coercitivamente em relação ao teu corpo, vacinando-te. Tens razão, o estado não deveria controlar nossos corpos. Mas não é em processos de vacinação que isto acontece, mesmo quando isto é obrigatório.

    A segurança sanitária coletiva está acima da individual;

    Sim! A segurança sanitária diz respeito à coletividade. A vacina, individualmente, não faz sentido. Se você está vacinado sozinho, não existe qualquer vantagem em relação ao controle da doença e sua circulação. A vacina é um projeto público de controle de doenças em nossa sociedade. E é por isso que, idealmente, ela é obrigatória. Pois visa à saúde da humanidade, acima de indivíduos isolados.

    É fundamental um indivíduo se vacinar, junto com os milhões que vivem próximo a ele. A vacinação, mais do que nos proteger isoladamente, faz com que os vírus não circulem. Neste sentido, quem não pode vacinar por alguma questão de saúde particular, também está protegida! E a vacinação de algumas doenças – talvez a COVID-19 se encaixe aí (ainda precisamos de alguns dados sobre isso) – precisam ser periódicas. Como a gripe, por exemplo.

    • Existe controle de doenças altamente infecciosas com documentos “teste de detecção negativo” com teste de validade

    Por que um passaporte vacinal faz sentido então?

    Há vários pontos que temos que considerar sobre o assunto. O primeiro deles é que a vacinação está avançando muito em muitos países do mundo, ainda que de forma muito desigual. O acesso à vacinação, pelo menos dentro do Brasil, está muito mais facilitado na atualidade e não tomar vacina – na maioria dos casos – está mais ligada à falta de vontade da população de tomá-las do que à falta de acesso. 

    Também é importante notar que o pouco acesso às vacinas fez com que uma nova variante surgisse, a Ômicron. Assim, se quisermos realmente voltar às nossas atividades normais, precisamos exigir a vacinação para que possamos nos proteger contra a Covid e controlar melhor o surgimento de novas variantes.

    Por fim, temos que lembrar sempre que o Brasil continua não fazendo testagem em massa da população. Seguimos ocupando um lugar irrisório no hanking mundial em relação à testagem por milhão de habitantes. Ainda que os números de internações estejam diminuindo no país, não temos como saber com exatidão como a pandemia está no país e, por isso, não temos como ter certeza quando poderemos ter um abrandamento de medidas restritivas. Exigir o passaporte vacinal, assim, vai ajudar o país no controle da pandemia já que sabemos que as vacinas dificultam que o vírus se espalhe com a mesma facilidade de antes. No entanto, é importante notar que o passaporte vacinal não deve substituir testagem em massa, essa sim a forma mais correta de levantar dados para estudar abrandamento das medidas restritivas.

    Lembrem-se: já existe passaporte para outras doenças, quando viajamos para o exterior!

    Outro ponto importante desta questão está relacionado à entrada em outros países. Não é de hoje que alguns países exigem que as pessoas estejam vacinadas para determinadas enfermidades. Um exemplo disso é o México, um país que exige que as pessoas que entrem em seu território estejam vacinadas contra febre-amarela. No entanto, é importante notar que, mesmo estando vacinados, há países que continuam não aceitando a entrada de pessoas de determinadas nacionalidades ou que tenham certos países de origem. Este é o caso dos brasileiros já totalmente vacinados contra a Covid-19. Afinal, os países temem a circulação de variantes e a morosa vacinação no Brasil está sendo fator decisivo nisso. Assim, mesmo que o governo brasileiro crie seu próprio ‘passaporte vacinal’, ele pode não ser aceito em outros países.

    Por outro lado, o passaporte entre países com as doenças sob controle – ou no caso de inexistência da doença há muitos anos (mas ainda existência de hospedeiros intermediários, como no caso da febre amarela) o passaporte adquire outro sentido: a da tentativa de manter a doença erradicada naquela localidade. Um passaporte contra a febre amarela entre fronteiras de países (como Brasil e México) faz mais sentido do que um passaporte interno entre localidades de uma cidade, no caso da COVID-19. Estamos habitando os mesmos espaços e circulamos em espaços conjuntos, antes de adentrar um território cujo acesso seja restrito. Enquanto não controlarmos a circulação do vírus com medidas não farmacológicas, além da vacina em conjunto, e mantivermos a transmissão alta na população, este passaporte tem pouca efetividade na prática.

    Finalizando

    Considerando o avanço da vacinação no país e no mundo, consideramos que o uso do passaporte vacinal é essencial. É ele que garante que a pessoa realmente tomou a vacina e, por isso, não transmite o coronavírus com a mesma facilidade que uma pessoa não vacinada. Além disso, é esse documento que vai proteger nossa população na circulação de novas variantes, como o caso da Ômicron. Por fim, é esse documento que vai proteger a população contra o negacionismo científico e contra os antivax.

    Este texto foi escrito originalmente para o Especial COVID-19, em 21/06/2021 e atualizado nesta versão em Dezembro de 2021.

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, produziu-se textos produzidos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, a revisão por pares aconteceu por pesquisadores da mesma área técnica-científica da Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.

  • #VacinaNoGrau: Pfizer, tá passada?

    Texto escrito por Mellanie Fontes-Dutra e Ana Arnt

    A Pfizer é a vacina que está sendo utilizada para eles: os jovens, aqui no Brasil, na campanha de vacinação neste momento. Tá passada?

    O anúncio dos resultados sobre a eficácia da Pfizer em adolescentes aconteceu no dia 31 de Março de 2021. E hoje, já que estamos lançando a campanha #VacinaNoGrau, resolvemos retomar este estudo! Aliás, já de cara, a notícia foi animadora. A eficácia foi muito alta e não foram observados casos de COVID-19 na amostra analisada de participantes adolescentes nesse estudo!

    Vamos entender como foi a pesquisa?

    O ensaio envolveu 2.260 adolescentes de 12 a 15 anos de idade nos Estados Unidos. Foram observados 18 casos de COVID-19 no grupo de placebo (que teve um N amostral de 1.129 adolescentes). Já no grupo vacinado (que teve um N amostral de 1.131 adolescentes), não houve nenhum caso.

    Em função de nenhum caso ter sido observado no grupo vacinado, a eficácia estimada chega a 100%. Todavia, é sempre bom lembrar que, esse dado é para uma amostra de 18 eventos. Isto é, quando extrapolamos este dado para milhares de vacinados – como ocorre na população geral – a possibilidade sempre é de que a gente observe um ou outro caso de COVID-19 em vacinados sim!

    E o que isto quer dizer? Que as medidas não farmacológicas de uso de máscaras, distanciamento físico e cuidados redobrados em espaços fechados e não ventilados seguem valendo E MUITO.

    Voltando aos dados do estudo, a vacina demonstrou ter uma proteção considerável contra agravamentos também! A regra do anterior segue valendo: a vacina é segura e têm proteção considerável, mas medidas não farmacológicas seguem sendo fundamentais. A gente não cansa de repetir isso, só para ter em mente isso. Isto é, para daqui a pouco ninguém vir dizer, se em milhares de vacinados aparecer algum caso: “AAAAH MAS NÃO ERA 100% EFICAZ?”. 

    Siacalme rapaz, isso não invalida TODA a proteção da vacina não

    Vamos falar de Imunogenicidade agora…

    A vacina desencadeou uma boa quantidade de anticorpos neutralizantes de SARS-CoV-2. Assim, esta vacina demonstra forte resposta imunológica um mês após a 2ª dose. Aliás, na análise anterior com participantes de 16 e 25 anos, essas quantidades também foram bem significativas. 

    E a tal da segurança?

    A vacina foi bem tolerada, com efeitos colaterais geralmente consistentes com aqueles observados em participantes de 16 a 25 anos de idade. Isto é: te joga guri, que vai dar bom.

    Mas não para por aí não… O estudo está sendo atualizado

    Como assim? Claro, ainda há mais grupos e faixas etárias para sabermos sobre a vacina, né? Dessa forma, está em andamento a atualização do estudo com crianças de 11 anos. Neste estudo, de fase 1/2/3 está sendo conduzido com crianças de 6 meses a 11 anos. Assim, avaliando segurança, tolerabilidade e imunogenicidade da vacina em um esquema de duas doses (aproximadamente 21 dias de intervalo)

    Os grupos:

    – Crianças de 5 a 11 anos

    – 2 a 5 anos

    – 6 meses a 2 anos.

    A coorte de 5 a 11 anos começou a receber as doses ainda em março. E nos planos estava iniciar a coorte de 2 a 5 anos em abril de 2021.

    Aprovadíssima

    No Brasil, a Nota Técnica Nº 36/2021-SECOVID/GAB/SECOVID/MS inclui crianças e adolescentes de 12 à 17 anos na campanha de Vacinação.

    Nesta nota técnica (NT), o Ministério da Saúde (MS) considera primordial que 85% da população brasileira seja vacinada contra COVID-19. Isto, a fim de reduzir drasticamente a transmissão da doença em nosso país. Dessa maneira, considerando o registro na Anvisa, em 10/06/2021, a Pfizer foi autorizada para a vacinação de jovens nesta faixa etária. Aliás, é a única, até o presente momento.

    A NT ressalta que a vacinação de adultos acima de 18 não foi concluída. Também aponta que esta faixa etária corre, significativamente, mais riscos de contrair e ter agravamentos no caso de COVID. Todavia, a vacinação dos jovens – que retornaram à escola, bom lembrar – é uma das ferramentas para isto para diminuir a transmissão de forma geral.

    Sobre os riscos em jovens

    Além disso, jovens com algum fator de risco relacionado a comorbidades, como traz a nota técnica, também aumentam a chance de agravamento. Dessa forma, este é outro fator que justifica a vacinação desta faixa etária, mesmo não tendo sido finalizada a vacinação de adultos.

    Figura retirada da Nota Técnica

    Tendo em vista estas análises, o MS através incluiu jovens de 12 a 17 anos no Plano Nacional de Operacionalização de Vacinação contra a COVID-19.

    Dia 15 de setembro, segundo a NT, teremos concluída a remessa de doses suficientes para vacinar 100% da população ADULTA com pelo menos uma dose! Aliás, hoje também inicia oficialmente o calendário de oferta de vacinas se dá a partir de 15 de setembro. Embora em alguns estados e municípios tenham começado antes. Todas as vacinações nesta faixa etária acontecerão, exclusivamente, com a vacina da Pfizer. 

    A ordem de prioridade para vacinação desta faixa etária é população de 12 a 17 anos:

    1. Com deficiências permanentes.;
    2. Com presença de comorbidades;
    3. Gestantes e puérperas;
    4. Privados de liberdade;
    5. Sem comorbidades.

    O que mais acontece dia 15 de setembro?

    Isto mesmo, a nossa campanha #VacinaNoGrau, destinada a todos aqueles jovens que estão iniciando esta etapa fundamental no combate à COVID-19!

    Acompanhe as datas no seu município para ver quando chegar o teu dia!!

    Por fim, lembre-se: vacinou? Se exibe por aí MESMO! Afinal, a vacinação é um direito de todos nós e uma alegria por fazer parte de mais uma etapa para vencermos a COVID-19!

    Aliás, inclusive marca o Todos Pelas Vacinas, marca os grupos parceiros, marca nossas tags #TodosPelasVacinas e #VacinaNoGrau, comemora mesmo! Mas, claro, comemora de máscara, com distanciamento, respeitando as regrinhas básicas não farmacológicas ahahahaha.

    Para Saber Mais

    MINISTÉRIO DA SAÚDE, SECRETARIA EXTRAORDINÁRIA DE ENFRENTAMENTO À COVID-19, NOTA TÉCNICA Nº 36/2021-SECOVID/GAB/SECOVID/MS

    BRASIL Lei nº 14.190, de 29 de julho de 2021

    BRASIL Lei nº 14.124, de 10 de março de 2021

    PFIZER-BIONTECH (2021) Pfizer-BioNTech Announce Positive Topline Results of Pivotal COVID-19 Vaccine Study in Adolescents 

    As autoras

    Ana Arnt é Bióloga, Doutora em Educação, Coordenadora do Blogs de Ciência da Unicamp e do Especial COVID-19

    Mellanie Fontes-Dutra é biomédica, doutora em neurociência e pesquisadora na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Divulgadora Científica na Rede Análise COVID-19

    Este texto é original e escrito com exclusividade para o Especial Covid-19

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    Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores. Dessa forma, os produziram-se textos a partir de campos de pesquisa científica e atuação profissional dos pesquisadores. Além disso, os textos passaram por revisão revisado por pares da mesma área técnica-científica na Unicamp. Assim, não, necessariamente, representam a visão da Unicamp e essas opiniões não substituem conselhos médicos.


    editorial

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